Diário de Rosalya escrita por TiaManda


Capítulo 3
O estranho da loja de roupas




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— MALDITO FILHO DA MÃE! VOCÊ ME PAGA! 

As pessoas me olhavam como se fosse louca. Gritando para o nada.

Mas eu não me importava. 

Droga.

— O colar não... Podia ter sido qualquer outra coisa, menos ele. — sussurrei. Droga. Começamos bem a experiência em um novo lugar. 

Senti uma mão quente sobre meu braço.

— Está tudo bem, senhorita?

Ergui levemente a cabeça. Minha visão estava meio embaçada por conta das lágrimas que eu recusava deixar cair, mas mesmo assim ainda consegui visualizar a silhueta de um garoto branco, cabelos pretos. — Quer entrar para tomar água? — ele apontou para uma loja.

Só então me dei conta de que estava no centro comercial da cidade. Muitas lojas, muita movimentação. Algumas pessoas ainda me olhavam de relance. Ah, que vergonha. Que ódio.

Olhei novamente para o garoto, ele ainda me encarava. Assenti com a cabeça. Só queria fugir dali.

Entramos em uma loja de roupas. A decoração do lugar podia ser resumida em paredes bege com detalhes roxos e araras douradas de roupa. Ele me pediu para esperar um minuto antes de entrar por uma porta nos fundos, não demorou muito para retornar, com um copo na mão.

— Aqui está! — me entregou — quer se sentar? Você parece agitada — apenas concordei, mas não esperei ele pegar uma cadeira, sentei no chão, ao lado da porta que ele havia saído. Ele me olhou um pouco confuso.

Tomei um gole de água e respirei fundo tentando não chorar. 

Passado alguns segundos, ele sentou ao meu lado.

— Você quer falar sobre o que aconteceu? — eu o encarei. Ele me olhou, sua expressão era parecida com um misto de preocupação e pena. — M-me desculpe, não queria te magoar.

An? Como assim?

Ah não. 

— Ah não... — sussurrei. Virei rapidamente meu rosto para que ele não visse as lágrimas teimosas. Tarde demais. Não consegui falar nada, estava com muita vergonha. Chorando na frente de um desconhecido depois de ter feito um papelão na rua, muito bom, Rosalya, parabéns.

Ainda sentia seu olhar sobre mim. Apoiei meus braços nos joelhos e escondi meu rosto entre eles.

Senti a presença dele perto de mim durante algum tempo, ninguém falava nada, ele, talvez, por receio de mexer com uma louca chorona, e eu porque a vergonha não deixava. Após uns cinco minutos assim, percebi que não estava mais ao meu lado.

Ergui a cabeça, percorrendo o ambiente a sua procura. Deparei-me com diversas peças únicas. Nunca havia visto nem metade daqueles modelos. Eram inéditos? 

Finalmente o achei. Ele estava atendendo um cliente. Pude vê-lo nitidamente pela primeira vez.

Seus cabelos eram pretos, usava um corte quase Chanel todo repicado - porém com franja - as pontas da frente grandes iam encurtando até a parte de trás. Suas roupas, diferentes. Ele seguia uma linha vitoriana, mas estilosa ao mesmo tempo. Confesso ter me encantado talvez um pouco pelo modo como se vestia e se portava. Era tão incomum e tão original.

Quando terminou de atender, voltou para onde eu estava. Eu ia levantar, mas ele fez um sinal de que não precisava e sentou ao meu lado novamente.

— Desculpa por essa cena toda... — falei sem pensar e me arrependi instantaneamente. Senti a obrigação de me desculpar. Isso tornou o momento ainda mais estranho.

— Não há necessidade disso. A senhorita precisava de um tempo para respirar — me encarou, compreendendo. Seus olhos eram de um cinza intenso — Está melhor?

— Sim, muito obrigada — sorri. Respirei fundo antes de continuar — Você deve estar pensando que sou louca, acho que devo explicações — negou com a cabeça — Vou falar mesmo assim — o olhei como se pedisse permissão. Ele continuou me encarando, em silêncio — Um cara roubou meu colar. Eu estava distraída e ele o puxou. Então corri atrás dele e aconteceu tudo o que você presenciou. 

— Decisão muito arriscada ir atrás dele assim. Podia acabar de uma forma mais... Trágica. 

— Eu sei, mas aquele colar era... É — corrigi — muito importante pra mim. Significa muito — de repente me achei estúpida falando assim. Olhei para a vitrine do outro lado da loja, sentindo-me uma criança entristecida por roubarem o doce.

— Se isso faz a senhorita se sentir melhor, eu não te acho louca — o encarei, surpresa — na verdade, te acho corajosa — sorriu. Sorri de volta. Por essa eu não esperava — talvez a sua coragem ultrapasse um pouco a prudência, mas ainda sim acredito que seja uma coragem válida.

Sorri com a última parte.

— Obrigada, eu acho — agradeci. 

Cerca de cinco pessoas entraram na loja.

— Tenho que ir agora, não vou te atrapalhar — falei. Ele levantou e me ajudou a levantar — Obrigada novamente — dei um beijo em seu rosto, como um gesto de gratidão.

Saí sem esperar resposta.

(...)

Abri a porta com mais força que o necessário, meus pais estavam cozinhando e imediatamente olharam para mim.

— Aconteceu alguma coisa, filha? — minha mãe encarou preocupada. Certamente eu transparecia a raiva que sentia.

Neguei com a cabeça e comecei a subir a escada que levava para o segundo andar.

— Rosa? — meu pai chamou — O que foi agora?

Ele perguntou como se isso fosse um surto diário, rotineiro.

Senti que iria explodir. 

— O que foi? — parei de subir — Eu segui o conselho de vocês. Fui conhecer a cidade. "Aproveitar" — fiz aspas com a mão.

— O que aconteceu, Rosalya? — minha mãe perguntou brava — Por que você está assim?

Nem eu sabia ao certo o porquê. Era o colar, mas tinha mais coisas engasgadas. Respirei fundo, obrigando as lágrimas a voltarem.

Minha mãe me encarou, parecia que estava analisando algo. Seu olhar parou no meu pescoço. Cerrou os olhos.

— Cadê seu colar? Achei que tivesse saído com ele. 

— Pegaram. 

— Como assim pegaram? — meu pai indagou.

— Fui roubada. 

Eles arregalaram os olhos.

— Como assim roubaram? — meu pai veio até mim — Como isso aconteceu?

— Um garoto puxou do meu pescoço e correu em seguida.

— Ele fez mais alguma coisa com você, filha? — minha mãe pegou no meu braço, conferindo se não havia machucados.

— Não. 

— E o que é isso aqui? — papai apontou para meu joelho ralado.

—Tropecei quando corri atrás dele.

— É o quê, Rosalya?!

— Você ficou louca?

— É, eu sei que não devia ter feito isso — cruzei os braços encarando o chão — Mas vocês sabem como aquele colar é importante pra mim.

— Sua vida vale mais que um colar, Rosalya — ela disse brava — Não faça mais isso, por favor — me abraçou, em seguida meu pai nos abraçou.


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