As Crônicas de Aethel (II): O Livro das Bruxas escrita por Aldemir94


Capítulo 11
O Mundo em Ruínas




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Havia apenas escuridão, sem qualquer sinal de algo que sugerisse vida…

De repente, brilhou a luz do luar, revelando uma densa floresta de árvores secas e mortas: não havia vida ali, não havia nada.

No chão não havia sinal de grama, folhas ou qualquer outra coisa que não a terra seca e morta e, próximo dali, se achava uma grande cratera sem água (o que restava do que, em tempos remotos, fora um lago).

De repente, alguém começou a correr por entre as árvores daquela floresta sem vida, em aflição, buscando qualquer coisa que tivesse língua para falar, ouvidos para ouvir ou apenas um coração batendo, anunciando vida naquele lugar.

Com seus cabelos castanhos e olhos marejados, Mabel Pines se via naquele lugar vazio e desolado, sem direção para ir.

Estar perdida era assustador, mas estar sozinha era ainda pior, de modo que Mabel entendeu que precisava enxugar as lágrimas e sair dali, pois de nada valeria ficar parada e em prantos.

Tentando se animar, a garota pensou no baile, nas guloseimas e em Aethel, vestido com os mais belos trajes reais que ela já havia visto, mesmo em seus filmes adolescentes mais clichês:

—Se acalme, Mabel! – dizia a garota para si – Pense no baile e no palácio… Você vai ficar legal, Mabel, já passou por coisas piores… E o Dipper deve estar te procurando sem parar… Isso aí, garota! Coragem!

—Já terminou seu monólogo? – alguém perguntou em meio aquele vazio.

—Quem está aí? – sussurrou Mabel, enquanto se abraçava devido ao frio (que ela não sabia se vinha do ambiente ou do receio que aquela voz lhe trouxe).

—Está um pouco solitário aqui, não acha? – disse a voz misteriosa.

Mabel olhou ao redor, com medo, mas foi apenas quando abaixou seus olhos que viu quem era sua companhia misteriosa: um pequeno gato de pelagem escura.

No início, Mabel achou que aquele gato era uma agradável presença fofa, porém, logo se deu conta de que havia qualquer coisa peculiar no pequeno animal, a começar por seus olhos azuis – esses tão profundos e dignos, que nem Aethel poderia competir.

Sua pelagem era curta, macia e brilhosa, como se houvesse sido cuidado por alguém com muito esmero. Sua voz era tão poderosa quanto acalentadora, como se fosse a de um pai falando com seus filhos pequenos.

Sua postura era humilde, mas também soberana, como um rei ainda maior que Aethel ou qualquer outro que já caminhou ou ainda viria a caminhar sobre a Terra.

Mabel pensou em pedir para segurar o felino nos braços, mas a criatura era tão distinta de todas as outras que Deus já fizera, que a garota logo teve receio e ficou em silêncio.

Porém, um sorriso brotou de seu rosto no momento em que o gato pulou em seu ombro e se ajeitou nos braços da garota.

Aquele gato não tinha um ar ardiloso ou sufocante, como algum tipo de serpente do Éden, mas sim de um amigo especial que encontramos depois de muitos anos.

Com paciência, o felino guiou a garota por entre as árvores secas e a terra arrasada, até chegarem a uma clareira onde crepitava a luz de uma fogueira.

Chegando lá, Mabel tomou um susto ao ver que, próximo as chamas, se encontrava Gael, com seu manto sombrio e segurando um livro na mão direita.

É claro que o poderoso feiticeiro havia notado a presença da garota; seu silêncio devia-se apenas a um profundo desinteresse, quanto por respeito ao felino.

—Gael?! Mas como?! O que você está tramando dessa vez?! – gritou Mabel.

O mago, com seu olhar tranquilo e aparência jovem, apenas ignorou as perguntas e prosseguiu com a leitura, sem qualquer mudança de expressão.

A apatia de Gael só mudou quando o gato se dirigiu a ele:

—Gael, porque está em silêncio?

—Não sou muito bom com pessoas - respondeu o mago – O que deseja de mim?

—Gael, nossa amiguinha ficou dormindo por muito tempo. Agora precisa saber o que perdeu, a começar pelo desafio de Nealie. Conte a ela o que aconteceu e depois eu direi o que ambos devem fazer.

—Está bem – disse o grande amigo – acho que devo isso a Aethel.

Com paciência, Gael se levantou e estendeu sua mão esquerda em direção a fogueira, projetando figuras de fogo que saltaram das chamas e se cobriram de ouro, ficando tão brilhantes quanto o pó mágico de Clarion e suas fadas.

Para Mabel, aquilo era muito agradável, como se estivesse assistindo ao início de mais um teatro mágico de fadas.

Ajeitando-se próxima à fogueira, a garota assistiu as figuras douradas ganharem movimento, enquanto o mago narrava os últimos acontecimentos, apresentava personagens como Jake e Rosa, mostrava as habilidades especiais de cada um e também contava um pouco de suas histórias de origem.

Mabel Pines fazia inúmeras perguntas (muitas das quais cansaram Gael), mas o gato pedia paciência ao mago:

—Acalme-se, Gael. Repita quando necessário e tenha paciência, pois Mabel precisa saber de tudo.

Após terminar as histórias e contar os acontecimentos recentes, Gael começou a falar de Nealie e de sua obsessão com o pomo das hespérides, explicando o quão imprescindível era que Aethel encontrasse a maçã dourada e revelasse a verdadeira rainha das bruxas, que ainda estava escondida e cuja futura ascensão tanto apavorava Nealie.

Terminadas as explanações, Gael fechou seu livro e o guardou no manto, enquanto o felino apontava com o focinho um caminho próximo a um grupo de árvores mortas:

—Sigam por ali – indicou o gato – E Gael, procure ser paciente com a menina.

—Mas é claro – respondeu o mago, enquanto suspirava – Farei como diz.

Colocando a mão direita sobre o ombro esquerdo da garota, Gael a guiou calmamente por entre as árvores até ambos chegarem no que parecia ser uma estrada em ruínas, tão velha quanto as estrelas do céu de Ghalary.

—Não se afaste de mim, criança – disse Gael – Não é porque este mundo está morto, que ele não possui perigos.

—Onde estamos? – finalmente perguntou a garota.

—A muito tempo esse foi um mundo de deuses e heróis, cheio de encanto e beleza, até que uma guerra irrompeu e a vida aqui foi zerada.

—E como eu vim parar aqui? Aquele feitiço da Nealie me teletransportou para cá?

—Não exatamente – disse o mago, enquanto caminhava – Você não está realmente aqui, apenas sua mente. Seu corpo ainda está inconsciente no palácio ghalaryano.

—Êpa! Volta e para! Está dizendo que a Mabel aqui é algum tipo de fantasma?!

—Você é uma alucinação, senhorita; uma projeção da sua consciência… Mas talvez pensar que é um espírito seja mais simples para alguém tão simplória.

—Como assim? O que quer dizer? - perguntou Mabel.

—Um simples fantasma pode atravessar paredes, fazer objetos flutuarem etc., mas uma “projeção de consciência” não pode fazer mais do que um corpo físico seria capaz, sendo a única diferença o fato de que suas ações operam em outros planos de existência, como o domínio dos deuses, algum reino de fantasia onde as leis naturais operam de formas distintas ou mesmo o mundo inferior… Você está entendendo?

 -...Nadinha.

Seguindo os conselhos do gato, Gael tentou explicar a Mabel que a situação dela era idêntica ao que ela havia passado durante o estranhagendon de Bill Cipher, quando a garota ficou presa naquela grande prisão de sonhos, onde ela se tornou a chefe de um reino encantado.

Porém, ao contrário daquela trágica ocasião, o corpo de Mabel não estava preso em um mundo estranho, apenas a sua mente.

Aos poucos, Mabel Pines começava a entender sua situação, embora ainda derrapasse em algumas explicações técnicas do mago, mas foi quando Gael revelou uma característica dramática da situação da garota que ela entrou em choque:

—Então quer dizer que se eu continuar aqui e não voltar logo para o meu corpo… Eu vou morrer? Morrer de verdade?!

—Infelizmente sim – disse Gael – Sua consciência precisa retornar imediatamente, ou seu corpo definhará. Nem Merlin pode reverter sua situação, criança.

Mabel ficou em silêncio, tentando assimilar tudoaquilo, enquanto ambos seguiram por estradas em ruínas até chegarem em uma série de construções que, em outros tempos, deveriam ter sido, no mínimo, esplendorosas: haviam colunas de basalto e mármore branco, paredes também de mármore, pequenas torres pontiagudas e os restos de um belo jardim - que muito deveria ter alegrado as mais distintas pessoas daquele mundo decaído.

Ao redor do jardim, havia colunas de mármore com algumas estátuas próximas que retratavam deuses, heróis, sátiros perseguindo ninfas, um Cupido beijando sua Psiquê e um garotinho sentado em uma rocha e dedilhando uma pequena harpa, enquanto uma garotinha sentada aos seus pés sorria, como se encantada pelo som inaudível daquela música que, se algum dia fora tocada, nenhum ouvido mortal tornaria a escutar.

Mabel tentava se distrair com as belas esculturas, mas saber que a morte se aproximava dela não lhe permitia maior atenção, assim como o fato de que as inscrições daquelas obras de arte estavam em uma língua estranha (provavelmente uma versão de grego arcaico) que ela desconhecia.

Como não era capaz de entender as lindas histórias que aquelas obras de arte contavam, Mabel logo começou a perder o interesse por elas.

Como a garota começava a tremer de frio novamente, o mago cobriu-a com seu manto sombrio, enquanto tentava distraí-la com as campanhas de Aethel e sobre o triunfo que, sem nenhuma dúvida, ele solicitaria ao senado.

De fato, Aethel não perderia a chance de ser exaltado por toda aquela classe política após sua vitória sobre Cláudio, especialmente porque isso poderia desmotivar novas rebeliões contra sua autoridade.

Apesar de gostar das histórias sobre Aethel, Mabel sentia que elas eram um tanto sérias demais, como se alguma coisa tivesse mudado desde a última temporada dela em Gravity Falls.

Era agradável lembrar dos bons momentos que ela e o jovem imperador haviam passado naqueles poucos dias no Òregon, ao mesmo tempo em que as lembranças de toda aquela magia, fadas, armaduras, espada mágica e até os zumbis, traziam aquele sentimento gostoso de alegria que todas as pessoas carregam desde os dias da infância primaveril, quando a fantasia é a mais pura realidade.

Para muitos a simples menção a esse sentimento pueril de alegria inocente poderia ser visto como um claro sinal de imaturidade - pensamento que faria Aethel inventar alguma aventura aleatória para ter um pouco mais de ar -, mas para Mabel era diferente: aquela garota que amava unicórnios, doces e bandas adolescentes de gosto duvido, ainda carregava no coração esse sentimento de alegria ingênua e isso era parte inseparável de seu charme.

Apesar de tudo isso, Mabel começava a pensar em qual era sua relação com Aethel e se ele ainda seria o mesmo que ela conheceu em Gravity Falls.

Logo veio na mente da garota o convite que Aethel lhe fizera pouco antes dela retornar para Piedmont.

—Talvez eu devesse ter aceitado – suspirou Mabel – Teria sido legal viver como uma princesa em um mundo encantado para todo o sempre.

Enquanto pensava em como as coisas pareciam ter mudado, Mabel abriu os olhos e se viu dentro de um grande salão, rodeado com fileiras de colunas de ambos os lados, com algumas estátuas logo atrás (muito bonitas, retratando sábios com livros, estadistas, generais e alguns reis com coroas de pedra).

Era um salão bonito, mas morto, como tudo mais naquele mundo sem luz solar nem vida.

Quando Mabel olhou para o fundo do recinto, avistou um trono retangular de mármore branco com rachaduras, com dois braços em forma de leão, um Sol pintado a ouro em um baixo relevo no encosto e quatro pequenos degraus a frente (tudo com um pouco de poeira):

—Deve ter sido um lugar fabuloso, mas agora tá tudo triste e sem vida – disse a garota.

—É o caminho natural das coisas – disse Gael, que até o momento permanecera em silêncio.

—O que quer dizer? – perguntou Mabel.

—O destino de tudo aquilo que existe no plano mortal é o fim derradeiro. Tudo o que existe é efêmero, senhorita. Um dia este mundo já foi glorioso, mas agora é vazio e morto; agora aqui não é nada.

Enquanto pensava nas palavras do mago, a garota pensou no grande palácio de Aethel, no baile e no milenar cerimonial que ela testemunhou, o que a fez perguntar:

—Gael… O que aconteceu aqui, poderia acontecer com o reino do Aethel?

—É inevitável – respondeu o mago – Por mais sábio e grandioso que seu amigo seja, um dia ele será reunido aos seus antepassados e seu império chegará ao fim. As areias do tempo farão seu nome desaparecer e nada mais restará, seja seu sangue ou algo que se possa chamar de legado. Aethel pode ser brilhante ao seu próprio modo, mas não pode evitar o destino de tantos reis e heróis legendários (alguns muito maiores do que ele), que é ser esquecido por todos. Talvez ele seja mitificado por alguém e sua lenda cresça de forma que haverá dois Aethels, o lendário (que pouco ou nada terá com o amigo que você, cara senhorita, conhece) e o real (que será esquecido). A verdade é que um dia a própria humanidade deixará de existir, de forma que não haverá mais ninguém para se lembrar de Aethel… O tempo mortal é curto e as obras do homem  são efêmeras… Nada se pode fazer quanto a isso. 

—Isso é meio horrível de se dizer em um lugar como esse, não acha? – disse Mabel, sentindo cada vez mais frio.

—Não, minha jovem – respondeu Gael – Se o tempo é curto, então devemos fazer nossa passagem valer a pena.

—Mas você acabou de dizer que tudo vai chegar ao fim!

—Sim, senhorita Mabel, mas por acaso isso nos exime de fazer o melhor possível?

Mabel não entendia muito bem aquelas coisas e talvez nem quisesse entender; ela era uma garota que preferia pensar no agora ao invés de perder-se em um futuro longínquo, muito além dela.

Para Gael deveria ser fácil perder-se nessas divagações, afinal de contas, apesar de sua aparência jovem, o mago havia testemunhado séculos de história humana! Desde os tempos de Vortigern, o tirano da Britânia, até aqueles dias atuais.

Talvez fosse mais fácil para alguém que viu o início e o fim de tantas coisas ter pensamentos tão desanimadores.

Após caminhar até o trono de mármore, Gael pegou na parte de trás do encosto um medalhão redondo feito de ouro, com um dragão europeu vermelho ao centro.

Após entregar a peça para Mabel, Gael lhe explicou que ela precisaria fazer uma jornada para a terra de Slumberland: a terra dos sonhos.

O mago explicou a Mabel que sua atual condição a tornava perfeita para cruzar os limites da realidade e adentrar a terra dos sonhos, governada pelo bom rei Morpheus, onde a garota poderia ajudar Aethel em sua jornada para derrotar Nealie.

Após fazer algumas considerações finais, Gael fez uma pausa e depois perguntou:

—Senhorita, quando me viu na clareira, sentiu um choque momentâneo… Mas porque seu medo se dissipou tão rápido?

—Eu não sei – respondeu Mabel – Você está diferente… Acho que o gatinho me acalmou e eu consegui ver. Ele era seu familiar?

—Eu não tenho familiares e ele não era um gato – respondeu Gael – Ele tem a sabedoria da eternidade… Às vezes aparece inesperadamente, nunca se sabe, mas podemos sentir sempre que ele está presente. Uma vez, quando você ainda estava em Gravity Falls, tentei prender Aethel em uma pintura de parede, mas aquele gato interferiu e o mandou para um outro mundo em segurança.

—Mas ele parecia tão legal, me passou uma sensação de paz… - disse Mabel.

—Seu coração é puro, senhorita Mabel, e esse é um dos motivos pelos quais eu desejo que vá até Slumberland… Só tenha cuidado com aquele irresponsável do Flip.

Após colocar o medalhão no pescoço, os olhos de Mabel brilharam e, enquanto ela desaparecia, Gael lhe disse para não perder aquele objeto, ou ela não poderia voltar da terra dos sonhos, encerrando com as seguintes palavras:

—O selo do dragão a guiará, senhorita, para minha última travessura contra Nealie.

Após um brilho forte, Mabel desapareceu.

Após sentar-se no trono em ruínas, Gael olhou para o teto daquele grande salão e começou a fazer algumas ponderações sobre os mais variados assuntos, quando foi interrompido por uma voz que imediatamente reconheceu como sendo do gato:

—Gael, porque ainda está aqui? Ainda há muito a se fazer.

—Gostaria de fazer algo antes de partir, apenas isso– respondeu o mago - Já faz algum tempo que não volto para casa.

—Eu compreendo – respondeu a voz, de forma amigável -, mas e quanto aos outros? Eles também estão longe de casa.

—Fala dos garotos que se perderam na floresta sombria? Merlin pode cuidar deles – resmungou o mago – Não tenho porque lidar com essa questão.

—Gael, Merlin está cuidando de dois deles no palácio, mas você deve cuidar dos outros dois que ainda estão na floresta.

—Está bem – suspirou o mago, cansado – Farei como diz… debater com você é bastante frustrante às vezes.

Levantando-se sem muita animação, Gael estendeu a mão direita e criou um círculo mágico que se revelou como sendo um portal para a grande floresta sombria.

Após fazer admirar uma última vez o salão sem vida, Gael atravessou o portal e se viu em meio aos arvoredos, as pedras com musgo e o ar fresco da grande floresta sombria.

Fechando seus olhos, Gael buscou sentir o movimento das árvores, a grama, os sons dos animais e os espíritos mais próximos dali, logo detectando a presença de duas pessoas.

Caminhando com tranquilidade, Gael chegou até uma clareira, onde viu dois adolescentes resmungando um com o outro.

—Que droga, Spud! A gente veio aqui salvar o Jake e agora estamos perdidos!

—Relaxa, Trixie - respondeu o rapaz identificado como Spud - Já passamos por muita coisa ruim antes.

A expressão de Trixie parecia a de uma fuzileira naval, tamanha a sua expressão de frustração, mas buscava manter o controle e afastar as folhas caídas de suas roupas.

Trixie era uma garota de pele morena e cabelos pretos habilmente amarrados em dois coques, olhos castanhos, calças cor de oliva (que lhe dava um aspecto de durona), um par de tênis cinzas e um moleton azul de manga curta (que possuía o desenho de um panda ao centro) e uma camisa de mangas longas por baixo, cuja tonalidade de azul era um pouco mais clara em comparação a do moleton.

Quanto a Spud, tinha pele clara, próxima ao damasco, algumas sardas nas bochechas (que contribuiam para lhe dar um aspecto pouco sério), cabelos castanhos e um tanto espetados (com pontas brancas escondidas por um gorro verde-oliva - mas que não escaparam a visão mágica de Gael) e olhos negros (provavelmente de um castanho ainda mais escuro que os de Trixie - e ressaltados pela pouca luminosidade da grande floresta).

Spud era um espécime muito particular, vestindo uma camisa laranja de mangas longas por baixo de uma camiseta azul escura (e um tanto folgada demais) com listras amarelas no peito e também nas mangas, além de um par de tênis azuis com detalhes cinzas e calças marrons (e exóticamente largas).

Em determinado momento, Gael olhou para algo escuro nas mãos do rapaz, que logo identificou como sendo luvas pretas sem dedos, que deveriam lhe passar algum ar de durão, mas que apenas ressaltavam seu ar de desleixo e falta de seriedade.

O mago começou a se divertir com a conversa daqueles dois amigos, apavorados com os lobos e outras alimárias:

—Spud… a gente não pode morrer aqui – disse a garota, apavorada com os sons da floresta – Temos que salvar o Jake.

—Trixie – respondeu o rapaz, enquanto abraçava a amiga em pânico – acho que o Jack é que vai precisar nos salvar…

—Para com isso, Spud… Ele foi sugado por aquele portal esquisito…. lá na pista de skate, lembra? E se algo acontecer com ele?

—Com ele? E se algo acontecer com a gente! – respondeu Spud, enfático - Dadas as atuais circunstâncias… acho que a casa caiu pra gente.

—A gente veio resgatar o Jack e a Rosa… e é o que vamos fazer, tá me entendendo? Lembra quando resgatamos o Jack do professor Rotwood?

—Mas é claro… – respondeu Spud, com uma expressão de tédio – Foi logo depois da gente ter vendido o Jack pro Rotwood.

—Ai ai, Spud, você sempre se prendendo a esses detalhes! O Jack e a Rosa estão contando com a gente!

—Trixie, eu quero ajudar… Mas acho que vamos acabar comidos pelos lobos; já até estou ouvindo os uivos deles!

—Eu também estou ouvindo – disse Trixie, abraçando Spud com ainda mais força, enquanto olhava para um arbusto que se mexia.

De repente, um corvo voou do meio das folhagens do arbusto e pousou em um galho de um velho carvalho, para alívio dos dois amigos, que suspiraram:

—Era só um corvo, hahaha… Acho que ele não tem muito apetite para adolescentes – riu Trixie.

—Tem razão – disse Spud – É só um passarinho alegre, certo?

—É claro que o “passarinho alegre” também come carne, como devem saber – respondeu a ave, que olhava os dois com olhos cinzas e voz assustadora.

Trixie e Spud abraçaram-se com ainda mais força, enquanto seus olhos fixaram-se no corvo.

Os dois amigos queriam fugir, mas o medo lhes havia paralizado quando, sem aviso, a ave voou do galho em direção aos dois e, em um instante, transformou-se em Gael, que sorriu para ambos:

—Espero que falar com uma pessoa lhes pareça menos “perturbador” do que com um corvo.

—Quem é você? – perguntaram os dois jovens, em uníssono.

—Perdoem minha impaciência, meus amiguinhos assustados – disse o mago –, mas temos muito trabalho pela frente e o tempo é demasiado curto. Fiquem aqui e sejam devorados pelos lobos ou me sigam e tenham uma vida mais longa e feliz.

—Seguir você? – perguntou Trixie – Como assim?

—É muito fácil, minha adorável senhorita com ares de durona, basta saberem que estou no comando e fazerem o que eu mandar, ou vou transformá-los em pedra… Estamos entendidos?

Antes que os dois esboçassem qualquer reação, Gael cobriu ambos com seu manto e, sem perder mais tempo, os três desapareceram dali, sem deixar rastros.


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Notas finais do capítulo

Familiar:
Mabel achou que o gato era o familiar de Gael, isto é, um animal que fazia companhia ao mago ou talvez um espírito em forma de felino, que estava ali para auxiliar Gael.
De acordo com a superstição britânica, os familiares são espíritos em forma de animais que servem aos feiticeiros, fazendo-lhes companhia, prestando-lhes serviços (que podem abarcar até o serviço doméstico), dentro outras obrigações.



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