Anjo da Noite escrita por MsWritter


Capítulo 33
Capítulo 33. Redenção


Notas iniciais do capítulo

Em primeiro lugar, algumas coisas que devem saber antes de começarem a ler: leiam com o Google tradutor ligado de romeno para português. Não coloquei a tradução na fic primeiro porque não é realmente importante o que o Vlad diz, segundo porque apesar de conhecer quem fale, eu não falo romeno, então não posso atestar que o que o Vlad está dizendo é verdade. Outra coisa, fic não betada, então perdoem-me os erros e avisem-me se encontrarem.

Desculpem-me pela palhaçada no fim da fic também, acontece que eu não resisti. Qualquer coisa, só pulem o diálogo. A música de hoje é Save me now do Andru Donalds.



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Here I am
In a place that I
Have never been
Out of love
And afraid that you
Won't let me in (no)

You came to me and I started to feel
That my senses had left me to die
Where is my strength when I need it the most?
Tell me what have you done with my mind

Save me now
From the depth of my infatuation
I could drown
In the sea of love and isolation
I'll take you down if you just
Save me now

All the time that I gave away
I'll give it to you
All the love that I never made
I'll make it to you, yeah

            O dia teimou em demorar a passar, mas as horas se foram, o sol se pôs, os cavalos foram guardados (com os protestos e coices de determinado garanhão negro, mas o sorriso discreto de um conde romeno), as cadeiras recolhidas e com o tempo o jantar seria servido.

Para alguém mais observador a cena que se desdobrava era um verdadeiro jogo de pôquer, com seus participantes blefando e apostando tudo nas cartas que tinham.

Vlad observava todo e qualquer gesto de Integra, esperando uma brecha, algum indicio de que ela ainda o queria em sua vida. Ele não tinha mais certeza. Sua partida havia sido bruta, não haviam conversado desde sua volta e o pior: mesmo que ela o quisesse, ele não sabia se era justo para ela, condená-la a uma meia vida por viver com uma meia pessoa. E se no fundo a rainha tivesse razão? Aquela podia ser a última chance de Integra formar uma família, ainda que com aquele canalha do Joseph. Se bem que... O cara era um idiota, mas ele não tinha provas de que ele era mesmo um canalha.

Integra amava Alucard. E por amar Alucard tolerava a presença dele mas... Qual era a justiça de se meter naquele casamento (acordo) se a possibilidade de que não pudesse estar ao lado dela era tão grande que... Bom, isso podia ser uma vantagem SE o melhor fosse apenas evitar o casamento. Agora, ele ainda poderia fazer alguma coisa se quisesse?

Já a atenção de Integra estava focada na rainha. No momento em que aquela velha mal amada, digo, aquela figura real ia se levantar e pronunciar o prelúdio do maior desastre de sua vida, porque ter o pai assassinado, sofrido duas tentativas de homicídio pelas figuras humanas mais próximas, conviver, se apaixonar e ver partir o vampiro mais sanguinário e poderoso que já existiu e dedicar toda sua vida à constante caça de monstros não era nada demais, afinal.

Já a dita rainha estava focando toda sua atenção à Joseph, estranhando o comportamento dele. Estava quieto, contido, parecendo um vulcão prestes a explodir, e vossa majestade não aceitaria jamais um comportamento desrespeitoso à mesa. Mas como a jogada agora residia nas mãos enrugadas de sua majestade, ela também observava os blefes dos outros jogadores. Pensava nas cartas altas que o recém-descoberto-arqueduque carregava, em seus olhos ao mesmo tempo penetrantes e perdidos em algum lugar entre a dúvida e o auto-desprezo. Observava Integra apostar todas suas fichas em uma mão fraca, mas com a expressão inalterada de uma jogadora experiente. Mas acima de tudo observava Joseph, que claramente não sabia jogar e estava ficando seriamente desapontado com as cartas que tinha.

O dito Joseph observava Vlad, com um olhar felino e quase faminto. Ainda nutrindo o ressentimento pela última derrota e perdendo o controle ante a ambição das apostas feitas. Tudo o que ele queria naquele momento era Integra. Não por ela mesma, mas pelo troféu. Ao mesmo tempo vencer o inimigo e levar o prêmio para casa: uma esposa troféu para exibir, a organização Hellsing, o título de cavaleiro da Távola, a nobreza que lhe faltou em seu nascimento, o dinheiro que lhe bancaria todos os gastos exorbitantes por dez vidas. E a vingança pelo nariz quebrado, pela humilhação sofrida. Era só a rainha anunciar e ele teria tudo. Faria um pedido exorbitante e exageradamente prepotente que Integra aceitaria. A mulher mais difícil da Europa aceitaria em público, em frente às câmeras. E então ele a tomaria em seus braços e a beijaria como se ela fosse tão barata que em sua mente ele já imaginava por onde seus dedos passeariam pelo veludo do vestido azul marinho, só para que ele pudesse olhar para Vlad naquele momento, um olhar que diria que ele havia vencido, que o conte não interromperia aquele beijo e que Integra nada poderia fazer para revidar: ela era dele.

E nesse jogo de olhares o jantar foi servido. E entre blefes e jogadas não muito arriscadas o mesmo jantar foi consumido. E então, violinos começaram ao longe, seguidos de violas e violoncelos, até que um piano foi tocado: uma valsa.

Enquanto os velhos nobres e cavaleiros, exauridos pela comida e bebida conversavam, riam e fumavam, os mais jovens reuniram-se, e em poucos minutos havia casais bailando pelo salão. Dançando juntos na verdade, abraçados dando pequenos passos com o tempo da música: uma desculpa para tocarem uns nos outros.

Integra não se moveu de onde estava, muito preocupada em fazer desaparecer o conteúdo de seu copo de whisky para quem sabe fazer desaparecer também a ansiedade que apertava seu peito.

Do outro lado do salão, um Vlad um tanto quanto frustrado ainda retirava um ou outro pêlo negro do terno cinza claro, aproximando-se dela para uma valsa. Uma única valsa.

Uma mão pálida e enfaixada foi estendida e aceita. Assim a dança começou. Um pouco receosos no começo, até que aos poucos os corpos de ambos aceitaram a presença um do outro. Vlad buscando o calor da cintura de Integra, enquanto Integra traçava com os dedos as faixas na mão direita de seu condutor, para por fim pousar a cabeça sobre o ombro dele, sentindo na clavícula as batidas do coração de um se sintonizarem com o coração de outro.

– Eu demorei muitos anos para aceitar que aquilo que se passa em meu coração é importante Milady, então peço minhas sinceras desculpas se não soube dar a real importância para aquilo que se passa no teu. – Vlad murmurou, enquanto girava Integra pelo salão, com a destreza de quem havia sido repreendido muitas vezes por não fazer aquilo direito e foi obrigado a aprender.

– Na verdade, eu ainda nem sei bem como lidar com as minhas emoções, então espero que entenda quando me desculpo por não saber lidar com a dos outros.

– Somos dois tolos então.

– E não somos todos? – Vlad sorriu por entre os cabelos loiros.

– Você disse que achava que me amava. Achar não é o suficiente.

– Não é. – Vlad continuou. – Mas eu não tenho mais certeza se é o correto.

– O que aconteceu Vlad? O que foi que fizemos da nossa vida?

– Escolhas erradas? Ou não era para ser mesmo...

– É fácil atribuir a culpa ao destino.

– Ama Alucard. E ele se foi. Mas enquanto eu estiver por perto será como se ele estivesse quase ao alcance das mãos...

– Mas ele nunca estará, não é? – Integra murmurou, finalmente aceitando que Alucard não teria voltado aquele dia no rio, e que Vlad a poupou da escolha mais dolorosa que faria em sua vida.

– Não posso te condenar a meia vida, por convidá-la a se casar com alguém incompleto.

“Alguém que é quase aquele que deseja, mas jamais o será.”

– Então me condenará a uma vida vazia, por me casar com alguém que não é.

Vlad sorriu, mas era um sorriso triste, conformado.

– Posso matá-lo se o problema for esse.

Integra apertou de leve a mão com que Vlad a conduzia. Não estava quebrada, mas Vlad franziu as sobrancelhas quando sentiu a pressão em seus dedos feridos.

– Se fosse a escolha correta Milady, se for para o teu bem, saiba que minha vida é tua, para tomar, salvar ou decidir.

– Se não me escolhe por vontade, Milord, creio que não há nada para ser decidido.

Vlad segurou a cintura de Integra com mais força, mas dessa vez ela o recusou, retirando-se da dança. Vlad ficou mais alguns segundos parado no meio do salão, até que, com passos tímidos e contidos, foi para o jardim.

Nenhum dos dois percebeu a rainha chamar Joseph e suspirar alguma coisa em seu ouvido.

Uma vez nos jardins do castelo, ergueu a cabeça, voltando os olhos âmbares para a lua. Em um ato inconsciente procurou pela estrela do Norte, imediatamente localizando-a e determinando a direção de casa. Não, a direção da Romênia. Ele não sabia mais a direção de casa. Voltou a olhar para a lua, contemplando seu brilho, sua luz. Sentindo-se pequeno diante da imensidão do universo.  

E toda aquela luz, todo aquele brilho, de repente se tornou escuridão, enquanto seus olhos enegreciam, sucumbindo à uma pancada forte na lateral de sua cabeça que ele não viu de onde vinha.

Milésimos de segundo depois de atingir o chão, a visão de Vlad voltou. Ele observava um fio de sangue correndo imediatamente a frente de seus olhos. Movendo a mão ao rosto, descobriu que o sangue estava saindo de seu nariz. Ele deve ter dado com a cara no chão na hora em que caiu.

O que aconteceu depois foi rápido demais para ele entender exatamente do que se tratava. Um chute nas costelas, outro no abdômen, o ar se perdeu por alguns minutos. Dois pares de braços o colocaram em pé e o seguraram por trás. Ele chegou a se libertar o suficiente para revidar. Seria muito fácil. Uma cotovelada, um giro de braço e dois de seus agressores estariam no chão. Livre seria muito fácil abater o terceiro. Bom, se fossem realmente só três, o que ele acreditava, já que um grupo maior não passaria despercebido durante um evento real. Bom, pelo menos ele esperava.

Libertou um braço, derrubou um agressor. Estava perdendo o equilíbrio, melhor acertar o terceiro primeiro e depois derrubar o que o segurava. Parou o punho exatos trinta centímetros antes de acertar o nariz de Joseph.

Um momento de hesitação e seu braço havia sido capturado outra vez. E ele não tentou mais se livrar do ataque. Ia aceitar toda e qualquer humilhação que recebesse. No ato covarde de Joseph viu refletida a covardia que foi seu ataque na noite do último baile. Um contra um, mas ele era um cruzado, educado e crescido em um campo de batalha, e Joseph era só um nobre mimado que não sabia ouvir um não.

E afinal, não seria nem a primeira nem a última vez que apanharia tanto a ponto de ficar inconsciente.

O próximo soco veio direto em direção à sua mandíbula. Bom, ele não tinha nenhuma cicatriz no rosto ainda.

– Você deve achar muito divertido. Sair por ai seduzindo damas de alta classe. Você é mesmo um conde?

Vlad tentou murmurar alguma coisa, mas outro soco em seu rosto o ensinou que era melhor ficar em silêncio.

            – Humilhando os nobres da corte. Fazendo-nos parecer ridículos... Qual é a ideia? Assumir a organização Hellsing? Saldar os débitos de sua família? É isso não é? Em troca de um título de nobreza?

            Outro soco, em suas costelas dessa vez. Já estava começando a ficar difícil respirar.

            Percebendo a dificuldade dele em respirar, um dos agressores o soltou no chão. O outro não agüentou o peso dele sozinho, deixando o cair.

            – Hey cara. Acho que já está bom. Afinal...

            – Se você não tem coragem, saia daqui! – Joseph murmurou por entre os lábios, enquanto aproveitava a posição de Vlad para acertar um chute em seu estômago.

            – Muito nobre pra quem precisa de três para bater em um homem que nem revida. – O homem murmurou, deixando os outros dois para trás.

            Joseph deu mais um chute que acertou a mão quebrada de Vlad, obrigando o conde a forçar o queixo contra o peito para segurar um grito de dor.

            – Quer que eu segure o rosto dele virado pra você? Ai você pode ver ele chorar. – O outro brincou, com um risinho.

            – Não assassine a gramática, por favor. – Joseph murmurou, acertando outro chute em Vlad que, ingenuamente achando que o ataque havia acabado, acabou sendo pego de surpresa e mordendo a língua.

            Joseph se ajoelhou ao lado da cabeça do conde, erguendo-o pelo colarinho agora ensanguentado:

            – Qual a sensação? Claro, está faltando a multidão para assistir sua humilhação, mas mesmo assim...

            O loiro soltou o conde com força, que bateu a cabeça no chão de pedra com um baque seco. Sentir Joseph segurando seus braços firmemente no chão com os joelhos fez Vlad abrir os olhos, apenas para descobrir a visão desfocada.

            – Você não tinha o direito... Não de convencer a rainha de que Integra o amava... Não de se meter no meu casamento... ERA O MEU FUTURO QUE ESTAVA GARANTIDO!

            Socos fortes e cobertos de ódio acertaram o rosto de Vlad repetidas vezes, até que Joseph o ergueu novamente, pelo nó da gravata dessa vez. E então, pânico.

            O conde sentia mãos desesperadas apalparem seu torso, freneticamente procurando por alguma coisa.

            – O que foi? – O outro homem perguntou, tentando entender a reação do outro.

            – Tem muito... Tem muito sangue...Hey! Acorda! Seu maldito...

            De repente, Joseph estava apavorado diante da possibilidade de ter matado um homem. Ele queria ensinar uma lição sim, mas não matar outra pessoa...

            Vlad ergueu a mão esquerda, timidamente procurando a fonte de tanto sangue por entre o colete cinza claro (que havia perdido uns dois botões) e a camisa branca.

            – Meus pontos abriram... – Ele murmurou, ofegante, tentando fazer sentido com a língua cortada. – Precisa... Precisa refazer... Infecção...

            – Pontos? – Joseph se perguntou estático, até que em um ímpeto desesperado puxou a camisa de Vlad com força, rasgando parte do tecido, estourando os botões no resto, até revelar por completo a pele do conde, o corpo repleto de deformidades e falhas na pele, causadas por cicatrizes antigas, e os dois cortes que grosseiramente espirravam sangue pela pele que a linha ajudou a cortar um pouco mais.

            – O que você...?

            – Já devia ter fechado... Já devia ter fechado... – Vlad estava começando a ficar incoerente nesse ponto. Estava acostumado a continuar a lutar ferido, mas aquilo era diferente. Estava perdendo as forças em uma velocidade apavorante. Ia desmaiar em breve.

            – Hey. Acorda! Você não quer o dinheiro da Hellsing... Quer?

            – Eu só quero... Eu só quero que ela seja feliz. – Vlad murmurou, forçando os olhos que já começavam a inchar a permanecerem abertos. O âmbar deles pela primeira vez não intimidando Joseph, mas implorando por aceitação. – Eu daria todo o passado, o presente e o meu futuro para que a felicidade dela estivesse comigo... Mas eu sou, sunt o fantoma... io sunt de coşmar...

            Joseph chacoalhou Vlad com força, temeroso de que o conde fosse morrer ali, com o sangue manchando suas mãos e roupas...

            –Tu nu-l merită. Vor muri înainte de exploataţie mâinile ei.... – Vlad murmurou, dessa vez agarrando o pescoço do outro com uma força completamente ilógica para a situação em que sua mão estava.

            Um tiro foi ouvido. E a atenção de Joseph finalmente foi tirada do olhar sanguinário que Vlad lhe dirigia por entre as pálpebras inchadas e se manteve na arma apontada agora para sua cabeça por uma tal Sir Hellsing muito irritada.

            – Largue-o agora.

            – Você... Ele... – Joseph ouviu seu comparsa sair correndo, mas não se deu ao trabalho de virar o rosto.

            – O próximo vai arrancar sua orelha fora. E eu posso mirar de um jeito que vai ficar irreparável. Que acha? Direita ou esquerda?

            Joseph, por um momento, estava paralisado sobre o corpo do conde, que ainda o mirava com desdém.

            – Tu nu stii gloria şi nobilimea ... Nu atingeţi niciodată pe un astfel de bijuterie pretioasa ... – Vlad murmurava, perdendo as forças enquanto sua mão caia no chão com um “crec” estranho.

            – Solte-o agora Joseph. Por tudo o que há de mais sublime nessa terra eu juro, não hesitarei em transpassar uma bala benzida para matar vampiros nesse seu coração imundo. Tenho autorização para fazê-lo e imunidade diplomática perante a nação.

            Aos poucos Joseph saiu de cima do corpo mole de Vlad, arrastando-se pelo chão até ficar pouco mais de meio metro distante do corpo.

            Integra se aproximou do conde deitado no chão, erguendo a cabeça dele em seus braços para ajudá-lo a respirar:

            – Vlad... VLAD! Você está me escutando?

            –Tu eşti cel mai frumos crearea a lui Dumnezeu. I venerează. Te iubesc.

            – Vlad... Nós vamos para o hospital. Vai ficar tudo bem...

–Sunt doar pentru tine ... Există doar pentru tine...

– VLAD!

– Te iubesc...

O chamado insistente de Sir Hellsing virou um eco distante e no final silêncio e escuridão. Vlad já estava inconsciente quando os primeiros curiosos por causa do tiro se aproximaram e não acordou durante o trajeto até o hospital, permanecendo sedado até a manhã do dia seguinte, acordando apenas no meio da madrugada do outro dia.

Quando acordou, Vlad não sabia muito bem onde estava, ou se aquilo importava. Aos poucos percebeu que mesmo que importasse, ele não tinha muito que fazer.  Qualquer movimento fazia seu abdômen e cabeça latejarem. Não demorou muito para que ele descobrisse que respirar também doía. Muito aliás.

Foi quando tentou abrir os olhos diante da escuridão do quarto. Bom, estava escuro, fato, mas ele também percebeu que seu olho esquerdo simplesmente não abria. Ele não se lembrava de ter recebido um golpe no olho... será que...

Espera ai. Ele estava numa cama, em um lugar que cheirava a produtos químicos e tinha um irritante bip bip soando em algum lugar perto da sua cabeça... Ah, século XXI Vlad. Provavelmente não foi um golpe de espada que você recebeu no olho. Deve estar só inchado.

Tentou erguer a mão direita para conferir se o olho estava mesmo no lugar, apenas para descobrir que esta estava completamente contida por entre placas de metal e espuma. Irritante. Tentou erguer a outra mão, completamente enfaixada também. Que coisa mais chata! E se seu olho não estivesse mais ali?

De tanto tentar raspar seu olho em qualquer parte de roupa, pele ou até mesmo o travesseiro, só para ter certeza de que ele estava ali, acabou fazendo um movimento brusco demais e torcendo seu abdômen. A dor veio em uma pontada forte, momentaneamente impedindo-o de respirar. Foi quando ele resolveu que com, sem, com dois, três ou vinte olhos, era melhor ele ficar quieto e respirar, ou em breve ele estaria, além de cego, agonizantemente sufocando sozinho em sua cama de hospital.

Hospital? Por que ele estava no hospital mesmo?

– Sabe, um dia, só por diversão, eu vou mesmo arrancar a orelha do Joseph fora. – Integra murmurou para Celas, enquanto as duas entravam no quarto.

– Sim Sir Hellsing. Podemos alegar que foi uma forma de salvá-lo, tipo, de impedir que ele se tornasse um monstro...

– Nem seria preciso. Imunidade diplomática aliado a auto-defesa, um bom motivo aliado a poucas testemunhas e muito dinheiro. No fundo o Joseph só tem aparência. Faz anos que a família dele não consegue cobrir os gastos.

Integra sentou-se em uma poltrona, imediatamente percebendo que Vlad estava acordado. Olhando para ela, na verdade.

– Olá. – Ela disse simplesmente.

– Oi. – Ele respondeu, fechando o olho que conseguia abrir.

– Celas, por que você não vai buscar um copo d’água? Sem gelo.

Celas assumiu uma postura rígida, indo em seguida procurar o tal copo d’água com uma expressão um tanto quanto apavorada no rosto.

– Acredito que tenha água por aqui, Milady. Se quiser, pode... – Vlad continuou, colocando-se mais sentado que deitado em sua pequena cama de hospital.

– Em primeiro lugar, sim, tem mesmo. Em segundo lugar, não é pra mim, é pra você. – Integra se levantou, servindo um copo para o conde.

– Eu não estou com sede... – Vlad murmurou, sendo interrompido pelo copo que Integra grudou em seus lábios.

– Mas vai beber assim mesmo!

Vlad fez menção de segurar o copo, mas apenas o esforço em erguer as mãos o fez lembrar que elas ainda estavam enfaixadas e não seriam de ajuda nenhuma. Acabou aceitando um primeiro ele, percebendo então que estava com sede sim, bebendo o líquido muito rápido e quase se engasgando. Má ideia, quase se engasgar doía muito mais que respirar.

– Você me apronta cada uma... – Integra murmurou, pressionando o homem contra seus travesseiros com um toque suave mas firme.

– O que aconteceu? – Vlad perguntou, aceitando que teria que se contentar com a maciez de seus travesseiros para apoiar a cabeça dolorida e tentar encontrar uma posição em que respirar não doesse tanto.

– O que aconteceu... VLAD! VOCÊ QUASE DEIXOU AQUELE CANALHA DO JOSEPH TE ESPANCAR ATÉ A MORTE E ME VEM COM ESSA DE O QUE FOI QUE ACONTECEU?

A princípio Vlad se assustou com a informação. Foi quando se lembrou o acontecido e soltou um pequeno “oh”. E então olhou para uma Integra irritada e corada a sua frente e começou a rir. E rir doía. Mas por algum motivo isso também era engraçado, então ele ria mais apesar da dor. No final acabou ficando completamente sem ar, sufocando em meio a riso e dor, e tentando se controlar na cama. E claro que isso só deixou Integra mais irritada, o que era só mais engraçado. Tentou se controlar, respirando fundo, choramingando alguma coisa quando o ato também se provou doloroso.

– VLAD! Quer parar de rir! Você só vai se machucar mais! Aposto que até respirar deve estar doendo!

– Na verdade, Milady... Até pensar dói... – Ele murmurou, tentando encostar o nariz no travesseiro para ver se melhorava alguma coisa.

– Você quer que eu chame uma enfermeira? Ela pode te dar alguma coisa para a dor, ou para dormir...

– NÃO! Digo... Estou bem Milady, não precisa se preocupar...

Passado o ataque de bobeira, Vlad percebeu que a última coisa que queria era preocupar Integra. 

– Não há necessidade...

Trade demais, Integra já havia apertado o botão. Vlad soltou um suspiro, aceitando que não teria voz naquilo. Afinal, se Integra tinha imunidade para atirar em um membro da corte, por que ela não poderia... Imunidade?

– Milady... A coroa concede aos membros da Hellsing imunidade diplomática?

– Não... – Integra respondeu, fazendo cara de inocente e olhando para o teto.

– Mas a senhorita disse que...

–Acontece que eu estou noiva de um conde estrangeiro sabe... E como vou ficar com o título depois de oficializar...

Vlad não entendeu mito bem as palavras a princípio, depois deu um sorriso bobo e quando abriu a boca para falar... Uma enfermeira entrou, atrapalhou a visão que ele tinha de Integra, fez um monte de perguntas que ele não entendeu, o colocou sentado, o deitou de novo, reparou numa careta de dor que ele fez, aplicou uma injeção e foi embora.

O conde romeno ficou tão atordoado com a sucessão de fatos que até tinha se esquecido do assunto quando Integra entrou novamente no seu campo de visão. Ele sabia que tinha algo importante para dizer, algo para discutir... Mas o que era mesmo? E enquanto Integra falava com ele, coisas que sua mente nublada não lhe permitia entender, ele tentava se lembrar...Tinha alguma coisa a ver com a Romênia...

– E então você entrou em choque hipovolêmico... Bom, quase.

– Choque hipovolêmico?

– Pois é. Princípio de um. E você sabia que tem um tipo de sangue muito seletivo Vlad? O-.

– Sangue? Sangue para o que?

– Vlad! Por que se faria uma transfusão de sangue em um paciente que vai morrer porque perdeu muito sangue?

– Pra...

– É ÓBVIO QUE É PORQUE ELE PERDEU MUITO SANGUE!

– Ah... Sim, cheio como um saco de batatas.

– Batatas? – Integra realmente não entendeu aquele comentário, o que a fez sair de seu estado de irritação muito rápido.

– Batatas.

– De qualquer forma, eles não tinham o seu tipo sanguíneo em reserva. – Integra murmurava,enquanto passava as unhas distraidamente por um curativo em seu braço, típico de quem levou uma injeção forte, ou quem sabe doou sangue.

“Eles me encheram de que então? Suco de tomate? Tomate... SIM PLANTAÇÕES DE TOMATE! PLANTAÇÕES NA ROMÊNIA!”

– Sir Hellsing é um pé de aveia! – Ele disse simplesmente, como quem tinha chegado a uma conclusão brilhante.

– E então nós... O que? – Integra perguntou, assustada.

– Aveia. Um pé de aveia. Sabe aveia?

– Aveia?

– É. Aquela diferente do trigo. Sabe o trigo?

– Vlad. Você está bem?

– Não. Na verdade, não sei onde foram parar meus olhos.

– Seus olhos Vlad? – Integra já estava começando a se preocupar.

– Não os dois. Só um. Você acha que ele ainda está no meu rosto? Do lado do outro, espero...

– Vlad... o que você...

– Celas está demorando com a água. Espero que ela traga também um copo de suco de laranja para o peixe... Ah... e diga para ela ir procurar meu olho, mas não precisa por dentro do copo d’água, senão demora mais...

– Laranja para o peixe?

–"Era uma vez um homem que estava pescando, Maria. Até que apanhou um peixinho!” –Vlad murmurou. Integra estava realmente preocupada. QUEM ERA MARIA?

– “Mas o peixinho era tão pequenininho e inocente, e tinha um azulado tão indescritível nas escamas, que o homem ficou com pena. E retirou cuidadosamente o anzol e pincelou com iodo a garganta do coitadinho. Depois guardou-o no bolso traseiro das calças, para que o animalzinho sarasse no quente. E desde então, ficaram inseparáveis. Aonde o homem ia, o peixinho o acompanhava, a trote, que nem um cachorrinho. Pelas calçadas. Pelos elevadores. Pelo café. Como era tocante vê-los no "17"! o homem, grave, de preto, com uma das mãos segurando a xícara de fumegante moca, com a outra lendo o jornal, com a outra fumando, com a outra cuidando do peixinho, enquanto este, silencioso e levemente melancólico, tomava laranjada por um canudinho especial...”

– Vlad... Do que diabos você está falando? Peixes com canudo? Homens com quatro mãos...

– “Ora, um dia o homem e o peixinho passeavam à margem do rio onde o segundo dos dois fora pescado. E eis que os olhos do primeiro se encheram de lágrimas. E disse o homem ao peixinho: "Não, não me assiste o direito de te guardar comigo. Por que roubar-te por mais tempo ao carinho do teu pai, da tua mãe, dos teus irmãozinhos, da tua tia solteira? Não, não e não! Volta para o seio da tua família. E viva eu cá na terra sempre triste!..." Dito isso, verteu copioso pranto e, desviando o rosto, atirou o peixinho n’água. E a água fez redemoinho, que foi depois serenando, serenando... até que o peixinho morreu afogado..."

– VLAD! – Integra gritou em desespero, tentando trazer o homem de volta para a realidade.

– Sabe, é só uma Velha História, mas é engraçado. As pessoas nos tiram de nossas vidas medíocres, nos ensinam o que e como fazer as coisas, depois esperam que nos adaptemos à nossa vida antiga. Se eu perder meu outro olho na guerra, como é que eu vou ler?

– O que...

– A história é de um poeta sabe... O nome dele... Ele tem a ver com a quinta semana do mês de maio...

Integra já estava em frenesi, apertando o botão para chamar a enfermeira e descobrir o que diabos ela tinha dado para Vlad.

– Mas eu não sei... Não sei se o peixe gosta de açúcar ou adoçante... E se eu for um peixe? E a senhorita aveia? São mundos diferentes sabe? – Vlad murmurava, enquanto caia no sono uma vez mais.

– O QUE DIABOS VOCÊ APLICOU NELE? – Integra berrava com a enfermeira, que alegava serem apenas analgésicos...

Dez minutos depois, Victória chegou com a água.

Nothing will not be more electric to me
Than to give you a taste of the love that I hide
In my condition I'm totally lost
Tell me what have you done with my pride

Save me now (save me now)
From the depth of my infatuation
I could drown (I could drown)
In the sea of love and isolation
I'll take you down if you just
Save me now
Save me now

And I'll stop loving you (save me now)
No way
Can't stop fantasizing (I could drown)
With you in my mind
Loves you girl
Loves you

Where is my strength when I need it the most?
Tell me what have you done with my mind


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Notas finais do capítulo

O poeta a quem ele se refere é Mario Quintana, e a crônica de fato se chama Velha História. E não, não sei quem é Maria. Agora, como um Vlad dopado, fraco e delirante foi capaz de recitar toda uma crônica deste tamanho, de um poeta brasileiro ainda por cima.... Bom, como diria o Obama : YES! WE CAN!

Afinal, só faço isso porque eu posso! E sabe o que vocês podem fazer? Deixar infinitos reviews! Onde foram parar vocês? Tô começando a ficar triste já!



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