Através dos Seus Olhos escrita por ReLane_Cullen


Capítulo 33
Querido Amigo


Notas iniciais do capítulo

N/A: Como disseram que quando eu começo a nota com Vocês vão querer me matar, vocês geralmente ficam com vontade de me matar; então deixo vocês decidirem daqui pra frente. Fico caladinha agora hauahauahuaa Olha, está um sacrifício para sair um capítulo que vocês não imaginam! Um conselho de amiga: Nunca sejam professores ahuahaua Sobre a cirurgia do Edward: Meninas, eu confesso que durante toda a fic eu estive em dúvida se a cirurgia daria certo ou não; eu tive muitos prós e contras para balancear e o resultado foi esse que vocês viram. Que bom que vocês gostaram. Agora vou deixar vocês em paz para lerem o capítulo :) Beijos e até o próximo!



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Capítulo 33- Querido Amigo

[BPOV]

Duas semanas depois e as palavras da minha mãe ainda ecoavam em minha mente, instigando-me a repensar as minhas ações. Eu realmente tinha a tendência de ser insegura e também não tinha a melhor autoestima do mundo.

Minha mãe estava certa e disso eu não duvidava. Eu precisava aprender a me ver da maneira que os outros me viam, mas não era uma tarefa muito fácil. Durante toda a minha vida foram os meus defeitos - que hoje me atrapalham- que me serviram de proteção. Quando se admite que não é capaz, que não existe razão para tentar, consequentemente não há chances de se decepcionar ou se magoar. Podia não ser a melhor maneira de se viver, mas era a mais segura.

Olhei a tela do meu celular. Não havia nenhuma ligação da Rose e nem do Edward. A falta de ligações dele me deixava feliz por um lado, afinal isso significava que ele havia seguido o meu conselho. Por outro lado, eu ficava triste pelo mesmo motivo.

E se não bastasse tudo o que eu estava enfrentando no momento, ainda tinha que lidar com o sumiço do Jasper. Rose prometera ligar assim que tivesse notícias e eu passava os dias grudada ao meu celular. Mas essa parecia ser a ligação mais demorada do universo. Eu não conseguia acreditar que Jasper havia sido capaz de tamanha idiotice. De alguma forma eu sabia que o acontecimento naquele beco havia sido o gatilho daquela fuga, mas continuava achando tudo aquilo uma grande estupidez. Tudo bem que ele estivesse sofrendo, mas tudo na vida tinha limite.

A campainha tocou, desviando os meus pensamentos. Eu não tinha a menor vontade de atender. Devia ser Jacob ou Leah com seus olhares inquisidores, querendo saber o que estava acontecendo comigo. Eu estava fazendo um excelente trabalho evitando-os nos últimos dias, mas eu tinha consciência de que uma hora eu não conseguiria fugir. Quando a campainha tocou pela segunda vez eu te que me levantar, caso contrário minha mãe acabaria levantando. Nem me preocupei em olhar no olho mágico e abri a porta, congelando em seguida.

"Oi." Jasper cumprimentou, sem-graça.

"Jazz!" Exclamei, abraçando-o. O alívio que eu sentia em vê-lo ali, parado à minha porta, era indescritível. Após tantas noites imaginado onde ele estaria e como estaria, eu podia sentir meu corpo relaxando enquanto o envolvia em meus braços. Era como se uma parte da minha culpa tivesse se esvaído.  Eu podia sentir meu coração bem mais leve, ao mesmo tempo que uma súbita raiva tomou conta de mim. Como ele tinha sido capaz de fazer uma coisa dessas comigo? Como ele era capaz de torturar não só a mim, como toda sua família e depois aparecer do nada na minha casa? Assim que ele se desvencilhou do abraço, tratei de demonstrar minha raiva com um tapa que acabou acertando o braço dele.

"Ai! Isso doeu." Ele reclamou brincando, massageando o local fingindo sentir dor. "Mas acho que merecia depois de ter te beijado."

"O tapa foi por você ter fugido. Isso foi por você ter me beijado."  Disse antes de chutá-lo na canela.

"Você ficou forte de repente." Ele comentou sarcástico e um silêncio se instalou. Não era como em Chicago, onde conseguíamos ficar confortáveis com o silêncio. Esse silêncio era pesado. Apenas um prelúdio de tudo o que viria dali em diante.

"Precisamos conversar." Avisei, mesmo sabendo que ele estava mais do que ciente disso.

"Eu já estava esperando por essa famosa frase." E embora a brincadeira estivesse evidente em sua voz, de nenhuma forma ele estava sendo debochado.

"Eu só vou avisar a minha mãe e é melhor que você venha cumprimentá-la." Disse e ele entrou, depositando a mala no chão. "Mãe!" Chamei-a, antes de abrir a porta do quarto.

"Oi. Quem era à porta?" Ela perguntou. Ela estava recostada à cama, lendo um livro. Sua aparência estava ótima.

"Você não vai acreditar! Era o Jasper!" Disse no tom mais animado que eu pude fingir.

"Olá, Sra Dwyer." Ele entrou no quarto, portando seu sorriso mais encantador

"Olá. É sempre bom vê-lo. Como vai seu irmão?" Minha mãe perguntou. Jasper me olhou brevemente, com a testa enrugada.

"Muito bem." Ele respondeu, meio incerto.

"Mãe, eu vou até a cafeteria com o Jazz. Você precisa de alguma coisa?"

"Não." Ela sorriu.

"Eu não demoro." Garanti, ao mesmo tempo em que saía do quarto.

"Como ela está?" Ele perguntou quando estávamos na rua.

"Bem, na medida do possível. O incrível é que ela está me obedecendo." Sorri fracamente.

"Ela não sabe que eu fugi."  Ele apontou o óbvio.

"Minha mãe está enfrentando uma gravidez de risco e eu achei melhor não estressá-la à toa." Encolhi os ombros.

Paramos na pequena cafeteria a cerca de duas quadras da minha casa. O lugar não era nenhuma Starbucks, mas teria de servir.

"Um Cappuccino e um Machiato." Jasper pediu a garçonete que veio nos atender.

"Então?" Perguntei, encarando-o.

"Eu não sei por onde começar."

"Que tal começar sobre a sua fuga?" Sugeri. "Por que você fugiu?"

"Eu já estava querendo sumir a um bom tempo. O que aconteceu naquele beco foi todo o incentivo que eu precisava." Ele confessou.

"E por que você veio justamente para cá?" Perguntei.

"Eu fiquei muito mal pelo o que aconteceu. Você é a minha melhor amiga e eu agi como um verdadeiro idiota. Eu precisava vir aqui para saber se você poderia me perdoar. Eu sei que o que eu fiz foi uma verdadeira estupidez, eu não deveria ter descontado em você toda a raiva que eu sentia do mundo. Eu precisava ver você para saber se você poderia ao menos considerar me perdoar por toda essa besteira."

"É claro que sim, Jazz. E você não precisava viajar até aqui para saber disso." Sorri sincera ao ouvir aquele desabafo. "Mas estou feliz que você esteja aqui."

"Eu também Acho que uma mudança de ares é tudo o que eu preciso para colocar a cabeça no lugar."

"Onde você esteve nessas duas semanas?"

"Conhecendo o pior lado de Chicago." Jasper revelou, com um olhar distante.      "Vendo aquelas pessoas, sem nenhum futuro, eu percebi que não queria o mesmo para mim. Acho que precisei chegar ao fundo do poço para entender isso."

"E por fundo do poço, você quer dizer..." Eu não consegui dizer as palavras. Até porque na minha mente eu não conseguia imaginá-lo sendo capaz de uma coisa daquelas.

"Exatamente o que você está pensando." Ele confirmou minhas suspeitas.

"Jazz..."

"Está tudo bem agora. Não se preocupe." Ele sorriu para me garantir, mas eu não acreditei.

"Como foi?"

"No início foi bom, eu não vou mentir. Você se sente nas nuvens e todo e qualquer problema desaparece da sua mente. Mas quando o efeito da droga passa, tudo o que sobra é um vazio terrível." A tristeza que eu via, enquanto ele relatava a história era de partir o coração. Pensei em perguntar que tipo de droga ele havia consumido, mas decidi que eu não queria realmente saber. Eu tinha uma mente muito imaginativa, e saber mais detalhes só serviria pra fornecer material para minha imaginação sobre o que teria acontecido com ele em Chicago.

"Você sabe que vou ter que avisar que você está aqui. Todos devem estar morrendo de preocupação."

"Devem?" Ele franziu o cenho, surpreso pela minha escolha de palavras.

"Eu não estou ligando muito para sua casa." Admiti.

"O que você quer dizer com isso?"

"Eu não quero falar sobre os meus problemas agora." Eu tinha certeza que ouviria um sermão dele no momento em que contasse minha decisão de fixar residência em Phoenix. E sinceramente, eu não estava com a menor vontade de ouvir qualquer crítica naquele momento.

"Okay." Ele assentiu, mas eu sabia que ele só estava esperando a próxima oportunidade para trazer o assunto à tona. "Quando você vai avisá-los?"

"Assim que chegarmos em casa eu vou ligar para a Rose." Avisei. Não era justo prolongar o sofrimento de Esme e Carlisle, além de todos os outros, apenas para encobrir a fuga dele.

"Só avise a eles que não é para ninguém aparecer aqui. Quando estiver pronto, eu volto por conta própria." O pedido dele soou mais que uma ordem e eu tinha a ligeira impressão que se alguém aparecesse aqui, ele sumiria de novo.

"Onde você pretende ficar?"

"Eu descobri um albergue perto do aeroporto."

"Você pode ficar lá em casa se quiser." Ofereci.

"Não. Sua mãe não está bem e eu não quero dar trabalho." Ele disse de forma categórica.

"Não seria trabalho algum e você seria uma ótima companhia." Insisti.

"Tem certeza?"

"Absoluta. Agora vamos." Eu estava pronta para pegar o dinheiro no meu bolso quando ele depositou o dele sobre a mesa.

"Nada disso. A conta é minha." Ele sorriu.

"Sim senhor." Aceitei a gentileza, outra hora eu debateria sobre a igualdade feminina.

"Sua mãe sabe sobre mim e Alice?" Jasper perguntou, enquanto andávamos de volta para casa.

"Não. Ela não sabe de nada do que aconteceu nas últimas semanas. Não tem porquê ela saber de uma coisa que não a está afetando." Se eu conhecesse bem minha mãe, ela ficaria arrasada pelo o que tinha acontecido com eles. Se adicionasse o fator James à equação, eu tinha certeza que traria danos à saúde dela.

"Mas está afetando você." Ele apontou. Jasper sempre tivera o dom de enxergar além da máscara de garota feliz que eu usava, mas aquele ainda não era o momento de abrir a caixa de Pandora.

"Eu sei cuidar dos meus problemas." Esquivei-me.

Assim que chegamos em casa, fui direto ao quarto da minha mãe. Como ela estava dormindo tranquilamente, decidi que aquela seria a melhor hora para ligar para a casa dos Cullens. Seria a coisa mais sensata e certa a se fazer, mas eu não admitia correr o risco de ouvir a voz do Edward. Se ele atendesse o telefone, eu iria sucumbir no instante em que ele dissesse 'alô'. Eu não tinha qualquer dúvida quando a isso. A minha opção mais segura seria Rose. Embora a loira tivesse fama de ser direta com as palavras, eu sabia muito bem o quanto ela podia ignorar certas questões quando era necessário.

"Alô?" Rose atendeu após o terceiro toque.

"Rose, sou eu." Tentei soar casual, mas tinha certeza que minha voz falhou um instante.

"Bella, como você está?"

"Bem, e você?" Devolvi o cumprimento.

"Também." Por um momento houve apenas um silêncio do outro lado da linha.   "Jasper está aí não está?"

"Como você sabe?" Perguntei, chocada com a rapidez com que ela havia deduzido corretamente o motivo da ligação.

"Edward levantou essa possibilidade e pelo visto ele está certo." Rose respondeu.

"O Jasper não quer que ninguém venha atrás dele. Ele disse que quando ele se sentir preparado ele vai por conta própria." Avisei. Pela minha visão periférica pude ver Jasper assentindo.

"Ele está bem?" Ela perguntou num tom de voz brando.

"Está." Aquilo não era uma inteira mentira. Ele estava bem no momento, mas me sentia mal em ter que esconder de Rose certos detalhes.

"Eu posso falar com ele?" Ela perguntou. Fiz um sinal para Jasper indicando que ela queria falar com ele, mas ele balançou a cabeça negativamente.

"Não, ele não quer conversar." Respondi.

"Ok. Eu vou avisar a todo mundo." Rose tentou parecer animada, mas o efeito da rejeição estava presente em sua voz.

"Obrigada, Rose." Disse antes de desligar o telefone.

Os dias que se seguiram foram bem agradáveis. Jasper e eu já estávamos familiarizados com a rotina um do outro, o que tornou a convivência bastante fácil. Ambos sabíamos que tínhamos assuntos pendentes para conversar, mas o acordo tácito de adiar tal conversa o máximo possível estava funcionando divinamente. No fim de semana, o time de Phil jogou na cidade e todos foram prestigiar, inclusive minha mãe, que alegou que seu maravilhoso comportamento merecia uma recompensa.

Eu senti o olhar de Jacob me fuzilando durante todo o jogo. Jacob sempre fora uma pessoa muito direta e com certeza esse meu joguinho de esconde-esconde só estava piorando as coisas. Jacob nunca soube respeitar o meu espaço e por isso eu precisava impor limites; mesmo um tão absurdo quanto esse.

***

"Você acha que eu deveria arrumar um emprego?" Jasper perguntou enquanto lavávamos a louça do jantar.

"Eu não sei. Por quanto tempo você pretende ficar aqui?"

"Quando você vai voltar para Chicago?" Ele perguntou. Se ambos tivéssemos disposição, aquela cadeia de perguntas poderia ter ido bem mais longe.

"Não sei." Admiti.

"Você não sabe quando ou se vai voltar?"

"Tem alguma diferença?" Arquei minha sobrancelha.

"O que foi que aconteceu enquanto eu estava bancando o idiota?"

"Você não vai me deixar escapar dessa conversa." Apontei o óbvio. O momento havia chegado e agora não tinha mais como escapar.

"Não vai me dizer que vocês brigaram por causa do beijo."

"Não foi nada disso." Resolvi omitir que eu desconhecia a reação do Edward ao que havia acontecido.

"Então o que foi?" Ele insistiu.

"Eu decidi que era melhor me afastar e deixar o caminho livre para Tanya." Encolhi os ombros.

"Tanya? Aquela que virou as costas pra ele quando ele mais precisava?" Ele cruzou os braços. A indignação e o sarcasmo dele não passaram despercebidos.

"Ela ainda o ama e sinceramente eu não tenho a menor chance de competir."

"Você acha mesmo que existe alguma competição?" Ele perguntou surpreso.

"Precisa ser tão direto assim?" Por mais que tentasse, não consegui disfarçar o estrago que aquela declaração fez no meu ego.

"Você não entendeu. Ela não teria como competir com você."

"Até parece." Revirei os olhos. Eu sabia que Jasper só dizia aquilo para me animar.

" Tanya é bonita, mas a beleza dela não conquista, apenas atrai. É uma beleza vazia. Diferente da sua. A sua beleza cativa, o seu sorriso mais ainda. Talvez seja essa sua despretensão, essa falta de percepção da sua beleza que a deixa ainda mais bonita." Eu podia sentir meu rosto queimando à medida em que Jasper derramava seus elogios para mim. Acho que eu nunca tinha ouvido alguém falar algo assim ao meu respeito. Sem dúvida, a firmeza que Jasper dizia as suas palavras, me fazia duvidar dos meus próprios conceitos. "Você não se preocupa com coisas fúteis..."

"Igual a Alice." Concluí a frase. Eu sabia que Alice era tudo menos fútil. Em minha memória eu ainda conseguia ver a Alice que me pediu para ajudar Edward e que me pediu para não desistir; ainda vejo a Alice que bolou um plano mirabolante quando Emmett e Rosalie brigaram, apenas para que eles se acertassem. Eu sentia falta dessa Alice. Pena que esse lado dela desapareceu no mesmo instante que James reapareceu.

"É." Ele concordou triste. "Você falou com ela?"

"Já tem um tempo. A conversa não foi assim muito agradável." Achei melhor omitir as acusações dela sobre um possível relacionamento entre ele e eu.

"Ela está totalmente cega." Ele observou.

"E a culpa é toda minha." Lamentei.

"Como?" Ele arqueou uma sobrancelha, confuso.

"Eu desconfiava do James desde que ele reapareceu e não disse nada pra nenhum vocês, tentando protegê-los."

"Você pode ter errado, mas a culpa não é sua."

"Claro que é!" Reafirmei, teimosa. Ninguém no mundo me faria mudar de ideia sobre aquele assunto.

"Você não tem culpa pela cegueira da Alice nem pela minha estupidez. Eu deveria ter aguentado, ter ficado e lutado; mas eu sou fraco demais para isso.  Eu e Alice somos os únicos culpados pelo o que aconteceu." Uma vozinha dentro de mim dizia para acreditar no que ele dizia.

“Talvez haja conserto.” Tentei soar positiva.

“Não tem mais volta. Eu não consigo mais.” Jasper suspirou.

“Ela ainda te ama.” Mesmo que ela nunca tivesse dito, eu sabia que aquilo era verdade.

“Mas não o suficiente para confiar em mim.” Por um momento Jasper ficou quieto, como se estivesse pensando. “É por isso que você não vai voltar. Você se acha culpada pelo o que aconteceu.” Ele concluiu.

“Se não fosse por mim…”

“O resultado seria o mesmo. James sempre foi um problema." Ele me interrompeu, decidido a acabar com a conversa. "Agora podemos mudar de assunto?”

[EPOV]

O grande momento havia chegado e eu não conseguia distinguir quais eram meus sentimentos. Eu estava animado em finalmente poder voltar a escola, ao mesmo tempo eu estava apavorado. Nos últimos anos eu havia construído um muro envolta de mim, que ninguém ousou tentar ultrapassar. Eu era quase que intocável. Bella havia sido a minha ponte para o mundo nos últimos meses, mas agora que ela não estava aqui e nem a doença, eu não sabia como agir. Pior, eu não sabia como as pessoas iriam reagir.

"Você tem certeza que quer ir à escola?" Minha mãe perguntou. Ela parecia estar tão apreensiva quanto eu.

"Tenho." Respondi sem pestanejar. Eu não estava muito certo, mas se minha dúvida transparecesse, minha mãe me deixaria confinado naquele quarto por mais um dia.

"Ligue para o Emmett se precisar de alguma coisa." Ela avisou, enquanto eu pegava a minha mochila.

"Pode deixar."

"Pronto?" Emmett perguntou assim que eu entrei na sala.

"Acho que sim."

Os olhares. Acho que aquilo foi o que mais me incomodou durante todo a aula. Ninguém ousou falar comigo, as pessoas pareciam não saber o que falar e eu agradeci a distância, pois eu também não saberia o que responder. No entanto, os olhares não mudavam de direção. Eu era a atração da classe, quase que uma aberração que todos queriam ver. Acho que eles passaram tanto tempo acostumados com a minha cegueira, que nem tentavam disfarçar os olhares e os cochichos.

O sinal do almoço finalmente tocou, mas isso não me fez mais feliz. Por que eu sabia que tudo o que passei na sala seria triplicado no momento em que pusesse os pés no corredor. Só pensar que aqueles olhares me acompanhariam durante todo o almoço me deixou com vontade de descartar a refeição. Refugiar-me na minha antiga sala de música era o melhor a ser feito.

Entrei na sala, e de alguma forma ela estava do mesmo jeito desde da última vez que eu a tinha visto. O piano ao centro, os outros instrumentos agrupados em um canto, algumas cadeiras em outro... Tudo estava igual, mas o sentimento de vazio persistia. O principal estava faltando ali.

"Oi." Uma voz familiar, despertou-me dos pensamentos.

"Oi." Virei-me para vê-la. Fitei-a por um bom momento. Alice não havia mudado em nada, a não ser pelo corte de cabelo. Tive vontade de fazer alguma brincadeira sobre sua altura, mas aquele não era o momento e nem sabia se a nossa "amizade" atual permitia tal liberdade.

"Eu só queria dizer que estou feliz que a cirurgia tenha dado certo." O sorriso dela era genuíno, mas não chegava aos olhos. Se os tempos fossem outros, Alice já haveria pulado em cima de mim, me abraçando e falando de tudo o que faríamos agora que eu podia enxergar novamente. Mas ao invés disso, existia entre nós uma distância, que parecia de uns cinco quilômetros, que nenhum dos dois estava disposto a vencer.

"Obrigado." Sorri de volta.

"Eu pensei que Bella estaria com você." Ela comentou casualmente. Ela não sabia o quanto tinha sido infeliz pronunciar aquelas palavras.

"Graças a você e ao James eu nunca mais devo vê-la." Tentei pronunciar as palavras com indiferença, mas senti minha vós quebrando na última palavra.

"O quê?" Ela franziu o cenho.

"Ah, e não posso esquecer  que também é culpa de vocês que meu irmão tenha fugido de casa." Eu não sabia se estava sendo injusto ou se a estava magoando, mas aquelas palavras precisavam serem ditas.

"Jasper fugiu?" Ela perguntou, a cor fugindo do seu rosto.

"Ele está com a Bella agora." Disse após alguns segundos. Ela precisava sofrer, mesmo que por um minuto, o que sofremos por dias.

"É claro." Ela bufou.

"Você realmente acha que tem alguma coisa entre eles?"

"Só um cego não vê." No instante que ela disse as palavras, seu rosto se contorceu numa careta. "Desculpa, eu não quis ofender..."

"Não ofendeu, afinal a cega aqui está sendo você." Devolvi, acidamente.

"Então me explica por que ele atravessou o país atrás dela?" Alice cruzou os braços e me encarou.

"Talvez eu fizesse o mesmo se a pessoa que disse que me amava não acreditasse em mim." Disse, olhando-a nos olhos.

"Eu não quero ter essa conversar com você. Não vamos estragar o que ainda restou da nossa amizade."

"Eu posso te pedir uma coisa em troca? Em nome dessa amizade?" Perguntei quando ela já estava de saída. "Fique esperta e não confie tão cegamente no James, ou o estrago pode ser bem maior do que o que já está feito."

"Tchau, Edward." Ela se despediu.

"Tchau."

Depois do almoço desisti de me preocupar com os olhares e tentei me concentrar na aula. Mas sem os olhares para me perturbar, minha mente viajava para um lugar aonde eu não estava preparado para ir. Na minha mente, aquela carta não havia sido um adeus definitivo, mas um 'E se?' em letras garrafais que pairava em minha mente.

O som do último sinal tocou, indicando o fim daquele verdadeiro suplício. Fui o mais rápido que pude até meu armário, evitando todas as pessoas, mas pelo visto seria impossível evitar uma.

"Edward." Tanya sorriu. A adolescência havia transformado seu corpo de uma maneira bem agradável. Tanya sempre fora bonita, mas agora sua beleza era ainda maior.

"Tanya." Devolvi o sorriso, embora mais comedido.

"Estou tão feliz!" Ela exclamou e de repente me abraçou.

"Obrigado." Disse, sem jeito.

"Desculpa, é que eu realmente estou feliz que tudo tenha dado certo." Ela se desculpou ao desvencilhar do abraço.

"Tudo bem."

"Até mais." Ela se despediu.

"Até."

Durante todo o caminho para a casa, as palavras de Bella ainda ecoavam na minha mente. Pelo visto ela tinha razão, Tanya ainda devia ser apaixonada por mim, caso contrário ela não ficaria junto ao meu armário me esperando. Decidi empurrar aqueles pensamentos para um canto e analisá-los depois. Tudo o que eu precisava era do meu quarto e de um tempo sem pessoas me encarando.

Ao chegar em casa, joguei minha mochila em cima da cama e peguei meu violão, mas um embrulho que estava atrás dele chamou minha atenção. Tinha uma forma retangular e era ligeiramente menor que o meu violão.

"O que é isso?" Perguntei ao ver a singela nota que acompanhava o embrulho. De: Jasper, Para: Edward. Era tudo o que a nota dizia. Mais do que depressa rasguei o papel e tive que segurar a respiração ao ver a pintura mais linda que já havia sido pintada. Não pelo o talento do meu irmão, mas sim pela modelo. Não havia qualquer nome ou indicação do nome da modelo, mas eu sabia que era ela.

Os acontecimentos daquela tarde logo vieram a minha mente...

Decidi sair do meu quarto, na esperança de encontrar alguma coisa que me distraísse daqueles pensamentos.

Infelizmente, não consegui o que queria. Assim que desci o primeiro lance de escadas, eu ouvi a voz dela.

Ela ainda estava aqui?

"Sério Jasper, quanto tempo mais eu vou ter que segurar esse violão?" Bella reclamava. Ela parecia estar extremamente irritada com algo.

"A pintura é uma arte que exige precisão." Jasper disse. Eu precisava sair dali. Afinal, o que eu diria se alguém aparecesse? Que eu estava escutando atrás da porta sem querer?

Eu tinha que sair, mas a minha curiosidade falava mais alto. Eu precisava saber o que estava acontecendo ali.

"Quanto tempo mais?" Ela insistiu na pergunta.

"Alguns dias." Meu irmão respondeu de maneira displicente.

"O quê?" Bella praticamente gritou dentro do quarto.

"Você acha que a Monalisa ficava apressando o Da Vinci? Você acha que o teto da Capela Sistina..." Jasper bem que tentou usar seus argumentos, mas Bella não o deixou.

"Eu não quero ouvir suas aulas sobre os grandes pintores." Bella disse cortante.

"Então cala a boca e me deixa continuar pintando." Ele devolveu no mesmo tom.

"Por que você não tira uma foto e a usa como modelo?" Ela perguntou. Estava claro para mim que Bella não queria estar ali, servindo de modelo para o Jasper. O que não estava claro para mim era a alegria que senti assim que constatei isso.

"Uma fotografia não é muito precisa. Eu poderia perder alguns dos seus traços." Ele explicou. Como não ouvi mais nenhum protesto por parte dela, concluí que ele a havia convencido.

Passaram-se poucos minutos até que a voz de Jasper fosse ouvida outra vez.

"Bella, não se mexa!" Jasper ralhou com ela.

"Mas minha mandíbula tá doendo!" Ela protestou, "Por que eu não posso ficar séria? Daria um efeito bem legal."

"Eu acho seu sorriso bonito." Jasper a elogiou, e eu senti uma súbita raiva invadindo meu ser, "Assim como o restante do seu rosto."

"Sei..." Bella parecia não acreditar muito nele.

Olhando para aquela pintura eu tive que discordar de Jasper. Bella não era bonita, era linda. Na verdade, linda ainda parecia um adjetivo muito pobre para descrevê-la. Fiquei por um tempo admirando aquela pintura, até que finalmente entendi a razão dela estar ali. Aquele era o pedido de desculpas do Jasper por tê-la beijado.

Isso queria dizer que haveria a possibilidade dele voltar para casa.


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