Margaery Tyrell: A Rosa Dourada de Highgarden 🌹 escrita por Pedroofthrones


Capítulo 31
Julgamento




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— Acha que podemos confiar que o veredito será bom? — indagou Olenna, enquanto a liteira chacoalhava. 

Willas deu de ombros.

— Só podemos rezar para que sim, Milady avó — respondeu. — Temos que confiar em Aegon…

Olenna bufou:

— Confiar nele não trouxe nada de bom para ninguém — ela respondeu, irritada e batendo a bengala no chão da liteira.

— Ele livrou a Campina dos Homens de Ferro — lembrou-lhe. — E deu à senhora mais tempo para defesa.

Olenna fez um som de desdém.

— Ajudou muito — zombou ela. — Tive tempo de pensar em como nada ajudaria pedir o testemunho de Sansa… que nada sai… e meu ex-colega de assassinatos, Petyr… que também está no Norte e não me ajudaria em nada. — Começou a bater a bengala no chão, nervosa, sentindo a liteira vibrar e um soldado gritar para o povo se afastar e dar passagem.

Olenna não estava disposta a confiar naquele Mendigo Supremo e seu grupo de pardais fanáticos. Não, ela ainda tinha uma última jogada.

A rainha dos Espinhos afastou as pesadas cortinas de verde-samito com franjas douradas, empurrando-as com a pequena mão manchada e enrugada, para poder ver o lado de fora. Observou as sete torres imensas do Septo Baelor, que pareciam crescer conforme a liteira se aproximava. Os sinos da Praça dos Sinos tocavam, avisando sobre o julgamento que iria ocorrer em poucos instantes. O som dos sinos estava a reverberar de forma longínqua pelas ruas, vielas e becos da da Grande capital dos Sete Reinos.

O som dos metais se batendo parecia irritar o dragão de Aegon, que rugia e parecia estar num irritante duelo de quem produzia o som mais irritante para os habitantes da cidade.

Pessoas vagavam até o Grande Septo de Baelor, pareciam ser atraídas pelas badaladas como moscas são atraídas por mel ou luz. Os nobres seguiam o mesmo percurso, mas preferindo usar cavalos e carruagens, cujo caminho era obstruído pela ralé de Porto Real.

Elinor estava longe, cuidando da mãe de Willas, que estava acometida e acamada por uma doença estranha. Não era fluxo sangrento, isso já era certo. Os meistres que examinaram a víuva de Lorde Mace encontraram semelhanças com a antiga febre de inverno; uma doença que matou dezenas de milhares de pessoas no antigo e longevo reinado do Rei Jaehaerys I Targaryen, há séculos atrás, durante os anos do primeiro inverno do velho rei, que ainda era jovem quando tudo aconteceu. A doença nunca mais havia sido vista novamente, entretanto, sumindo com o fim do inverno que a trouxe.

— Isso quer dizer que teremos uma nova epidemia? — indagara Willas a um dos meistres da Fortaleza que examimara o caso da sua mãe. O velho negou com a cabeça.

— Parece pouco provável — respondera —, embora não impossível. Não temos certeza se é mesmo a mesma doença que assolou o povo nos tempos do velho rei; todavia, não é seguro ficar perto dela sem conhecimento total, Milorde.

Willas voltou os olhos escuros de corça para a mãe, observando uma septã colocar um pano molhado em sua testa. O cabelo prateado de sua mãe estava trançado, mas com fios soltos.

— Está tão frio… — a mulher balbuciava de forma fraca, se remexendo nos pesados cobertores de pele e veludo. As duas duas enormes lareiras, as velas acesas nas arandelas e os archotes nas paredes do aposento — que ficara brilhante e abafado tamanho o número de fogo e focos de luz que haviam nele — eram capazes de aquecer o corpo da mulher.

— Quanto tempo ela tem? — ele indagou, voltando a olhar para o meistre.

— A febre de inverno mata em três dias — o homem com uma corrente fina no pescoço respondera. — Embora exista um único relato de matar em dois; mas, como eu disse, foi apenas um único caso entre milhares.

O primogênito de Mace Tyrell e Alerie suspirou. Sua mãe já estava enferma havia dois dias.

— Não existe mesmo nada que se possa fazer?

O meistre meneou a cabeça, mostrando que a resposta era “não”.

— Lamento, milorde — disse o Meistre. — Basta apenas esperar; pois sua mãe está nas mãos dos deuses agora. — o homem puxou os elos da corrente em volta da garganta, desconfortável. — Talvez seja melhor chamar um septão e deixá-la confessar seu pecados, caso ela...

— Sim, eu entendo — Willas respondeu, não querendo ouvir o restante.

 

X O X O X O X O X O X O X O X O X O X

 

O Grande Septo de Baelor era magnífico: como todo o septo, tinha sete lados e era inteiramente branco, com um teto abobadado feito de mármore e cercado por sete torres imensas de cristal. 

Estas torres prenderam minha doce Margaery, pensou Olenna, vendo as magníficas torres do septo parecerem se erguer diante dela. Cada uma tinha o sino, que iria tocar após o fim de seu julgamento. Belas, sim, mas sob o domínio de fanáticos nojentos que ousavam falar dos sete deuses como se eles próprios fossem a encarnação das divindades dos sete céus.

 De frente ao Septo, ficava a estátua do falecido e fanático monarca que ordenara a sua construção: Baelor I Targaryen, o Abençoado. Um homem idolatrado e amado por quase todos habitantes dos sete reinos. Um idiota. O falecido rei fora apenas mais um entre vários reis Targaryen dado a status de grandeza e loucura — e nem sequer fora um dos mais interessantes, diga-se de passagem, prendendo as próprias irmãs porque não suportava que homens mais viris que ele estariam dispostos a profanar os corpos delas e mamar nas tetas reais.

Bem teria feito Baelor em consumar o casamento com a irmã, assim o imbecil e depravado de seu irmão, Aegon IV, talvez não tivesse enchido a depravada com a sua maldita semente — semente esta que encheu a maioria das mulheres dos sete reinos naquela época —, e assim, o maldito Daemon Blackfyre não tivesse nascido, e nem dado origem a toda maldita casa e fracassada casa Blackfyre. Sim, teria sido melhor assim; pois Olenna bem sabia que havia verdades no boato de Aegon não ser filho de Rhaegar eram verdadeiros. Não importava, seu falecido e estúpido filho apoiara Renly Baratheon, e depois Joffrey “Baratheon”, só lara ter um neto no trono; a verdade é que o dito “direito divino” dos monarcas estava valendo menos que uma moeda de cobre.

O povo tinha a passagem barrada pelos pobres companheiros, um grupo da fé, formada por pessoas do povo simples, que empunhavam armas para proteger a fé, não podendo acompanhar a liteira até o final do caminho.

A liteira parou diante dos degraus brancos do septo. O povo clamava o nome de Margaery e o de sua casa. Eram uns tolos, mas era melhor ter apoio de inúteis do que apoio nenhum. Além do mais, aquele mesmo povo humilhara Cersei quando ela andou nua pelas ruas e vielas, zombando de seus peitos expostos e até dos pelos raspados da buceta dela. De certa forma, isso fazia Olenna ter algum nível de respeito por aquelas bocas chorosas e imundas.

Olenna sorriu e acenou para o povo, enquanto um de seus soldados — esquerda ou direita, ela nunca sabia reconhecer — a ajudava a descer. Seu neto saiu logo atrás dela, usando sua bengala. Ele precisava mais dela do que sua avó.

De fato, Olenna podia ser velha e pequena, mas nunca realmente precisou usar aquele graveto retorcido para se locomover; suas pernas estavam ótimas. Mas na corte, é melhor ser aquela que ninguém dá valor do que ser o centro das atenções.

Entretanto, após estes últimos anos difíceis, a idosa rainha dos espinhos já não era mais a mesma: perdera seu filho Mace — ele poderia ser imbecil, mas era seu filho imbecil —, perdera também seus feiosos netos Redwyne, assim como seus dois netos Tyrell; todos em um curto período de tempo. A perda de tantas pessoas foi um duro golpe na velha, que não tinha mais a mesma energia de antes; não fazia mais sentido para Lady Olenna continuar existindo com tantas pessoas perdidas. E, pelo que ela podia imaginar, não demoraria muito para enterrar a nora também.

Sua hora ainda não havia chegado, entretanto; precisava dar apoio ao seu neto, e precisava recuperar a sua neta, Margaery. Ainda precisava ser forte, por eles, e pelo bem da Campina. Havia feito coisas repreensíveis pela sua família, e estava disposta a fazê-las de novo. Se aquele rei idiota e o mendigo dos pardais achavam que ela era alguma Cersei Lannister ou Daenerys para jogarem fora, sem sofrerem qualquer tipo de represália, estavam enganados. Ainda havia muita vida naquele corpo pequeno e murcho.

A carruagem drapeada de preto do Rei havia chegado junto à liteira dela. Era uma casa rolante exageradamente larga, com dois andares e tendo até cama para dormir e nenhuma janela. Era muito lenta e uma extravagância sem sentido; teriam chegado mais rápido se não a lerdeza de tal locomoção. O orvalho oleado e o ouro que a constituíam eram quase que completamente ofuscados pelo tecido negro e a renda vermelha do trapeado que os cobriam. Havia várias bandeiras com o brasão dos Targaryen: um dragão vermelho de três cabeças cuspindo fogo num fundo negro. Sem dúvidas a parte que mais exibiu o símbolo real era o imenso dragão de ferro negro e olhos de rubi que empinava de forma imponente o topo da carrugem, com as asas negras e brilhantes abertas e rugindo para o mundo.

Quando o rei saiu da liteira de mãos dadas a sua consorte, a rainha Arianne, o povo urrou ainda mais alto e o rei e a rainha se viraram para acenar para eles, agradecidos pela recepção. 

Aquela ali nunca irá brilhar como a minha neta, pensou Olenna, achando que Arianne não servia para tal posição, como a maioria da raça dela. Mulheres dornesas eram pouco mais que prostitutas que não cobravam por seus serviços.

A idosa, contudo, estava de olho no Guarda Real do rei: um cavaleiro enorme e musculosos, que usava uma imensa espada de duas mãos. O mesmo soldado sombrio e gigante lutara por Cersei no julgamento dela, massacrando o primo da rainha com a espada de duas mãos — e ele era tão forte, que a empunhou com apenas uma mão.

Willas e Olenna fizeram uma reverência ao casal real quando este ficou de frente a eles. Nestes momentos, Olenna sempre percebia como estava ficando velha; pois seus joelhos pareciam ser duros como madeira.

— Que este seja um dia em que o nome da casa Tyrell seja limpo — disse o Rei, tocando o ombro de Willas quando ele se ergueu, como se fossem amigos de fato.

— Que os deuses lhe ouçam, meu rei — respondeu Willas, sorrindo.

— Eu que o diga… — murmurou Olenna.

O rei voltou seus olhos púrpuras para a pequena velha, olhando para baixo, de tão miudinha que ela era.

— Disse algo, Lady Olenna? — indagou Aegon, com um sorriso leve.

Deu um sorriso desdentado, que fez o rei quase perder a compostura ao vê-lo.

— Disse que espero que estejas certo, Vossa Graça.

O Alto Septão os esperava no topo dos degraus. Foram naqueles mesmissimos degraus brancos que Lorde Eddard fora decapitado pelas ordens imbecil do Rei Joffrey — agora não mais rei, pela graça do novo rei Aegon. Também foi onde Cersei desceu e mostrou ao povo sujo daquela fedida cidade seu corpo nu e raspado.

Cersei e Joffrey estavam mortos, mas todos ainda tinham que pagar pelos pecados deles. Esperava que os deuses tivessem guardado um lugar especial para eles no sétimo inferno, mas nem tinha certeza se eles seriam aceitos por lá.

Quando subiram os malditos degraus, Olenna encarou o simples homem que ousava falar pelos deuses. Ele estava cercado de Filhos do Guerreiros, soldados da fé, que deixaram seu nascimento nobre de lado e fizeram juramentos para defender a fé dos sete e empunhar armas; envergavam armaduras que brilhavam como prata e tinham cristais nos elmos, que brilhariam se tivesse sol. Por baixo do metal, eles usavam pele de cílicio que criavam coceira no corpo, como sinal de devoção. 

O Alto Septão era apagado pela beleza dos próprios guardas. Era um homem simples, não usando nenhuma veste bordada a ouro ou a imensa coroa de cristal; usava lã descolorida e tinha os pés sujos e duros como pedra. Quem o visse sem saber quem era, poderia jurar que era apenas um mendigo qualquer, não o chefe da religião que dominava quase todos os sete reinos. 

Mendigo ou não, aquele homem ainda era a maior santidade do Mundo Conhecido, e devia ser tratado como tal. Olenna, seu neto e os reis ajoelharam-se ante a figura imunda do Alto Septão.

Um por um, todos tiveram que beijar a sua mão suja e cheia de calos, como se ele fosse algum fazendeiro qualquer. Olenna tocou sua mão enrugada e manchada. A mão do Alto Septão era dura e aspera, parecia mais como tocar uma pedra do que uma pele. Franziu os lábios, beijando a Alta Santidade nas costas da mão. Durou apenas um mísero segundo, mas foi o bastante para Olenna se sentir enojada.

— Na minha época — alfinetou Olenna —, a fé dos sete costumava ser mais… colorida.

O Alto Septão o olhou como se não desse importância ao seu comentário ácido.

— Milady — ele lhe respondeu, sem emoção —, lembra-te de que o povo sempre vai preferir ter alimento a arco-íris. Creio que já deveria saber disto, visto que vossa família sempre foi rápida em lhes alimentar; então, creio eu, que entenda que a falta necessidade de extravagâncias em momentos de necessidade.

Olenna torceu a boca, segurando a língua afiada, sentindo a mão de seu neto tocando-lhe o ombro, indicando que devia ficar quieta. Assentiu as palavras da Santidade.

— De fato, Vossa Alta Santidade.

O Alto Septão assentiu ao ouvir as suas palavras.

— Eu espero que tudo ocorra bem, Alta Santidade — disse Aegon, com os cabelos prateados caindo até os ombros e com a fronte coroada pela antiga coroa valiriana de Aegon I, o Conquistador.

O Alto Septão fixou o olhar duro e escuro para o rei e acenou com a cabeça.

— Também espero, Majestade — respondeu. 

O rei assentiu e o Mendigo Supremo se virou e deu alguns passos até um púlpito de mármore que ficava na frente dos portões do Septo.

Ele ergueu a voz para falar com a multidão:

— Lady Olenna e Margaery Tyrell hoje serão julgadas e devem enfrentar a justiça dos deuses, como qualquer um de nós. — A plateia gritou em comoção, e o Alto Septão teve de esperar que todos se acalmassem para poder continuar: — É dever da fé julgar o ato da quebra sagrada do direito do hóspede; devemos lembrar que ninguém está acima da justiça divina, pois todos somos iguais aos olhos da Mãe e do Pai, todos somos os seus filhos e devemos ser julgados como tal.

A plateia aplaudiu toda aquela bela baboseira religiosa e o Alto Septão saiu de seu de seu púlpito, voltando-se para os monarcas e os Tyrell.

— Podemos entrar agora e dar começo ao julgamento de Lady Olenna e sua neta — ele disse. — Lady Olenna e sua neta serão julgadas, tal qual esta já foi julgada anteriormente: três homens… um deles sendo filho do guerreiro para representar a divindade a qual serve e os outros dois septões representam o Pai no Céu e o Ferreiro… e três septãs para representar as divindades da Mãe, da Donzela e da Velha no julgamento.

Olenna dirigiu ao velho Alto Septão um sorriso desdentado, como fizera com o rei Aegon. O velho, porém, não se desconcentrou com o gesto, olhando para ela com um rosto de pedra.

— Na verdade, Vossa Alta Santidade — comentou Olenna, de forma gentil — eu mudei de ideia.

O rei se virou e a olhou, depois encarou Willas, que a olhou pertubado. A voz solene do Alto Septão não pareceu perturbada, embora pudesse ser vista como uma certa confusão em seu semblante quando o homem uniu as sobrancelhas:

— Que dizer, Milady?

Olenna estava pronta para morrer, mas não se deixaria ser lavada deste mundo por um grupo de fanáticos imundos e seu falso rei. Deu de ombros e disse:

— Não quero mais ser julgada pela fé — ela disse. — Não com seus juízes, pelo menos. — Olhou para o seu rei e depois encarou o Alto Septão novamente e lhe disse: — Quero um julgamento por Combate, Alta Santidade. Exijo isso.

O Alto Septão pareceu ficar um pouco irritado com a atitude da pequena idosa.

— E por que o diz agora, no dia marcado de seu julgamento, quando tudo já estava preparado? — indagou ele, levemente irritado. — Por qual motivo não o fez assim que chegou a Capital?

Olenna deu outro simples movimento com os ombros.

— Eu estou velha, Santidade — ela lamentou-se, tocando no topo de sua bengala com as duas mãos. — Minha memória já não é mais a mesma; entretanto, a Velha no Céu acabou de me iluminar com a sua sabedoria e me lembrou, mesmo que de forma tardia, de que tenho este direito. — Sorriu novamente. — Espero que isto não seja um problema. Todos são iguais perante a fé…

— De fato — concordou o Alto Septão, com bílis na voz, interrompendo-a.

—...E todos devem ser julgados igualmente — ela completou. — E todos têm o direito de ter um julgamento por combate.

O Alto Septão a olhou com mais fúria fria no duro olhar. O rei deu uma risada, mas disfarçou com uma tosse e que estava limpando a garganta; parecia estar se divertindo com a jogada da velha Olenna.

— Avó, o quê está a pensar? — indagou seu neto, nervoso com a sua jogada. Nem ele sabia do plano.

— Qual será o seu guerreiro, Milady? — indagou o Alto Septão. — Certamente, mesmo que seja uma dita ideia momentânea, a grande Velha no Céu lhe iluminou com alguma ideia?

Esquerda e direita deram um passo adiante, preparados para um deles ser o escolhido de Lady Olenna. Nenhum deles, entretanto, era o escolhido da velha senhora.

Olenna dirigiu um olhar para o enorme soldado da Guarda Real de Aegon; o guerreiro usava uma armadura de escamas brancas e uma capa igualmente branca; seu capacete tinha a viseira abaixada, impedindo que seu rosto fosse visível, e era encimado por penas coloridas. Era enorme, chegando a ter dois metros de altura, e sobretudo, era forte. Fora ele quem vencera o julgamento de Cersei no julgamento da rainha morta.

— Bem — disse Olenna, virando-se para o rei —, eu não sou uma rainha; entretanto, creio que meu amável poder-lhe-ia me emprestar um de seus soldados, sim? — deu outro sorriso banguela.

O rei sorriu:

— Ora, mas é claro, Lady Olenna — ele respondeu. — Creio que a senhora seja tão sagaz quanto a Velha no céu. — Olhou para o Alto Septão. — E creio que o bom Alto Septão vai escolher um bom e justo soldado para lutar o meu Sor Strong, não?

O Alto Septão fez um grunhido e assentiu. Depois, virou-se para seus filhos do Guerreiro.

— Sor Theodan — chamou e o soldado que atendia por este homem deu um passo à frente e se ajoelhou. — Você ainda representará a fé neste julgamento; lutará contra o escolhido do Rei Aegon.

O cavaleiro assentiu.

— Será uma honra, Vossa Santidade.

— Tenho a certeza de que sim — comentou Olenna.

O Alto Septão a olhou de soslaio.

— Espero que a vossa Neta também tenha um bom guerreiro como este.

Olenna arregalou os olhos ao ouvi-lo falar de Margaery.

— Ela tem Sor Strong…

— A senhora tem Sor Strong — ele corrigiu. — Sua neta e você não podem ser julgadas no mesmo julgamento, Milady.

— Minha irmã não está aqui — lembrou Willas. — Não pode escolher um guerreiro.

O Alto Septão o olhou de soslaio.

— Então ela será julgada formalmente como era o plano original? — ele indagou.

Olenna piscou para ele, sem reação. Aquele velho pardal empoeirado estava querendo lhe passar a perna?

Antes que outra coisa fosse dita, o rei Aegon interviu.

— Lady Margaery será julgada quando tudo acabar então — ele disse. — Peço a Vossa Alta Santidade que espere até este confronto contra o Norte passar.

O Alto Septão anuiu.

— A Fé não vê problema nisso — respondeu, então, abaixou o olhar para Lady Olenna. — Vamos ver se os deuses iluminam sua neta com a mesma sabedoria que iluminaram a senhora, Lady Olenna.



X O X O X O X O X O X O X O X O X O X

 

Lady Alerie estava quente e seu cabelo estava fora da coifa, caído de forma desordenada no enorme travesseiro. Seu cabelo sempre foi prateado, mas, agora, tinha algumas partes grisalhas. Elinor ficou encarregada de cuidar dela; preferia isso do que ir ao septo de Baelor novamente. A ideia a deixava apavorada; só de olhar a figura do enorme e belo templo ficava nervosa, com um nó no estômago. Além do mais, sentia que sua família não andava tendo muita paciência para com ela.

Nem sabia por qual motivo as pessoas ainda iriam aquele julgamento idiota: Joff não era mais considerado rei; a quebra do direito dos hóspedes era sagrada, e qualquer um quer era vítima de assassinato tinha direito a ter o caso julgado; todavia, Elinor sabia que Aegon precisava da Campina do seu lado, e não dividída: ele precisava evitar mais derramamento de sangue das grandes famílias da Campina, principalmente as que estavam do seu lado. O Alto Septão poderia ser um fanático, mas sabia que apenas Aegon era o monarca que defendia a sua fé: Daenerys era aliada a fé do deus vermelho pagão; o mesmo para Stannis Baratheon; e, por mais que o bastardo de Ned Stark não fosse pretedente ao trono de ferro, ele também serviria, pois rezava aos velhos deuses.

Aegon e Arianne devem estar torcendo para Margaery morrer, deduziu. A Campina odeia dorneses como Arianne; a única forma que garantiria o apoio a causa de Aegon — verdadeiro ou não — era se alguma das facções inimigas mata-se a prima de Elinor.

— Meus pés estão frios — reclamou Alerie, novamente, apesar de ter tijolos ainda quentes neles. Sua voz era fraca como um pum de rato; embargada.

Elinor afastou o cobertor de lã pesada dos pés dela e retirou os tijolos, colocando outros mais aquecidos embaixo deles e cobrindo a região novamente com a coberta. Pegou uma colher e um pote de mel e deu algumas colheradas para a senhora enferma, erguendo um pouco a cabeça dela com o braço, pois ela estava muito fraca para fazer qualquer esforço. Depois, deixou o mel de lado e pegou uma jarra de água e verteu o conteúdo num cálice, e deu de beber para Alerie, que bebericou um pouco.

— Onde está a minha filha, Elinor? — indagou Alerie. — Onde está Margaery?

Que bom que agora ela me reconhece, pensou Elinor, um pouco aliviada. A mãe de sua prima andava confusa; quando não estava desmaiada, estava perdendo a lucidez, achando que os filhos e o marido ainda estavam vivos e jovens, ou que Elinor era a sua filha.

— Margaery não está aqui agora, milady — Elinor respondeu. — Ela…

— Eu sei, eu sei… — balbuciou Alerie, mexendo a cabeça de um lado para o outro. Conforme se movia, o rosto brilhava pelas velas, pois a pele estava lustrada pelo suor. Elinor tocou em sua testa úmida. Estava fervendo.

Pegou um pedaço de pano e afundou no balde, encharcando-o e depois torcendo um pouco, para tirar o excesso de líquido do tecido. Quando terminou de ver os pingos, desenrolou e passou o linho no rosto pálido de Alerie. Os lábios da dama estavam azuis e, agora que a viúva de Lorde Mace conseguia manter os olhos abertos, pôde ver que o brilho febril neles, parecendo não ver nada realmente. Ela lambeu os lábios secos e rachados, e Elinor percebeu que até a língua estava seca.

Quando o vinho ficou aquecido, verteu um pouco de água na pequena taça e ergueu a cabeça da viúva de Lorde Mace, ajudando-a a bebericar o líquido — o que Alerie fez com avidez parecendo desesperada para sugar cada gota da bebida.

Quando ela terminou de beber, Elinor pousou sua cabeça no travesseiro, com calma, e pôs um pano de linho molhado em sua testa. Líquido escorreu pelas beiradas, caindo até o travesseiro.

— Sonhei com minha filha — disse Alerie, com a voz ainda embargada, mas menos fraca do que antes. — Sonhei com Margaery. Ela corre perigo… Vai fazer algo ruim…

Que Margaery estava em apuros isso era verdade; mas Elinor não sabia que forma a sua prima teria de fazer mal a alguém na posição que estava.

— Descanse, Milady — disse Elinor, tentando acalmá-la. — Margaery está bem…

— Não está! — a mulher exclamou, com o máximo de força que havia lhe restado. — Eu a vi, ela estava imbuída em fogo de jade e tinha aquele ser de tentáculos… — virou a cabeça e tossiu. Seu corpo tremeu. — Oh, por que está tão frio aqui?

De fato, o inverno estava rigoroso, mas o quarto estava bem fechado e havia diversas velas acesas, assim como as duas enormes fogueiras. Era a doença que acometia a viúva com o frio. Elinor se levantou e foi até uma das lareiras de dois metros de altura, enquanto Alerie ficava balbuciando coisas sem sentido sobre seus sonhos febris.

Pegou o cabo de madeira e retirou a panela dourada das chamas. O metal dourado estava incandescente pelo calor do fogo e o carvão que havia dentro estava em brasas. Colocou com cuidado por baixo do colchão de palha de Alerie e torceu para a palha não pegar fogo.

— Meus pés ainda estão frios — ralhou Alerie e Elinor suspirou irritada. Esfregou os pés da mulher, mas nada ajudou a mulher. — Preciso falar com Margaery — continuou Alerie, enquanto Elinor tentava aquecer os seus pés pálidos e duros. — Ela precisava ser avisada… Não se alie ao anão, Elinor… Ah, o fogo! Está em todo o lado!

Elinor não sabia mais o que fazer; pensou que deveria chamar os meistres, mas ela sabia que a mente de sua Senhora estava perdida para a febre, perdida em alucinações, pobrezinha.

— O mal se aproxima — Alerie continuou a dizer —, o messias de gelo e fogo; o futuro rei de árvore pálida no trono de raízes… Oh, Elinor, Elinor, Elinor… Como pode a minha irmã ter se aliado ao messias do apocalipse?

Elinor meneou a cabeça, vendo que a mulher estava perdida de vez. Devia ter pedido para o meistre ter deixado algum remédio para ela dormir.

— Deuses antigos — chamou Alerie, fechando os olhos e franzindo o cenho —, guiem a minha filha.

Compadecida, Elinor tocou o ombro da mãe de sua prima.

— Margaery esta longe, Milady — disse. — Não há o que se pode fazer. — Continuou: — A senhora sabe que os verdadeiros deuses são os Sete, não os dos bárbaros nortenhos.

Neste mesmo momento, as janelas de cristal se abriram de forma abrupta, parecendo explodir, e ventos frios e furiosos invadiram o cômodo, apagando todas as velas, tochas e até as lareiras, derrubando alguns lustres no chão. Flocos de neve adentraram no local. Elinor deu um grito assustado e se abraçou com as poderosas rajadas de vento, que pareciam dentes afiados, rasgando o seu vestido e a sua pele.

Lady Alerie abriu os olhos e se ergueu de forma abrupta, sem parecer estar mais fraca pela doença, e virou o rosto, encarando Margaery. O vento fazia seus cabelos de prata esvoaçarem, e seus olhos brilhavam em um azul intenso; um brilho frio, como estrelas de gelo, queimando durante a noite.

— Você não sabe de nada — declarou Alienor, com uma fúria fria, fixando o olhar brilhante nela. Suas palavras faziam surgir névoas brancas no ar, que sumiam tão rápido quanto surgiam. — Os deuses antigos criaram este mal, e nem fogo do império caído o derrotou por completo. Reze a todos os deuses Elinor, pois nem o mais sombrio dos teus pesadelos seria capaz de prever o mal que irá assolar este reino. — finalizou: — Saia deste castelo, antes que a perdição de Jade aconteça e queime tudo por aqui.

Tão rápido quanto veio, os ventos frios sumiram, e os flocos de neve agitados pararam e começaram a pairar no ar. Caindo lentamente. Os olhos de Alerie perderam o brilho sombrio e a força pareceu esvair-se de seu corpo. Ela caiu, sem lamento, no colchão, fechando os olhos. Parecia estar dormindo.

Elinor, ainda assustada e atordoada, olhou em volta, assustada. Tudo estava escuro e havia uma camada de neve em várias partes, mas tudo estava mais calmo. Olhou para Alerie, que parecia estar num sono tranquilo.

Temerosa, Elinor se aproximou — ainda assustada com o espetáculo sombrio que havia acabado de presenciar — e pousou a cabeça com cuidado no peito da mulher. Estava morta.

Elinor fez o sinal da estrela de sete pontas e murmurou uma oração.

Sinos começaram a badalar, assustando-a e fazendo erguer a cabeça em direção a janela de cristal escancarada. Levantou-se de seu banco e foi até ela. Não podia ver o septo de Baelor dali, mas imaginava que era dele que reverberava o som, tal qual o fazia mais cedo.

A porta se abriu e uma serva entrou. Elinor virou-se para encará-la.

— Milady, o que houve aqui? — indagou a moça, abismada com o estado do quarto. — Deixou o vento entrar? Isso faz mal a Lady Alerie!

— Lady Alerie está a descansar agora — disse. — Para sempre. Está em paz.

Ao entender suas palavras, a serva assentiu e fez o sinal da estrela de sete pontas.

— Julgamento de Lady Olenna e Lady Margaery terminou? — indagou. — Foi bem rápido.

A mulher assentiu.

— Sim, foi para isto que vim lhe avisar. Mas foi apenas o de Lady Olenna.

Elinor franziu o cenho.

— Que quer dizer? — Indagou. — Pensei que minha querida prima também seria julgada.

— E ia mesmo, madame; mas a Rainha dos esp… Lady Olenna escolheu um julgamento por combate e encerrou o dela rapidamente. — Continuou: — O de Lady Margaery terá de esperar, decidiu a fé, até que tudo seja resolvido.

Elinor olhou para o pacífico cadáver de Lady Alerie e lembrou-se de suas palavras sombrias palavras de mau agouro.

— Temo que as coisas não vão melhorar tão cedo — disse Elinor, achando que a situação estava prestes a piorar para todos.

 


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