“Eu não agüento mais !”

Era isso que eu pensava enquanto estava naquela sala , sentada em uma daquelas cadeiras de plástico brancas que eu tanto odiava ouvindo alguma professora dar as matérias cujo eu não estava interessada em saber . Eu podia ver flocos de neve se formando na janela da sala . Isso era estranho. Desde quando no Brasil neva ?

Aquele barulho irritante do giz arranhando a lousa verde me deixava um pouco histérica . Nunca gostei desse tipo de barulho . Isso só tornava tudo cada vez mais tedioso e insuportável .

As aulas haviam começado hoje e eu não via nada demais . O mesmo cheiro de mofo , as mesmas carteiras ... Eu nem precisava me concentrar , provavelmente eu sabia mais do que a própria professora mesmo ...

E aconteceu .

A professora parou de fazer aquele barulho irritante com o giz e com a boca ( mais conhecido como falar ) e parou para olhar a porta . Notei que muitos dos meus colegas faziam a mesma coisa . O que podia ser tão bom para fazer aquela demente a qual todos nós temos que chamar de professora parar de falar ?

Ele .

Parado na porta , estava o garoto mais lindo que eu já havia visto na vida . Os cabelos loiros claro e lisos , olhos de um azul penetrante que as vezes dava a impressão de mudar para verde . A pele pálida e a boca.... simplesmente perfeita .

- Olá senhor ... ? – falou a professora com um olhar duro . Fala sério ! Ela devia ser muito tapada para falar desse jeito com um Deus grego . Como pode ?

- Não é necessário saber meu nome , professora . E não me chame de senhor , porque , caso a senhora não tenha notado , eu não sou casado .

Todas as garotas começaram a dar risadinhas , menos eu . Tive a impressão de que ele não estava brincando .

Os olhos dele correram pela sala e pararam em mim . Por que tive a impressão de que sua expressão suavizou um pouco quando me viu ?

- Hum ... Claro ... – ela respondeu em um murmúrio quase inaudível . – Por favor sente-se ao lado da senhorita Oliveira e...

- Perdão professora – disse ele , mas não parecia querer que ela o perdoa-se . – Se a senhora não notou , eu fui transferido de outro colégio e não sei o nome de nenhum de meus colegas , portanto eu devo presumir que posso me sentar onde quiser .

Eu não sei quem ficou mais chocado : a professora ou o resto da turma , tirando a mim . Tinha a impressão de que já o conhecia , já sabia desse jeito dele de ser .

- Bem , eu ... – a professora resolveu explicar , já sem graça . Eu não acreditava . Como ele conseguiu deixar a mulher que já ordenou em alto e bom tom que fizéssemos os cinqüenta e oito exercícios que não valiam nota ficar sem graça , isso era um mistério . Mas era ao mesmo tempo atraente .

Ele saiu da porta e eu não acreditei quando vi. Não acreditei mesmo. Porque ele estava vindo na minha direção. E mais ainda quando ele expulsou o garoto que sentava na carteira ao lado da minha

Principalmente quando ele sentou naquela carteira . Especialmente quando ele olhou pra mim  .E sorriu .

 E eu não acreditei que eu mesma tinha sorrido de volta .

- Bem ... – disse uma pessoa com roupas bregas , gizes de cores diferentes nas mãos parada na frente da lousa com a boca aberta – Eu ... Claro , claro ... Continuando ... Bom ...

Achei que devia estar com problemas de surdez . A professora mais rígida do colégio sem falas ?

Eu realmente gostei desse garoto .

- Nossa , você viu como a Rebeca é insensível ? Nem pra rir ... Diferente de mim ... – eu ouvi isso de uma criatura extremamente feia e burra cujo todos apelidam carinhosamente de Laís .

E aí começou . Aí que minha vida começou a mudar .

Ele se levantou , foi até estar do lado da garota e disse :

- Exato . Diferente de você ela sabe reconhecer uma piada e algo sério . Diferente de você que faz de tudo pra chamar atenção . Tem razão . Nem se pode comparar .

Eu não acreditei . Ele tinha me defendido ?

E por que eu tinha a impressão de que o conhecia de algum lugar ... ?