Magnum escrita por Miss Black_Rose


Capítulo 29
Capítulo 29




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* * *

A porta do elevador se abriu lentamente, dando para um corredor estreito, decorado por vários quadros de flores. Os dois investigadores se entreolharam com um mau pressentimento e após hesitarem por alguns minutos seguiram em direção a única porta na outra extremidade. Atravessando-a sem problemas, foram parar em um arredondado corredor de madeira repleto de uma coleção de objetos caros e empoeirados, se deparando, primeiramente, com a grande pintura de uma mulher ruiva.

 

Descendo alguns degraus de madeira, do lado oposto ao do elevador, Benson e Munch chegaram a uma sala em formato de cúpula, com um cristalino teto de vidro, provavelmente com uma luz embutida do outro lado, provocando um efeito eclesiástico ao ambiente. Um par se sofás e uma mesa de xadrez eram os únicos móveis da pequena sala, junto com uma estante repleta por uma coleção de vasos pequenos e antigos.

 

— Pareceria uma sala comum. – afirmou Munch. – se não fosse tão estranho ela não possuir mais saídas.

 

— E quem disse que não há? – Benson sussurrou para si mesmo, enquanto se aproximava de Munch, sobre o grande desenho geométrico no chão. – eu não me sentiria muito à vontade para jogar xadrez. Até porque não há cadeiras.

 

— Bem. Há sofás.

 

— Sim. Muito mal posicionados por sinal. Ryan, me ajude.

 

Ambos carregaram o pesado sofá para trás. A marca da base do móvel se destacou no piso empoeirado. Benson se agachou próximo a ela, apontando com a pequena lanterna que se assemelhava a uma caneta: um espaço de milímetros se destacava. Anthony o seguiu com a luz da lanterna para baixo da mesa de xadrez.

 

— Gosta de xadrez, Ryan? – perguntou.

 

— não muito, senhor, na verdade acho entediante.

 

— pois deveria gostar, é um bom jogo de lógica. Estou meio enferrujado nele, mas acho que me lembro de algumas regras.

 

— provavelmente nenhuma que possa nos ajudar.

 

— exato. Nenhuma, exceto que esteja especificada... Em algum lugar. – Benson afirmou apontando a luz da lanterna para a frase abaixo da borda da mesa.

 

— Da concórdia, a força; Da oposição, o conceito; Luz e Sombra voltadas para o poder; Unidas no mesmo topo. Interessante, mas onde vamos chegar com isso? – Ryan acendeu um cigarro. A voz num tom levemente amargurado.

 

Anthony Benson sabia que o encontro com as criaturas o havia alterado. De qualquer forma isso ocorreria, mesmo que não afetasse sua crença (e a de muitas pessoas) em relação a pós-morte. A confusão do jovem era visível e pelo que sabia de tipos como Ryan Munch é que se fechavam quando eram vistos em certo conflito de idéias, tomando uma postura defensiva diante dos outros. O problema era até onde levaria consigo aquela aura insolente que o tomava agora. Embora estivessem trabalhando junto há apenas dois meses, Anthony tivera a oportunidade de conhecer bem o seu parceiro. Também sabia o que podia esperar dele. Era muito imaturo ainda, mas já tinha “pego o espírito da coisa”. Ambos possuíam uma parceria harmoniosa, se ora ou outra a insolência do rapaz não o pegasse desprevenido, mais por um choque de personalidades do que por antipatia.

 

— é um enigma, Ryan. Suponho que esteja nele a chave para chegarmos à próxima porta. – afirmou pacientemente.

 

Munch não respondeu. Tinha os olhos azulados voltados para a estante. A baforada cinzenta se dissolvia, subindo até a cúpula. Benson a seguiu com os olhos, de repente reparando em um feixe de luz rebelde, destoado dos outros. Seguindo em direção a ele, após calcular rapidamente a distância entre a mesa de xadrez e sua marca no chão, empurrou o móvel. Ryan já estava do outro lado da sala, olhando para os pequenos vasos, com desenhos de animais. Um elefante, uma águia, um cavalo e o último parecia oculto entre as várias linhas douradas que o enfeitavam. Ryan pôs o cigarro na boca e pegou um dos vasos na mão, abrindo sua tampa.

 

— senhor... – chamou, o cigarro, pendurado nos lábios perplexos, quase a cair. – Parece que estamos ricos.

 

— o que?

 

Munch exibiu uma grande pedra de diamante cristalina de dentro do vaso.

 

— já viu uma coisa dessas tão de perto antes? Nem sabiam que eram reais. – disse, entregando-a para o supervisor.

 

— não, não vi. Será verdadeiro? De qualquer forma não podemos ficar com isto. Devolva ao lugar.

— o que?

 

— não é nosso, Ryan.

 

— talvez possamos usá-lo como pista... Afinal pode ter ligação com alguma coisa. – Ryan continuou após uma pausa, então, se rendendo: - ok. Está bem, vou colocá-lo dentro do vaso, embora eu ache que vá ser levado por qualquer um outro, de qualquer forma.

 

Munch voltou para a estante, mas antes de guardar o diamante, sobre o olhar grave de Benson, cedeu à curiosidade de olhar no próximo vaso. Encontrou a metade de uma moeda do qual desconhecia a origem.

 

— é só uma moeda velha, senhor. – disse mostrando a metade entre o polegar e o indicador.

 

— fique com ela, mas guarde essa pedra no lugar.

 

— ok.

 

Após confiscar os outros vasos, Munch guardou (com muita reluta) o diamante no lugar. Era uma pena que Benson fosse tão correto. Talvez não houvesse mal algum em guardar a pedra para si, mas se perguntava se seu supervisor agiria do mesmo modo se estivesse sozinho.

 

* * *

Concreto molhado. Eu não me lembrava de sentir esse cheiro em casa, mas era o que sentia no pequeno espaço escuro ao meu redor. Com a luz da lanterna vasculhei-o. Não havia nada. Era só uma saleta de entrada, abaixo da escada que havia se fechado alguns minutos após a minha descida. No entanto, estava tranqüilo (minto, tinha o coração no céu da boca, portanto estava tranqüilo apenas em relação ao ambiente). Não haviam sinais de zumbis. Passei por uma abertura e enfim me senti em casa. Eu me lembrava bem daquele lugar. Era um largo corredor de vidrais iluminados. Imagens angelicais que me lembravam do apartamento onde trabalhara até o momento e provavelmente que eu jamais voltaria a ver. Eu sabia que após percorrê-lo (não era longo) chegaria a mais uma cúpula. Mas essa, ao contrário da anterior, mais baixa e pavimentada, com uma estatua no meio, sobre uma fonte. Senti um ataque nostálgico ao me deparar realmente com a fonte. Ela estava desligada e repleta de poeira, mas mesmo assim despertou em mim um sentimento profundo e reprimido. Fora lá que minha mãe cantara quando Ada nasceu. Tinha-a no peito, quando pediu que eu sentasse ao seu lado e ouvisse seu canto. Pena que não me lembrasse mais da música, mesmo assim tinha a impressão de vê-la ali, cantando.

 

Ao meu redor se destacavam três largas portas de madeira. Uma delas eu me lembrava que não levava a nada, uma outra, se não me engano nos levava a superfície e a última ao resto da casa. No entanto, não tinha idéia de qual podia me levar até Ada e por isso escolhi a dedo.

 

A abri com certo esforço, era uma porta pesada, e me deparei com uma escadaria em formato arredondado de aproximadamente uns vinte degraus até um grande salão. Este iluminado, de decoração sofisticada, me lembrando mais ainda com saguões de velhos castelos ingleses, com tapetes longos e acortinados nas altas janelas (estas, no caso, como parte da decoração, já que estava no subterrâneo do hotel). Haviam armaduras lustradas rente às escadas para o segundo andar, uma lareira do outro lado junto com os sofás de veludo e o piano de cauda (este que tenho na memória) abaixo da escadaria. Vários quadros também se destacavam nas paredes, a maioria de tamanho padronizado, talvez de parentes meus ou não, mas não conseguia ter a certeza de saber quem eram eles. Um lustre dourado se via com todas suas velas acesas e a estava tudo em uma ordem impecável. Fiquei rente à escada, observando nostálgico, mas atento. Foi quando ouvi um estrondo e parte do teto do saguão caindo no andar superior. Junto a ele dois corpos. Dahlia e Ling. A primeira em desvantagem no chão, chutou a segunda para cima. Ambas se destravaram. Dahlia se ergueu rapidamente seguindo acelerada em direção a assassina. Desvencilhou vários golpes, mas todos agilmente desviados. Ling girou seu brinquedo sobre o braço da inimiga, fazendo como há poucas horas fizera comigo, torcendo-o para trás e forçando-a a se agachar. Mas falhou em tentar passar a linha no pescoço de sua presa. Dahlia atingiu-a na perna com um golpe rápido e forte que fez a assassina gritar, afrouxando sua arma. Aproveitando a trégua, agarrou-a e desferiu um soco, brutalmente a lançando para o andar de baixo. Passando o braço sobre os lábios sangrados, a louca piscou para mim e pulou na direção da assassina que se erguia lentamente. Dahlia a segurou com uma chave de braço e pensando que ia quebrar o pescoço de Ling me manifestei.

 

— espere. Minha irmã! Onde ela está? – perguntei para Ling, enquanto esta exprimia uma careta de dor, asfixiada pelo braço de Dahlia. – Dahlia, não a mate ainda.

 

— há outro, você pergunta para ele. – me respondeu a louca.

 

— outro? Que outro?

 

De repente ouvi um disparo. Dahlia gritou. Vi um buraco aparecer em seu ombro. Ling a lançou para os lados. No segundo andar um chinês alto, vestido a terno e com as pontas do cabelo tingidas de loiro, se destacou.

 

— até que enfim apareceu. – ling disse se afastando da inimiga e massageando o pescoço.

 

— sinto muito pela demora. – respondeu o homem apontando a arma em minha direção.

 

Dahlia tentou se levantar, mas Ling já girava o ioiô próxima a ela.

— olha aqui, seu frouxo, num é um tiro que vai me deter, não... – Dahlia começou, interrompida por outro grito. O homem atirara novamente. – nem dois!! – bradou, enquanto segurava o segundo buraco.

 

— Quem são vocês? – perguntei.

 

O homem riu.

 

— oras, não ficou muito óbvio? – perguntou para mim. – nós fomos contratados pra fazer da sua vida um inferno.

 

— por quê?! – perguntei.

 

— pergunte ao nosso chefe. – ele respondeu.

 

— basta, Qiang! – Ling falou. Embora não fosse um grito tinha o tom da voz mudado e a frieza quase dizimada. – nunca conheci alguém à minha altura. – disse para Dahlia. – Nenhuma vítima jamais me deu tanto trabalho.

 

— fico lisonjeada. – a louca respondeu.

 

— não, não fique. Isso só me traz mais gosto pela sua morte.

 

— então acho melhor te mandar pro inferno antes que isso aconteça. – Em seguida, se moveu agilmente como se os dois tiros no ombro não fossem nada. Ling avançou em sua direção e Qiang tentou atingi-la. Aproveitando a trégua do mercenário atirei contra ele. Qiang se afastou, mas ouvi seu gemido. O havia acertado nem que fosse um mero raspão.

Ling manobrava aquele maldito brinquedo de forma artística, mas perigosa, e Dahlia se desviava muito bem dele, tacando alguns objetos em sua direção. Me desesperei. Minha casa estava sendo destruída! Atirei contra Ling que conseguiu bloquear o projétil com sua arma, dando oportunidade à Dahlia de se lançar contra ela. Ambas caíram no chão. Dahlia desferiu um soco, mas a assassina se desviou fazendo com que estourasse o piso de carvalho. Ver as farpas lentamente no ar, me tomou de ira e apreensão, mas não suficiente a ponto de esquecer Qiang. Deixei Dahlia se resolvendo com a assassina (e destruindo minha casa) e subi até o segundo andar atirando na direção do mercenário. Qiang se lançou atrás de uma coleção de bustos de célebres homens que meu pai possuía, da qual posteriormente nada restou, senão os fragmentos que um dia, talvez, eu me dispusesse a recuperar.

 

Quando as munições acabaram e não houve mais o que atirar, desvencilhamos socos numa contenda que sabíamos que só acabaria com um dos dois morto. Qiang era robusto e resistente e, embora, não tivesse os ossos tão largos quanto os dele, eu sabia que estava em vantagem, ou, pelo menos, em condição igual.

Ossos já haviam sido partidos (ou, no mínimo, rachados) e eu tinha a impressão de que precisaria dos remédios de misteriosa procedência que Dahlia possuía.

E assim que lembrei de seu nome senti o chão estremecer e repentinamente algo atravessá-lo, interrompendo minha luta com Qiang. Eu não sabia o que era aquilo, mas era uma criatura grande que nos separou, dando ao mercenário a chance de sair da minha vista.

 

“covarde”, foi a única coisa que pensei antes de me deparar com a monstruosidade que se erguia no meio do saguão. Era uma planta, ou deveria ter sido algum dia. O que sei é que ela havia dominado todo o espaço, transformando-o rapidamente em uma selva.

 

Dahlia e Ling ainda brigavam, mas agora, também separadas pela planta, que exigia seu espaço entre elas. Dahlia foi agarrada pela cintura e lançada contra uma parede, mas, ao contrário do que esperava, a louca deu uma cambalhota no ar e usou a usou para conseguir impulso e se lançar na direção da planta, soltando algo dentro dela. Eu não sabia o que era, porém, já havia me acostumado com suas surpresas e o quanto antes me lancei para o chão. Um ponto luminoso se destacou no ponto da planta em que Dahlia havia jogado algo, e logo ela explodiu para os lados.

 

Quando levantei a cabeça, empapado por uma gosma esverdeada, misturada com algumas peças do piano, olhei com muita reluta ao meu redor. O saguão já não podia ser apresentado como tal. Havia sido resumido a uma maçaroca verde e melada, repleto de vestígios do que um dia chegou a ser.

 

Odiava aquelas bombas de propulsão. Era impossível sair inteiro do efeito delas, sendo a vítima ou o cenário.

* * *

 


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