Photograph escrita por Nyuu D


Capítulo 2
Capítulo 2




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/99935/chapter/2

Alô.

– Tezuka – ele ficou enrolando uma mecha rebelde de fios dourados no dedo enquanto olhava para a assinatura de Tezuka na página do livro. Duas semanas haviam se passado. O inverno já batia à porta, gelando ainda mais o clima da cidade. Entretanto, ainda havia folhas remanescentes nas árvores. – Sou eu, Atobe.

Oi...

– Muito interessante seu autógrafo, mas sugiro que não deixe seu número de telefone para todo mundo que pedir um. – Disse com bom humor. Tezuka não respondeu. – Veja bem, eu estou ligando porque queria que você aceitasse minha oferta de fazer uma noite de autógrafos. Eu dei seu livro para o meu pai ler, ele gostou muito, ele gosta muito da era Edo. Ele se interessou.

Tezuka ficou em silêncio por mais uns instantes. Keigo ia falar, mas achou melhor calar-se e esperar que o outro reagisse. – Do que se trata uma noite de autógrafos?

Bingo.

– Bem, normalmente acontece numa livraria, com algum coquetel, imprensa, essas coisas.

Não sou conhecido o suficiente para atrair tanto o público.

– Mas os convidados do meu pai são. Tezuka, entenda, para ascender na vida, é muito importante ter bons contatos.

O que eu posso fazer para retribuir o favor?

– Ai, ai, Tezuka... Você fica oferecendo essas coisas pra mim – ele soltou um suspiro sedutor no telefone e ficou imaginando a cara de constrangimento de Kunimitsu do outro lado da linha. – Depois eu penso no que você pode fazer para retribuir. Por enquanto, apenas pense no que vai vestir, tem que ser algo que te deixe muito elegante.

... Quando isso vai acontecer?

– Daqui a quinze dias.

Então você já marcou, tendo certeza que eu ia aceitar?

– Se você não aceitasse, eu ia acabar armando pra você ir parar lá de algum jeito. – Confessou. – Mas, já que você aceitou, pelo menos as coisas serão mais fáceis.

Tezuka suspirou ruidosamente. – Em todo caso, obrigado.

– É um prazer. Me passe seu e-mail ou algum outro contato pra eu enviar tudo o que você vai precisar. Porque, do resto, os organizadores da empresa vão cuidar.

Tezuka nunca teve tanta atenção direcionada para sua pessoa como naquele dia. Estava adequadamente vestido com um blazer preto, camisa branca, e um cachecol lilás comprido no pescoço. E sentado numa poltrona, atrás de um balcão, onde pessoas faziam fila com seu livro na mão para um autógrafo...

Isso era estranho, ele sabia que os Atobe eram influentes, mas não imaginava que ia reunir tanta gente assim. Enfim. Keigo estava sentado ao seu lado, agindo como um verdadeiro assessor de imprensa, embora ele às vezes assinasse fotos de algumas pessoas que gostavam do trabalho dele, também. O nome dele certamente chamou muito a atenção delas.

– Sabe – Atobe disse a um determinado momento, enquanto Tezuka bebia um gole de água. – O que você acha que atraiu essas meninas para cá?

O rapaz não respondeu. Ele ajeitou os óculos no rosto e sorriu pequena e educadamente para uma menina de cabelos trançados que o chamou, encantada, de “Tezuka-sensei”, pedindo seu autógrafo na capa do livro. Ele pegou um canetão marcador e rabiscou quase num desenho seu nome ali.

Aquela, por exemplo, com certeza havia lido o livro antes de ir até aquele lugar.

– O que atraiu muitas delas foi aquela sua foto tão bonita nos anúncios da noite de autógrafos – Keigo respondeu a si mesmo, fazendo um gesto de falsa modéstia com a mão. É porque ele havia tirado a foto, é claro.

– Isso não soa muito bem para um escritor, Atobe.

– Não quis ofender, seu livro é excelente, eu já falei isso. Mas boa aparência ajuda, não?

Hunf. Tezuka era tão difícil, Atobe só estava tentando elogiá-lo.

Enfim, o loiro havia conseguido que muitos nomes importantes fossem para a livraria naquele tempo – vários deles, inclusive, se interessaram bastante pelo livro de Tezuka.

Ele ficou feliz, no final das contas, por acabar cedendo aos caprichos malucos de Keigo.

Depois daquele momento, um coquetel havia sido organizado na livraria, com um buffet que ocupou um lugar onde, normalmente, ficava um espaço destinado às crianças dentro da livraria. Havia uma imensa variedade de bebidas, canapés, pequenas barcas de sushi, e outros mimos totalmente desnecessários.

Tezuka estava sem fome, mas ficou com uma taça de Cosmopolitan nas mãos durante boa parte do tempo, já que Atobe insistiu que ele bebesse. Conheceu muitas pessoas, e também ouviu outras que o elogiavam dizendo o quanto choraram em uma ou outra passagem, o quanto o protagonista era incrível etc.

Em algum momento qualquer, Atobe estava de frente para Tezuka, segurando a sua quinta taça de Amaretto. Mas ele não estava bêbado, na realidade, estava muito bem, sorridente e de queixo erguido como sempre.

– Eu tenho certeza que quando você fizer um livro novo – Atobe mexeu a taça num movimento galante. – O tamanho da livraria na noite de autógrafos vai dobrar.

– Atobe – ele teve que insistir. Não conseguia compreender uma pessoa como aquela. – Eu ainda não entendi por que está fazendo tudo isso... Quer dizer – interrompeu-se. – Eu agradeço muito, mas bem, realmente, não há um motivo específico para você organizar isso tudo pra mim.

– Tezuka, eu sou uma boa pessoa. – Ele meneou a taça em sua própria direção. – E você é um talento, merece um espaço como esse.

O moreno assentiu suavemente com a cabeça e bebericou um gole da bebida nova que Keigo havia arrumado para ele – um Amaretto, também. As pessoas já estavam se retirando do local, quase sempre indo até Kunimitsu para despedir-se dele e parabenizá-lo mais uma vez, para então irem embora.

E quando a última pessoa foi embora, os pais de Atobe vieram dar boa noite aos garotos.

Tezuka retornou à mesa onde estavam suas coisas para recolhê-las e ir também. Um grupo de pessoas limpava tudo no meio tempo. Keigo ficou escorado no móvel enquanto o moreno guardava seus pertences dentro da bolsa transpassada.

– Então, como está se sentindo? – O loiro sorriu.

– A pergunta deveria ser direcionada a você, o idealizador disso é você.

– Eu estou me sentindo realizado. Ou quase – acrescentou e deu uns passos adiante quando Tezuka terminou o que estava fazendo e jogou a alça da bolsa no ombro. – Lembre-se que você ainda tem que fazer algo para retribuir o meu favor.

– Me pergunto o que vai ser... – Ele suspirou com um aparente bom humor.

Atobe sorriu, feliz por vê-lo daquela maneira. Tezuka era bem sério na maior parte do tempo, então, se ele estava com um jeito de que estava contente, era mais do que satisfatório. Os dois saíram da livraria e Keigo acenou para seu motorista que estava no estacionamento.

– Eu vou de ônibus pra casa.

– Desculpe, mas não enquanto estiver comigo – Atobe fez um sinal para que o motorista não fosse abrir a porta para ele. Obediente, o homem entrou no carro novamente.

Keigo abriu a porta da limousine compacta e fez um gesto com a mão para que Tezuka entrasse. O rapaz olhou hesitante para o interior do automóvel, que tinha bancos em couro cor de areia, suportes para copo e um mini frigobar.

– Vamos, eu insisto.

– Não me sinto confortável aceitando toda essa mordomia – Tezuka cruzou os braços. – Eu entendo que esteja acostumado com isso, mas eu não estou...

Atobe franziu o cenho. – Ainda acha que eu quero te comprar?

Podia até soar dessa maneira, mas Keigo não estava fazendo de propósito—sério. Ele estava tão acostumado com esse estilo de vida, que não era incômodo para ele. Não se sentia fazendo aquilo forçadamente ou intencionalmente, esperando que Tezuka se sentisse em débito.

– Não sei...

– Pode ir de ônibus se quiser, mas não vejo motivo pra recusar minha oferta. – Keigo empinou o nariz.

Tezuka olhou novamente para o interior da limousine e acabou tomando sua decisão fatídica:

– Vou de ônibus, obrigado. – Ele deu um passo atrás e curvou-se rapidamente diante de Atobe, como forma profunda e sincera de agradecimento por tudo o que foi feito pela sua pessoa. – Quando souber o que posso fazer para retribuir, não hesite em me ligar.

– Vou pensar nisso com carinho – ele resmungou, todo contrariado. O outro se afastou em seguida, segurando a pasta com firmeza entre os dedos, caminhando na direção do ponto de ônibus, ou seja lá que diabos fosse.

Atobe atirou-se dentro da limousine e esbravejou as ordens ao motorista que, coitado, não tinha absolutamente nada a ver com o fora que seu bocchama havia levado.

Já Tezuka não pôde evitar acompanhar com os olhos o movimento veloz do automóvel preto que levou Keigo para longe de suas vistas. Estava muito tenso. De repente percebia que fazia tudo o que Atobe queria sem sequer perceber o que estava de fato acontecendo – e não podia deixar que isso continuasse acontecendo, era loucura. Se tivesse mesmo entrado naquela limousine, sabe Deus o que teria acontecido.

Ele suspirou e parou no ponto de ônibus. Já era tarde, o ônibus devia demorar, mas tudo bem—era melhor do que se vender daquele jeito.

A partir daquele momento, Tezuka viu sua carreira lançar-se rapidamente para o alto. Seu livro foi lido por muitas pessoas pelo Japão todo, e ele chegou, em um mês, ao ponto de ser parado na rua por uma pessoa que dizia ter lido sua obra e perguntado quando sairia a próxima – sendo que ele nem tinha previsão para isso.

Inui Sadaharu, seu amigo e assessor, estava particularmente impressionado com a força que o nome Atobe tinha; muito embora já soubesse que aquela família era importantíssima e influente, as coisas foram realmente além do esperado.

Fazia algum tempo que não tinha contato direto com Keigo e, por um motivo óbvio, Tezuka sentiu necessidade de convidá-lo para fazer alguma coisa como retribuição por toda a ajuda dada. Inui sugeriu levar Atobe a um restaurante caro num bairro movimentado da cidade, entretanto, Kunimitsu não via motivos para fazer isso—na realidade, ele sabia que não combinava com esse tipo de lugar.

Achou melhor, então, levá-lo a outro lugar.

Keigo foi até o apartamento onde Tezuka morava sozinho. Estava curioso para saber como era.

Mas não devia ter pensado que seria muito além daquilo que havia imaginado.

– Fique à vontade – Tezuka abriu a porta para ele.

Havia livros. Muitos livros, livros por toda a parte, de todos os tamanhos, cores, estilos, assuntos. Livros técnicos, de filosofia, romance, suspense policial, terror. Tudo. Dali a pouco, Tezuka teria que livrar-se dos móveis e usar seus livros como suporte para a televisão e os eletrodomésticos da cozinha.

Claro que Atobe estava exagerando, mas que havia muitos livros... Isso sim.

Keigo sentiu-se estranho naquele lugar, talvez porque fosse muito compacto, e ele sempre esteve acostumado com ambientes gigantescos. Mas era quase como experimentar estar do outro lado e, assim, o loiro entendia porque o outro ficava desconfortável com a pompa toda.

Mesmo assim, o lugar estava bem quentinho, com certeza climatizado, porque o inverno rigoroso da cidade derrubava flocos de neve, que deixavam tudo coberto de branco.

Talvez por isso eles não tivessem se visto mais no parque da cidade...

– Vou buscar um casaco. – Tezuka fez um gesto com a mão para Atobe sentir-se à vontade novamente e foi até o quarto.

Keigo ficou observando tudo, esfregando as mãos uma na outra. Elas estavam cobertas por luvas grossas. Ele puxou o cachecol de cashmere para o rosto, cobrindo o nariz, que estava gelado.

Quando o moreno voltou, ele estava esfregando as lentes dos óculos num lencinho de papel.

– Aonde vamos? – Atobe perguntou depois de baixar o cachecol. Tezuka pôs os óculos no rosto e o olhou mais atentamente. Então, Keigo percebeu que não sabia qual era o problema que ele tinha na vista, ainda.

– Vamos a um sushi bar que um velho amigo meu tem. É perto daqui, podemos ir andando.

– Nesse frio, debaixo da neve? Quer congelar meus pés?! – Keigo se encolheu todo. Tezuka piscou na direção dele.

– Não vale a pena ir de carro até lá... Vamos fazer do meu jeito hoje, por favor.

– Tá bom, tá bom, se você insiste – bufou. Um vapor branquinho dissipou-se rapidamente diante do rosto do loiro, já que Tezuka havia aberto a porta para que eles saíssem.

A caminhada não foi longa, mas com Atobe reclamando a cada dois minutos por causa do frio de rachar, as coisas ficaram mais complicadas do que o aparente. Entretanto, Tezuka achou melhor não dar muita bola para isso agora, afinal, não ia mudar nada. Então deixou que ele reclamasse, até chegarem ao Kawamura Sushi.

Mas o loiro continuou andando uns cinco passos antes de perceber que Kunimitsu não estava mais ao seu lado.

– Já chegamos, Atobe – ele indicou o pequeno restaurante.

Keigo fez uma expressão surpresa, quase desdenhando. Tezuka ignorou e entrou no lugar. Atobe correu para alcançá-lo e, quando entrou, um rapaz de sobrancelhas grossas recepcionava o moreno com entusiasmo, uma faca na mão e muitos dentes na sua boca sorridente.

– Muito bom te ver aqui, Tezuka! – Ele dizia. – Faz tempo que não nos vemos. Como tá o Inui?

– Ele está ótimo, mandou lembranças.

– Ah, desculpe – Takashi direcionou-se para Keigo, que estava lá, parado, olhando os dois com uma expressão surpresa. – Bem vindo ao Kawamura Sushi, sente-se onde quiser, senhor – ele disse de forma polida. Havia várias pessoas no pequeno restaurante, sentadas confortavelmente nas mesas baixas, e mais dois homens do lado de lá do balcão estavam preparando a comida.

– Ele está comigo, esse é o Atobe Keigo. – Tezuka explicou.

– Ah! Prazer, Atobe-san, sou o Kawamura Takashi, dono do restaurante – Kawamura fez um gesto com a mão que segurava a faca, explicando. Ele tinha uma aparência calma, mas parecia meio estrambótico. Atobe fez um sinal de cumprimento com a cabeça. – Bem, escolham um lugar e sentem-se, eu vou servi-los.

– Restaurante familiar? – Keigo indagou com as sobrancelhas erguidas. Tezuka concordou com a cabeça e procurou um lugar para duas pessoas, de forma que não ocupasse uma mesa onde mais pessoas poderiam sentar. Tão logo encontrou, ele e Atobe acomodaram-se.

– Kawamura é meu colega de escola. Eu e ele fazíamos parte do clube de tênis. – Explicou, arrumando os óculos no rosto. O outro assentiu com a cabeça, interessado de verdade.

Keigo estava se sentindo num mundo totalmente alheio ao seu. Nunca havia ido num restaurante daquele tamanho, todos os que frequentava tinham pelo menos o triplo de espaço só com mesas. Mas o mundo era interessante, as pessoas eram diferentes. E Tezuka era um sujeito muito diferente dos que Atobe conhecia.

– Que tipo de sushi você gosta? – O moreno perguntou após uns instantes, quebrando o raciocínio do outro.

– Gosto com bastante wasabi.

– Ah, é a especialidade do Kawamura... – Tezuka cruzou os braços e deixou um sorriso minúsculo escapar de seus lábios.

Com certeza foi a primeira vez que ele “sorriu” diante de Keigo.

Kawamura veio anotar os pedidos deles e, depois de alguns instantes, ele saiu de perto, deixando-os sozinhos novamente. Atobe acomodou-se melhor na almofada e olhou para Tezuka com seus orbes azuis curiosos. – Então, como estão as coisas? Planejando um livro novo?

– Eu estou com algumas ideias, mas preciso colocar tudo no lugar antes de entrar num trabalho novo... Ler um pouco mais, aprimorar o vocabulário...

– Eu estou com planos de viajar para a Rússia para fazer algumas fotos. – Atobe apoiou as mãos no colo de forma educada, e Tezuka percebeu que ele não se encostou à mesa em momento algum. – Um amigo meu está fazendo um livro-reportagem sobre Moscou... E pediu para eu fazer as fotos, preferencialmente agora, no inverno.

– Então, vai viajar?

– Não sei – Atobe disse quando Kawamura voltou com dois copos de água com gás, gelo e limão. Ele mexeu no copo com o canudo, fazendo o gelo e as fatias de limão girarem loucamente dentro da água. – Depende, se eu tiver um bom motivo pra ficar, eu não vou.

– Hum... – Tezuka fez, sem demonstrar muito interesse ou alteração, mas teve que pegar o copo e beber um gole de água para ocupar a cabeça. E as mãos. Kunimitsu sentia-se entrando num labirinto cheio de encruzilhadas malucas quando Atobe começava a falar aquelas coisas dúbias.

Tezuka sabia pelo que se interessava, mas não sabia se estava interpretando as coisas de forma errônea. Provavelmente não.

Mesmo assim, ainda era um pouco cedo. Ou ele estava sendo recalcado demais.

Comeram e ficaram conversando. Takashi mesmo participou do papo em um determinado momento, explicando que Tezuka era o capitão do clube de tênis que eles frequentavam e era o melhor jogador de toda a região. Keigo ouviu tudo muito interessado, com um sorriso nos lábios, como se sentisse muito orgulho do moreno por isso.

Tezuka, todo cheio de modéstia, insistia em dizer que Kawamura estava exagerando um pouco.

– Mas eu perdi para você – Atobe disse, fazendo um gesto de resignação com as mãos. – Você só pode ser muito bom, mesmo...

– Obrigado.

– Você jogou com ele, Tezuka? – Takashi se animou. Ele estava sem aquela faca maluca na mão, mas com certeza recebeu uma injeção de ânimo ao falar sobre tênis. – Nossa, faz muito tempo que eu não jogo tênis, me bateu uma nostalgia agora! Um dia temos que definitivamente alugar uma quadra e reunir o pessoal pra jogar.

– O Inui vai gostar de ouvir isso. – Tezuka acrescentou educadamente, num tom de bom humor, mas sem sorrir. Takashi deu um sorriso para o rapaz e recolheu os copos deles, dizendo que logo traria mais dois por conta da casa.

– Ele te admira muito, o Kawamura. – Atobe disse, levando um sushi à boca. Tezuka o observou, aparentemente sem entender, e não respondeu. Olhou para Takashi por um instante antes de retornar sua atenção ao loiro, que mastigava o sushi com um tempero fortíssimo de wasabi sem sequer fazer careta.

Atobe começou a ficar incomodado. Com alguma coisa...

Talvez com a intimidade que Takashi tinha com Tezuka, mesmo que o chamasse pelo sobrenome. Mas a forma como se falavam, era realmente num tom de velhos amigos. Claro que Keigo não podia competir com isso, afinal, conhecia Kunimitsu há apenas alguns meses... Mas ainda assim...

Estava com ciúme. É.

Quando terminaram de comer, Atobe quis pagar a conta, mas Tezuka disse que não, porque era sua forma de retribuir. Podia não ser lá grande coisa, mas era “alguma” coisa. Entretanto, Keigo manifestou-se com um sorriso de convencido nos lábios, cruzando os braços enquanto o moreno dava um cartão na mão de Takashi.

– Mas eu nunca disse que queria isso como forma de retribuição pelo que eu fiz por você.

– Mas foi o que eu escolhi – Tezuka respondeu sem alterar seu tom de voz. – Você não me deu muita escolha ao fazer uma noite de autógrafos pra mim...

Atobe mexeu nos cabelos, sustentando o sorriso. – De fato, não dei. – Ele fez uma pausa significativa. – Gosta de música clássica, Tezuka?

– Hum... Gosto...

– Quero te mostrar algumas coisas, então, será que posso te levar até minha casa mais uma vez?

Tezuka suspirou sem soar muito ruidoso, mas foi um suspiro. Keigo estreitou os olhos. – O que foi isso?

– Você... – O moreno ajeitou os óculos no rosto. – O que você quer de mim...?

Pela primeira vez, Atobe apoiou um dos cotovelos na mesa e segurou o rosto, todo sedutor, com a mão. Tezuka inconscientemente projetou os ombros um pouco para cima diante do olhar dele. – O que eu quero de você. – Ele mexeu os olhos de forma pensativa. – São tantas coisas...

Tezuka engoliu atravessado.

– Tezuka, não me force a insistir.

– Me dê um motivo – olhou-o através das lentes dos óculos, analisando a pintinha que ele tinha debaixo da pálpebra do olho direito. – Para eu ir à sua casa depois de sairmos daqui.

– Um motivo? – Atobe empertigou-se. – Porque eu quero.

Tezuka o encarou, seriamente. – Esse não é um bom motivo.

– Quer um motivo melhor? – O outro assentiu. – Pois bem. – Fez uma pausa significativa. – Você também quer.

Eles ficaram se olhando por longos segundos. Um instante que se interrompeu brutalmente quando Kawamura retornou com a notinha do cartão para Tezuka.

– Aqui, Tezuka – ele disse gentilmente. – Obrigado, espero que volte aqui mais vezes. Converse com o Inui pra reunirmos todo mundo, certo?

– Sim, obrigado, Kawamura. – Tezuka e Atobe se levantaram da mesa, despediram-se do chef e saíram do restaurante. O frio estava ainda mais rigoroso, e isso forçou Keigo a enfiar as mãos nos bolsos do casaco de lã e encolher os ombros. Tezuka, sem se incomodar com o frio, apenas escondeu-as nos bolsos despreocupadamente e olhou para o loiro.

– E então, Tezuka...?

Kunimitsu suspirou, sentindo-se derrotado. Estúpido. Mas ia acabar fazendo a vontade dele mais uma vez.

– Não vou voltar tarde. – Disse ele, observando a fumaça que saía de sua boca. – Tenho coisas para fazer amanhã.

– Prometo que não vou tomar tanto do seu tempo, Tezuka-sensei – Atobe disse com bom humor. – Vou ligar para o meu motorista...

Atobe empurrou a porta dupla de carvalho que abria para uma sala muito... Digamos... Cheia de trecos.

As sancas de gesso eram mais profundas, com luzes quentes e um lustre grande no teto branco – devia ser um dos que Tezuka viu quando esteve lá a primeira vez. Tudo era decorado em tons de ouro envelhecido. Paredes em vermelho vinho e piso de madeira escura, com alguns detalhes muito peculiares. Havia uma vitrola antiga num dos cantos e aparelhos de som mais novos. Um tapete persa cor-de-gelo gigantesco ficava no centro da sala, rodeado por poltronas e sofás de couro marrom com almofadas de veludo. Uma estante gigantesca carregava milhões de LPs, CDs, DVDs e Blue-Ray, todos separados categoricamente. E do outro lado, outra estante tão gigantesca quanto a primeira carregava muitos livros.

Tezuka chegou à conclusão que aquela sala de música devia valer todo o seu apartamento. Com juros.

– Que fazemos aqui? – Tezuka caminhou pela sala, cheio de receios. Ficou imaginando Atobe com um robe de banho verde-musgo, um copo de vinho e um charuto. Ou algo parecido com isso.

– Eu gosto de perder algumas horas do dia ouvindo música. Sempre me inspira com as fotografias – ele disse, caminhando até a estante e procurando um entre os LPs. – Então, queria que me acompanhasse hoje.

Tezuka cruzou os braços—Atobe era muito galante, de uma forma esquisita. Ele tinha muita classe, isso era notável, mas parecia simultaneamente tão esnobe que dava nojo. Entretanto, o moreno estava começando a acreditar que Keigo realmente não fazia nada por mal, ele estava apenas acostumado com aquilo como se fosse o padrão de vida de todo mundo na face da terra.

Veja o nível da ingenuidade.

Atobe pegou um dos LPs e foi até a vitrola. Era engraçado como ele tinha algo tão antigo na sala de música. Tudo bem que aquela casa tinha muitos toques de classe bem expressivos, mas enfim... Ele podia ter um toca-discos mais atual, com caixas, sei lá. Talvez ele gostasse do som da vitrola.

Ele pôs o disco e uma melodia familiar começou a ecoar pela sala.

Tezuka forçou a cabeça a resgatar na memória a quem pertencia aquela música, mas não conseguiu lembrar.

Atobe tirou o cachecol do pescoço. As enormes janelas estavam fechadas, tanto a vidraçaria quanto com pesadas cortinas de veludo gelo, que davam um ar muito mais sóbrio ao local.

– Bach. – Anunciou Keigo através da sinfonia que invadia os ouvidos de Tezuka e fazia a respiração ficar mais lenta e pesada.

Ficou impressionado. Não necessariamente porque a música era de bom gosto, mas porque Atobe tinha pleno conhecimento do que estava falando. E enquanto deixava o cachecol sobre o sofá, ele ergueu os olhos azuis e, de repente, tudo estava em harmonia. Ele e a música. Eram uma sintonia incrível.

Tezuka tinha quase certeza que aquele rapaz tinha um forte poder de premeditar tudo o que fazia, tendo confiança nos resultados.

Keigo caminhou pela sala e sentou-se na maior poltrona que lá havia. E fez um gesto para que Tezuka sentasse em sua frente.

O loiro apoiou-se gentilmente na mão e ficou olhando atentamente para o rapaz à sua frente, tal como estivesse o analisando drasticamente através de suas reações. Não era nada disso, estava apenas admirando.

– O que inspirou seu livro, Tezuka?

– Alguns livros de época. De história, principalmente...

– Como eu disse, a música me inspira. Acho que podemos fazer coisas inimagináveis através de uma melodia, quisera eu ter o talento de conseguir tocar um instrumento assim... – Ele suspirou e fechou os olhos, deixando a melodia invadir seus sentidos. – Já tive muitas aulas, mas...

Por isso não tinha nenhum piano ou coisa do tipo por ali, concluiu Tezuka.

Keigo ficou de olhos fechados por um longo instante. E ele não parecia estar prestes a dormir, na realidade, estava mesmo imerso na música. Tezuka se mexeu no sofá, ajeitando-se um tanto antes de recostar a cabeça e fechar os olhos, também. Gostava de música clássica, mas raramente tirava um momento para apreciá-la como Atobe parecia fazer constantemente.

Não conseguiu determinar por quanto tempo ficou com os olhos cerrados, mas... Quando os abriu, Keigo apoiava-se com uma das mãos no braço do sofá, a outra no respaldo, e os joelhos o sustentavam ao lado das pernas de Tezuka, de forma que o loiro impunha-se completamente sobre ele.

O loiro arrependeu-se de não tê-lo olhado de perto vezes antes, e Kunimitsu o encarou com olhos expressivos, talvez até desistentes. Ou talvez ele estivesse somente afirmando algo que já devia ter sido dito há muito tempo.

Ele tirou a mão do braço do sofá e tocou-a na lateral do corpo do outro. – Se me permite...

Atobe sentiu os dedos enrijecerem quando Tezuka fechou os olhos mais uma vez.

Tomaria isso como um sim.

Então, arfando de ansiedade, curiosidade, desejo e uma quase impaciência pulsando nas veias, Keigo aproximou o rosto do de Kunimitsu. Os lábios não se encostaram, mas as respirações já se encontravam duramente, uma brigando com a outra para ver qual seria a mais forte.

Atobe ganhava, sem dúvidas. Estava muito excitado e agitado. Parecia uma criança desesperada para pegar o docinho que estava bem embaixo do nariz, entretanto, fazia um pouco de suspense consigo mesmo para sustentar um pouco mais aquela sensação gostosa da espera. De ficar se perguntando como seria o sabor.

Respirou fundo mais uma vez antes de roçar os lábios nos dele. Abriu espaço lentamente com a língua para desfrutar da sensação. Escorregou a mão um pouco para as costas de Tezuka e subiu o outro joelho para o sofá, sentando-se nas pernas do moreno.

Kunimitsu levou as mãos às costas dele e manteve os olhos fechados suavemente como estavam antes, uma vez que o beijo não fugiu para um clima mais pesado. Isso era muito porque Keigo estava mantendo um ritmo calmo, quase como se estivessem reconhecendo um ao outro antes de qualquer outra coisa. E estavam, de certa forma. O loiro estava acostumando-se com os traços do corpo dele em seus braços.

O beijo partiu naturalmente. As bocas separaram-se e Atobe arfava feito um louco, como se tivesse feito muito esforço físico.

Tezuka o encarou.

– Você pensou em tudo... Não?

Atobe sorriu e passou a mão nos cabelos com falsa modéstia, mantendo-se sentado sobre o corpo do outro.

– Eu sempre penso em tudo, Tezuka. Gosto de fazer planos.

O moreno ficou olhando para ele por alguns instantes, analisando o sorriso satisfeito que se formava nos lábios. Entretanto, ainda dava para notar que ele estava ansioso. Talvez o fato de ter conseguido o que aparentemente almejava desde o início deixou Atobe com o coração enlouquecido no peito. Consequentemente, sua respiração se alterava.

– Atobe – ele falou educadamente, movendo os olhos para um outro ponto qualquer atrás dos ombros do loiro. – Está na minha hora, eu preciso ir agora.

Keigo ergueu um pouco o queixo e soltou um suspiro pesado de quem recupera o fôlego. Em seguida, ele impulsionou-se para trás e ficou de pé, esperando que Kunimitsu também levantasse. Assim o rapaz fez, ajeitando o casaco no corpo e os óculos no rosto. Ele estava um pouco nervoso, meio atrapalhado, enfim... Tezuka sempre foi muito tímido com essas coisas.

Já Atobe, tinha uma facilidade incrível, pelo jeito.

– Obrigado pela companhia, Tezuka. – Ele fez um carinho no queixo do moreno e sorriu na direção dele, apreciando como ele franzia ligeiramente as sobrancelhas com constrangimento. – Posso pedir para meu motorista levar você?

– Não se preocupe, eu vou sozinho. – Tezuka fez um gesto com a cabeça e assim que Atobe soltou seu rosto, ele caminhou pela sala na direção da saída, sendo seguido pelo anfitrião até as escadarias. Lá, ele encontrou uma empregada à qual Atobe deu ordens expressas para acompanhá-lo até a saída dos terrenos, lá nos portões. Tezuka ficou um pouco constrangido de fazer a empregada sair da casa com ele naquele frio, mas com certeza ela não iria deixar de seguir uma ordem do patrão.

Então, acabou indo com ela até o portão e depois caminhou algumas quadras até pegar um ônibus para, depois, ir até a estação de metrô e voltar para casa.

Fez tudo no piloto automático, mesmo. Ainda estava um pouco atordoado com aquele beijo e a coisa toda. A música, o clima, enfim...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Photograph" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.