A fada que o escreva escrita por Creeper


Capítulo 18
A infância de Suichiro


Notas iniciais do capítulo

Hey, espero que gostem ♥

Edit: mais um capítulo, mais uma luta com minha internet para ela deixar eu colocar a imagem, AHSUAHSU. Mas consegui!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/804314/chapter/18

Tudo cheirava majestosamente bem, desde as flores que nos rodeavam até os doces e o chá em nossa mesa à sombra de uma das árvores do jardim. Como que para completar a cena, os passarinhos cantaram acima de nossas cabeças e cortaram os céus em uma linda dança.

— Seus irmãos querem o seu bem. – Amy explicou. – Eles apenas não sabem... Usar as palavras certas. – pigarreou.

Franzi o cenho e continuei a enfiar alguns biscoitos e chocolates em minha boca, ajudando tudo a descer com uma grande xícara de chá cheia de açúcar, apesar de que naquele momento eu preferia uma cerveja de fruta do dragão.  

— Eles são uns malas, isso sim! – inflei as bochechas.

Amy soltou um suspiro e saboreou delicadamente um dos biscoitos.

— Pequeno Suichiro, você tem noção do porquê essa casa foi construída nessa colina? – ela colocou a mão em frente a boca enquanto mastigava.

Balancei a cabeça negativamente e me servi de mais um pouco de chá.

— Porque sua avó era uma arquiteta estrangeira que havia acabado de ser largada pelo marido com uma filha doente. – Amy pousou as mãos em seu colo. – Ela então resolveu que aqui seria o refúgio das duas, principalmente para cuidar da saúde de Peach.

Engoli em seco e tossi por causa do biscoito que ficou entalado em minha garganta. Amy deu uma risadinha, pegou o guardanapo de pano e passou-o gentilmente em minha bochecha cheia de migalhas.

— Depois disso você já sabe, minha mãe veio trabalhar como governanta e eu virei a melhor amiga de Peach. Crescemos juntas até que ela quis visitar um dos vilarejos.

— E então? – arregalei os olhos.

— Foi difícil convencer sua avó a deixá-la ir. Mas conseguimos. E no dia em que visitamos o vilarejo, Peach conheceu o seu pai. – rangeu levemente os dentes. – Eu tentei avisá-la de que os dois eram incompatíveis, todavia, os apaixonados não escutam ninguém.

Deixei escapar uma risada abafada, baixei o olhar e encolhi os ombros.

— Por que mamãe se apaixonou pelo papai? Quero dizer, ele é um pouco... Grosso. – sussurrei.

— O Sr. Vulpecula também não é um poço de simpatia. – Amy levou sua xícara aos lábios.

Juro que teria cuspido todo o chá que tomei caso não tivesse coberto a boca com as duas mãos e paralisado no lugar.

— O quê?! – ri absurdamente alto. – Você acha que eu e ele... – fiquei vermelho desde o pescoço até o rosto. – N-Nós, hã, nós... – gesticulei afobado.

A governanta arqueou uma sobrancelha e devolveu sua xícara ao pires com graciosidade, aguardando a hora em que eu conseguiria completar uma frase.

— E-Então, por que ela se apaixonou? – pigarreei.

— Foi o primeiro homem que ela conheceu na vida. Ela se impressionou. – revirou os olhos.

Amy e papai definitivamente tinham uma rixa. Fitei minha xícara pela metade e tive um estalo na cabeça.

— Espera... – fiz um biquinho. – Você disse que ela era doente. Como ela se curou?

Tirando a melancolia que mamãe sempre carregou, ela não me parecia enferma em minhas lembranças de criança.

— Por que não tenta perguntar ao seu pai? – Amy sugeriu.

— Você joga baixo. – rebati manhoso.

— Eu sei. – a mulher deu de ombros e riu. – Pergunte a ele sobre o pedido de casamento. – cochichou.

Franzi as sobrancelhas novamente, peguei um chocolate e coloquei-o de uma vez na boca. Se aquilo era um desafio de Amy, eu cumpriria, por mais que minhas pernas estivessem bambas por debaixo da mesa só de pensar em ter uma conversa com meu pai sobre ele e mamãe.

— Sabe, Suichiro... – Amy suspirou pesadamente e encarou o nada. – Sempre quis o melhor para Peach e permaneci com ela até o fim. – assentiu.

— Você amava a mamãe, não é? – inclinei a cabeça.

— Mais do que você pode imaginar, querido. – ela esboçou um sorriso fraco. – Mas a única coisa que quero agora é que você seja feliz. 

Mastiguei devagar, perdendo a vontade de comer. Eu estava confuso quanto ao que era ser feliz naquele momento. Fitei a janela do escritório de papai, questionando-me se eles já haviam ido para o quarto de tratamento.

Fazia anos que não via Amy, contudo, ainda achava que ela era a que melhor me conhecia naquela casa. Imaginei o que aconteceria se eu lhe contasse de fato sobre o que sentia por Dante, mas preferi guardar segredo.

Conversamos um pouco sobre minha vida em Hibisc e algumas poucas novidades em Hasi onde a vida era estática. Entre uma xícara de chá e outra, avistei algo com o canto dos olhos.

O jardineiro guiava dois homens para um lugar que eu me lembrava muito bem. Ergui-me subitamente, um tanto surpreso e as palavras escaparam de minha boca:

— O túnel da mamãe. 

Uma estátua de anjo marcava o início de uma escada que levava ao subterrâneo onde encontrava-se a sepultura de Peach. Quando crianças, eu e meus irmãos não podíamos descer lá sozinhos, apenas acompanhados de Amy.

Era um lugar escuro e um tanto úmido, iluminado unicamente quando uma fileira de candelabros se acendia na parede. Cheirava a flores mortas e possuía uma porta no fundo que não era aberta nunca, sequer sabíamos para onde ia dar.

— O que estão fazendo? – indaguei em choque.

— Pedi para que fechassem a passagem da escada. – Amy revelou com pesar. – Uma das pacientes do Dr. Tama veio acompanhada de seus dois filhos e um deles caiu ali enquanto brincava.

Cerrei os dentes, desacreditado.

— Não podem fechar por causa disso. – cuspi as palavras. – Crianças não deveriam brincar perto de um túmulo. 

— Suichiro, não fale assim comigo. – a mulher franziu levemente as sobrancelhas.

Pisquei os olhos pausadamente e queimei de constrangimento, pois tive a súbita lembrança de que concordei em levar Úrsula e Leona para brincarem em frente a caverna dos vampiros.

Amy respirou fundo, encolheu os ombros e gesticulou para que eu voltasse a me sentar. Obedeci a contragosto.

— Esse não é o único motivo. – ela falou tristemente. – As outras empregadas estão com medo de que o surto de demônios possa chegar até aqui e acham que o túnel é um esconderijo em potencial para aquele tipo de criatura.

— Mas não vai chegar até aqui! – protestei. – Já estão resolvendo na Guilda de Hibisc e...

A governanta lançou-me um olhar solidário e serviu-me mais um pouco de chá.

— Não temos toda a certeza do mundo. A única coisa que podemos fazer é nos proteger.

— Por favor, deixe aberto. – pedi angustiado. 

— Suichiro… – ela meneou com a cabeça.

— Pelo menos até eu partir novamente. – uni as mãos e olhei-a no fundo dos olhos. 

Amy soltou o ar e fez um curto gesto de confirmação, dando-se por vencida. Um sentimento de alívio preencheu-me momentaneamente e levantei-me de imediato, correndo até os homens que conversavam com o jardineiro. Os três me cumprimentaram com uma breve reverência e escutaram meu pedido, deixando seus materiais ali e afastando-se.

Respirei fundo e encarei a escada sob a estátua, reunindo a coragem necessária para descê-la. Olhei para trás, avistando Amy ainda sentada à mesa, observando-me de longe.

Dei um passo à frente e desci o primeiro degrau. Os candelabros estavam acesos, permitindo que uma luz alaranjada escapasse do túnel e iluminasse meus pés. O cheiro das flores murchas invadiu minhas narinas e a mão que percorria a parede passou a sentir sua umidade.

Terminando de descer a escada e adentrando a pequena sala circular, encontrei em seu centro o enorme retângulo de pedra cinza que cobria a cova de Peach e tinha em sua superfície pétalas secas e caules amassados.

Olhando ao redor, avistei a porta de madeira que nunca era aberta. Alguns empregados chutavam que ela dava para dentro da casa, ou seja, uma passagem interna, já outros supunham que era um porão abandonado. Talvez Amy soubesse a resposta, pois de qualquer forma eu não ousaria abri-la, já que sentia um grande medo somente de estar parado ali.

Recuei alguns passos, sendo tomado pela apreensão que me assombrava desde criança quando entrava no túnel da mamãe. Um nó se formou em minha garganta e os olhos arderam. 

— Desculpa, mamãe. – murmurei.

Queria contar a ela sobre o que os gêmeos me falaram. Queria perguntar a ela qual a decisão certa a tomar. Queria dizer tanto a ela. Mas nunca estaria satisfeito em conversar apenas com um túmulo de pedra.

Funguei e subi as escadas de volta, abandonando a sala circular e voltando para onde o céu era azul e o clima era bom. Suspirei derrotado, deixei os ombros caírem e retornei para perto de Amy. Ainda não era forte o suficiente para lidar com aquilo.

— Que tal irmos para dentro? – ela estendeu-me a mão.

Concordei, analisei uma última vez à estátua de anjo e adentramos a casa. 

 

***

 

Passei o dia explorando a mansão, tendo em vista que Amy possuía seus afazeres, os gêmeos iam para o vilarejo fazer sabe-se lá o que e papai estava cuidando de Dante. Como eu disse, Hasi era estática e a casa Whitlock não fugia a regra.

Não havia um móvel novo sequer ou algum que tivesse mudado de lugar. Nem mesmo meu quarto estava diferente, continuava sendo o mesmo cômodo de paredes cor creme, uma cama gigante com dossel bege e móveis brancos sem uma única partícula de poeira. Claro que não fui eu quem escolhi a decoração, particularmente teria optado por algo mais... Colorido?

Por um curto instante, tive uma visão de mim mesmo no chão daquele quarto, entretanto, em uma versão menor, talvez tivesse por volta dos 8 anos e enchia um caderno com os rabiscos que eu chamava de desenhos.

Um sorriso se formou em meus lábios e eu avancei para a sacada, imaginando se teria mais lembranças do meu pequeno eu. E tive, vendo-me no jardim junto com meu pai. 

“ – Precisa escolher um caminho, Suichiro. – seu semblante era sério. – Se torne um mago tão bom quanto sua mãe foi ou um médico excepcional como eu.

Encolhi os ombros e pressionei os lábios, observando de soslaio como meus irmãos divertiam-se com seu karma de gêmeos, sendo capazes de criar silhuetas brancas idênticas às suas e usá-las para brincar, dançar e lutar.

— Mas eu nunca vi o karma da mamãe, como posso querer ser um mago como ela? – choraminguei. – E ser médico é entediante. – resmunguei.

Era verdade que mamãe trabalhou como maga por um tempo, porém, abandonou o título após a primeira gravidez para se dedicar inteiramente aos filhos.

Papai franziu as sobrancelhas e soltou o ar pelo nariz.

— Então, o que você quer ser?

— E-Eu não sei. – abaixei a cabeça e apertei a barra de minha camisa.

— É bom se decidir. Quando mais cedo começar, melhor se tornará. – ele suspirou impaciente e passou por mim, deixando-me plantado no jardim para escutar as risadas que os gêmeos davam com seus karmas.

Eu não sabia ainda, contudo, estava prestes a descobrir quando uma semana depois recebemos visitas. Tratava-se de um homem baixo de bigode engraçado e feição gentil acompanhado de um pequeno garoto de cabelos brancos e grandes olhos azuis. Eram estrangeiros, todavia, eu entendia o que diziam porque papai era bem rigoroso quanto a quantidade de línguas que devíamos falar.

— É um prazer conhecê-lo, Sr. Arendel. – papai assentiu levemente com a cabeça.

— O prazer é todo meu por querer conhecer minhas invenções, Dr. Tama. – Sr. Arendel sorriu. – Gaspar, cumprimente o doutor.

Foi engraçado ver Gaspar abaixar-se duramente em uma reverência graças a sua roupa engomada e gravata apertada. Ele mantinha os lábios em uma linha reta e tremia as sobrancelhas como se estivesse prendendo a respiração há algum tempo.

Entretanto, todo seu desconforto sumiu ao colocar os olhos em mim. Suas pupilas dilataram e a boca se abriu no maior dos sorrisos.

— Pai, ele também tem um filho! – Gaspar berrou animado.

Sr. Arendel se afundou em constrangimento e tentou acalmar sua criança, já Amy colocou a mão na frente da boca para esconder sua risada e gesticulou para que eu me aproximasse. 

Timidamente, levantei-me do degrau em que estava sentado e apresentei-me para o inventor e seu filho. Gaspar não parou de sorrir por um instante desde que me viu e eu me peguei pensando se suas bochechas não doíam.

— Meninos, que tal vocês brincarem no jardim enquanto seus pais tratam de negócios? – Amy abriu a porta.

Olhei para meu pai a procura de permissão. Ele levantou as sobrancelhas e deu de ombros como se dissesse que eu podia ir em frente. Gaspar não esperou mais nem um segundo, apenas agarrou minha mão e puxou-me para o jardim.

— Quantos anos você tem? – ele perguntou ao caminharmos pela trilha de pedras brancas.

— Oito. – balbuciei. – E v-você? – era um esforço enorme fazer minha voz sair.

— Nove. – ele cruzou os braços atrás da cabeça. – Quando fizer quatorze, vou entrar na Guilda de Hibisc e estudar para ser um inventor! – seu sorriso foi de orelha a orelha.

— G-Guilda? – fitei-o de canto de olho, curioso.

— É, é o lugar que você vai para estudar e treinar. Você pode escolher entre ser um mago, um inventor, um exorcista ou um explorador. – Gaspar vislumbrou o céu. – O que você quer ser quando crescer?

Tive vontade de chorar e agachei-me na metade do caminho. Gaspar estranhou minha ação e piscou os olhos lentamente, entretanto, acompanhou-me ao sentar-se nas pedras sem se importar em sujar sua bermuda bege.

— Eu não sei. – suspirei de modo trêmulo. – Eu detesto meu karma porque ele nunca vai ser tão legal quanto o dos meus irmãos ou do meu pai.

Percebi que Gaspar sorria. Travesso e cúmplice.

— P-Por que está sorrindo? – afastei-me um pouco, envergonhado.

— Eu também odeio o meu karma. Por isso vou ser inventor.  – ele inclinou o torso para trás e sustentou o peso do corpo nas mãos. 

Ponderei um pouco. Não era tão criativo para ser inventor. Não tinha a menor coragem para ser exorcista. O que me restava era…

— Acha que eu devia ser explorador? – fitei-o em busca de aprovação.

— Eu não acho nada. – Gaspar agitou a mão. – Você quem tem que achar, a vida é sua. 

Ele era tão direto e despreocupado que me assustava. 

— Meu pai é inventor e explorador. Ele está procurando dois aprendizes para ensinar o que sabe. Quero dizer, um ele já tem, sou eu. – contou convencido e apontou para si mesmo com o polegar.

Arranquei uma flor do arbusto em minha frente e retirei pétala por pétala, imerso em meus pensamentos. Soltei outro suspiro, dessa vez de tristeza e deixei o corpo cair sentado nas pedras, mesmo sabendo que Amy me mataria por sujar minha bermuda branca.

— Você devia ir morar comigo. – Gaspar disse de repente.

Arregalei os olhos e disparei:

— Ficou maluco, garoto?! 

— Ah, papai sempre diz que eu tenho um parafuso a menos. – ele gargalhou. – Assim como diz que se algum dia eu achar alguém com coragem o suficiente para morar comigo, poderia levá-lo para casa, já que moro sozinho.

— Por quê? – indaguei perplexo.

— Porque o papai está sempre viajando a trabalho ou ocupado na guilda. Eu não conheci minha mãe, porque ela fugiu com outro homem depois que nasci. Então fico sozinho em casa a maior parte do tempo. – Gaspar aspirou a brisa que bateu em nossos rostos.

Não conseguia acreditar naquilo. Ele devia estar mentindo, só podia estar mentindo.

— Como consegue viver assim? – questionei incrédulo.

— E você, como consegue viver tão triste em uma casa grande dessas com vários empregados e coisas legais? – Gaspar lançou-me um olhar interrogativo.

Ruborizei por inteiro e abracei meus joelhos.

— Não se sente solitário? – sussurrei.

— Às vezes. Por isso te chamei para morar comigo. – ele encolheu os ombros. – Você também se sente, não é? – inclinou o rosto em minha direção.

Concordei em um breve aceno de cabeça.

— Então vem comigo para Hibisc. – o garoto me estendeu a mão. – Prometo que vai gostar!

A hesitação percorreu meu corpo, mas a emoção gritava em meu peito, pedindo para enfim ser liberta. Engoli em seco e minha mão vacilante ousou tocar a de Gaspar, apertando-a e assim selando o início de nossa amizade.

Gaspar não me deu tempo para mudar de ideia, levantou-nos em um sobressalto e correu para dentro da mansão novamente, encontrando papai e Sr. Arendel a conversarem na sala de estar.

— Pai, achei alguém para morar comigo! – ele gritou.

— O quê?! – Amy quase derrubou a bandeja de chá que carregava.

— Gaspar! – Sr. Arendel o repreendeu. – Mil desculpas pelo comportamento do meu filho, Dr. Tama. – curvou-se sem jeito.

Papai balançou a cabeça como se não tivesse problema, devolveu sua xícara a bandeja de Amy e nos fitou com um ar de avaliação.

— Sobre o que você está falando, meu jovem? 

Então Gaspar contou tudo ao papai e Amy. Eu tive vontade de sumir. Vontade de apagar o que aconteceu no jardim. Vontade de ser tão pequeno quanto um camundongo para poder correr dali e nunca mais ser encontrado.

— Se Suichiro estiver disposto, é claro que eu permito que ele more em nossa casa e seja meu aprendiz de explorações. Contudo, a decisão final é do Dr. Tama. – Sr. Arendel ajeitou uma das pontas de seu bigode.

— Se esse é o desejo dele, que vá. – papai respondeu.

— Dr. Tama! – Amy deu um grito esganiçado. – Não pode deixá-lo ir assim, Suichiro é apenas uma criança! – seus olhos ficaram marejados.

— Ele enfim decidiu o que quer fazer. – o homem retrucou franzindo as sobrancelhas e abanando a mão.

— Ele tem oito anos, senhor, ele ainda não está na idade para decidir o que quer ser. – ela disse duramente. – O que Peach acharia disso? – colocou a mão em seu peito.

Um silêncio pesado reinou na sala. Até mesmo a agitação de Gaspar esfriou, Sr. Arendel paralisou sua xícara no ar e o maxilar de papai ficou travado. Amy não se deixou abalar, franziu o cenho e cerrou os punhos, disposta a vencer aquela discussão.

— Amy, não se esqueça de que Suichiro é meu filho, não seu. – papai argumentou em um tom rígido capaz de rasgar a atmosfera de tensão. – Ele pode ir e voltar quando quiser. Eu vou pagar todas as despesas dele pelo tempo que precisar.

Amy mordeu o lábio inferior e algumas lágrimas brotaram no canto de seus olhos. Ela respirou fundo, pediu licença e retirou-se da sala a passos pesados. Confesso que depois daquilo uma pequena insegurança cresceu em meu peito e eu quis mudar de ideia para não deixar Amy triste.

Porém, não existia insegurança ou indecisão com Gaspar. Aquela criança gritona e sapeca foi capaz de quebrar o clima gélido da sala, tagarelando sobre tudo o que eu encontraria em Hisbic.”

E foi o que aconteceu. Me despedi de Hasi e parti para Enginóvia no dia seguinte com Gaspar e seu pai para morar na casa de dois andares (que estavam prestes a desabar) repleta de ferramentas, fuligem e desenhos de projetos grudados até no teto.

O pai de Gaspar nos visitava nos intervalos entre seus trabalhos, mas nós nunca nos sentíamos sozinhos de verdade, pois tínhamos um ao outro. Nas noites de tempestade, Gaspar nos protegia formando uma cabana com os lençóis, colocava-me debaixo de seu braço e cantava uma canção de ninar. Brincávamos e gargalhávamos o dia inteiro. Ousávamos testar novas receitas na cozinha. Líamos livros inteiros em uma tarde e escrevíamos nossos dias como se fossem uma jornada épica de dois heróis.

Faltando dois anos para nosso exame de admissão na guilda, Sr. Arendel passou a ficar mais em casa para nos ajudar a treinar e estudar. Ao completarmos 13 e 14 anos, eu e Gaspar já brigávamos um com o outro por motivos banais como privacidade, o maior espaço do quarto ou sobre um estar usando a roupa do outro. Entretanto, no dia seguinte já éramos melhores amigos novamente, prontos para as aventuras e lições que a vida nos reservava.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Suichiro humilde, foi morar com o primeiro pobre que conheceu. Mas agora sabemos como nosso protagonista saiu de casa e os motivos, aliás, me contem o que acharam, vou ficar muito feliz ♥

Beijos.
—Creeper.