Sair para caminhar foi a coisa certa a se fazer, me vi diante daquele balanço de pneu perto do lago, pensativa, chequei se estava firme e depois sentei, observando o panorama do lago, suspirei. Já estava perto do crepúsculo e tinha dois idiotas nadando juntos como um casal de adolescentes, as meninas conversando no deck só para depois Ymir e Christa se unirem aos dois bocós na água. O casal de mulheres parecia preso naquele episódio de New Girl onde o senhor Tran faz hidro tai-chi no Nick Miller, Historia segurando Ymir que ficava leve flutuando na água, fazendo carinho na barriga enorme da mulher, era puro carinho e cuidado.

Eu estava super decidida sobre minha vida naquela manhã só para tudo ir por água abaixo com os acontecimentos daquela tarde mexendo minhas estruturas. Passar aquele nervoso com o Zeke fez a ficha cair: estou grávida e não posso me arriscar e qual a primeira coisa que faço? Me arrisco. Foi no piloto automático, talvez por ainda estar no começo, fico esquecendo que estou grávida, por sorte na imprudência de hoje era um maluco inofensivo, mas podia ser um maluco perigoso, até parece que nunca vi filmes de terror. Sendo uma loira, estou no topo da lista das primeiras a morrer, qual o problema comigo? 

Claro que eu era uma loira durona com tudo pra ser a survivor girl, mas veio uma voz na minha cabeça dizendo que se eu queria levar aquela gravidez pra frente eu precisava me cuidar ou não daria certo, talvez aquela situação com Zeke tenha sido um sinal que sou muito doida pra isso. Ouvir as meninas foi importante, claro, a experiência delas era uma escola. 

Quem iria imaginar a doida das batatas se tornando mãe? Ela deu conta, mas… O marido dela é o Connie, que é surtado também, mas era um pouco menos que o Armin. Ver Bert e Reiner em ação bem de perto foi outro aprendizado, aqueles homens pareciam naturais naquilo, feitos pra coisa, já imaginava Armin surtando à mínima adversidade.

Se for mesmo pra fazer isso, preciso ser a rocha da nossa família. Só estava um pouco estranha me sentindo tão frágil, eu nunca adoecia, meu corpo sempre foi a minha base, a gravidez é uma coisa que acaba com a pessoa, e não falo de estética. Esse sono, esses enjoos, essa sensibilidade enorme, dor muscular de quem correu uma maratona, minhas TPMs sempre foram tranquilas e meu útero estava cobrando por essa gentileza com lucros e correções monetárias. No fim, era a ansiedade de ter algo assim nas minhas mãos, eu sempre fui uma pessoa tão decidida, acho que desaprendi a lidar com a dúvida. 

Eu não tinha tempo pra isso, literalmente, por isso não tinha mais como ficar voltando atrás por cada sensação de medo, porque era isso, eu não tinha nenhuma culpa, só medo. Suspirei, decidida, levantei do balanço fazendo o caminho de volta até o deck onde havia Mikasa e Sasha, elas conversavam sem notar minha presença, eu tinha passos suaves mesmo, me senti até meio mal de ouvir a conversa delas que não era pra eu ter ouvido embora tivesse meu nome no meio, fiquei parada sem saber o que fazer, só escutando, como uma fofoqueira. Deus, eu estava passando muito tempo com o Marco!

— Eu contei, Sasha… — Mikasa gesticulava. — Foram quarenta minutos com ele provando por A mais B que o Eren é um péssimo marido, péssimo pai, não se importa comigo, não faz nada por mim, que eu faço tudo sozinha e merecia pessoa melhor.  

— Dez anos se passaram e esse homem não supera? — Sasha tomou o licor de seu copo.

— Ele só se supera na falta de noção mesmo, essa ladainha é antiga, porém dessa vez, ele deu todo um plano com opções de “correção de curso" — Fez aspas com os dedos.

— Meu Deus, quem? — Arregalou os olhos. — De novo o surto coletivo do Jean?

— Não, o disco virou mas pra um lado ainda mais arranhado: ambos Armin e Annie, já que ele não estava sabendo da situação delicada dos dois.

— Como assim? Tipo você fazer um trisal com eles? — Sasha estava com a cara no chão, boquiaberta.

— Pelo que deu a entender, sim. É cada merda sem sentido, eu nunca vi os dois dessa forma, o Levi perdeu a cabeça!

— Mulher do céu! Pior que o pai do Bert querendo que a Pieck ficasse com o Jean ao invés do Zeke também. Qual o problema desse povo em querer usar o Jean como substituto dos Jaeger? — Perguntou incrédula. 

— Realmente não sei, só sei que eu fiquei meio ofendida, porém com a sensação de impotência, não posso contar pra Han nem pro Erwin porque com certeza ia dar briga entre os três. Não posso contar nem pro Eren, imagina ouvir uma loucura dessas? Eu que sou filha fico chocada, estou até envergonhada, fico meio constrangida em encarar meu próprio marido, não sei nem com encaro os coitados dos meus amigos… — Ela respirou fundo e desviou o olhar. — Fora o medo de Levi estar certo sobre os problemas do meu casamento.

— Todo casamento tem problemas, mas casamento é seu, você não tem do que se envergonhar, o surto é do Levi e não seu. Fora que é você quem tem que estar satisfeita ou não, sente que o que ele apontou é verdade? E mesmo se for, é algo ruim a ponto de jogar tudo pro alto?

— Umas coisas ele falou e eu nunca nem tinha notado… Mas pesaram um pouco. Só que não quero jogar tudo pro alto, até porque ele não está certo sobre tudo, a reação do Eren na loucura do Zeke que o diga.

— Então não deixe ninguém entrar na sua cabeça, querida. Seu padrasto e sua mãe já demonstraram algum desgosto sobre seu casamento?

— Não, eles sempre respeitaram minhas decisões, mesmo depois de todos esses anos eu não sei exatamente se gostam ou desgostam do Eren, pra ser bem honesta, mas sempre o trataram com o devido respeito. O Eren sempre leva na esportiva essas coisas do Levi, mas eu me irrito, sabe? A situação  do chute, por exemplo, eu paralisei de raiva, o que houve de errado comigo? Eu nunca paraliso! 

— Pra tudo tem uma primeira vez, não vai poder defender o Eren de tudo pra sempre.

— Annie?! — Mikasa finalmente sentiu minha presença, Sasha também virou de uma vez, do susto. — Há quanto tempo está aí?!

— Cheguei agora. — Menti. — Parecia uma conversa séria, não quis atrapalhar, sinto muito pelo chute que seu marido levou, mas ele bem poderia ter desviado. 

— Pior que é verdade. — Sasha caiu na gargalhada.

Depois da minha chegada, elas mudaram de assunto pra disfarçar e eu respeitei. Mas que loucura sem sentido foi essa do Levi? Um trisal comigo e o Armin? Pobre Mikasa, não mereceria um castigo desses. Os dois casais voltaram do lago e o grupo, agora mais numeroso, ficou conversando bobagem à base de licor e os brownie bizarros fazendo efeito. Reiner e Bert já eram chatos normalmente, imagina chapados? Troquei um olhar de desespero com Ymir, que riu às minhas custas e com razão, era uma grande tragédia cômica.

Era aquilo que me guardava pelos próximos dois anos? Pra aguentar aquela gente chata completamente sóbria só segurando na mão de Deus mesmo, mas eu aguentei antes de ter idade o suficiente para beber, o que era mais algum tempo, né? Se bem que quando eu não tinha idade pra beber, eu já fumava, estava sendo um inferno esse tempo sem fumar também, que droga ser saudável! Mas eu daria um jeito, era só arrumar um novo vício. Suspirei jogando o sofrimento antecipado pela janela, sofrimento antecipado era coisa de perdedor. 

Falando em perdedor, houve uma gritaria vindo da direção da casa, ficamos em alerta e logo chegou um Marco ao lado do marido, ambos correndo como duas scream queens desesperadas, eu prendi o riso porque era nessas horas que Jean escorregava na pose de bicha heteronormativa. Os coitados estavam exaustos, cheios de feno no cabelo, as roupas amarrotadas com certeza pela safadeza no celeiro dos Springer. Os homens estavam com cara de desespero e todos ficamos chocados com tamanha loucura.

— O que diabo aconteceu? — Foi Reiner quem perguntou primeiro. 

— Connie e Eren estão tentando conter o Armin que teve uma badtrip e se escondeu no galinheiro. — Marco explicou se encostando na mesa do deck recuperando o fôlego.

— Galinheiro? Onde tem aqueles velociraptors? — Ymir arregalou os olhos. — Não contem comigo pra nada.

— E nem pretendemos, viemos aqui chamar Reiner e Bert pra dar cobertura. — Marco gesticulou entre os dois homens.

— E qual foi o motivo desse colapso? — Bert perguntou, eu estava com o coração na mão.

— Armin surtou porque o Eren contou pra ele dos seus planos. — Jean disse apontando pra mim. — Eles ficaram chapados com os brownies e ainda tomaram um monte de whisky, os três, um caos total entre eles e o Connie.

— Como o Eren sabia dos meus planos? — Arregalei os olhos.

— Foi quando você e Mikasa conversavam em algum momento antes de virem pro lago, ele acabou ouvindo tudo. —  Jean explicou.

— Ótimo! — Bufei. — Eren Jaeger estraga tudo novamente.

— Amiga, eu sinto muito. — Mikasa disse super constrangida com a mão nos lábios. — Mas jamais eu imaginaria uma reação dessas do Armin.

— Claro que não, você não é casada com ele. — Revirei os olhos. — Fiquem todos aqui ou vão direto para dentro, deixa que eu cuido do homem da lua.

— De jeito nenhum! O negócio lá está muito feio. — Garantiu Jean. — Talvez seja interessante você não aparecer por lá.

— É o meu marido, minha vida, minha escolha, eu preciso esclarecer as coisas do meu jeito, não posso simplesmente ficar de braços cruzados.  — Encarei eles. 

— Então o restante das meninas, sim, devem ir pra dentro. — Marco encarou Mikasa e Historia — Vocês cuidam de tudo por aqui?

Elas acenaram positivamente com a cabeça e assim fomos os cinco correndo na frente pra resolver esse babado. Foi por isso que eu não podia contar logo, meu marido é doido, eu que sou eu estava arrasada de medo, imagina o Armin, precisava ter certeza do que eu estava fazendo, a possibilidade de ser mãe solo tinha que ser muito bem calculada na minha rota. Mas se meu pai conseguiu, eu também conseguiria, porém ainda precisava conversar direito com um Armin sóbrio, maldito Eren, eu só não mato aquele palerma com pena de deixar a Mikasa viúva.

Bom, se Armin não quiser ser pai depois de passado esse drama inicial do choque mais os narcóticos, tudo bem, assinarei os papéis do divorcio e me resolvo sozinha dali em diante, vai doer? Vai, mas ninguém morre de amor, ele será meu ex-marido e bola pra frente. Com certeza o Eren contou tudo de mal jeito, o desgraçado, já pintava na minha cabeça dele contando num impulso do nada sem preparar terreno algum. Falando no diabo, nos deparamos com ele e Connie do lado de fora do galinheiro espantando as galinha, os pobres animais corriam com medo dos doidos, se não fosse o meu marido surtando, eu riria.

— Vocês todos me traíram! Sabiam e não me contaram nada! Traidores! — Gritava a voz de Armin de dentro da casinha. — Não quero ver ninguém! Eu quero morrer! Quero morrer devorado por frangos!

— Armin, nenhum frango vai querer te comer! — Eren gritava de volta.

— Meu Deus do céu! — Disse Reiner horrorizado mas prendendo o riso. — Acho que esse vai pro topo da lista dos badtrips.

— Realmente, misericórdia. — Sussurrei quase pra mim mesma.

— Gente! — Connie virou para nós. — O que a Annie faz aqui? Ele não pode vê-la!

— Annie?! — Armin apareceu só com a cabeça do lado de fora na portinha, aos prantos. — Eu não quero saber de você! Você me traiu!

— Que raio de história é essa? — Perguntei incrédula.

— Não sabia que o Armin era tão pró-vida assim. — Marco levou a mão ao peito exasperado.

— Pró-vida?! — Eu não estava entendendo mais nada... Espere!— Ele acha que a minha decisão foi a de abortar?! 

— E não foi!? — Jean e Marco falaram ao mesmo tempo.

— Abortar?! — Eren me perguntou, também confuso. — Espere! Você está grávida também?! É por isso que você escolheu ficar com o outro cara? Porque engravidou dele?

— Meu Deus, é pior que a encomenda! — Connie começou a chorar. — Annie, como pôde? 

— Annie, você traiu o Armin e ainda engravidou do amante?! — Reiner me encarou com a boca aberta.  

— Claro que não, seus idiotas, de onde tiraram essa ideia de doido? Ela engravidou mas foi do próprio Armin! — Bert explicou por mim, graças a Deus, eu estava muito confusa. 

— Espere, como vou saber que você não está acobertando a safadeza da sua amiguinha? — Eren apontou para Bert.

— Como é que é? — A veia da testa do obelisco humano estava quase estourando de raiva. — Veja como fala, Jeager ou explodo sua cabecinha de merda à base do soco!

— Parem já! — Marco se colocou entre os dois.

— Do que diabos você estava falando naquela hora? Que história é essa de outro cara? — Jean apontou para Eren. — Como assim você não sabia da gravidez dela? 

— A coisa toda é por causa da gravidez dela! — Marco completou.

— Do que diabo você estava falando? — Eren apontou para Jean. — Eu falava do outro cara que está na vida da Annie há dois meses.

— E eu falava da gravidez! Pela sua conversa pesada interpretei que estava indo por um caminho obscuro, ou seja, aborto.

— Vocês são péssimos fofoqueiros! — Marco botou as mãos na cabeça.

— Eu que o diga… — Suspirei e sentei numa pedra pra respirar, esses homens iam me fazer sair da maternidade direto pro hospício mesmo. — Gente, foi tudo uma série de mal entendidos! Eu estou grávida do Armin, não tem outro cara! Na verdade, vendo essa confusão aqui pondero veemente não ter cara nenhum e ser mãe solo, que ganho mais. 

— Você está esperando um filho nosso? — Armin finalmente saía do galinheiro.