Shimmer escrita por scarlite


Capítulo 20
Capítulo 20




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Sete de março.

08 horas e 45 minutos.

No lago, cinco crianças brincam na água levemente aquecida pelo sol.

Um homem no mercado descobre como é saborosa a mistura entre o café e os pães de queijo da quitanda.

Uma mulher deixa cair sua xícara quando o bebê em sua barriga chuta.

E no alto de uma árvore, uma garota descobre a mais bela de todas as vistas. Um corpo esguio e mãos ágeis escalam o enorme e desengonçado Cicómoro. As folhas em formato interessante lembram estrelas no céu.

Enquanto a escalada prossegue, pouco a pouco a paisagem vai se revelando, o gramado se transforma num tapete verde que se derrama como uma lata de tinta sobre o assoalho da terra. Ela inspira profundamente o cheiro do vento, imaginando se poderia haver no mundo lugar mais bonito e confortável de se estar.

Pensou que gostaria de carregar o cicómoro consigo para casa, imaginou-se arrastando a imensa árvore nas costas e riu.

Pensou como seria bom poder engarrafar todos os cheiros e os sons que ouvia e sentia ali, o sol se misturava com as nuvens no céu fazendo com os tons quentes e frios uma mistura fascinante. Era uma boa coisa que sua tia não a estivesse assistindo agora a metros do chão.

Dado seu histórico de realizações catastróficas, ela mesma olhou com vertigem para baixo cada vez mais distante, porém a sensação durou pouco quando passou uma perna por um galho grosso na ponta do qual um ninho de sabiás pendia. Os pequenos bichinhos com bicos muito abertos, grasnavam confundindo o farfalhar das folhas provocado por Bella com a aproximação da mãe.

A vida!

Era tão lindo o mundo para a garota. Os matizes que a natureza assumia, a beleza do equilíbrio entre os sons suaves e o clima... Tudo a remetia a sua música, e como um passe de mágica, muitas notas começavam a brotar emparelhadas na cabeça avoada.

Mais um impulso e estava finalmente no último galho acessível da árvore. “No topo do mundo”, pensou. Abriu os braços agarrando a emoção.

E riu.

Como se estivesse no momento mais feliz.

Ela tinha esses arroubos de felicidade clandestina; daqueles momentos em que a única coisa que apetece é gargalhar. Aquela pequena euforia no conforto de uma nova descoberta.

Esse seria dali pra frente seu lugar preferido no mundo todo.

- Olha só o que encontramos aqui. – mesmo na altura em que estava, seria impossível não ouvir os berros de Victoria.  Um rasgo no rosto em lugar de sorriso, era como se apresentava a prepotente garota.

Nos olhos do mundo, parecia claro o porquê daquele tom debochado, mas, para Isabella tudo parecia ilógico. Uma vida afagada com elogios excessivos.

Se não fosse tão esquiva das relações humanas, Bella poderia muito bem relacionar o caráter das pessoas com fórmulas químicas. Sim, numa mistura bem regada, qualquer excesso pode se converter numa miríade de desvios: Um egocêntrico, um megalomaníaco ou uma moça tão desesperada por ser notada como a ruiva bonita.

- Deixa a garota em paz Victoria. – Uma das companheiras de turma de Isabella interveio em solidariedade.

Foi numa manhã de quinta, quando todos estavam concentrados em suas próprias conversas. Um grupo de jovens em frente ao colégio e seus debates sobre quem seria o melhor ator de ação do momento.

Entre todos os rostos juvenis, havia um que cativava todas as atenções de Victória: James Moriatti. Os olhos pequenos e azuis, o sorriso malicioso... Todo o conjunto fazia-a suspirar. Era óbvio para quem quisesse ver, mesmo o próprio James, que ela via nele sua paixão de colegial.

Como em toda escola, existiam os famosos grupos.

Deste lado, os jogadores e os devassos liderados por John Sullivan.

No oposto, os estudiosos e esforçados, porém, populares, geralmente filhos de pessoas com posses.

E havia, claro, os intermediários – As garotas patricinhas, os neutros.

E Isabella Cullen.

Não se sabia ao certo entre eles o que se passava na cabeça da garota que fugira da escola com uma galinha da aula de biologia. Victoria poderia ignorá-la, como sempre fez, não fossem os olhares que James e seus amigos andavam direcionando para a menina estranha.

Não sabia se os olhos misteriosos e tristes, ou o jeito incomum... Victoria e todas as meninas tinham de admitir; Isabella estava ficando a cada dia, mais bonita. Logicamente, nenhuma das moças da pequena escola de Forks daria o braço a torcer. Porque um dos rapazes mais atraentes da escola olhava para ela?

Mesmo esses apetrechos estéticos, poderiam facilmente se fazer obscuros ante o comportamento incomum e os trejeitos absurdos.

Como falar sozinha.

Isabella andava de um lado a outro nos corredores murmurando palavras incompreensíveis. Mesmo os professores notavam a sua excentricidade, no entanto, em lugar de a olharem com temor ou estranheza o que se via em seus olhos era aquela admiração velada de quem contempla uma obra de arte enigmática.

Era de fato um enigma.

Era a garota “gênio”, a grande promessa da cidade. Não existiam padrões para a mente da menina. Era às vezes assustador dividir a sala de aula com ela.

Porque assustador? Tudo ligado ao evento com o quadro de avisos da sala 15. Mas, esse é um acontecimento que deixo para narrar depois...

- Não enche Kate. – Aproximou-se do tronco da velha árvore, olhando sobre as folhas a figura de Bella que ainda olhava a linha do horizonte sem se dar ao trabalho de prestar atenção na ruiva.

Uma veia saltou em demonstração da irritação.

- HEI! – Nenhuma resposta.

- HEI! – A voz aumentada seria impossível de ser ignorada. No entanto, ao que parecia, o era intencionalmente.

- O que vai fazer sua louca! – Kate agarrava o braço da amiga. – Agora vai jogar pedras na garota? O que diabos deu em você Victoria?

- Me larga sua idiota.

Num movimento brusco, a ruiva atirou a pedra o mais longe que pôde em direção ao topo da arvore. Acertou a perna de Isabella, só assim ela olhou para baixo vendo a figura emproada e aparentemente irritada de sua colega.

- Olá.

- Treinando para ser macaco de circo?

- Não sei se isso seria possível. – A inocência na voz de Bella pareceu corroer a paciência de Victoria.

- Não seja imbecil. Não ia precisar de treino algum, basta ser a louca que normalmente é.

Isabella arregalou os olhos, em desaprovação as palavras da moça. Mesmo sendo costumeiramente destratada, havia algum tempo desde que ouvira seu nome associado ao termo loucura.  Podia-se dizer que atravessava uma calmaria no ambiente escolar.

No tocante as provocações, estava quase esquecida. Não a prendiam mais no banheiro ou tentavam afogá-la na piscina pelo menos.

Isso a deixava feliz.

O que era agressividade, agora se tornara sistemático insulto. Dia após dia, garotas com quem nunca trocara uma palavra, vinham-lhe com deboches e sabotagens.

Andava com parte do cabelo escondida atrás da orelha desde que lhe grudaram chiclete no intervalo, por sorte ninguém reparara na grande faixa que lhe faltava no lado esquerdo. Por defesa própria, preferia se refugiar na mesa mais afastada. Sempre só.

A parte esses pequenos inconvenientes, nada de tão grave. Estranhava até, a forma como os rapazes pareciam mais simpáticos nos últimos tempos. Surpreendera-se deveras, quando Mike Newton lhe apareceu com um doce certa manhã. O garoto demonstrou desapontamento ao lhe recusar a oferta. Não gostava de comer doces pelas voltas do almoço.

Mesmo adulta ainda seguia a risca as antigas indicações de sua tia.

Não atinava no que causava a mudança no tratamento dos rapazes consigo. Imaginava que poderiam ter percebido a tolice de lhe perturbar, ou apenas temessem seu primo. Mesmo John demonstrava-se menos propenso a provocá-la.

Mas, aquela realidade não se aplicava as meninas da turma de Victoria. Ainda via certa naturalidade em Kate, uma loira alta e bem servida fisicamente.

Decidiu por ignorar as provocações da ruiva. Permanecendo onde estava, apenas engoliu a mágoa e procurou pelos pensamentos que carregava antes da interrupção.

- Hei sua louca. Estou falando com você!

Bella sentiu o frio se aproximando, eram agora quase cinco da tarde e os grupos começavam a se organizar para retornarem a casa. Começou a se por em descida na árvore ignorando os insultos contínuos de Victoria. Até conseguiu cantarolar uma de suas músicas, até que alcançou o chão num pulo.

Um punhado de terra úmida lhe cobriu as mãos, ela sacudiu espalhando gotas de lama por todo lado, inclusive sujando a calca cor de rosa de Victoria.

Girando nos calcanhares, e ainda em silencio calmo, Bella se voltou para onde os outros alunos e professor estava. Não completou o seu caminho, já que Victória agarrara-lhe os cabelos com força, fazendo-a parar bruscamente com a dor dos fios sendo puxados.

- Quando eu falar, você tem que parar e ouvir sua lunática. Tenho um aviso pra você.

Kate tentara acudir a pobre garota, porém, foi parada por Jen e Jessica, outras companheiras de Victoria.

- Deixa a garota em paz Victoria, não vale a pena ser dispensada por isso...

- Fale por você Kate – Jéssica prontamente revidou.

- Me solta Victoria. – depois de emitir um grunhido de dor, Bella assumira uma postura estranha para ela. O que surpreendeu as garotas acostumadas a vê-la se esgueirando e correndo das agressões. Parecia fria e estranhamente controlada.

- Não se aproxime de James ouviu!

- Ai. – Os olhos castanhos estavam cheios de lágrimas pela dor do puxão de o seu algoz lhe proporcionara.

- Sua maluca, você tem que se conformar como a aberração que é. Uma pena seus irmãozinhos não perceberem o estorvo que você é.

As garotas riam a pulmão cheio da tortura praticada.

- Aberração! Você devia ser trancada num sanatório...

Os risos aumentavam, o que causava verdadeiro frenesi em Victoria. Agarrou o queixo de uma Isabella raivosa e apertou-lhe sem dó, fazendo uma careta de dor surgir do delicado rosto agora pálido.

- PARA! – Bella gritou se desvencilhando da ruiva prepotente, olhou com uma raiva incontida para a garota a sua frente, estava cansada de ser perturbada. Avançou para sua oponente, mas, instantaneamente parou. Sem razão ou motivo, apenas pareceu lembrar de algo que a perturbou, deixando-se estática.

- Se você acha que algum garoto em sã consciência vai gostar de você, pode ir esquecendo. No mínimo eles querem te comer e te largar.

- PARA. – Os sons, o burburinho do grupo estava causando um zumbido doloroso nos ouvidos de Isabella, ela tapou-os buscando alivio para a dor de cabeça que atacava em pontadas estridentes.

- Pensa que não vi você se exibindo para o Mike, ele é meu, sua aberração. – Um punhado de lama foi chutado manchando a blusa branca que a garota usava.

- PÁRA, pára, pára... – Bella continuou repetindo enquanto cobria os ouvidos.

- Ela é louca! - narizes franzidos e olhares de aborrecimento.

Enquanto a respiração pesada continuava misturada a voz embargada, as garotas foram ficando assustadas.

- E se ela tiver um troço, vamos sair daqui. – Uma puxou a outro sem olhar para trás. A primeira a correr foi Jéssica Stanley, levando consigo a Jen.

Kate hesitava entre ficar a ajudar a garota Cullen, ou afastar-se para longe da confusão orquestrada por sua amiga. Por fim o lado nobre foi vencido e ela também se afastou deixando uma Bella perturbada para trás.

Minutos passaram e ela permanecia ali, com os olhos fixos no chão e a respiração ofegante.

Levantou-se apenas para encostar-se no tronco do Cicómoro. Abraçou o próprio corpo e se pôs a cantarolar uma musica antiga ensinada por Esme. A cada balançar do corpo, um pouco mais perdido seu olhar se fazia.

Por mais forte que seja uma alma; por mais rica que ela seja, chega um momento  em que ela começa a se desprender. Não comunicaria para os professores ou direção. Seria inútil como sempre fora, deixar claro para os seus colegas que não podia se defender sozinha.

Que ninguém tivesse visto e estava bom.

A última coisa que desejava era provocar mais incômodos para a família.  

Está tudo bem, tudo bem... Pensou em meio ao turbilhão de pensamentos e impulsos desconhecidos, tinha raiva. Pensava coisas terríveis a fazer como vingança para Victoria. E ficou apavorada com a realização de odiava a garota e a queria...

Parou por completo todos os movimentos, mesmo a respiração. Pensou em Edward. Sempre tão compassivo... E seu peito se encheu de carinho. Era o antídoto para estes momentos de ira. Bastava por enquanto.

Duas grandes mãos.

Uma voz grave e desajeitada e por fim, dois olhos muito azuis.

- Er... Você está bem?

De todas as pessoas, ele era o último que Bella queria ver agora. Encolheu-se e procurou se por de pé para correr dele. Não esquecera por completo o que aconteceu na praia. E lá estava o garoto que havia batido em Edward.  


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