(In)Definidos escrita por Siaht


Capítulo 1
I. Inimigos


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoas lindas!!!
Tudo bem com vocês?
Sim, abril ainda não acabou e estou de volta com mais uma fanfic sobre os incríveis membros da família Delacour-Weasley. Dessa vez tenho a honra de inaugurar a semana do Louis e, se você me conhece, já sabe que ele é o meu queridinho da nova geração e dono dos meus headcanons mais loucos haha
Antes de mais nada, quero agradecer mais uma vez às organizadoras do Delacour's Month por esse projeto feito sob medida para me deixar muito feliz e recomendar que passem vocês passem na página do DM no Twitter (@delacoursmonth), porque só fanfic maravilhosa..
Bom, essa história é meio que um derivado de "Rubro" (mas não é necessário ter lido), uma fic que escrevi há algum tempo para um desafio de drabbles. Desde então estava querendo escrever algo maior e mais profundo sobre o Louis e a minha O.C. favorita: Frida McLaggen. A oportunidade finalmente surgiu. Espero que vocês da Frida, do Louis e dessa fanfic.
Até as notas finais! ♥



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I

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{inimigos}

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Inimigo. Adjetivo. Aquele que se encontra em oposição, se mostra hostil, contrário, funesto; adverso. Que odeia alguém, que procura prejudicá-lo; nocivo

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Do lado de fora, a tempestade caía sem misericórdia. Do lado de dentro, uma goteira pingava insistentemente, produzindo o mais inoportuno dos sons. O rapaz supunha que, àquela altura, já deveria estar acostumado. Chuva e goteiras eram uma constante tão grande em sua vida que às vezes sentia que iria se dissolver em água. Ou, pelo menos, que o prédio no qual estava iria. Era espantoso, até mesmo admirável, o fato da Academia Shoreline para Abortos se manter de pé, quando tanta umidade corria por suas veias. Mas ali estava ela, apesar de todas as probabilidades, sobrevivendo às intempéries do clima. O garoto quase riu do teor ridículo de seus pensamentos. Quase. Acabou, no entanto, optando por se manter impassível e continuar apenas desenhando imagens desconexas em seu caderno. 

Louis Weasley estava entediado. Era provável que aquele fosse o objetivo, afinal estava na detenção e os castigos não eram feitos para serem divertidos. Ainda assim, não conseguia evitar a frustração, a inquietação que se apoderava de seu corpo inteiro e o desejo de que algo acontecesse, qualquer coisa que fosse suficiente para quebrar a monotonia. Como se estivesse em um filme ruim, no qual vontades se realizavam no instante em que o protagonista as verbalizava, a porta da sala se abriu com um estrondo. E o menino gemeu internamente ao ver quem passava por ela como um furacão. Todo agrupamento de pessoas tinha o seu doido local, aquela pessoa excêntrica e barulhenta que era de bom tom evitar. A da Academia Shoreline para Abortos era Frida McLaggen. 

A menina entregou um bilhete ao senhor Grey, que nem deu ao trabalho de tirar os olhos do livro que lia, e caminhou a passos firmes, o cabelo negro dançando pelas costas,  até o fundo da sala. A única mesa vaga era a que estava ao lado de Louis, então ela se sentou ali, jogando a bolsa – de forma bastante dramática – no chão e produzindo um estalido no processo. Aparentemente, McLaggen não conseguia fazer nada de forma silenciosa, o que era bastante incômodo. Mas, bom, tudo sobre a garota o era. 

Mesmo aceitando alunos dos Estados Unidos e de toda Europa, desde que eles conseguissem compreender o idioma, a Shoreline ainda era o tipo de colégio pequeno o suficiente para que todo mundo se conhecesse. Então, sim, Louis sabia o suficiente sobre Frida para alimentar seu desgosto por ela. Especialmente porque os dois vinham compartilhando aulas pelos últimos três anos. Nos dois primeiros, a garota era apenas o tipo chato de nerd que se envolve demais nas aulas e sabe todas as respostas. Uma sabe-tudo irritante. Recentemente, contudo, a moça resolvera se tornar uma idealista ou algo do tipo. Alguém que precisava questionar tudo e todos, o tempo inteiro, e parecia cultivar algum desejo estúpido de mudar o mundo. Ou, pelo menos, torná-lo mais inclusivo para abortos. Patético, inútil e exaustivo só de imaginar. Ela não percebia que aquilo era um desperdício de tempo e energia?  

— Weasley — a garota cumprimentou de forma seca, após um minuto inteiro. Talvez apenas por julgar que fosse a coisa educada a se fazer. Ela não gostava dele. Louis sabia. Havia um desprezo muito evidente na forma como pronunciava seu sobrenome. Além disso, nem se dignara a lhe dirigir um olhar. Como se fosse muito superior para aquilo. Como se fosse muito superior a ele. Era provável que se sentisse assim. Ela era bastante arrogante. 

—  McLaggen —  ele lhe respondeu com um toque de deboche na voz. Não conseguia evitar. A moça lhe era tão ridícula que o sarcasmo sempre acompanhava qualquer menção a ela. 

O rapaz viu quando ela revirou os olhos, mas nenhum dos dois disse nada. Frida apenas pegou um livro na bolsa e começou a ler, enquanto Louis voltou para seus desenhos. Deveriam estar fazendo a lição de casa, porém, o garoto imaginava que a da garota já estivesse pronta e ele simplesmente não estava afim de fazer tarefas. Além do mais, o senhor Grey não se importava o suficiente para forçá-los a qualquer coisa. Era sempre bom pegar detenções nos dias que o homem ficava encarregado de supervisionar o castigo. Não houve mais conversas, o que não chegava a ser uma surpresa. Louis, afinal, não conseguia imaginar o dia em que teria algo a falar com aquela menina. 

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Havia muitas coisas que irritavam Frida McLaggen. Especialmente naquela quarta-feira. A chuva incessante, as goteiras que criavam poças  nas quais era inevitável escorregar, as almôndegas suspeitas servidas no almoço – que ainda se reviravam em seu estômago –, o ego sensível do professor de História que não aceitava questionamentos, a detenção injusta que recebera… A lista era infinita. No entanto, nada jamais iria conseguir incomodá-la mais do que um potencial desperdiçado. E era exatamente por isso que ter que se sentar, em silêncio,  por uma hora inteira, ao lado de Louis Weasley era a pior punição que alguém poderia lhe infringir. Primeiro, porque ela poderia usar aquela hora para coisas muito mais úteis. Segundo, porque Louis Weasley era a própria definição de potencial desperdiçado. 

O rapaz tinha aparência certa, o sobrenome certo, a reputação certa. Era popular e respeitado pelos colegas, no entanto, parecia incapaz de utilizar sua influência para algo útil. Em outras palavras, Louis Weasley era o próprio rei da Academia Shoreline para Abortos. E Frida McLaggen detestava monarquias. Detestava ainda mais a constante expressão de tédio no rosto do garoto. O desdém que tomava conta daqueles olhos azuis. O nariz empinado que sugeria que se julgava melhor do que todos eles. Bom demais para os meros mortais. Bom demais para se dar ao trabalho de aparecer nas aulas – ou se concentrar quando finalmente dava o ar de sua graça. Legal demais para se importar com o que quer que fosse.  Como alguém que se importava com tudo e todas as coisas, Frida não conseguia não se enfurecer diante daquela postura. Se fosse Louis – homem, branco, europeu, dono de um sobrenome importante e de muita popularidade – as pessoas iriam ouvi-la. Prestariam atenção ao que dizia, ao invés de fazerem chacota com seu nome ou a taxarem como louca. Poderia fazer a diferença para todos naquela escola. No mundo real, no entanto, ela tinha muito pouco poder e Louis preferia ser apenas um babaca presunçoso. A vida às vezes era muito injusta! 

Ciente de que fuzilar o colega de classe com seus pensamentos não resolveria nada, a menina apenas tirou um livro da bolsa e se esforçou para se concentrar na leitura. Suas tarefas de casa já estavam feitas e revisadas.  Ler era, portanto, a melhor coisa que poderia fazer durante aquele martírio.

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A chuva havia diminuído, quando Louis deixou o castigo. O céu, entretanto, continuava bastante nublado e o sol já havia se despedido, embora ainda não fossem 18 horas. Seria mais uma noite fria e tempestuosa, ele sabia. Tendo crescido na Cornualha, o rapaz já estava acostumado a elas. Até as apreciava. Havia algo sobre tempestades que o apaziguava. O fim do mundo eminentemente lhe era sempre reconfortante. Ignorando a garoa, o garoto se dirigiu até seu dormitório e trocou o uniforme cinza e sem graça por moletons e um par de tênis.  Precisava liberar toda a energia caótica que vinha se agitando dentro dele desde o momento em que acordara. Precisava correr. 

Louis Weasley estava sempre correndo. De forma literal e figurada. Era excelente em fugir do que o incomodava e passava boa parte do tempo sonhando com o dia em que poderia abandonar tudo aquilo. Apenas desaparecer no mundo, deixando qualquer vestígio de magia para trás. Também era muito bom em corridas físicas. Se a Shoreline tivesse uma equipe de atletismo, certamente se destacaria. Ele estava no time de natação, é claro, mas aquilo era diferente. Na falta de um incentivo ao desporto, o garoto apenas se levantava ao amanhecer, todos os dias, e corria por uma hora inteira, antes de enfrentar suas aulas e o terror da rotina. Era algo que o ajudava a desanuviar a mente, liberar endorfina e queimar um pouco da ansiedade que estava sempre correndo por suas veias. Em dias muito ruins, como aquele que acabara de ter, corria ao fim da tarde também. Uma forma de exaurir seu corpo e sua cabeça, para que pudesse apenas se jogar em sua cama e ter alguma chance de dormir. 

Certamente havia lógica em seu método, mas seria mentira dizer que pensara muito a respeito e tomara alguma decisão saudável. Louis estava apenas seguindo seus impulsos. Aquela voz interna que o dizia para correr ao menor sinal de ameaça, ao menor sinal de problema, ao menor sinal de estresse. Então, ele pegava seus fones de ouvido, se deixando embalar por algum rock pesado ou indie melancólico, e simplesmente corria. Desejando poder correr para longe daquele lugar, daquela vida, daqueles ossos, daquela pele. Para longe de si mesmo. 

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A porta se fechou com um baque, atraindo a atenção dos quatro adolescentes que ocupavam a pequena mesa. A menina gemeu internamente pelo barulho causado, não tinha a intenção de ser sempre tão barulhenta, porém, não conseguia não existir no volume máximo. 

— Desculpem. — Frida pediu, se aproximando dos colegas — Pela porta e pelo atraso. Fiquei presa na…

— Detenção. — uma garota gorda com um cabelo ruivo de farmácia afirmou, enquanto voltava os olhos para a câmera fotográfica que tinha em mãos. Rachel a conhecia bem demais. 

A menina assentiu, enquanto um breve rubor tomar conta do rosto. 

— Sim, mas isso não importa. Temos uma edição para fechar. 

— Não que alguém vá se queixar, ou até mesmo reparar, se uma nova edição da Tribuna da Shoreline não for distribuída. —  a menina loira, que tinha a cabeça deitada na mesa, comentou irônica.

Frida a ignorou. Havia fundado o jornal do colégio no ano anterior. Sua mãe, Rosalía McLaggen, era jornalista esportiva d’ O Profeta Diário e isso fazia com que o jornalismo fosse uma parte constante de sua vida. Informação era algo que ela valorizava desde a infância, assim como a certeza de que difundir essa informação era importante. Por isso, atormentara a direção da Shoreline até conseguir autorização para fundar o clube de jornalismo. Na verdade, vinha produzindo um protótipo de boletim informativo antes mesmo de qualquer autorização – a imprensa não seria censurada! –, então, o diretor achara mais simples dar a ela o que queria de uma vez. Frida conseguia várias coisas, vencendo as pessoas pelo cansaço. Não era algo de que se envergonhasse.

A possibilidade de operar na legalidade, contudo, não lhe trouxera muito. Ganhara uma sala, pequena e empoeirada, que podia usar para reunir os colegas e o direito de usar os computadores e impressoras da escola. Todo resto era por sua conta e risco. A ideia de um clube de jornalismo não atraíra muita gente, mas ao menos atraíra alunos suficientes para que formasse uma equipe. Ou algo parecido. Rachel Lodge, que havia ganhado uma câmera fotográfica trouxa dos pais no natal e se tornara obcecada por fotografia, era a fotógrafa. Ela não era exatamente boa, porém era esforçada e vinha melhorando. Dylan Watanabe, um estudante do último ano, escrevia sobre esportes e se gabava constantemente do fato da coluna dele ser a única coisa que as pessoas realmente liam. Por “pessoas” ele se referia aos alunos populares, aqueles de quem o menino tentava em vão se aproximar. De qualquer modo, o rapaz, pelo menos, possuía algum conhecimento sobre esportes. Um assunto que, ironicamente, Frida nunca dominara. 

Havia ainda Jacob Scott, um menino de 13 anos, de pele negra, óculos muito grandes no rosto e dono de uma coleção de suéteres esquisitos. Ele era mais empolgado do que competente, a garota, no entanto, gostava de tê-lo por perto e admirava sua animação inocente. O fato dele ser uma das únicas pessoas na escola inteira que realmente prestava atenção no que ela dizia também era um bônus.  Por fim, havia Jodie Mitchell – a loira sarcástica –, ela não era exatamente parte da equipe. Apenas ficava por ali, presente em todas as reuniões, sempre resmungando ou apenas dormindo num canto da mesa. No começo isso enlouquecia Frida. Mas isso fora antes dela perceber que Jodie gostava de Rachel. E talvez a recíproca fosse verdadeira. De uma forma ou de outra, havia alguma coisa acontecendo entre aquelas duas e ela não iria atrapalhar. 

Então, não, eles não eram muitos e definitivamente não eram os melhores jornalistas do mundo. Ainda assim, estavam tentando e conseguiam colocar uma edição da Tribuna em circulação toda semana. Já era alguma coisa. Especialmente quando comparado ao desempenho dos outros clubes ou times do colégio. Não que houvessem muitos. A Shoreline definitivamente não investia em atividades extracurriculares e tudo existia de forma mais ou menos improvisada, sobrevivendo mais da boa vontade dos envolvidos do que de qualquer esforço ou incentivo do colégio. 

Havia uma equipe de natação, que surpreendentemente conseguia vitórias – a maioria deles conquistadas por Louis Weasley – nos poucos campeonatos aos quais se submetia. Um time de lacrosse que era a própria definição do fracasso. Um clube de teatro que contava com meia dúzia de membros, figurinos de segunda mão, um palco caindo aos pedaços e, por algum motivo, encenava Romeu e Julieta, da forma mais ofensiva possível ao texto de Shakespeare, todos os anos, antes do recesso de Natal. A banda da escola consistia basicamente em qualquer pessoa que soubesse tocar um instrumento e quisesse se reunir com outros colegas duas vezes na semana. Existia ainda o clube de xadrez de bruxo, criado pelo professor de matemática, o senhor Williams. Os membros dessa equipe competiam apenas internamente e Frida, que nunca tivera qualquer interesse em xadrez de bruxo, não fazia ideia de como aquilo funcionava. Por fim, havia Candice Morgan e seu grupo de amigas. Candice era estadunidense e parecia determinada a espalhar todos clichês da adolescência trouxa norte-americana pelo colégio. Sendo assim, criara seu próprio grupo – não oficial – de  líderes de torcida. Ou qualquer coisa parecida. Na realidade, aquilo não passa de um agrupamento de meninas, em trajes sumários e feitos por elas próprias, dançando alguma coreografia retirada de um vídeo clipe dos anos 2000, enquanto o time de lacrosse perdia jogos de forma humilhante. Em resumo, a epítome do patético. 

A McLaggen suspirou, sabendo que estava sendo injusta. Além disso, se fosse honesta, perceberia que todas aquelas opções eram bastante lamentáveis e a forma relapsa como eram conduzidas ainda pior. Pensando sobe isso, Frida acabou se dando conta de que deveria escrever um artigo sobre o assunto. Afinal, no fim do dia, era isso o que ela fazia. 

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Louis Weasley e Frida McLaggen eram tão diferentes quanto água e vinho. Gelo e fogo. Dia e noite. Ainda assim, os dois adolescentes tinham duas coisas em comum. A primeira, e mais óbvia, era o fato de ambos serem abortos. O segundo, e mais importante, era o talento único para se envolver em problemas e conseguir detenções. Embora, até isso, fizessem de formas opostas. 

Louis se encrencava com frequência por se importar muito pouco com o que quer que fosse. Matava aulas, ignorava professores, não fazia lições de casa ou trabalhos. Nutria um desprezo arrogante por figuras de autoridade, tendo a mania ultrajante de responder questionamentos com dar de ombros ou revirar de olhos. Além disso, vivia se escondendo em lugares nos quais os alunos eram proibidos de entrar. Claramente não se importava com a escola ou com seu próprio futuro. Era a essência da indiferença. 

Frida, por sua vez, entrava em problemas por se importar demais. A menina tinha certa tendência ao excesso. Se envolvia demais, sentia demais, pensava demais, falava demais, tinha convicções demais. Não conseguia se manter impassível diante ao que considerava errado. Possuía um desejo latente de mudar o mundo e não se importava em fazer o que considerasse necessário para isso. Questionava tudo e a todos, discutia com colegas e professores, espalhava panfletos, pendurava cartazes, escrevia abaixo-assinados, quebrava qualquer regra que considerasse estúpida, iniciava protestos – mesmo que a maioria deles fossem atos solitários.  Não mantinha muito respeito por figuras de autoridade e demonstrava isso as infernizando de todas as formas possíveis. 

Opostos ou não, o fato era que suas constantes infrações conseguiram incomodar suficientemente a direção da escola para que os dois fossem condenados a uma detenção conjunta. Uma detenção sem duração definida e na qual deveriam limpar e organizar a biblioteca do colégio. Há alguns meses, parte do telhado do cômodo havia desabado, durante um temporal. O telhado fora consertado, porém, o caos ainda reinava entre suas paredes. Havia prateleiras quebradas, livros e folhas soltas espalhados por todos os lados, lama, sujeira, mesas e cadeiras reviradas ou completamente destruídas. A água havia secado, entretanto, o cheiro de madeira apodrecida e  mofo eram sufocantes. Naquele momento, a antiga biblioteca se assemelhava mais a uma zona de guerra. 

— O senhor não pode estar falando sério, arrumar tudo isso vai levar uma eternidade! — Louis protestou no instante em que o diretor revelou a ele e Frida o cenário pós-apocalíptico que deveriam consertar. 

O senhor Dempsey sorriu de forma afetada. Ele era um homem de meia-idade, alto e corpulento. Tinha cabelos escuros, começando a se tornar grisalhos nas têmporas, muito bem penteados, dentes alinhados e muito brancos e estava sempre bem vestido. Era o tipo de pessoa que tanto Louis quanto Frida sentiam vontade de socar.  O que lhes garantia um terceiro ponto comum.

— Então, vocês dois ficarão uma eternidade em detenção. O que é ótimo, já que assim terão menos tempo para criar problemas. 

Louis teve que se esforçar muito para não revirar os olhos e piorar sua situação, então, apenas manteve a expressão mal-humorada no rosto. Podia ser um causador de encrenca, mas sabia quando se calar. Frida, por sua vez, praticamente quicava ao seu lado. 

— Eu não acredito que vocês deixaram a situação chegar a esse nível, eu falei várias vezes com o senhor sobre a biblioteca e sobre como alguém precisava fazer algo sobre isso.  havia revolta na voz da menina, fazendo com que seu sotaque se intensificasse. O Weasley não sabia exatamente de onde aquele sotaque vinha, no entanto, sabia que a colega de turma não era britânica. 

— E agora você vai fazer isso, senhorita McLaggen. Não é maravilhoso? —  o diretor respondeu cheio de condescendência.

— O que eu já havia me oferecido para fazer há meses, quando ainda parecia possível salvar algum livro. O senhor não permitiu. 

—  Não era seguro na época. —  foi a resposta seca que recebeu.

—  E agora é? —  Frida questionou. 

—  Agora tenho certeza de que o telhado não vai cair sobre a cabeça de vocês. 

Louis não achava aquilo muito reconfortante, porém, achava mais sensato não se intrometer naquela história. Não tinha nada a ver com aquela discursão, afinal, e não iria se enfiar em mais problemas por causa de Frida McLaggen. Aquela detenção já parecia ruim o suficiente sem provocar Dempsey ainda mais.

— Uau, saber que o teto não vai cair sobre nossas cabeças é realmente um alento. Agora só corremos o risco de contrair algum problema respiratório ou encontrar um zumbi em meio aos escombros do que um dia foi uma biblioteca. Ter deixado essa situação chegar a esse ponto é incompetente e lamentável, só gostaria de deixar isso registrado. — a menina comentou atrevida. Louis quase sentiu uma pontada de admiração por sua coragem. Quase.

Os olhos do diretor faiscaram, ainda assim, a única coisa que ele disse foi: 

— Está registrado, senhorita McLaggen. Agora espero que vocês dois aproveitem o castigo e utilizem esse tempo para refletir sobre suas atitudes e falas. — antes que a garota pudesse retrucar, ele já tinha sumido de vista. 

— Isso é um ultraje! Completamente errado e revoltante! —  Frida afirmou inconformada, enquanto batia os coturnos escuros no chão. 

— É, vai levar uma vida inteira para arrumar esse lugar. —  Louis se sentiu obrigado a acrescentar com um suspiro resignado. Aquele castigo era insanidade, na melhor das hipóteses. O senhor Dempsey devia estar realmente tentando ensinar uma lição aos dois. Ou apenas se vingar. Era mais provável que fosse a segunda opção.

—  Você realmente acha que esse é o problema, Weasley? —  a moça parecia incrédula. Louis realmente não entendia o motivo. Não que ele fosse capaz de entender como a cabeça daquela menina funcionava. O que certamente era algo positivo. 

—  Sim, ter que passar minhas horas livres dentro dessa sala destruída, tentando limpar e arrumar todo esse caos é claramente o meu problema. O que mais seria, McLaggen? 

—  O fato dessa sala destruída ser a biblioteca da nossa escola. A única biblioteca, diga-se de passagem, e que já está devastada há meses. Uma biblioteca que, nos seus melhores dias, já era pequena, mal abastecida e parecia prestes a cair aos pedaços, como a maioria dos prédios desse lugar, mas que agora basicamente não existe. Se a gente conseguir salvar  um terço desses livros será um milagre. Todo esse conhecimento, toda essa história, toda essa arte vai se perder e eu duvido que alguém irá se preocupar em substituí-las. Isso é revoltante. E muito triste. —  Frida parecia prestes a chorar e Louis não sabia bem como reagir diante daquele discurso inflamado.  

Uma parte dele dizia que talvez houvesse sentido nas palavras da garota. A outra só não queria pensar muito sobre aquela situação ou se envolver em qualquer um dos espetáculos de Frida McLaggen. Afinal, ele sabia que ela tinha tendência a fazer tempestade em copo d’água. No fim do dia, não era como se ele realmente se importasse com “todo o conhecimento perdido”, com aquela biblioteca ou já houvesse sequer passado muito tempo por ali. Nada daquilo lhe parecia suficientemente pessoal para que devesse dar à mínima.

—  Você não acha que está exagerando? —  Louis indagou. O olhar assassino que recebeu em resposta o informou de que aquela era claramente a coisa errada a se dizer.

—  Exagerando? 

E lá estava. Frida McLaggen transformando qualquer coisa em uma palestra. Uma palestra muito chata. Era por isso que ele não conseguia ficar perto da garota por mais do que cinco minutos, Louis se lembrou. 

—  Na verdade, McLaggen, eu estava errado mais cedo. —  ele a interrompeu, de forma bastante rude, antes que o discurso começasse  —  O grande problema aqui é ter que cumprir essa detenção com você, dentre todas as pessoas do mundo. —  e de fato era. Para o Weasley ter que aturar aquela menina, seu idealismo estúpido, suas homílias, suas palavras difíceis, sua tagarelice, sua arrogância e toda aquela esquisitice diariamente, por tempo indeterminado, seria um verdadeiro pesadelo. 

—  Você não é exatamente a minha pessoa favorita também, Weasley. —  Frida respondeu indignada. Como se ela já tivesse motivos o suficiente para sentir raiva naquele dia, sem que aquele idiota se somasse à equação... — Na verdade, está bem longe disso. Se você quer saber, eu preferiria cumprir essa detenção com qualquer outra pessoa do mundo. 

Era oficial, ela odiava aquele garoto. Até aquele momento, Frida hesitara em definir o que sentia pelo Weasley como ódio. Tinha uma política pessoal que não incluía odiar abortos. Merlin era testemunha de que eles já eram odiados o suficiente apenas por serem quem eram. Além disso, a menina realmente acreditava na importância de formar laços com pessoas como ela e construir uma comunidade. Sendo honesta, não estava indo muito bem nesse departamento, já que fazer amizades era algo que sempre lhe fora complicado. De qualquer forma, continuava tentando.

Louis Weasley, no entanto, estava excluído de qualquer possibilidade de amizade ou cordialidade. No fim do dia, Frida  não precisava gostar de todos os abortos do mundo só porque eles eram abortos.  Ela se considerava uma feminista, mas isso não fazia com que gostasse de todas as mulheres que já conhecera. Estava livre, então, para detestar Louis o quanto quisesse. O que, no caso, era muito, uma vez que o rapaz era um otário desprezível. Não bastasse a arrogância, o egoísmo, o desdém por tudo e a óbvia limitação intelectual, ele ainda era grosseiro. Uma figura repudiável de todas as formas possíveis. 

— Ótimo. — Louis a respondeu, parecendo nada abalado. — Eu não gosto de você e você não gosta de mim. Você fica no seu canto, eu fico no meu e a gente tenta terminar esse castigo imbecil sem se matar. Tudo bem para você?

Não estava nada bem para, mas era melhor do que nada. Então, ela simplesmente respondeu:

—  Tudo bem.

—  Ok.

—  Ok.

Os dois se deram as costas, enquanto se amaldiçoavam mentalmente, em um começo nada promissor.


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Notas finais do capítulo

Ok, tenham um pouco de paciência com Louis e Frida. Eles são um pouco difíceis (especialmente o Louis nesse capítulo, mas a Frida vai acabar não ficando atrás muito em breve haha), mas são adolescentes cheios de questões e problemas. Juro que eles vão melhorando ao longo da história. Além disso, qual a graça de ler ou escrever sobre pessoas perfeitas?
Esse primeiro capítulo é bem introdutório mesmo, mais para apresentar os personagens, a escola e a relação nada amistosa dos dois haha Em breve volto com mais.
Espero mesmo que tenham gostado! ♥
Beijinhos,
Thaís



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