It Hurts So Good escrita por IsaWonka


Capítulo 1
1


Notas iniciais do capítulo

Para a Yuka-chan.



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            A porta estava entreaberta e um pequeno feixe de luz projetava-se para dentro do quarto como se fosse um corte na escuridão. Nas paredes brancas, havia quadros que produziam marcas escuras, como se fossem buracos. As figuras de pessoas pareciam sorrir de forma macabra, os ambientes cuidadosamente pintados para parecerem alegres transformavam-se nas mais estranhas florestas esculpidas pela noite.

            Silêncio. Os relógios; as pessoas que, corajosamente, ainda ficavam pela rua; corujas; o vento — tudo estava parado. Nada se movia ou demonstrava qualquer sinal de vida, exceto o norueguês.

            Sua respiração estava exaltada. Deitado na cama, o feixe sorrateiro de luz incomodava-o ao extremo, mas ele não conseguia se levantar para fechá-la — ficar na escuridão total seria ainda pior. Além disso, seu corpo parecia não colaborar: as pernas estavam fracas e trêmulas, a pele estava molhada pelo suor e estava quente, febril.

            Ele virava a cabeça de um lado para o outro, de olhos fechados, como se estivesse tendo um pesadelo. O suor encharcara-lhe o travesseiro e ele tinha a sensação de que não conseguia mover os braços com naturalidade. Era como se algo impedisse, como se estivesse preso.

            Com dificuldade, ouviu alguns leves passos ao longe. Junto com os passos, vieram os sussurros. Eram de uma voz que Adrien não conseguia distinguir, embora lhe parecesse familiar. Aos poucos, pareciam várias vozes falando ao mesmo tempo. Era algo desconexo, incompreensível.

            Como temia, seus olhos semicerrados viram uma sombra projetar-se em meio a pouca luz que invadia o quarto. Parecia disforme, parecia ter algo errado com ela... Quatro braços. Não, eram as pernas. A cabeça... Adrien não conseguia distinguir. Queria levantar, mas não podia — ainda sentia-se preso à cama. Queria gritar, falar alguma coisa, mas sua garganta estava travada como em uma sensação de choro e respirar ficava pior. Aos poucos, a imagem transformava-se em duas, como se fossem gêmeos siameses.

            O norueguês piscou os olhos várias vezes. Fechou-os por um instante e, ao abri-los novamente, tudo havia sumido: a figura, os sussurros, mais nada estava ali. Tentou mover o corpo e conseguiu, sentando-se vagarosamente, com certo receio. Os pés descalços tocaram o chão — extremamente frio — e ele sentiu as pernas fraquejarem. Com a respiração ofegante, retomou o equilíbrio e abriu a porta cuidadosamente, alargando a luz que se esgueirava para dentro de seu — suposto — quarto.

            A casa parecia diferente. “Não é a minha...” pensou, analisando o ambiente que também lhe era familiar. “Essa é... É a casa de Aleksander...”. A única diferença era que os corredores pareciam estender-se sem fim, tomando forma apenas quando o norueguês se aproximava.

            Adrien passou a sentir que alguém o seguia. Ao olhar para trás, não via nada ali — naturalmente. Começou a andar mais rápido e algo dentro de sua cabeça o mandava sair daquela casa. Os passos ficaram cada vez mais apressados, até que ele começou a correr.

            Correu até o corpo não aguentar e só então percebeu como os ambientes repetiam-se em um corredor infinito. Não chegava a lugar algum e pensou que não havia saída até avistar uma porta diferente no fim de um cômodo. Voltou a correr e, ao abrir a porta, deparou-se com uma escada.

            Tarde demais para parar, caiu. E caiu aos pés de alguém — alguém que ele conhecia muito bem.

            — Adrien?

            O louro sorriu, amável, enquanto observava o norueguês contorcer o corpo dolorido.

            — Novo esporte, rolar escada abaixo?

            — A-aleks...

            — O que foi?

            — E-eu... A sua casa... Ela...

            Aleksander balançou a cabeça negativamente e sentou em um degrau, segurando o norueguês nos braços.

            — Assaltaram a minha casa?

            — N-não... — ele respirava com dificuldade, agarrando-se ao sobretudo do dinamarquês.

            — Você foi correr dele e... O que você estava fazendo dentro da minha casa, Ad? — levantou uma sobrancelha, pensativo.

            — Não é a...

            — Não é...? Você quer brincar de mímica?

            Adrien fechou e apertou os olhos. Há poucos instantes, vira uma aberração humana tentar entrar em seu quarto, correra por uma casa completamente viva, despencara de uma escada e agora estava nos braços do dinamarquês, ouvindo-o com as brincadeiras de sempre.

            — Não é a sua casa — sussurrou, sem força.

            — Como não? Eu acabei de voltar de uma conferência mundial e você estava lá. Por que veio pra cá ao invés de ter ido para a sua casa? Achei que você tivesse ficado conversando com o Sveinn.

            — Mas eu não... Fui...

            — Mas eu te vi lá.

            — Aleksander...

            — Você estava lá!

            — Cale... Essa boca...

            — Mas eu te vi, eu te vi — cantarolou outra vez, só para irritá-lo.

            Adrien tentou respirar, parando a inspiração na metade: seu corpo doía ao fazê-lo. Se não tivesse caído na escada, já teria batido no dinamarquês ou corrido para longe. Ou os dois. Mas não podia.

            — Eu não... Queria...

            — Ter caído da escada — completou. — Eu sei.

            — Não... Aleksander... — as falas do norueguês eram pausadas, ele se comunicava com dificuldade. — Não queria... Ter te deixado...

            Naquele momento, o dinamarquês voltou a sorrir, abraçando-o um pouco mais forte.

            — Aleksander... Meu corpo dói...

            Adrien sentiu a força do abraço aumentar, fazendo-o gemer baixo com a dor. Sua respiração voltou a ficar ofegante, enquanto Aleksander apertava-o cada vez mais.

            — A-aleksander!

            O dinamarquês beijou-lhe os lábios com agressividade, sem soltar-lhe o corpo dolorido. Parecia que, quanto mais o norueguês resistia, mais ele o torturava. Por fim, Aleksander o mordeu com força, fazendo-o sangrar.

            O sangue norueguês escorria pelo pescoço, manchando a pele clara e fazendo o tecido das roupas mudarem de cor sutilmente. Adrien gemeu, apertando os olhos, enquanto suas mãos apertavam o tecido do sobretudo dinamarquês — a força era tanta que os nós de seus dedos ficavam brancos.

            Adrien gritou antes de ver-se dentro de um quarto novamente.

            Era um cômodo normal que ele não conhecia. Havia ali uma cama de casal, uma mesinha simples no canto — com um pequeno vaso de flores sobre si — e carpete no chão. Quando Adrien sentiu os pelos fofos em seus pés, reparou que estava descalço.

            Com um pulo, o norueguês viu a maçaneta se mexer e, mais assustado ainda, viu que duas pessoas entravam no quarto.

            Uma delas ele já tinha visto.

            A outra era mais alta que o primeiro e também vestia um sobretudo — porém, azul. Os cabelos eram claros, bem como os olhos. E ambas beijavam-se vorazmente, tanto era o entusiasmo que fechar a porta foi complicado — eles não se separavam nunca.

            Adrien sentiu o corpo estremecer. Estaria excitado vendo aquilo? Não. Era outro sentimento. Parou por alguns segundos e pensou. Tentou desviar o olhar e não conseguiu. Tentou se mover e também não conseguiu. Queria sair dali. Não queria assistir àquela cena, Aleksander era... Seu.

            Quando tentou falar, a voz não saiu. Quando fechava os olhos, continuava a ver a cena do mesmo jeito e, com horror, percebeu que estava sem as pálpebras. O sangue voltou a escorrer pelo seu rosto e ele gritou — porém, ninguém mais o ouviu.

            Caiu de joelhos, levando a mão até os olhos e sentindo o sangue invadir-lhe a boca. O gosto metálico logo se espalhou por todo o seu paladar e ele tossiu. Subitamente, o corte feito pela mordida de Aleksander também se abriu. Sua boca voltou a sangrar e a dor se alastrou pelo seu corpo novamente — a dor de ter caído pela escada.

            Com dificuldade, percebeu que alguém estava ao seu lado.

            Era seu irmão.

            Tentou chamar-lhe a atenção, segurar-lhe o pé, a roupa, qualquer coisa. Quando conseguiu, Sveinn sorriu ao vê-lo naquela situação.

           

            O sorriso islandês foi a última coisa que Adrien viu antes de perceber que estava sob uma espécie de mesa. Uma corda prendia seus tornozelos e seus braços estavam amarrados acima de sua cabeça.

            Não conseguia ver ninguém por perto. Além da mesa, tudo estava escuro.

            Também não conseguiu ver nada quando seu corpo começou a ser esticado.

            Aos poucos, a dor se alastrava. A garganta gritava descontroladamente enquanto suas juntas abriam-se. A respiração parecia não ser suficiente. Adrien tentava mover a cabeça para algum lado, para ver alguém, mas não conseguia. O corpo crescia cada vez mais, os órgãos estouravam. A dor era intensa demais. Simplesmente entregou-se.

            Fechou os olhos e desmaiou, esperando a morte.

            De repente, acordou sentado em sua cama. O quarto todo estava escuro. O que seus olhos viam era o mesmo quarto do começo de seu pesadelo. A porta entreaberta. A luz entrando. Os quadros medonhos, os olhares desconfiados. A sombra.

            Adrien estremeceu quando viu uma sombra invadir a luz de seu quarto novamente. Não fosse pelo pavor, teria gritado. Mas seu grito foi sufocado quando se deu conta de que conhecia aquela silhueta.


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Notas finais do capítulo

Reviews. Senão, espero que vocês tenham pesadelos.