Um Reino de Monstros Vol. 3 escrita por Caliel Alves


Capítulo 20
Capítulo 4: Entre colossos - Parte 3




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Chegou o dia da apresentação da espada, devido a alguns atrasos, isso foi feito no quinto dia. Aberta a oficina, o armeiro convidou o trio a entrar.

Letícia, Saragat e o mago-espadachim com Index empoleirado nos ombros adentraram.

Tell estava apreensivo, embora tivesse dominado a transmutação um dia antes.

— Venham todos, modéstia parte o resultado ficou ótimo.

— E só ficou boa por que euzinha aqui ajudei, né não?

Rosicler fez joinha com as duas mãos e piscou um olho.

O mascarado fez um biquinho mostrando reticências. A ladina deu dedo para ele num gesto infantil.

— Puxa! Eu estou ansioso para saber qual é a minha espada.

Os olhos de Tell vaguearam para todas as armas dependuradas nas paredes da oficina.

O artesão de armas sorriu.

Em cima de uma mesa, envolto em um tecido, estava a tão aguardada lâmina. Após o grupo se juntar, a gatuna retirou o lenço que recobria a arma.

— Nossa!

— Olha, Tell, que espada linda.

Os olhos dos dois brilhavam como duas joias preciosas. Saragat disse:

— É, até que ficou boa.

— Ora, seu tapado.

— Acalme-se, guria, conjuradores entendem de rezas, não de armas.

Todos sorriram. Pela primeira vez o enfezado mascarado havia recebido uma resposta à altura do seu mau humor. Letícia percebeu algo e logo falou:

— Essa espada não é maior que o sabre não, seu Z?

— Oh, não minha jovem, ela é uma espada de uma mão e meia.

— Uma mão e meia?

O dono da lâmina e o guardião perguntaram ao mesmo tempo.

— Sim, também chamada de espada bastarda, é a nomenclatura vulgar para lâminas que não se enquadrem em nenhum outro modelo. Geralmente são espadas de dois gumes, com guarda cruciforme, punho em madeira de lei. Podendo ser empunhada com uma ou duas mãos, por isso o cabo é maior.

E assim era a espada de Tell, a guarda era cruciforme, mas possuía floreios em alto relevo. O cabo era feito em carvalho negro, equilibrando bem o seu peso. O pomo recebeu parafusos banhados em prata. Ao todo ela possuía 1,5 kg. E chegava a 1,30 m de cumprimento. Algo chamou a atenção do encapuzado na base da lâmina.

— O que é esse negócio aí?

De modo pedagógico, Rosicler explicou a utilidade dos serrilhos.

— Ah, isso é um quebra-espada. São serrilhos postos na base da lâmina para desarmar o oponente ou quebrar a arma dele, sacou?

— Desde quando tu entende de forja de espadas, sua ladra desavergonhada?

— Vai se ferrar, vai, capa-preta dos infernos. Saiba que essa lâmina tem muito de mim.

Z teve que sorrir, realmente aquele era um grupo de heróis muito engraçado. Ao menos eles estavam se esforçando. Z pediu para que o garoto pegasse a sua espada.

— Seu Z, será que ela vai aguentar a minha energia mágica e as transmutações?

— Não se preocupe, guri, essa espada foi batida mil vezes.

Saragat estreitou os olhos e meneou a cabeça, Rosicler ergueu o malho para acertá-lo.

Unh, eu sei, mil vezes, hein?

O garoto ficou feliz e admirado com a lâmina, o peso, o gume, parecia mais uma obra-prima que uma arma. Uma bainha em couro trabalhado lhe foi cedido. A espada embainhada parecia à arma de um cavaleiro errante, um paladino da justiça.

— Agora sim você parece um herói de verdade, garoto.

Index pousou no alto de sua farta cabeleira.

Letícia lembrou-se que o cabelo do garoto realmente parecia um ninho e pediu uma tesoura ao armeiro.

— Tell...

— Que é?

— Vem cá!

— Pra quê?

— Espere aí que você vai ver.

Quando o garoto percebeu o que a alquimista queria fazer, saltou pra fora da oficina e virou-se para trás ironizando a sua professora.

— Não vai me pegar tão fácil.

— Ela não, mano, mas eu já te peguei.

Quando o garoto olhou para a sua perna, percebeu que um longo fio de sombra havia capturado a sua perna direita, impedindo-o de escapar, ele deu de ombros e desistiu.

***

Sentados à mesa do jantar, Z servia o fim de suas escassas provisões.

— Se eu num tivesse te ajudado na forja, tio, eu ia arrumar comida pra nois.

— Com isso ela quis dizer “roubar”, viu, seu Z.

— Cala a boca, zé-mané.

Tell mesmo a mesa não cansava de admirar a espada que ganhara. A lâmina o refletia com os cabelos cortados, parecia até mesmo outra pessoa.

— Garoto, larga essa coisa logo!

— Olha, Saragat, ela não é uma beleza?

— Ai, ai, aonde eu amarrei meu burro, Nalab?

Index voou até a direção do conjurador e disse-lhe apontando um dedo acusador:

— Olha aqui, ele está feliz, deixe-o!

— Morra, sua bola de carne...

Antes que o Cajado Nebuloso atingisse a mascote do grupo, o mago-espadachim interferiu. Pondo a lâmina em estoque, ele defendeu o ataque do mascarado. O encapuzado aplicou pressão, mas a espada não se moveu um centímetro para baixo. Zlang, erguendo a arma, ele desarmou Saragat, o artefacto caiu a metros de distância.

— Até que enfim ele me defendeu!

E como se rezasse, o guardião caiu de joelhos e juntou as mãozinhas fofas.

Depois disso, o jantar continuou sem mais ocorrências desagradáveis. Evitaram falar sobre os monstros, esse assunto causava indigestão, e discorreram sobre amenidades. Ao terminarem, o primeiro a trazer o assunto à baila novamente foi o anfitrião.

— A conversa está ótima, meus queridos amigos, mas tenho que ser desagradável: como vocês libertarão a Cordilheira de Bashvaia sem a ajuda dos habitantes locais?

Saragat cruzou os dedos enluvados embaixo do queixo e disse cautelosamente:

— É verdade que amanhã termina o nosso prazo, mas hoje mesmo não vi mais movimentação de monstros no perímetro. Acredito que eles tenham subido as estações acima. Não sei bem o motivo, como dito pelo seu Z, o Batalhão Colossal é o menor dos batalhões, entretanto, são bastante organizados, e os alto-oficiais muito poderosos.

— Mas porque este batalhão tá aqui, sabidão?

— A palavra correta é sabichão, gatuna. O Batalhão Colossal pode ser o menor em termo numérico, mas muito intimidador pela força. Eles estão aqui para garantir matéria-prima, minérios e pedras preciosas. Eles mudaram o rumo de muitas batalhas em Lashra. Reservar um estoque como esse que é Bashvaia é imprescindível para manter a hegemonia econômica do Reino dos Monstros.

— Tu fala complicado demais, morcegão.

O servo de Nalab alisou o rosto mascarado até a ponta do nariz e expirou fundo.

Ela faz de propósito, só pode ser.

A alquimista imaginou que se os anões, caveiras, gárgulas e gnomos subiram as outras estações, os combates não seriam nada fáceis e se pronunciou:

— Apesar de sermos um grupo, não temos a coesão necessária, Saragat. Na luta contra os Guardiões do Portal, isso ficou mais que evidente. Não conseguimos montar uma estratégia de luta adequada, aliás, nem pudemos coordenar uma simples defesa.

— E isso é culpa de quem, galega azeda?

— De ninguém, Rosicler, entenda o que eu estou falando...

— Perdoe, mas a senhorita Letícia está certa. Na luta da mina, vocês pareciam amadores.

Tá esculachando, né, veio?

O olhar da ladina foi tão acusador que o artesão de armas apenas deu de ombros.

Tell se sentira frustrado nesse instante, mas depois recobrou a confiança. Sejam lá quais fossem os futuros desafios, ele os venceria.

— Saragat, diga o que devemos fazer para vencer está batalha.

— É a primeira vez que concordo com o que sai de sua boca, pivete... vejam bem, como bem observou a nossa militar, devemos coordenar um ataque que permita sempre um retardatário.

— Ah, então fechou, mermão, você pode ser o “retarda-otário” do grupo.

O conjurador lançou um olhar mortal para a gatuna que só pôde conter o riso com as mãos.

— Como ia dizendo antes desse estorvo me atrapalhar, precisamos que sempre um de nós quatro permaneça na reserva. Não sei quem será o primeiro dos alto-oficiais a nos enfrentar, mas tenho uma leve impressão de que será nossa “pedra-lascada”.

— Titã Cubo.

Esse nome trouxe um sabor amargo à boca de todos os convivas, ele os tinha praticamente derrotado de modo humilhante. O servo de Nalab concordou com a cabeça.

— Isso mesmo, seu Z. Pra cada luta com esses mostrengos mais poderosos, formaremos trios. Sabendo quem é o primeiro, iremos fazer assim: eu, Letícia e claro, Tell. Rosicler, nessa primeira luta você ficará de fora, ok?

— Como é o negoço?

— Ele tem uma defesa muito poderosa. Eu e Letícia poderemos usar ataques de longa distância, o garoto compõe o trio porque precisaremos de um espadachim para dar combate a corpo a corpo. Com os seus olhos de gato Rosicler, você achará uma abertura nas defesas dele.

Hihihihi, o que é isso, prêmio de consolação é, veio?

O armeiro analisou a proposta, era a mais sensata. Cada um deles descansaria em uma batalha e poderiam ajudar dando dicas de fora.

— Realmente você é um brilhante estrategista, Saragat.

— Que é isso, seu Z, não precisa falar a verdade tão alta.

— Eu jurava que orgulho era pecado.

— Ah, cala a boca vai, Rosicler!

— Venha calar, chapeuzinho preto.

Antes que os dois se engalfinhassem, Tell rapidamente lançou uma pergunta:

— Olha, eu entendi o que você falou, mas se estivermos batalhando contra um grande número de monstros?

— Presta atenção, menino! Caso isso aconteça, cada um formará uma dupla e dará cobertura um ao outro. Aquele com quem tiver mais afinidade.

Rosicler deu língua para o encapuzado, realmente eles nunca formariam uma dupla.

Eu prefiro um calabouço cheinho de ogros a ficar com você só um minuto, sua larapia linguaruda de uma figa, filha da...

— Bem, tudo certo, então?

— Sim!

Com a resposta unânime, o mascarado recomendou que todos fossem logo dormir.


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