Avec mortem escrita por K Maschereri


Capítulo 6
Fogo amigo




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Depois de verificar todos os cantos possíveis da propriedade, toda e qualquer esperança de que tudo não passasse de um mal entendido ou uma pegadinha desapareceu. Existiam pegadas no jardim, assim como uma pequena trilha de gotejos de sangue, que levava até algumas marcas de pneus. A janela do piso superior, do quarto particular de Devrim, tinha sido arrebentada; era provável que tivesse servido de entrada para uma segunda pessoa. A hipótese de que seu marido tinha sido levado era a única que fazia sentido, mas não completamente.

Nada parecia ter sido roubado: a TV ainda estava ligada; a comida sobre a mesa ainda estava morna; mesmo o precioso notebook de Devrim jazia intocado na escrivaninha, em stand by. Não existiam odores diferentes na casa, logo, quem quer que tivesse feito aquilo tudo não poderia ser humano, como algum fã maluco e conspiratório ou algo parecido. Mas os únicos não-humanos com quem Devrim tinha algum tipo de desentendimento se encontravam na Romênia, sob a proteção da casa Drăculești.

A moça suspirou. O motivo de terem se mudado para a Grécia, dentre todos os lugares possíveis no mundo, era exatamente este: sair dos limites de poder de seu pai; viver em paz. Santorini, assim como todo o resto do país e alguns países vizinhos, estava sob tutela de uma Casa Italiana, encabeçada pelo clã dos Verchiato — um dos mais pacíficos de toda a Europa. Ao pedir tutela à Famiglia de Enio Verchiato, Vyka e Devrim pensavam ter escapado de todo o jogo político e banho de sangue dos Drăculești. Mas pelo visto, não foi o suficiente.

A cabeça de Veronika funcionava a mil, imaginando cenários diversos na tentativa de entender o  porquê do ocorrido, mas tudo sempre voltava ao pensamento de que nada do tipo teria acontecido se tivesse chegado mais cedo. Apoiou-se na escrivaninha, habitat natural de Devrim, tentando digerir tudo o que havia acontecido, desejando que ele ainda estivesse ali, carrancudo e mal-humorado, mas ali.  Depois de alguns longos suspiros em uma tentativa falha de manter a calma, sentiu lágrimas de frustração escorrerem por seu rosto, e as mesmas palavras, sem parar, ecoando em seus pensamentos: se eu estivesse aqui, eles não o teriam levado. Eu teria impedido. Mas eu não estava, e olha o que aconteceu.

Foi então que um som agudo e baixo ecoou pela casa. Antes que a mulher se desse conta do que acontecia, mergulhada em um mar de remorsos, um corvo enorme, com uma fita vermelho-sangue de pontas douradas em volta do pescoço adentrou a casa e pousou no assento da cadeira que se encontrava junto à escrivaninha, com o que parecia ser uma carta em seu bico.

Ao acariciar o animal para pegar a mensagem, Vyka sentiu uma leve tristeza misturada com alívio em seu peito, pois, naquele instante, teve certeza de que tudo aquilo não passava de mais um dos planos de seu pai: o selo de sua família, a Casa Drăculești, vinha estampado em cera vermelha na dobra do envelope. E uma vez aberta, a pequena mensagem se provou a resposta, mesmo que incompleta, para tudo o que a incomodava no momento.

 

Tango. 7:30 p.m.

Venha sozinha,ou ele vai pagar a conta por você.

M. D.

 

 


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