Leah e Jacob: um amor mortífero escrita por Batatinha


Capítulo 2
Capítulo 2




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Nós nunca nos realizamos.

Somos dois abismos — um poço fitando o céu. ( Fernando Pessoa, Litania)

 

A sensação era a mesma de todo ano: o falso sentimento que tudo era novo. Os fogos rasgavam o céu, todos em volta comemoravam o nascimento de um novo ano. A mulher de verde não tinha muito o que comemorar, saiu para pegar outra taça de vinho, pelo menos o álcool fazia mais por ela do que o réveillon. Estava perdida em pensamentos quando esbarrou com uma pessoa:

 

— Desculpa-me! Eu não o vi. 

 

— Ainda continua vivendo no mundo da lua, Leah Clearwater ? —  um pequeno sorriso invadiu o rosto do estranho.

 

Leah demorou uns quinze segundos para processar quem era aquele homem. Descobriu quando sentiu seu coração disparado, como ela poderia ter esquecido daquela voz. 

 

— Você está por aqui? Nossa! Quanto tempo! Como está?

 

— Estou bem! E você o que faz aqui? Pensei que odiasse passar o ano novo rodeada de pessoas. Como dizia mesmo, ah: os livros são as melhores companhias.

 

— Ainda são. Sempre são. Mas eu trabalho para o Dr. Carlisle Cullen agora e não poderia faltar a primeira confraternização com o meu chefe.

 

— Bem, a Leah que eu conheci teria inventado a maior e melhor desculpa de todos os tempos.

 

— Bem, eu me permiti mudar um pouco nos últimos anos.—  Leah não percebeu o quão melancólica soou sua fala.

 

O homem na sua frente estendeu-lhe uma taça com um líquido âmbar. O cabelo preto parecia o mesmo, apesar de estar diferente; ele tinha cortado os longos cabelos e parecia que estava bem focado na musculação. Continuava bonito, Leah percebeu. Tão bonito que fazia ela querer rodopiar pelo salão. Bonito não mais como um jovem bobo, mas como um homem formado. 

 

— Mudar é necessário para todos, tristes seríamos se continuássemos os mesmo. - ergueu a taça —  As boas mudanças!

 

—  As boas mudanças! — o barulho das taças quebrou a troca de olhares dos morenos.

 

Ele estava alterado. Leah queria perguntar, mas tinha medo. Queria saber como estava a vida dele agora, há tanto que ela não sabia mais nada dele. Será que casou ou continuava com vida cretina que possuía? Será que teve filhos? Fez as pazes com a mãe? E irmãos cresceram? E o gato dele? Ele conseguiu abrir aquela empresa que tanto queria? O que ele sentia no seu íntimo? Será que a ansiedade dele melhorou? Tem se cuidado mais? Mas o medo das respostas não permitia. Algumas ela não suportaria saber a resposta.

 

— Leah. Leah. Parece que foi ontem que te vi, mas já tem tanto tempo. Ainda dando aulas?

 

— Não. Agora trabalho com eventos. Sou cerimonialista. — Deu um meio sorriso — E nas horas vagas social media dos Cullen.

 

— Você conseguiu me deixar surpreso. Você amava lecionar. O que aconteceu? 

 

Leah recostou na parede azul, e olhou diretamente para o homem à sua frente. 

 

— A vida. A vida aconteceu. A crise dos quarenta é pior que a dos vinte.

 

— Sei que vou soar repetitivo e chato, mas é surpreendente. Achei que se aposentaria falando sobre o Shakespeare  e a importância da literatura. Você amava falar dessas coisas, sua pupila dilatava, lembra?— ele olhou para ela com o mesmo olhar que costumava olhar no meio de seus desabafos de uma aula e outra.

 

— Acho que sou especialista em deixar as coisas que amo pelo caminho. Foi um susto quando acordei um dia e percebi que queria outra coisa.

 

— Você e sua dificuldade de não saber o que quer. Acho que algumas coisas não mudam mesmo. —  Leah deu o primeiro sorriso sincero na noite, ou talvez do mês todo. - E o Embry? Vocês ainda andam grudados? 

 

— Ele se mudou para Seattle. Agora é mais complicado nos vermos com frequência.

 

— Quem diria. Vocês eram quase a extensão um do outro.

 

Leah olhou para o relógio, hora de ir. Mas por ela passaria a noite ali.

 

— Pois é.

 

Ficaram em silêncio. Se olhando. Ela voltou há dez anos no tempo. Eles viviam um caos, mas um caos bom. Ela conheceu aquele homem quando era um garoto irritante e ele transformou a vida dela. Leah não gostaria de saber quem ela seria se não o tivesse conhecido. Quem seria ela sem aquele amor platônico e as possibilidades que nunca foi capaz de descobrir?

 

— Foi bom te rever, Leah. Poderíamos tomar um café qualquer dia desses, para relembrar nossos dias de lutas. 

 

— Claro, acho ótimo. — por um momento, um pequeno momento, um fio de esperança.

 

— Essa semana seria ótima. Estarei na cidade até sexta-feira. Me mudo para Nova Orleans  no sábado.

 

Leah sorriu novamente. Ela sempre esteve perdendo ele, desde o primeiro momento. E agora, talvez, o perderia para sempre. Mas ela sabia que um dos sonhos dele era esse. Ela sabia porque ele contou, enquanto ela estava deitada em seu colo esperando o ônibus, na madrugada, cansados e cheios de sonhos. Ela sabia.

 

— Perfeito! Mando mensagem e combinamos o dia. Bem, preciso ir agora. Foi bom te ver também!

 

Ela depositou a taça na grande mesa, caminhou até o homem o abraçou. Ele correspondeu. Ficaram ali. Ela queria eternizar o momento. Sentiu-se com vinte anos de novo desejando ficar com ele para sempre. Se despediram e ela saiu, com um misto de tristeza e nostalgia.

 

— Clearwater! - chamou. - Ainda gosta do Van Gogh?

 

— Claro. Algumas coisas não mudaram. — ela falou se virando.

 

— Tenho o lugar perfeito para nosso café.

 

Leah Clearwater queria congelar aquele sorriso. Ela acenou e se virou novamente. Sentiu o peito dando uma fisgada. Sabia que aquele encontro não aconteceria. Sabia que ele iria embora dali a seis dias. Sabia que não o veria tão cedo, ou talvez, nunca mais. Entretanto, não tinha jeito: ele ainda a deixava fascinada. Tão fascinada quanto ela era por fogos de artifícios, e lembrou o motivo dela ter aceitado ir para a confraternização. Ela queria ver a queima de fogos.





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