Anjo da Noite escrita por MsWritter


Capítulo 64
Capítulo 64. Busca


Notas iniciais do capítulo

Música de hoje é "Hallelujah", do Leonard Cohen. Existem muitas (muitas mesmo) interpretações dessa música. A minha preferida é, sem sombra de dúvidas, a versão do Jeff Buckley (versão de estúdio). Prestem a atenção na letra, na melodia, até na forma como ele respira durante a música (a tradução daqui está... aceitável. http://letras.mus.br/jeff-buckley/6098/traducao.html ). Se eu precisasse escolher uma única música para essa fic, provavelmente seria essa. Isso dito, existem várias facetas da música que gostaria de explorar com vcs nesse capítulo, mas como o próprio Jeff me ensinou, às vezes é preciso deixar às coisas no mais simples, faltantes até, para que a pessoa que ouve ou lê complemente e crie uma obra prima. Falando nisso, a todos que chegaram até aqui (que começaram a ler agora ou que estão me acompanhando há anos), meus sinceros agradecimentos. A gente se vê!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/92874/chapter/64

I heard there was a secret chord
That David played and it pleased the Lord
But you don't really care for music, do ya?
Well, it goes like this: the fourth, the fifth
The minor fall and the major lift
The baffled king composing Hallelujah

Hallelujah, Hallelujah, Hallelujah, Hallelujah

Well, your faith was strong, but you needed proof
You saw her bathing on the roof
Her beauty and the moonlight overthrew ya
She tied you to her kitchen chair
She broke your throne and she cut your hair
And from your lips she drew the hallelujah

Hallelujah, Hallelujah, Hallelujah, Hallelujah

– E todas as vidas que consumiu? Elas não vivem em você?

– Não há vida em algo morto, minha cara. Suas almas não sobrevivem em mim. Seus sonhos são apenas esperanças corrompidas, seus amores apenas separações dolorosas.

– Mas se você nada sente, como podem doer?

– Há apenas uma voz em silêncio, uma alma que não morre, pois em vida já não vivia. Essa alma que não sente se cala por se saber anestesiada aos horrores. Em seu silêncio está o terror da falta de vida. Não se engane jamais, não há beleza na eternidade.

Vlad e Integra já estavam há horas no escritório, em silêncio, pensando em como resolver o caso "renegade". A cada quinze minutos um dos dois lembrava o outro que eles só tinham a palavra de Helena. Que como eles não receberam ameaça alguma, até onde eles sabiam, Thomas podia estar trancafiado nos porões do Palácio Apostólico e tudo aquilo podia ser apenas mais um jogo de um vampiro antigo entediado. Mas os dois, ao mesmo tempo, abaixavam a cabeça porque "e se fosse verdade?". Se Thomas realmente tivesse voltado a solo inglês e estivesse caçando ele era uma força com a qual a Hellsing não podia hesitar. Enquanto grande parte das tropas vasculhava Londres procurando sinais do retorno do vampiro, Integra e Vlad estavam condenados a pensar em formas cada vez menos agradáveis de caçar o monstro.

– E o selo que prendia Alucard? - Vlad perguntou, já quase sem ideias.

– Para prender Thomas? Duvido muito que daria certo. Segundo os escritos do meu bizavó, para que o selo funcione, o individuo a ser selado precisa estar totalmente desprovido de qualquer forma de vontade. Com alma, espírito e ânimo mortos, se e somente se o individuo concordar e aceitar um mestre, será trancafiado. - Integra respondeu, com um charuto pendurado na boca.

– Está dizendo que Alucard aceitou ser dominado?

Integra deu de ombros. Ela nunca tinha entendido o porquê daquilo e não se importava a essa altura da vida.

Quase uma hora depois, foi a vez de Integra falar:

– E se nós invocássemos os poderes de Alucard?

Vlad tremeu ao ouvir aquelas palavras, ao mesmo tempo pela indicação de que Integra ainda queria o vampiro de volta e pela lembrança do mago asqueroso.

– Mas como controlamos Alucard? Esse não vai ser um problema ainda maior que Thomas?

Integra precisou concordar. Afinal, não era Alucard que eles invocariam. Era o poder dele. Que eles invocariam para quem? Quem eles iam sacrificar? E quando a loucura viesse, como eles iriam controlar?

Vlad abriu a boca para dar outra sugestão, mas ele mesmo negou com a cabeça e ficou quieto.

– É melhor você dar a ideia, para poupar o trabalho de eu ter que pensar nela e depois perceber que não funciona. - Integra comentou, jogando o charuto fora.

– Tendo em vista que Celas tem um bom nascimento, eu ia sugerir de alimentá-la com o nosso sangue e o de Helena para que ela fique mais forte que Thomas e o derrote. Se ela não nos matar imagino que o efeito seja passageiro.

Aquela ideia não era ruim. Integra ficou olhando para Vlad até o rapaz perceber que ela queria saber porque o plano não daria certo.

– Bom... Nós temos o mesmo problema em mãos. Para ela ser mais forte que Thomas, ela teria que consumir pelo menos o mesmo tanto de vidas que ele. Por mais que seja temporário, a chance dela enlouquecer é imensa. Como controlaremos Celas? O selo está fora de questão.

Integra respirou fundo.

– Tentar encontrar alguma coisa mais forte que Thomas para derrotá-lo só está piorando a situação, já que qualquer coisa mais forte que ele é um problema ainda maior. - A Hellsing murmurou, acendendo dois cigarros de uma vez.

Vlad fez careta ao vê-la determinada a fumar dois cigarros ao mesmo tempo, mas decidiu que aquilo não era o suficiente para calá-lo.

– Não temos como destruir o corpo de Thomas e pelo visto a vontade também não. Afinal, como foi que Alucard morreu?

Integra chegou a começar a gritar alguma coisa rude, quando percebeu que também não sabia. Sabia que tinha alguma coisa a ver com Shrondger e os ossos de Mina Harker, mas qual o processo envolvido e porque deu certo ela não tinha a menor ideia. Em um tom bem mais calmo ela disse isso para o conde.

– Mina Harker? Quem é Mina Harker? - Vlad perguntou atônito. Integra ficou um tempo pensando se Vlad sabia o que era Shrondger, mas resolveu responder a pergunta que lhe havia sido feita.

– De acordo com os escritos de Van Hellsing, ela foi uma mulher que chegou a ter seu processo de transformação iniciado, mas voltou a ser humana quando Alucard foi capturado.

– Um momento. A chave para derrotar Alucard estava no corpo de alguém que foi transformado em vampiro por Alucard e voltou a ser humana?

– Foi exatamente o que eu disse Vlad. - Integra respondeu, já irritada com a interrupção.

Vlad simplesmente se levantou, abriu os braços e ficou olhando para ela. Integra simplesmente ficou olhando para ele. Depois de quase um minuto nessa posição, Vlad se cansou e disse:

– O meu sangue! Ele é o sangue de alguém que era um vampiro e voltou a ser humano.

– Não seja ridículo Vlad! - Integra respondeu.

Vlad baixou os braços, bufou, deu as costas para Integra e foi mexer em seu computador, batendo nas teclas com força. Dez minutos depois, virou o monitor para Integra olhar uma quantidade absurda de documentos abrindo um sobre o outro.

– Seja o que for que pode matar Alucard, eu tenho isso no meu sangue e está ficando mais forte agora que a sombra de Alucard desapareceu. Se conseguirmos entender o princípio e usar isso contra Thomas, no mínimo, podemos tentar nos defender.

Integra tentou contra argumentar, mas entre os documentos na tela do computador, a expressão de Vlad e o fato de que apesar de parecer impossível, aquilo era a melhor coisa que eles tinham, acabou apenas acenando com a cabeça.

Dois meses mais tarde, ainda não tinham nenhum sinal de Thomas além da palavra de Helena e nenhum plano melhor. Mas com a gripe ainda assolando Londres e ocasionando os mesmos problemas com os vampiros, não havia muitos recursos disponíveis para o suposto caso "renegade", então uma equipe mínima de soldados estava a procura do vampiro, enquanto apenas uma parcela da equipe médica e tecnológica da Hellsing tentava desvendar o mistério do sangue de Vlad. Nenhuma equipe estava obtendo sucesso.

E como toda situação problemática, aquela só tendia a ficar pior. Porque com as tentativas de controlar a doença e com a sede se espalhando por entre os vampiros, agora também vampiros jovens estavam sendo contaminados. E enquanto em seres humanos a gripe causava fraqueza, febre, dores e em alguns casos, hemorragia; nos vampiros havia apenas um sintoma: alucinações. E um vampiro novo alucinado é feroz. E um vampiro feroz ataca. Como se a organização Hellsing precisasse de vampiros atacando sem motivo em plena luz do dia (e ocasionalmente virando purpurina no meio da rua). Resultado? Além de todos os problemas ainda haviam jornalistas atrás de Integra e Vlad praticamente todas as horas do dia. E eles não estavam interessados só nos mistérios que cercavam as operações da Hellsing, mas de alguma forma resolveram que o casamento de Integra e Vlad era assunto de novo. Dessa vez o fim do casamento.

– Sir Hellsing! Sir Hellsing! Estão tentando a vida de casados mais uma vez?

– Possuem um relacionamento amigável após a separação?

–São parceiros profissionais?

–Qual a postura da Hellsing em relação às pessoas desaparecidas?

–Por que havia uma viatura da Hellsing próxima da escola onde James teve o surto psicótico?

– Como estão lidando com as tendências homossexuais do conde?

"Por que isso", "por que aquilo", "qual aquele outro"... Integra já não aguentava mais por o pé na rua ou, pior ainda, olhar o jornal do dia e ver uma foto sua com o rosto virado e a manchete "organização Hellsing se mantém em silêncio". Estava terminando de picotar o jornal em pedacinhos quando ouviu a voz de Vlad, que falava ao celular enquanto tentava ao mesmo tempo equilibrar dois copos de café, abrir a porta e entrar no escritório.

– Não, entenda, a organização Hellsing funciona como uma organização de apoio ao governo inglês, e sob pedido direto da Rainha foi envolvida nos casos que estão sendo discutidos.

Vlad pousou um dos copos na mesa de Integra e continuou a relatar o discurso padrão divulgado pelo departamento de imprensa do governo.

– Um comunicado oficial já foi expedido sobre o caso de James Kingsman e eu não tenho mais nada a lhe informar a respeito. Sim, a família está recebendo todo o apoio necessário. - Que era nenhum, já que o filho era um monstro sanguinário que antes de ferir doze pessoas e matar um soldado em um surto psicótico matou e bebeu o sangue dos pais e irmãs. - Até onde sabemos não tem relação com o vírus em questão...

Integra bebericou seu café, observando a postura do conde enquanto ele começava a mexer em seus papéis, com o telefone prensado no rosto por seu próprio ombro.

– Não acredito que meu relacionamento pessoal com a Condessa seja de interesse público e muito menos relevante nesse caso... Obviamente Sir Hellsing mantém o título de Condessa Dracul. O quê? É claro que não, jamais ouvi tamanho absurdo em toda minha vida. Não sei, como posso saber o que se passa na cabeça das outras pessoas? Obviamente eu posso assegurar que tal momento jamais ocorreu. Sim, tenha um bom dia.

Vlad respirou fundo e ficou alguns segundos olhando a pilha de papel picado aos pés da mesa de Integra.

– Aquele é o meu jornal? - Ele finalmente perguntou, perplexo.

–É. Não tinha nada de interessante nele. - Integra respondeu, virando o rosto para tomar seu café olhando fixamente para a parede.

– Certo. - Respondeu Vlad, não acreditando naquilo.

Ficaram alguns minutos em silêncio, com Integra olhando para a parede e Vlad bebendo seu café enquanto olhava o jornal na internet. Foi quando o conde encontrou a reportagem com a foto de Integra. A matéria era ainda mais interessante que a foto.

– É inacreditável como eles passam da insinuação de que nosso casamento foi forjado para esconder tendências homossexuais de minha parte, para afirmar que o tal casamento acabou porque eu a traí ou com Mihaella ou com Celas, para, sem pronunciamento ou motivo nenhum, começarem a fofocar sobre estarmos juntos novamente. Como se o fato de duas pessoas casadas passarem parte do dia juntos fosse algo ilícito.

"Passarem parte do dia juntas". Aquilo chamou a atenção de Integra. Desde que começaram a trabalhar juntos, começaram também a passar grande parte do dia na presença um do outro e, com o tempo, a tensão que preenchia o ar do escritório foi se dissolvendo. Era impossível para Integra não respeitar o trabalho de Vlad e, passado o silêncio apavorante das primeiras semanas, Vlad estava sendo bastante cordial, apesar de jamais comentar sobre sua vida pessoal com Integra. Integra sabia duas coisas: que Vlad vinha fazendo uma quantidade absurda de exames, mas não sabia porque ou o que eles revelavam; e que, às vezes, Mihaella decidia que Vlad estava trabalhando demais e sequestrava o rapaz do escritório. Qualquer coisa além disso, Integra não fazia ideia. De repente não saber nada sobre o rapaz era algo insuportável.

– Vlad?

– Hum? - Vlad respondeu, não levantando os olhos das planilhas que parecia já estar trabalhando há algum tempo. Quanto tempo Integra ficou devaneando?

– Vlad. - Ela chamou de novo.

Dessa vez Vlad parou o que estava fazendo e olhou para a Hellsing.

– Como você está?

Vlad ficou alguns segundos olhando para Integra, procurando a resposta mais adequada para aquela pergunta. O que Integra queria ouvir? O que era verdade? Em qual sentido ela estava perguntando? Nas últimas semanas um acordo silencioso havia sido formado entre os dois e esse acordo ditava que eles seriam cordiais, trabalhariam juntos e não deixariam que seus problemas pessoais afetassem seu trabalho. E, muito embora Vlad estivesse se sentindo um covarde, deixando de lado tudo o que sentia por Integra para que pudesse continuar em frente, ele estava aceitando a situação e não sabia se estava pronto para mudá-la.

– Eu estou bem, Integra. Obrigado. - Ele respondeu, tentando voltar para sua planilha, mas não estava mais conseguindo escrever nada.

– Eu entendo se não quiser falar sobre isso, mas mentir não é do seu feitio. - A Hellsing respondeu. Sob o olhar quase que ofendido de Vlad, Integra simplesmente apontou para as mãos de Vlad, não mais firmes. - Você está tremendo.

Vlad olhou para a caneta em sua mão e percebeu que não havia como negar que o objeto estava balançando levemente. Deixou a caneta de lado e juntou as mãos, tentando em vão fazê-las parar de tremer. Respirou fundo algumas vezes, para então responder:

– Eu estou melhor. Eu... Eu vou ficar bem. É só uma questão de tempo.

– Eu sinto a sua falta.

As palavras escaparam tão rápido da boca de Integra que tanto ela quanto Vlad se surpreenderam ao ouvi-las. E quando Integra finalmente as ouviu em voz alta, percebeu o quanto aquilo era verdade. É fato que ela nunca se sentiu tão só em toda a sua vida e sempre sentiria saudades de seu pai, saudades do vampiro, até mesmo saudades de algumas coisas que não tinha certeza se conhecia. Mas além da vontade de ter alguma companhia, sentia falta da companhia de Vlad. Não aquele Vlad que estava ali trabalhando com ela, mas o Vlad que não entendia como funcionavam propagandas de lingerie, que franzia o cenho falando no telefone, que tocava violino sem encostar o arco nas cordas enquanto Integra estava dormindo, que tomava seu chá sem açúcar apesar de adorar doces. Mas aquele Vlad... Aquele Vlad era assombrado por demônios tanto metafóricos quanto reais, aquele Vlad era frágil, aquele Vlad dependia de Integra. E Integra estava verdadeiramente feliz em ver que Vlad estava melhor, realmente estava. Mas ela sentia falta de um Vlad que ficasse ao lado dela, em vários sentidos da palavra.

– Eu também sinto a sua falta. Mas, Integra... Aquela situação estava insustentável.

A Hellsing concordou com a cabeça em um aceno pequeno, contido. Ela sabia disso. Ela também sabia que Vlad só estava melhorando porque estava longe dela. E mais que tudo, sabia que não podia pedir mais nada dele.

– Eu estou tentando...

Mas Integra nunca soube o que Vlad estava tentando, porque o telefone de Integra tocou e o som alto e agudo quebrou o momento. A loira atendeu a ligação, sem dizer uma única palavra além de "Alô" e "Aguardem minhas ordens". Após desligar o aparelho, olhou para Vlad e o comunicou:

– Encontraram Thomas. Ele exige uma audiência com o "Baffled King".

Hallelujah, Hallelujah, Hallelujah

Well, there was a time when you let me know
What's really going on below
But now you never show that to me, do you?
But remember when I moved in you
And the holy dove was moving too
And every breath we drew was hallelujah

Hallelujah, Hallelujah, Hallelujah, Hallelujah

Well, maybe there's a God above
But all I've ever learned from love
Was how to shoot somebody who outdrew ya
And it's not a cry that you hear at night
It's not somebody who's seen the light
It's a cold and it's a broken hallelujah

Hallelujah, hallelujah, hallelujah, hallelujah
Hallelujah, hallelujah, hallelujah, hallelujah
Hallelujah, hallelujah, hallelujah, hallelujah
Hallelujah


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Read and Review, please.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Anjo da Noite" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.