Lie - The Story Of The 8th Sin escrita por Koneko-chan, Yukari Rockbell


Capítulo 3
Um ato de confiança. Ou não.


Notas iniciais do capítulo

Eu gostei particularmente desse capítulo, principalmente da parte da bolinha HSUAHS. Enjoy :3



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Chapter 3 (Ep. 14 – Brotherhood): Um ato de confiança. Ou não.

Já fazia tempo desde que Wrath partira, não sei para quê. Como sempre estava o maior tédio no nosso esconderijo, mas hoje mais cedo, quando Envy saíra, voltara com uma bola de plástico – daquelas com as quais cachorros costumam brincar – e ficou quicando-a na parede. Era uma distração visual para todos nós – principalmente Gluttony, que olhava para a bolinha imaginando o momento em que mudaria de posição e deslizaria para perto dele. E todos sabíamos que caso isso acontecesse era “tchau, tchau, bolinha!”. Ela ia passar a eternidade num lugar bem sombrio conhecido como “O Estômago do Gluttony.”

Entretanto, Envy não deixou que isso acontecesse, interrompendo a brincadeira quando ficou cansado disso.

– Droga, será que o Wrath vai demorar?

– Ele foi para Dubith, é claro que vai demorar. – Lust respondeu.

– Não fica tão longe assim. – ele argumentou.

– Lust, Envy, Lie, estou com fome. – Gluttony reclamou, ainda com os olhos na bola que repousava nas mãos de Envy.

Revirei os olhos e me estiquei até Envy, pegando a bolinha de sua mão e jogando para Gluttony.

– Coma isso e cale a boca. – falei.

Gluttony sorriu e a bolinha foi parar logo em sua boca.

– Não! – Envy gritou.

Olhei para ele e levantei uma sobrancelha.

– É só uma bola, você pode roubar uma igual de qualquer cachorro tosco que apareça na rua.

Ele me fuzilou com o olhar e apoiou o queixo na mão, colocando o cotovelo no joelho.

– Você é chata, Lie.

– Não. Chato é ficar ouvindo o Gluttony reclamar o dia todo que está com fome.

Ele sorriu maliciosamente e levantou o rosto em minha direção. Ativei meu estado de alerta.

– Melhor parar de me responder, Bela Dama Misteriosa.

Estreitei meus olhos para ele e cruzei as pernas, olhando para outro ponto e tentando não relevar a ameaça. Envy prometera não contar nada aos outros afinal. Notei Lust, curiosa, levantar uma sobrancelha.

Ouvimos passos e eu levantei os olhos para avistar a chegada de Wrath.  Ele carregava alguém nas costas e o amarrou com correntes em algo que não pude distinguir se era ferro ou o quê.

– Bem vindo, Führer. – Lust disse. – Como foi a inspeção no território do Sul?

– O irmão mais novo do Alquimista de Aço vai ser um sacrifício tão bom quanto sua Mestra. E temos mais um bônus.

– Ah, uma cara familiar! – ela continuou, sorrindo. – Já não o via há um século.

O homem amarrado era um homúnculo alto e forte com o cabelo espetado e o rosto fino. Sua tatuagem de ouroboros ficava nas costas da mão esquerda.

– Acorde Greed. – Lust insistiu.

Nesse momento, os olhos dele se comprimiram, indicando que realmente estava acordando. Eu me levantei e dei um passo para olhá-lo melhor.

– Nossa – disse com uma voz firme e muito masculina. – Vocês estão todos juntos.

– Você parece bem, “Escudo Supremo”. – Lust prosseguiu.

– E você continua sendo uma mulher bonita. A melhor arma, a luxuriosa Lust. – seus olhos desviaram-se para outro ponto. – E o comilão Gluttony! Você não perdeu peso nenhum... O invejoso Envy! Aquele que não tem nenhuma noção de estilo. – Envy olhava-o parado de onde estava, ainda mal humorado. Provavelmente com raiva de mim por ter deixado Gluttony comer a bolinha. Entretanto, estreitou o olhar para Greed quando este terminou sua descrição. – Onde está o preguiçoso Sloth? – perguntou em seguida, parecendo satisfeito com a reação de Envy.

– Ele continua um preguiçoso. – respondeu Lust. – Ele está trabalhando.

– Sério, vocês não mudaram nada em cem anos! – Greed continuou. Então pareceu notar Wrath e a mim pela primeira vez. – E vocês são?

Eu respondi primeiro.

– Lie. Não fui criada pelo Pai de vocês, apenas me juntei ao grupo.

– O raivoso Wrath.

– Lie? Entendo... Mas Wrath? Você é King Bradley!

– Sim. – Lust continuou. – O Pai o criou para ocupar o lugar de um humano chamado King Bradley. Ele é nosso irmão.

– Um homúnculo nesses tempos? – ele pareceu surpreso. – Impossível.

Ouvi uma risada estridente vinda de Envy.

– Não existe o impossível! – disse, parecendo divertido. – Era uma das nossas expressões favoritas, você se esqueceu? Ou você ficou senil?

– Cala a boca, idiota. – Greed disse com um sorriso no rosto.

Notei os olhos de Envy se esbugalharem em fúria enquanto ele soltava uma exclamação de raiva.

– Ooh, isso mesmo! Esses olhos... – Greed continuou. – São desses olhos de que eu gosto! Eu não vejo sua verdadeira forma há algum tempo! Me mostre, Envy!

Envy se levantou. Verdadeira forma? pensei franzindo o cenho e imaginando qual seria a verdadeira forma dele.

– Vá se danar. – ele disse, sério e enraivecido. – Vou esmagar você, já que você quer.

– Vocês não sabem ficar quietos? – disse uma voz atrás de nós.

Nos viramos surpresos.

– Eu não quero que lutem uns contra os outros – disse o Pai.

– O que está acontecendo, velhote? – Greed provocou. – Você não envelheceu muito, desde a última vez que nos vimos?

Um som baixo. O Pai fechava um livro.

– Greed. Meu filho que partilha minha alma. Por que você traiu seu próprio pai?

– Por quê? Você não acha que eu sou o melhor? O insaciável Greed... Você me deu a vida e eu vivi de acordo com essa natureza. Se eu continuasse vivendo sob suas ordens, nunca ficaria satisfeito.

– Você vai trabalhar para mim outra vez?

Um momento de silêncio, enquanto Greed soltava um pigarro de prazer.

– Não!

– Entendo...

Ouvi o som de algumas engrenagens se movendo e, embaixo de onde Greed estava pendurado, o chão começou a se abrir. Um grande tanque de lava fervente começou a subir até ele. Eu franzi o cenho, tanto surpresa quanto angustiada. Se descobrissem o que eu fiz, provavelmente aconteceria o mesmo.

– Que mau gosto... – disse Greed enquanto a coluna onde estava preso descia.

Logo seus pés afundaram na lava e ele soltou um grito alto e doloroso. Senti um aperto. Não. Eu não podia deixar que Envy dissesse o que sabia. Saber que eu me relacionei com humanos e fiquei triste com a morte de um provavelmente era considerada uma das maiores traições.

Eu olhei para Lust e Gluttony. Ela observava a cena com cara de tédio, como se pensasse que ele realmente merecia, enquanto Glutonny apenas conservava sua expressão débil e chupava o indicador da mão direita. Olhei para Wrath. Ele parecia alheio à situação. Meus olhos desviaram-se, por fim, para Envy, cuja cólera ainda predominava no olhar. Mas fora isso, sua expressão era inabalável e indescritível.

– PARE COM ISSO! – gritou Greed. – O fogo do inferno não é assim tão morno! Então, eu vou observar, meus irmãos!

O Pai levantou uma das mãos.

– Você vai regressar para o local de seu nascimento. A minha alma! Greed!

– QUE BOM! – gritou ele. – Não quero nem saber se você vai ficar com dor de barriga, velhote!

Um barulho de gotas. Eu observei pelo canto do olho um líquido vermelho descer por um tubo até cair noutro recipiente de vidro. Dali ia para uma taça, que quando cheia, parecia vinho. O Pai pegou a taça e elevou-a em nossa direção.

– Mal posso esperar pelos próximos dias, rezo para que continuem sendo leais.

Ele virou a taça goela abaixo, ingerindo todo o líquido até a última gota. Notei Envy lançar um olhar a mim, talvez enfatizando as palavras do Pai. Retribuí seu olhar, um tanto gélida. Sabia que havia hesitação em meus olhos pelo que eu vira agora mesmo. Não, eu não queria ter o mesmo final de Greed. E agora me perguntava que destino eu escolhera.

– Bem, – disse Wrath, por fim. – tarefa cumprida. Agora, se me derem licença, preciso voltar lá para cima. Pride deve estar com minha mulher.

Eu franzi o cenho, sem entender e observei Wrath se retirar.

– Para acentuar o disfarce. – Lust comentou, notando minha confusão. – Bradley se casou com uma humana e eles, supostamente, adotaram Pride com o nome de Selim.

Eu a observei.

– Então Wrath é, para os humanos, o pai de Pride?

Ela sorriu com minha tentativa de entender.

– Mais fácil dizer que Selim Bradley é filho adotivo de King Bradley.

Eu assenti, compreendendo. Ouvi um gemido vindo de Gluttony.

– Eu queria ter comido o Greed-san... – murmurou ainda com o dedo na boca.

Eu o olhei por alguns segundos, tentando imaginá-lo devorando Greed.

– Para onde vai tudo o que você coloca na boca? – perguntei num múrmuro.

Envy soltou uma risada alta, chamando minha atenção para ele.

– Para onde vai o que o Gluttony come?! – exclamou com um sorriso sacana no rosto. – Quer descobrir?

Eu hesitei a resposta. Não por que tivesse ficado em dúvida, mas porque tinha que tomar cuidado com o que falar para Envy.

– Pensando bem, não. – respondi.

Ficamos alguns segundos em silêncio. Fiquei encarando Envy, mas ele já tentava encontrar outra coisa com a qual se distrair. Eu suspirei e desviei meu olhar, sentando num cano próximo.

– Lie – ouvi uma voz fria me chamar.

O Pai.

Eu me virei para ele, surpresa e ao mesmo tempo amedrontada. Será que Envy abrira o bico? Eu aprendera a não confiar em promessas alheias, mas esperava que talvez ele pudesse...

– Sim? – respondi, esperando não estar sendo desrespeitosa por não chamá-lo de Pai.

– Sobre o que viu aqui hoje, – ele prosseguiu. – espero que não resolva trair-me como seu irmão de consideração, Greed. Sendo você a mais propícia a enganações aqui, quero deixar avisado que se hesitar em colaborar, seu destino será semelhante ao do que há pouco estava aqui. Afinal de contas – ele olhou diretamente para mim, tirando os olhos do livro ao qual imperceptivelmente já havia deslocado sua atenção. – Você aceitou nosso convite.

Senti uma bola na garganta impedir uma resposta imediata. Eu tentei engoli-la e, embora não tenha funcionado, respondi:

– Sim senhor, Pai. – murmurei em resposta. Entretanto, senti a necessidade de completar: – Não se arrependerá.

Pela sombra, pude ver o rosto do Pai se contorcer numa espécie de sorriso. Eu baixei o olhar. Essa noite estaria traumatizada com a possibilidade de algo acontecer comigo. Eu precisava confirmar com Envy se ele continuava com a promessa. Não queria, claro, sua companhia, mas era necessário ficar de olhos bem abertos com ele.

Eis que surgiu a possibilidade perfeita.

Envy se espreguiçou e olhou para nós.

– Vou dar uma volta por aí – anunciou. Vendo que Lust parecia prestes a dizer alguma coisa, interrompeu. – Pode deixar, não vou matar nem machucar ninguém.

– Posso ir com você? – perguntei.

Ele olhou desconfiadamente para mim por um segundo.

– Por que você quereria minha fútil companhia? Ou melhor, por que eu quereria a sua?

Eu lhe dei um sorriso cínico.

– Fico honrada em saber que já sou tão querida pelos meus irmãos de consideração. Só quero tomar um ar fresco, isso aqui é meio claustrofóbico.

Eu me levantei. Envy estava com cara de quem não gostava da ideia, mesmo assim, começou a andar para a saída.

– Ok, Bela Dama Misteriosa, você venceu...

Eu o segui, sentindo o olhar de Lust em minhas costas. Eu sabia que ela estava começando a notar o fato de Envy e eu sairmos sozinhos, mesmo que da última vez eu tenha saído primeiro.

Esperei até que tivéssemos saído. Envy olhou ao redor no beco já escuro pelo anoitecer e subiu pela parede de tijolos para o telhado. Eu o segui novamente. Ele ficou parado por um momento e soltou um longo suspiro.

– Ahh. Que noite bonita...

– Envy – chamei, quando terminei de subir até o telhado.

– Hm?

Eu olhei ao redor, procurando alguém que pudesse estar ouvindo.

– Quero falar com você... mas aqui não é o lugar mais seguro.

Ele levantou uma sobrancelha.

– Seguro?

– Não quero que os outros homúnculos nos ouçam.

– Lust vai ficar lá em baixo, ela quase não sai. Quanto ao Gluttony tenho certeza de que se for sair vai ser só para com...

– Envy – falei, lançando-lhe um olhar fulminante. – Não quero. Que ninguém. Ouça!

Sua expressão voltou a ser de mal humor.

– Você é prevenida demais... Siga-me.

Ele começou a andar pelo telhado, pulando para os outros. Nos afastamos bastante da entrada do esconderijo. No caminho, me distraí um pouco. Sentir o vento frio da noite em minha pele foi uma bênção depois de ficar fechada o dia todo naquele lugar. Distraí-me a ponto de não notar quando Envy parara e escorregar no telhado, batendo a cabeça.

– Outch! – gemi.

Envy bufou e começou a rir.

– Desastrada.

Esfreguei minha cabeça, sentada no telhado.

– Ok, chega de rir, você parece uma hiena. – murmurei, lançando-lhe um olhar.

Mesmo assim, ele riu mais um pouco e se sentou ao meu lado.

– E então, o que foi? Diga logo antes que eu perca a paciência. – perguntou-me por fim.

Eu suspirei e descansei as mãos no colo.

– Quero saber se ainda está de pé.

Ele ficou sério.

– O quê? O negócio de eu não contar para ninguém o que você deixou escapar ontem?

– Sim.

Ele revirou os olhos.

– Sim, ainda está de pé. Não vou contar para ninguém.

Assenti.

– Obrigada.

– Mas, – ele disse, postando um sorriso no rosto. Eu sabia, sempre tem um “mas”. – quero saber o restante da história.

Eu fiz uma expressão de desgosto.

– Agora?

Ele deu de ombros.

– A hora que der, não estou com pressa. Mas também sei com quem estou lidando. Eu vou te cobrar. E se me irritar demais, sou capaz de acabar soltando algo sem querer.

Eu bufei.

– Legal. Que ótimo. Se falar algo eu te mato, ok? Lust, Wrath e os outros vão fazer a mesma coisa que fizeram com Greed comigo caso descubram.

Ele deu um sorriso presunçoso.

– Foi algo tão ruim assim o que você fez?

– Não exatamente. – murmurei. – Mas o suficiente para qualquer homúnculo ficar bem surpreso.

– O suficiente para que eu queira te matar? – ele perguntou.

Eu fiquei quieta por alguns segundos. Não conhecia Envy há tempo suficiente para saber se ele próprio se encarregaria de minha morte sem nem precisar contatar os demais. Eu esperei que não. Se eu não fosse orgulhosa, provavelmente rezaria a Deus que o fizesse entender.

– Talvez. – respondi finalmente.

Ele franziu o cenho e sorriu.

– Bem, considere que eu não tenho dificuldades em querer matar alguém. E raramente não consigo. É bom se cuidar.

Assenti.

– Espero que você entenda e colabore. – murmurei. – Sei que não tem nada a ver com você e que vocês, homúnculos criados pelo Pai, talvez fiquem melhor sem mim. Mesmo assim, não quero ter que me arrepender de optar por ajudá-los.

Ele assentiu e se espreguiçou – notei que isso era um hábito – aproveitando o movimento para se deitar no telhado.

– Não vou falar nada, prometo. Só que ambos temos que colaborar, Mentira.

– Por mim está feito, Inveja.

Envy estendeu a mão para mim. Eu a observei por um tempo e então sorri, notando que ele fazia o mesmo. Apertei sua mão e nos olhamos por um tempo.

– Obrigada Envy.

Ele tirou sua mão do aperto.

– Por nada, Lie. – disse levantando-se. – Só não se acostume. Eu não costumo ser tão legal.

Eu ri, observando-o caminhar para a direção de onde viemos.

– Vamos voltar?

Assenti. Então, o segui.

Eu o segui pela terceira vez naquele dia.

 


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Notas finais do capítulo

Deixem reviews e façam uma escritora feliz, onegai!
Arigato gosaimasu ♥