The One That Got Away escrita por Polaris


Capítulo 4
Homem


Notas iniciais do capítulo

Boa tarde!

Aproveitando o feriado para atualizar a história, espero que gostem!

Boa leitura!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/810559/chapter/4

02 de junho de 1942

Se naquela época eu tivesse dito a ela que nunca senti tanto orgulho de alguém como no dia em que apareceu na minha soleira, com aquela jaqueta da ordem das aviadoras da força aérea americana —radiante, para variar— tenho certeza de que não acreditaria em mim.

 Também não acreditaria se dissesse que ouvi atentamente a cada palavra dela pelo outro lado da porta, enquanto não conseguia parar de tagarelar com Becca sobre a sensação de pilotar um avião oficial pela primeira vez. E, secretamente, desejei que sorrisse para mim da mesma forma que sorria para minha irmã.

Agora, tenho certeza de que deveria ter dito isso quando tive a chance.

✧♡✧

GÊNIO. BILIONÁRIO. PLAYBOY E FILANTROPO. A trajetória do homem de ferro vai muito além do excêntrico herdeiro das indústrias Stark. Durante a demonstração de uma frota de seus mísseis Jericho, no Afeganistão, Anthony Stark foi sequestrado por um grupo de terroristas locais e...

Impaciente, Jane pulou aquela parte, já que os outros três artigos abertos no navegador diziam exatamente a mesma coisa. Ela queria saber mais. Queria saber por onde esteve. Quem conhecia. E principalmente: o que andou fazendo nos últimos anos.

Provavelmente estava sendo específica demais, refletiu. Não havia motivo para informações daquele tipo serem estarem na internet para que todos pudessem ver. Não era assim que funcionava, era? De qualquer forma, continuou lendo.

...Não levou muito tempo até que sua identidade fosse revelada para o mundo durante uma coletiva de imprensa. Nos anos seguintes, Tony Stark esteve envolvido em uma série de incidentes envolvendo ameaças sobre-humanas, levando-o a cooperar com o governo americano, assim como seu pai...

— Jane? Está quieta a tanto tempo. Tudo bem por aí?

Ela se assustou tanto que fechou a janela do navegador.

Diabos. Havia levado mais de uma hora para encontrar o maldito artigo.

— Tudo certo, Anton — Jane respondeu, forçando um sorriso — eu só estava lendo o meu — ela desviou o olhar para a uma das guias abertas, tentando lembrar o nome daquele site — .youtube.

Ele parecia confuso, mas não disse nada.

Jane estava certa, no fim das contas. Na internet conseguiu reunir mais informação sobre o Homem de Ferro do que sequer sonharia encontrar em livros. No entanto, nada do que lera até então soava familiar ou despertava aquele sentimento nostálgico da cafeteria. O que era um tanto frustrante.

— Tem certeza de que está bem?

— Tenho — ela suspirou ao levantar-se da cadeira, já que todo seu trabalho tinha ido por água abaixo — mas acho que preciso de um pouco de ar. Posso sair por uns vinte minutinhos?

— Numa terça-feira à tarde? — disse ele, indicando a academia vazia — não sei como vou conseguir dar conta sozinho.

Tão dramático.

— Obrigada Anton — Jane respondeu, dando um beijo em sua testa — você é o melhor.

—Tome cuidado — alertou ele — e não ande no sol por muito tempo. Não quero que acabe desmaiando na rua outra vez.

Jane fez uma careta. Era vergonhoso demais se lembrar daquilo.

Já fazia três dias desde aquele incidente. Para variar, não lembrava de muita coisa. Tudo o que sabia, e segundo o próprio Anton, era que havia desmaiado enquanto conversava com um homem aleatório na barraca de frutas — e que felizmente (ou não) a carregou no colo, como se fosse uma donzela em apuros do século dezenove por três malditas quadras. 

Não havia nada de extraordinário naquilo, embora fosse a primeira vez que acontecia. Apenas uma queda de pressão, provavelmente por causa do calor, foi o que Anton disse para tranquilizá-la — mesmo que depois daquilo ele tivesse praticamente a arrastado até o hospital e, estivesse de olho em cada passo seu desde então.

De qualquer forma, quando abriu os olhos, Jane estava de volta na academia, trazida por aquele homem e escoltada por Anton. A pior parte era saber que sequer teve a oportunidade de agradecer o pobre coitado, já que havia desaparecido tão logo que o amigo garantiu que estava segura em casa.

E o homem ainda a intrigava.

Sempre que se pegava pensando naquele rosto— pela lembrança vaga dele, pelo menos — sentia certa familiaridade, quase como se o conhecesse de algum lugar. Ela queria vê-lo outra vez, nem que fosse apenas para descobrir seu nome. Só que ninguém sabia nada sobre ele. Nem Anton, nem os vizinhos ou as pessoas da feira. O que a fez pensar que realmente fosse apenas um turista de passagem.

Mas se ele a conhecesse, refletiu, teria dito alguma coisa. Não teria?

— Sim senhor — respondeu Jane, batendo continência antes de sair pela porta e rindo dos resmungos do amigo.  

Jane foi andando pela rua sem direção específica. Talvez fosse ao parque, ou apenas desse uma volta pelo quarteirão. Para sua sorte, o dia estava atipicamente nublado, o que diminuía consideravelmente as chances de desmaio repentino. Ainda assim, estava abafado. 

E quente.    

Ela passava pelos prédios antigos do quarteirão sem pressa alguma, cumprimentando uma ou duas pessoas que encontrava pelo caminho. Não porque conhecia ou se importava, mas por puro hábito — andar com Anton a deixara desse jeito — até que em algum momento sentiu que sua garganta estava seca. Coincidência ou não, também avistou uma fachada conhecida e pensou por que não? Além disso, o café de Lana estava vazio, provavelmente pelo horário.

Jane parou na porta e hesitou. Talvez estivesse com um pouco de medo de estar ali, depois da última vez, mesmo ciente de nada mudaria estar ali ou não. Ela frequentava aquele café religiosamente pelo menos quatro vezes por semana, durante os últimos três anos, e nunca tinha feito a menor diferença. 

O problema não era o lugar.

Quando entrou, tudo estava exatamente do mesmo jeito de três dias atrás. As mesmas toalhas de mesa. A mesma decoração. As mesmas garçonetes. A televisão, no entanto, exibia um programa de variedades local. Ela então respirou fundo, o aroma de café recém passado impregnado em suas narinas e comprou um chá gelado antes de sentar-se na varanda, no mesmo lugar daquela manhã esquisita, com a mesma vista para a rua. 

Nenhuma memória apareceu, no entanto.

Sentada, Jane olhou para os dois lados, certificando-se de que estava sozinha e puxou um pequeno cordão prateado com dois pingentes que escondia debaixo das roupas. Nem mesmo Anton sabia, mas ela não tirava aquilo do pescoço. Nunca.

Primeiro passou os dedos delicadamente em um pingente esquisito, com formas desconexas e levemente azuladas, que não fazia ideia do que poderiam significar, mas que achava fascinante à sua maneira. Ela sempre se perguntava para que servia. Será que tinha alguma utilidade, afinal? Ou seria apenas um pingente aleatório? Um presente de alguém? Eram tantas possibilidades que sentia a cabeça girar só de imaginar.

Então seu olhar se perdeu naquilo. O segundo pingente: uma placa de identificação. Parcialmente destruída e desgastada pelo tempo, encarou as letras de seu nome cravadas naquela chapa de metal. Correu os dedos pela textura irregular, tentando entender o que poderia ter acontecido com ela. Estava partida depois das letras J e A. Havia ainda uma terceira letra, mas pela altura do corte não saberia dizer se era um N ou M — e era por este motivo inclusive que preferia ser chamada de Jane. Não era ruim, além de ser o único nome que conseguia pensar.

 Jane mordeu os lábios, sentindo um bolo subindo pela garganta. Merda, sabia que deveria ter se livrado daquilo. Estava enferrujado, quebrado e só servia como um lembrete constante de que estava tão quebrada quanto ele. Mas ela simplesmente não conseguia, não importava o quão patético fosse, aquele colar, aqueles pingentes, eram uma das poucas coisas que a ligavam a pessoa que havia sido. 

Talvez fosse por esse mesmo motivo que estivesse tão interessada no Homem de Ferro ultimamente. Desesperada por alguma ligação com seu passado, por mais insignificante que pudesse parecer.

Está tudo bem, pensou consigo mesma. Vai passar. Sempre passa. Não era a primeira vez que acreditava estar prestes a descobrir alguma coisa grande — e a se frustrar quando voltava à estaca zero— e certamente não seria a última.

Ainda assim, seria bom aprender um pouco de história. Ou melhor, reaprender. Era tão estranho não se lembrar de que a guerra tinha acabado em setembro de 1945. Muito menos sobre o que havia sido o muro de Berlim ou que o homem já tinha pisado na lua e que realmente existia vida fora da terra. Parecia tão... surreal.

— Jane — ouviu uma voz feminina, com um sotaque carregado, Lana. Ela imediatamente guardou o pingente de volta embaixo da camiseta — está se sentindo melhor? Precisa de alguma coisa?

Ela levantou uma sobrancelha.

— Do que você está falando, Lana?

Lana deu-lhe um olhar compassivo.

— Anton contou sobre seu desmaio na feira. E me pediu para ficar de olho em você.

— Claro que ele contou — ela revirou os olhos. Sabia que não era por mal, mas precisava mesmo dizer a Lana? — aquele linguarudo.

Lana deu uma risadinha.

— Não pode censurá-lo por isso, querida. É da natureza dele.

— Eu sei disso — Jane suspirou enquanto tomava um gole do chá — ainda assim, é humilhante.  

— Se acha isso humilhante, deveria ter visto o dia em que machuquei o pé com a tábua do piso. Ele passava aqui a cada duas horas para conferir se estava em repouso, como se eu fosse uma inválida. E nem tinha sido tão grave assim.

Jane inclinou a cabeça, esticando os lábios.

— Mas ele sempre cuidou de mim — Lana continuou, com um olhar nostálgico —principalmente depois que Jason partiu. Anton tem um coração gigantesco, como você mesma deve ter percebido.

Jason era o marido de Anton, e irmão mais velho de Lana. 

Jane nunca teve coragem de perguntar quando ou como ele faleceu, mas sabia que o casal estava junto desde a década de oitenta e que os três eram muito unidos. Eram uma pequena família, e aquilo estava estampado nos olhos castanhos e vívidos de Lana. Ela esboçou um sorriso tímido para a mulher parada à sua frente. 

Lana era muito bonita. Não sabia se os cabelos loiros eram tingidos ou não, mas destacavam sua pele alva e contrastavam muito bem com o batom em tom de café que sempre usava. Além disso, ela era muito gentil e tão acolhedora quanto Anton, o que a fez ceder.    

— Estou bem, Lana — ela garantiu — eu juro.

— Isso me leva a outro ponto  — Lana fez uma pausa e Jane podia jurar ter visto um brilho malicioso em seu olhar — o rapaz da feira. Ele era bonito? Cheirava bem?

Jane fez uma careta.

— O que exatamente Anton disse a você?

— Na verdade, ele não disse nada além do desmaio — Lana respondeu, com um gesto exagerado — o que, convenhamos, é bem esquisito. Mas isso não responde minha pergunta.

Jane parou por um instante, voltando aquele dia. 

Estaria mentindo se dissesse que era feio, mas também não se lembrava de tantos detalhes assim. Sabia que ele tinha o maxilar bem marcado e uma marquinha bem no meio do queixo, tão visível que mesmo com a barba rala conseguiu perceber; A maior parte do cabelo estava coberto pelo boné, então não saberia dizer que tipo de corte usava, apenas que era comprido e que batia na altura dos ombros,  o que em geral, Jane não achava particularmente bonito, mas que por alguma razão parecia combinar com ele. E, claro, tinham também aqueles olhos. Tão azuis e expressivos.

Sentiu o corpo estremecer.

— Não lembro direito. Era um cara normal, eu acho — Jane se surpreendeu com a indiferença em seu tom de voz, ela até desviou o olhar e tomou o resto do chá em uma golada, como se realmente não ligasse — por que o interesse?

— Poucas pessoas carregam uma desconhecida por três quadras, querida. É normal sentir curiosidade.

— Em outras palavras: você quer ouvir a fofoca completa.

— Precisamente.

Jane começou a rir.

— Vou ter que desapontá-la. Não me lembro de mais nada além disso.

— Uma pena — suspirou Lana enquanto brincava com a ponta de suas unhas vermelhas — não é sempre que acontece algo de interessante pelo bairro.

         — Que bom que minhas desventuras entretêm você — Jane ironizou.

         Lana balançou a cabeça, tirando outro sorriso de Jane, mas antes que pudesse dizer qualquer outra coisa, ela teve um pressentimento ruim, como se estivesse sendo observada. O que era estranho, porque olhando ao redor notou que estavam apenas as duas naquela parte do salão. Seria apenas impressão?

         — Não fique assim— consolou Lana, provavelmente percebendo a mudança abrupta no semblante de Jane — que tal se eu te compensar? Tem uma fornada fresquinha de papanasi saindo agora. Por conta da casa.

Os olhos de Jane se iluminaram com a proposta. Mesmo assim, não conseguia deixar de se sentir incomodada.

— Parece ótimo — respondeu ela, sentindo a boca salivar. Foi naquele momento que olhou para a rua e o encontrou, encarando-a com aqueles olhos. Jane sentiu o mundo parando por alguns instantes— de verdade, Lana — ela balbuciou, recobrando os sentidos. Era difícil se concentrar com o homem da feira olhando daquela maneira em sua direção. Então disse: — mas preciso ir andando. Já estou fora há mais de meia hora e não quero que Anton carregue os halteres sozinho.

Lana contraiu as sobrancelhas.

— Tenho certeza de que Anton não vai se importar caso você se atrase mais alguns minutinhos, Jane.

Ele não era nem um pouco discreto, embora ela tivesse demorado para notá-lo ali, praticamente escondido pelo movimento dos carros. Sua postura era tensa, como se estivesse em um conflito interno. Jane refletiu se o homem tinha percebido que estava encarando-o tão descaradamente quanto ele — tinha quase certeza de que sim. Estava pensando que talvez devesse acenar ou algo do tipo, mas um ônibus passou e ele simplesmente desapareceu.

Impossível. Pessoas não sumiam assim, do nada.

— Eu preciso mesmo ir, Lana — ela balbuciou, ao se levantar. Não queria perdê-lo de vista.

Jane se despediu às pressas de uma Lana confusa e saiu da cafeteria o mais rápido que conseguiu, olhando ao redor. Ele não poderia ter ido longe. Esquerda ou direita? Não saberia dizer por onde fora, então optou por seguir seus instintos e escolheu a esquerda, subindo a rua praticamente correndo, como se sua vida dependesse daquilo. Quando virou a esquina, o viu de relance entrando em uma viela e agradeceu a sorte. Ela apressou o passo como nunca e tentou chamar sua atenção.

— Ei, você — Jane gritou, mas ele pareceu não ter ouvido (ou estava ignorando-a de propósito) — espera!

Merda. Para onde ele pode ter ido agora?

Ela saiu da viela e percebeu que acabou parando na avenida principal — muito mais movimentada que as ruas paralelas onde estavam antes. Então enfiou-se por entre a multidão, em busca do casaco vermelho daquele homem. Não se importou quando empurrou ou pisou nos pés de uma ou duas pessoas que quase a arrastaram para o lado oposto. Estava perdendo-o.  

Olhou ao redor por tempo suficiente para avistar aquele vulto vermelho entrando em outra rua —desta vez realmente longe demais para ouvi-la. Saiu correndo até a esquina e finalmente chegou no lugar onde ele estava: um beco sem saída.

Mas ele não estava mais ali. 

✧♡✧

Aquelas mãos transmitiam um calor diferente. Algo que nunca sentiu antes, mas que no fundo, ela sabia o que significava. Por isso o afastou, como se ele estivesse em chamas. Não sabia o motivo, mas não poderia sentir aquilo. Não por ele.

— Não aja como se fosse uma despedida definitiva, doçura — disse ele, com um sorriso torto — você ainda vai estar por perto. E pelo que me lembro, prometeu que ficaria de olho em mim.

Ela relaxou um pouco. Só um pouco. Talvez estivesse sendo paranoica, afinal.

— Acho que você tem razão — ela respondeu, sorrindo de leve — ainda vou estar perto o suficiente para garantir que não faça nenhuma idiotice.

—Eu nem sonharia com isso.

— Agora está sendo condescendente.

Ele ergueu uma sobrancelha, como se não soubesse do que ela estava falando. Odiava quando fazia isso.

— De qualquer forma – disse ele, ignorando seu último comentário — essa é minha última noite na cidade. Podemos ficar aqui a noite toda remoendo possibilidades ou podemos nos divertir um pouco. O que me diz, senhorita?

Ele estendeu a mão em sua direção outra vez, olhando-a com expectativa. É um erro, sua mente gritou. Não deveria se deixar aproximar demais dele. Seus lábios por outro lado, disseram:

— O que tem em mente, sargento?

— Muitas coisas, minha querida oficial de voo— ele devolveu no mesmo tom, seus olhos afiados analisando-a, como se pudesse enxergar dentro de sua alma. Ela não sabia se era uma coisa boa ou não — Mas que tal começar pela feira? Estou curioso para descobrir o que aquele Stark planeja.

Ela ficou em silêncio por alguns instantes. Não poderia aceitar sua mão. No entanto, não via problema em se divertir um pouco. Era impossível dizer quando conseguiriam fazer algo parecido outra vez.

— Tudo bem – ela respondeu, passando sua frente —mas não ache que isso é um encontro ou algo do tipo — ela abriu um sorriso travesso enquanto andava de costas, alguns passos na frente dele — nos vemos por lá, patife.

E então ela o abandonou na soleira da casa, ouvindo a risada dele, sabendo que logo a alcançaria.

Ele sempre alcançava.  

✧♡✧

Quando abriu os olhos, Jane sentiu um peso gigantesco no peito, uma melancolia difícil de descrever. Ela sentia como se tivesse algo faltando — para variar— e que estava lá fora. Era como se tivesse perdido algo muito importante pela cidade e precisava desesperadamente encontrar, mesmo que tivesse de olhar em cada rua, cada beco e prédio. O problema era: não sabia o que procurar ou sequer por onde começaria.

Ela olhou pela janela. Claro que não faria aquilo, ao menos não naquele momento, no meio da madrugada. Ao invés disso, ela se levantou e saiu do quarto, em direção a sala.

Seu apartamento era simples, ainda que não deixasse de ser extremamente confortável. Uma suíte com banheira, uma pequena cozinha no estilo americano e a sala com sofá e uma televisão velha de tubo era tudo de que precisava. Ela quase nunca usava os utensílios domésticos — embora achasse o micro-ondas uma mão na roda, já que detestava cozinhar — principalmente depois do incidente com a torradeira, mas adorava a vista da sacada e o fato de todas as janelas serem grandes o suficiente para que não se sentisse sufocada quando tinha pesadelos. 

Como naquele momento.

Mesmo que não achasse que aquilo tivesse sido um pesadelo. Era diferente. Era...

Arg.

Ela não fazia ideia do que era.

Atravessou o corredor e a sala, indo direto para a sacada em busca de ar fresco. Estava morrendo de sono, mas sabia que não conseguiria dormir, pelo menos tão cedo. A cidade estava tranquila pelo horário e o frio da madrugada não a incomodava tanto — na verdade, apreciava o vento soprando em seu rosto.

Trazia uma sensação engraçada de liberdade.

O céu estava limpo, ela notou. As estrelas brilhavam alto no céu e iluminavam a cidade tanto quanto as luzes amarelas dos postes, uma vista muito bonita. Inspirou fundo algumas vezes e quando sentiu que estava mais calma, se sentou na borda, com o corpo virado para o interior do apartamento. Ela olhou para a sala, iluminada fracamente pelo micro-ondas e depois para a cozinha, como se quisesse garantir que tudo estava em seu devido lugar. Virou para a ilha de mármore e ergueu uma sobrancelha ao encontrar o maldito livro que comprara na feira, bem ao lado das ameixas igualmente compradas naquela manhã, antes daquele encontro. 

Balançou a cabeça

Não queria se lembrar do homem naquele momento. Sua cabeça já tinha perguntas sem resposta demais para seu gosto. Mas... 

Será que teria a oportunidade de vê-lo outra vez? Por que teve a impressão de que ele estava fugindo dela? E por que diabos estava dando tanta importância aquele homem?

—Vai ser uma longa noite— Jane concluiu e, como se concordasse com ela, sentiu a brisa noturna bagunçando seu cabelo.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "The One That Got Away" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.