Sete Vidas escrita por SWD


Capítulo 132
sete vidas epílogo vida 5 capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

ANTES:
A feiticeira Medeia manteve vivo por milênios o coração de seu ex-marido Jasão, o antigo comandante da nave Argo.
Dean Winchester, ocupando o corpo de um menino ghoul, devorou o coração do príncipe tessálio, ganhando sua aparência e aspectos da sua personalidade.
Dean Winchester é enganado pelo Trickster e, ao tocar o amuleto, é transportado para outra realidade.
A consciência de Jasão assume a posse do corpo do ghoul e ele tem acesso às memórias de Dean Winchester.
O Trickster entrega a Jasão-ghoul o texto do feitiço capaz de transformá-lo em humano.
Jasão, agora humano, doa sangue e salva a vida de Samuel Winchester.
Jasão se apresenta a Adam Winchester como seu ascentral.
AGORA:



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Amanhecia e Jasão permanecia imóvel olhando para as águas escuras do Pacífico da extremidade do píer de Venice Beach. Chegara na véspera, quando o sol estava se pondo; e ali permanecera a noite inteira, simplesmente olhando na direção do horizonte.

Era um velho costume em momentos de luto. Olhar o mar com a mente vazia, sem questionamentos. Era a sua forma de afastar a angústia. Era um guerreiro, um comandante, e perdera muitos companheiros em batalha. Perdera todos os filhos. Estava acostumado com perdas. Mas estar acostumado não significa não sentir a perda. Adam Winchester era seu descendente e, no momento, era o mais perto que tinha de uma família.

Deixara Samuel sozinho sofrendo sua perda. Samuel e Adam viviam uma relação de dependência mútua. Algo que Jasão conhecia muito bem. Afinal, entre seus liderados na nave Argo estavam os espartanos Κάστωρ e Πολυδεύκης, conhecidos como Dioskouroi ou filhos de Zeus. Irmãos tão ligados que o sofrimento de Πολυδεύκης após a morte de Κάστωρ fez com que Zeus os reunisse no Céu como brilhantes estrelas gêmeas.

Ainda não estava muito familiarizado com o medíocre céu noturno visto das iluminadas cidades americanas e aquela não era a época certa do ano. Mas sabia, das memórias de Dean, que o amor fraterno dos Gêmeos tornara-se lendário e que a história deles era conhecida por toda humanidade. Sua constelação, Gemini, era uma das doze mais populares, mesmo numa época em que quase ninguém olhava para o Céu.

Estava perdido nas lembranças do seu eu passado quando escutou o que pareceu um riso. Quase que imediatamente se vê envolvido por um pequeno tornado que o tira do solo e o mantém suspenso no ar a três metros de altura.

– Respeito, garoto. Muito tempo se passou mas ainda sou seu comandante.

– E como chegou aqui, meu comandante, tão longe no espaço e no tempo? Como escapou do destino comum a todos os mortais?

– É uma longa história, mas prefiro contá-la com os pés firmes no solo.

Jasão vai sendo baixado lentamente a medida que o vento diminui de intensidade, ao mesmo tempo em que se condensa numa forma que, mesmo que feita de ar, se parece em tudo com um corpo humano.

– Estou feliz de revê-lo, ΖΗΤΗΣ. Escutei falar que Hρακλῆς havia matado você e seu irmão Κάλαϊς.

– Estamos na América, século XXI. Os poucos que curtem as histórias dos antigos nos conhecem como Calaïs e Zetes, os Boréades. Os valorosos filhos do nobre Bóreas, o gelado vento do norte. Você conheceu Hρακλῆς, o agora mundialmente mega-hiper-famoso Hércules. Fizeram um desenho animado ridículo sobre ele e as crianças acreditam que ele foi um grande herói. O verdadeiro Hρακλῆς sempre foi um FDP megalomaníaco e mentiroso. Matar a mim? Ao meu irmão? Ridículo! E depois, como seria possível matar a flechadas alguém que é feito de ar?

– E seu irmão, onde está?

– Por aí. Ele não é ficar parado. Mal de família, sabe.

– Antes você vivia entre os homens. Tinha uma forma física. Ainda é assim?

– Prazer, Chad Murray, ator.

– Ator?

– É a melhor profissão do mundo, cara. Fama, dinheiro e chovem mulheres gostosas a fim de você. Você pisca o olho e surge uma bela garota na sua cama. Ah! Como eu gosto disto!

– Até onde me lembro você gostava de garotos.

– Não se pode obrigar um vento a soprar sempre numa única direção.

– Entendo. E o que está fazendo aqui em Venice Beach?

– Vim ver o Necker. Está vendo aquele carinha na prancha de surf? Neste últimos dois séculos, ele se tornou meu melhor amigo.

– Garotas. Sei muito bem.

– Já falei. Só amigos. Ele veio do norte da Europa, de onde sopra o vento norte, mas morou um tempo no Mediterrâneo. Lá se envolveu com uma antiga conhecida nossa. Ele é um espírito aquático. Um merman que pode se passar por humano.

– Da tripulação da Argo, mais alguém está vivo?

– Aqueles de nós que eram semideuses ainda vivem. O vidente Idmon, filho de Apolo. Autólico, o filho de Hermes. Nosso antigo timoneiro Eufemo, filho de Poseidon. Palemon, o armeiro coxo que é filho de Hefestos. E Hércules, naturalmente. Mas eu não quero nem olhar para a cara deste FDP.

– Me fale deles. Onde estão? O que fazem no mundo moderno?

Idmon está um velho. Quem vê diz, brincando, que ele parece ter mais de mil anos. O que deveria significar que está bem conservado, já que tem, na verdade, quase quatro mil anos. Em compensação, seus poderes proféticos estão mais fortes que nunca. É o vidente mais respeitado nos círculos ocultistas ocidentais, embora poucos acreditem que ele realmente exista. E não é só isso. Ao longo dos séculos, estudou a fundo a magia de diversos povos. Tornou-se um mago poderoso. Leva uma vida de eremita na Tessália. Ele só é encontrado quando deseja. Sua presciência é muita precisa para acontecimentos do futuro recente. É como se ele sempre visse simultaneamente o presente e o que acontece entre um e dez minutos no futuro. Ele nunca é pego de surpresa.

Autólico continua o mesmo vigarista adorável do passado. É dono de uma rede de cassinos e de dezenas de estabelecimentos que se passam por respeitáveis, mas são, na verdade, bordéis de luxo. Ele faz uso de um feitiço para aparentar algo em torno de quarenta anos. Sem o feitiço, volta a ter cara de um garoto de 16. Puxou a baby-face do pai. Herdou dele também a mão-leve. É capaz de te deixar nu e você não perceber. Tem uma fortuna incalculável em jóias e obras de arte, mas continua roubando até esmola de cego. Tem a fama de nunca dormir desacompanhado. Já fizemos muita farra juntos. Já até compartilhamos algumas garotas. Pensando bem, até que seria uma boa voltar a encontrá-lo.

Eufemo vive em Santorini desde sempre. Afinal, foi ele quem criou a ilha e ele não se cansa dela. É difícil encontrar um nativo da região que não seja descendente dele. Mas, nos dias de hoje, é preciso ter cuidado. De tempos em tempos, diz que quer conhecer o mundo e some por vinte ou trinta anos. Depois volta, se dizendo filho dele próprio. Os habitantes mais velhos de Santorini e das ilhas próximas sabem a verdade, é claro. Ele bebe e se exibe andando sobre a superfície do mar. Mas, naquela ilha, não importa a idade, não tem quem não tenha sido amigo dele na juventude, afinal ele tem sempre a aparência de um jovem de 20 anos e todos o ajudam na farsa.

Palemon foi envelhecendo lentamente e hoje aparenta ter cerca de cinqüenta anos. Também, filho de quem é. Hefestos parece que nasceu velho. Sempre pareceu mais velho que o pai, Ares. Palemon é atualmente consultor da NASA e mora numa mansão cinematográfica incrustada num paredão do Grand Canyon. Sua oficina ocupa uma grande extensão do interior da montanha. Continua fazendo o que gosta: criar máquinas. Maravilhas mecânicas. Não gosta de sistemas eletrônicos nem de sistemas digitais. Descobriu recentemente e mergulhou de cabeça em nanotecnologia. Está numa de criar robôs microscópicos, nanobôs.

– Está bem informado.

– Quando eu não tenho nada para fazer, às vezes dou uma espiada na vida dos velhos amigos.

– Acha que eles atenderiam a uma convocação de seu antigo comandante?

– O pessoal anda meio acomodado. Há milênios que não travamos uma grande batalha, que não vivemos uma aventura épica. Nosso grande momento ainda é a nossa velha saga da busca pelo Velocino de Ouro.

– Eu tenho em mente algo que seria um desafio à altura.

– O quê, por exemplo?

– Invadir o Inferno e tirar um homem de lá.


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Notas finais do capítulo

18.01.2012
Κάστωρ e Πολυδεύκης,os Dioskouroi = Castor e Pólux, os Dióscuros, que, como foi dito, no texto da fic, foram transformados nas estrelas alfa e beta da constelação zodiacal de Gêmeos.
Os Dióscuros eram irmãos de Helena de Tróia