Os raios de sol, este já inclinado mais para o horizonte, invadem o espaço na sombra da arvore em que dois corpos estão deitados e lhes lança um cobertor de calor suave. A macies da grama e a leve brisa que traz o suave cheiro da primavera deixa uma combinação boa para relaxar, o som do canto dos pássaros e ao da água de um pequeno riacho, somado ao pulo ocasional de algum peixe travesso, apenas complementam a paisagem.

Sob a proteção da arvore Arme se mexe sutilmente, despertando do estado de sono leve. Enquanto sua consciência retorna e o sono se afasta rapidamente, ela boceja e estica seu corpo em uma espreguiçada pequena. Seus sentidos começam a voltar calmamente: O cheiro das flores, o som dos animais próximos, a macies da grama e a leve respiração que bate contra sua bochecha.

Espere, oque?

Arme vira o rosto para o lado devagar, o suficiente para uma boa olhada onde Elesis tira, por incrível que seja, um cochilo. Ou tirava. A líder começa a se mexer levemente e a fazer pequenos ruídos, sinais de que seu sono está começando a desvanecer. Talvez, apenas talvez, ela tenha despertado Elesis sem querer.

Elesis é teimosa e vive sempre pensando de mais nas coisas. Lime havia lhe contato que uma vez ela ficou a noite toda acordada porque não sabia se deveria ir a um evento da rainha usando uma armadura ou o tecido de seda que foi lhe dado. Felizmente Lime, ao amanhecer, a ajudou dando um fim no sofrimento e inquietação da jovem líder sugerindo um traje cerimonial.

Elesis precisa relaxar mais, todos pensam e poucos dizem, e conseguir que a jovem espadachim tire um cochilo sob a sombra de uma arvore perto dos arredores de Canaban é por si só um milagre.

É engraçado, Arme observa, que mesmo dormindo Elesis parece carregar uma tensão natural em seu corpo, como se estivesse pronta para levantar de repente ou se defender de um ataque surpresa, mesmo que a subida e descida calma de seu peito parecessem zombar da tensão presente no corpo da líder, era como ver agua e óleo se misturando.

Arme sabe melhor, talvez mais que todos - a menos que Lire esteja na conta - que velhos hábitos são difíceis de se perder, mesmo que a jornada tenha acabado e a paz se instalado, aquelas noites de sono leve, vigias, onde qualquer barulho acordava a todos, onde infinitas possibilidades se estendiam no pensamento de cada um: Um monstro, um animal, o vento?

Velhos hábitos se recusam a sumir facilmente, talvez seja por isso que quando Arme volta seus olhos para o rosto de Elesis ela não se surpreende em ver aquelas esferas vermelhas olhando-a diretamente.

Ela teria, antigamente, se questionado - e provavelmente reclamado do quanto isso é estranho, apenas para provocar uma briga - por quanto tempo Elesis está a encarado, mas nos dias atuais Arme descobriu que isso realmente não é importante, não mais, principalmente porque aquela Arme nunca se deitaria para um cochilo com uma Elesis a menos de alguns centímetros de distância.

Os olhos de Elesis viajam pelo rosto da Arme, nunca parando em algum ponto específico e Arme se pergunta quando exatamente ela despertou e se ela está procurando alguma coisa em si, perdida em algum pensamento pós-sono ou se ainda não acordou. Sua dúvida se esvai assim que a líder suspira e fecha os olhos novamente tentando aproveitar o resto do sono que ainda lhe sobra.

Arme ri levemente diante da sonolência de Elesis, e Elesis faz uma careta para o som que chegava aos seus ouvidos. Arme ri mais. Talvez ela estivesse mais desperta do que pensava, mas ela não tem culpa, certo?

Elesis faz menção de se levantar diante de toda a situação e Arme dispara suas mãos para o corpo dela, impedindo-a, ganhando uma a encarada com as sobrancelhas levantadas em uma pergunta não dita.

— Apenas mais alguns minutos. — Arme diz.

Elesis levanta ainda mais uma de suas sobrancelhas, inclinada a negar, quando Arme faz um pequeno som de choro acompanhado de uma leve curvada dos lábios, seus olhos se enchem de lagrimas e Elesis suspira porque ela sabe o quanto isso é fingido. Elas ficam assim por quase um minuto até que a ruiva olha para o céu analisando a posição do sol e quanto tempo ainda tem antes do anoitecer.

— Apenas mais alguns minutos. — Repete Elesis e Arme sorri.

Elesis fecha os olhos, seguidamente se Arme, e tenta voltar a dormir, ou ao menos relaxar o suficiente, mas Arme ainda está sorrindo e Elesis pode praticamente sentir isso. A jovem maga aproxima um pouco mais seus corpos, suas mãos encostando levemente, seus peitos mais próximos e fecha os olhos. Elesis não se incomoda, não com isso, mas se sente inquieta, uma familiaridade que percorre seu corpo. A líder abre um olho e, sim, Arme tem um sorriso convencido no rosto.

E uma grama em sua franja.

Como? Pensa, desinteressada em saber a resposta.

Elesis leva a mão até os cabelos roxos e retira o pedaço de grama, ao sentir o leve movimento ao seu redor e pequenos dedos em seu cabelo, sutis como a brisa que percorria o campo, Arme abre os olhos e se depara com Elesis segurando a pequena folha entre o indicador e polegar enquanto balança a cabeça para os lados em um falso desaponto. Um sorriso ameaça surgir em seu rosto assim que vê Arme fazer um biquinho. Elesis nega novamente com a cabeça, mas sente que talvez seus lábios a traem, se inclinado em um sorriso pequeno.

— Você é chata.

E Elesis dá de ombros antes de fechar os olhos novamente. — Seus minutos estão passando. — É a única coisa que diz.

Elesis escuta Arme bufar - o leve vento feito move alguns ruivos de cabelos ruivos próximos ao seu rosto - e murmurar algo, provavelmente outra reclamação, antes se aconchegar mais perto da ruiva.

Dessa vez ambas sorriam.