Race in Heels - Corrida em saltos escrita por badgalkel


Capítulo 17
Seize




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Era noite e a luz do luar iluminava o jantar que era servido na sacada do quarto no décimo sétimo andar de um dos hotéis mais luxuosos do Barein. A brisa fresca ricocheteava o vento, que dançavam sobre o ambiente e fazia as cortinas brancas de seda e toalhas da mesa balançar.

Sentados na mesa redonda de vidro e digerindo não só a comida espetacular daquele rodízio como também a vista da cidade de Sakhir abaixo deles, estavam Liza e Charlie. Eles estavam lado a lado e dispensavam cerimônias para ficar o mais próximo um do outro que a lei da gravidade permitia.

Com uma das pernas jogada por cima da perna de Charlie por baixo na mesa e uma das mãos fazendo um carinho ritmado no cabelo da nuca do monegasco, a jovem já havia dispensado o seu prato depois de se dar por satisfeita.

O rapaz coloca o último pedaço de carne da boca para apoia-se no encosto da cadeira relaxado, assistindo o garçom retirar os seus pratos. Charlie acaricia a perna desnuda em seu colo e aguarda ansiosamente que o buffet termine de recolher o seu material para que pudesse tirar logo aquele vestido do corpo da mulher e finalmente aproveitarem aquela cama gigante do quarto.

Ele a encara nos olhos e sorri diante do sorriso dela. Liza conseguia sempre superar a própria beleza aos olhos de Charlie, ele sempre ficava admirado de quão bela ela era.

Eles ficaram se encarando em silêncio até que os funcionários se aproximassem para avisar que iriam embora.

— Foi um jantar maravilhoso, muito obrigada! – Liza diz levantando-se para apertar a mão dos garçons e acompanha-los até a saída, Charlie a segue. – Definitivamente vou procurar por vocês quando estiver na cidade novamente.

— Obrigado. – o chefe diz. – Tenham uma boa noite.

Quando a porta se fecha e Liza se vira para Charlie, sozinhos no quarto, ele sorri maliciosamente na direção dela.

— Calma, tigrão. – ela diz rindo. – Eu ainda estou na digestão do jantar. Se for pra cima de você é provável que tudo volte em menos de cinco minutos.

Charlie passa a mão na própria barriga, que está com um leve volume por baixo da camisa, e concorda em meio à risos.

Ela tira os sapatos de meio salto do pé e solta os cabelos que estavam presos em um rabo de cavalo longo enquanto o rapaz também libertava os próprios pés e abria alguns botões da camisa lisa.

Eles seguem de volta à varanda e deitam-se abraçados em uma espreguiçadeira, dividindo o espaço limitado enquanto olhavam as estrelas no céu resplandecente daquela noite.

— É uma boa hora para aquela conversa que temos que ter? – o monegasco indaga, fazendo um carinho nos cabelos da mulher.

Liza faz uma careta sofrida.

— Mas está tão bom assim. – ela diz apertando seus braços ao redor do rapaz e enterrando a cabeça no seu peito.

Charlie sorri.

— Uma hora teremos que falar sobre isso.

Ela suspira.

— Tem razão. – diz erguendo-se e cruzando as pernas, posicionando-se de frente à ele. Eliza fica com a expressão séria ao questionar: – O que somos?

O monegasco franze o cenho.

— Como assim, o que somos?

— Digo, um para o outro. - ela esclarece. – Preciso saber as suas reais intenções aqui.

Charlie se endireita na espreguiçadeira, erguendo o tronco para ficar em posição ereta e suspira.

— Eliza, eu não tenho muitas certezas na minha vida. – ele declara. – Mas uma delas é que eu quero você e com isso quero dizer que possamos crescer e criar toda uma vida juntos. Como um casal.

Ela assente vagamente.

— Eu não sou do tipo de homem que fica pulando de relacionamento a relacionamento, enrolando ou iludindo. – Charlie revela. – Meu coração se comprometeu à uma única pessoa e ela é você. Então quando digo que penso em crescer e criar uma vida é que tenho intenção de te namorar, fazer de você a minha esposa e quem sabe num futuro ter uma porrada de pivetes.

Liza não se reprime e acaba por sorrir alegre.

— Quantos você quer ter? – ela questiona. – Preciso de uma previsão, porque se for um time de futebol vou ter que preparar as coisas aqui embaixo.

Charlie ri antes de admitir: - Sou louco para ter um casal. – ela arqueia as sobrancelhas em surpresa.

— Com o garoto sendo mais velho, para cuidar da irmã?! – ela indicia.

— Sim. – ele assente animado. – E afugentar os urubus que vão ficar em cima dela.

A mulher ri, concluindo: - Prevejo um pai muito ciumento e protetor.

Charlie pondera.

— Ela vai poder namorar só aos trinta e casamento só aos quarenta e cinco. – acaba por dizer, causando ainda mais risadas na mulher.

Quando elas vão se dissipando Liza encara os olhos verdes do rapaz encantada.

— Eu quero isso. Eu vejo o quanto quero claramente agora, com você. – diz com a voz terna.

A brisa corre pela varanda e balança os cabelos soltos dela levemente. Ela fecha os olhos curtindo o roçar carinhoso do vento e aproveita para continuar com a sua visão: - Quero que nos apoiemos nos momentos de alegria e de tristeza. – ele entrelaça os dedos nos dela, que sorri com o toque. – Que viajemos o mundo todo e ter um álbum sobre cada lugar que tenhamos batizado com sexo. – ela abre um dos olhos a tempo de ver Charlie assentir com um sorriso malicioso no rosto e ri de leve.

Ela passa a mãos pelos cabelos, jogando-os para trás e mira as luzes da cidade ao horizonte, com olhos sonhadores.

— Depois, você vai brigar comigo por fazer muito esforço durante a gravidez dos nossos filhos, eu sei que isso vai acontecer. – ela ri – Vamos viver em uma casa com quintal grande para que as crianças possam brincar, onde tentaremos construir uma casa na árvore e um balanço. Mas vamos acabar chamando um marceneiro porque a construção vai ficar com uma aparência duvidosa.

Charlie gargalha com a mão sob a barriga.

— Isso é bem a nossa cara. – ele declara ainda pouco risonho. Em seguida completa: - Vamos ter uma piscina para os dias de verão e lareira para os dias de inverno. – se adianta em acrescentar: - E tem que ser em um bairro seguro, perto da escola das crianças, para que elas possam ser livres e ir de bicicleta se quiserem.

— Você e as crianças vão criar um motim para termos um cachorro – ela diz e o monegasco sorri alegre – e eu vou deixar, mesmo que a bagunça fique para eu limpar... – ela suspira extasiada – Ter uma vida plena e feliz, basicamente.

— É... – Charlie concorda – é essa vida que eu também idealizo para nós.

Liza sorri satisfeita pouco antes de ficar mais séria para declarar: - Mas, além de tudo isso, eu também quero me consolidar na minha profissão.

Charlie assente sem hesitações: - É claro.

— E para que isso aconteça nós teríamos que manter esse relacionamento às escondidas.

O monegasco arqueia as sobrancelhas em surpresa.

Liza engole em seco com o silêncio que assola o lugar de súbito.

— Eu sei que não é a melhor das opções. – ela explica – Mas a Cris ainda não encontrou uma brecha no contrato. Ela e os advogados estão estudando uma possibilidade de intervir ou pedir um ajuste que possa vir a nos favorecer. – Liza acaricia os dedos dele entre os seus – Mas enquanto isso não acontece, eu não posso arriscar o que conquistamos.

 Charlie suspira pesadamente.

— Mesmo que a gestão da F2 foi demitida e esse campeonato seja idealizado por pessoas completamente diferentes, não posso confiar plenamente neles. – ela enuncia – Por mais que haja um julgamento e toda a investigação, os advogados deles são bons e não posso esperar que todos do júri haja de forma honesta ou que eles não voltem a me atacar. Então sempre tenho que estar em alerta e estou completamente ciente de todas as possibilidades. Arco com a responsabilidade por mim mesma, assim como Zach disse que a McDraguen também estaria ao meu lado independente do que vier a acontecer. – ela umedece os lábios vagarosamente – Mas, mon amour, eu jamais me perdoaria se você fosse prejudicado por estar com a imagem atrelada à minha.

 Charlie assente com os olhos vidrados em um ponto qualquer da pulseira delicada que Liza usava.

— Eu não posso reivindicar a sua decisão, porque não cabe somente a mim. – ele explica, subindo os olhos até os dela – Estaria te prejudicando tanto quanto e essa é a opção mais sensata a se seguir. Por mais que não seja do meu agrado, também não é o pior que poderia acontecer.

Ela sobe para o colo do monegasco e passa os braços ao redor do pescoço dele.

— É temporário. – ela sopra – Eu prometo.

Ele sorri fraco.

— Vai ser difícil olhar para você e não poder te beijar no meio dos outros. – Charlie diz pousando a mão na cintura dela. – E deixar claro para todo mundo que você é minha.

— Não se preocupe. – ela sorri aproximando o rosto do dele e encostando os seus narizes – Eu coloco qualquer um para correr, já trabalhei com todo o tipo de homem. O importante é que no final da noite é com você que eu vou dividir minha vida.

Eles se beijam finalmente.

(...)

— Então, vamos repassar. Quem sabe?

— Cris, tio Fábio, Danny, Mike, Carlos e Lando.

— Desconfiei que Lando soubesse. Porque contou para ele? – Charlie questiona com a testa franzida.

— Ele viu suas mensagens. – Liza dá de ombros. – Com ele é um olho no simulador e o outro no celular dos outros. Mas ele é de confiança, gosto do garoto.

— Tá legal. – ele sopra.

— Certo. – ela assente.

— Melhor você entrar na frente. – Charlie abre espaço, indicando a porta á frente deles. – Eu espero uns três minutos e vou.

Liza ri.

Ou podemos entrar como colegas de trabalho que se conhecem e estão conversando amigavelmente. – ela diz. – Não precisamos ficar completamente afastamos, só não demonstrar para os outros que a gente troca saliva.

— Fluídos corporais também. – ele arqueia uma sobrancelha maliciosamente.

Ela contém o riso.

Os dois atravessam a porta e adentram a sala de conferência, que naquele dia em específico estava sendo usada como estúdio para tirar as fotos dos pilotos das equipes, fazer o merchandising e vídeo oficial de abertura da nova temporada da Fórmula 1.

Foram espalhadas mesas, cadeiras e penteadeiras de maquiagem pela sala, para retocar as imperfeições nos pilotos; araras com os macacões oficiais de cada equipe; assim como telas brancas e verdes, tripés, iluminadores e toda aparelhagem de fotografia para fazer os cliques.

Pela sala estão espalhados alguns pilotos que já haviam chego, fotógrafos, o pessoal do marketing, supervisores da FIA e um assessor de cada construtora.

— Benedetti, maquiagem agora. – Jordyn esbraveja assim que a pilota entra em seu campo de visão.

— Lacroix, vai se vestir. – Garret diz e então o casal se separa.

Liza se aproxima da maquiadora que está a finalizar o rosto de Daniel a tempo de assistir o rapaz se olhar no espelho e abrir um grande sorriso.

— Obrigado, Guida. – ele agradece e salta da poltrona, parando de frente à Liza. – Hannah Montana disse que ninguém é perfeito, mas aqui estou eu.[1]

 A jovem ri junto á maquiadora e toma o lugar do piloto.

— Oi, é um prazer te conhecer. – a maquiadora ruiva de olhos negros estende a mão em sua direção. De princípio a pilota já pôde perceber o seu jeito despojado e toques da sua personalidade pelas mínimas tatuagens que marcavam o seu braço esquerdo.

— O prazer é meu, Guida. – Liza aperta sua mão rapidamente.

— Vamos só fazer alguns retoques, ou você prefere alguma coisa mais carregada? – ela pergunta mirando a jovem através do espelho à sua frente.

— Só uns retoques. – Eliza diz massageando as bochechas. – Se você conseguir dar aquela atenção nos meus cílios, eu ficaria agradecida.

— Vamos fazer dos seus olhos o destaque desse vídeo. – Guida diz deitando a cabeça de Liza no encosto da poltrona, que sorri.

Enquanto a maquiadora se preparava para iniciar o trabalho na pele da pilota um rapaz alto, de face sorridente, olhos e cabelos castanhos, e jeito tímido aproxima-se de sua penteadeira.

— Al! – Guida salda, se interrompendo para abraça-lo rapidamente e com vigor. – Como foram as férias?

— Ótimas! – ele diz alegremente. – Fui para a Tailândia, fiquei com a família, visitei os meus avós... – ele suspira extasiado – Estou absolutamente com a cabeça limpa para voltar nessa temporada com tudo.

— Precisa estar para aturar aquele seu colega. – Guida diz revirando os olhos enquanto começava a trabalhar no rosto de Liza – Vou te falar, se ele vier com aquela de “não faço maquiagem porque é coisa de maricas” de novo eu vou quebrar a cara dele e deixar ele aparecer no vídeo de abertura com hematomas.

Liza arqueia as sobrancelhas, levemente surpresa pela súbita mudança de humor.

— Falando assim parece que ele é um completo cretino. – Alessandro se encolhe inibido.

— E ele é. Ainda fico perplexa em como vocês conseguem aturar esse cara. Mas, enfim. – Guida suspira de leve, recompondo-se. – Al, esta é Eliza Benedetti, a novata da McDraguen.

O rapaz segue os olhos em sua direção e sorri de maneira cortês: - Não tivemos oportunidade de sermos devidamente apresentados, - ele lhe estende a mão – é um prazer. Sou Alessandro, mas pode me chamar de Al, porque o nome em si é muito comprido.

— O prazer é meu, Al. – ela aperta a mão grande e ossuda, característica de homens da sua estatura sorrindo.

— Parabéns pela sua promoção! – ele parabeniza com um sorriso simpático – Eu assisti as suas últimas corridas na F2 com minha namorada, você foi uma fera no volante!

— Obrigada! – ela diz alegre.

— Por nada. – o tailandês dá de ombros gentilmente. – Tenho que me apressar, meu nome é um dos primeiros a ser chamado e eu não estou nem vestido ainda.

Elas acenam e vê o rapaz se afastar apressado.

— Jorge me disse que o Alessandro é um dos caras mais carismáticos do grid. – Liza comenta, recordando-se do piloto apontar o tailandês como seu melhor amigo.

— O Al é um amor. – Guida concorda, passando o pó no rosto da pilota cuidadosamente. – O Christian Robertt não merece ter ele na equipe, ele não valoriza o Al o suficiente. Acho errado um chefe de equipe beneficiar mais um dos pilotos que o outro. Deveria ser feito por igual.

— Não o conheço, mas já ouvi falar sobre suas polêmicas decisões.

A maquiadora balança a cabeça em negativas, expressando o seu desapontamento.

— Sei que esse esporte é restrito aos melhores entre os melhores e só fica quem mostra resultados, mas isso não é motivo dele tratar as pessoas como se fossem peças que podem ser substituídas – Guida diz em tom de repulsa. – Foi assim quando trocou o Pierre Gregov pelo Al e o Duncan Petrov pelo Max Vandemanen.

Liza já havia sido posta à par de como funcionava a predominância dos pilotos, engenheiros, técnicos e mecânicos pela sua empresária e somada aos comentários assíduos do pessoal da equipe podia dizer que tinha uma base de informações verídicas em que trabalhar para se manter no grupo.

Contudo nenhum deles havia sido tão explícito e desinibido ao relatar os acontecimentos, por isso ela continuou a ouvir as declarações atentamente.

— Com o Pierre, por Deus, foi duro. – Guida suspira sentida – Ele também é um amor, tão querido quanto Al. Merecia mais. Muito mais. – ela assente veemente – Pelo menos conseguiu ficar na Alfa Toro.

A Alfa Toro nada mais era que a segunda equipe da construtora Rang Blue Racing no campeonato, a segunda melhor construtora da atualidade. Haviam engenheiros, técnicos, estrutura de máquinas e estratégias diferentes, contudo comandadas por um único proeminente e este era Christian Robertt.

 A RBR, sua abreviação, se consolidava como a equipe principal enquanto a outra era posta como secundária. Porém as vagas em ambas eram altamente disputadas.

No entanto, todo piloto sabia que se ele quisesse ganhar destaque e ter a possibilidade de correr com o carro com maiores chances de alcançar a vitória da temporada teria que fazer por merecer a vaga na principal. E estas atualmente pertenciam à Max Vandemanen e Alessandro Arthit.

Em resumo o campeonato era regido por dez equipes com dois pilotos cada e todas elas tinham as suas particularidades. Algumas delas já haviam sido grandes com feitos históricos no esporte que tentavam se adequar ao mercado, como a Witchkan, enquanto outras progrediam com a modernidade e se destacavam cada vez mais, como a dominante por anos consecutivos Mustof.

— O Petrov se segurou no campeonato pela Witchkan e hoje é parceiro do Jorge. Não está entre as melhores, mas pelo menos não está fora – Guida informa.

A ocupação de uma vaga se consolida por variáveis em comum entre piloto e construtora. Ambas as partes se faziam por demasiadamente interessados em uma perfeita harmonia, o piloto levando em consideração o respaldado tecnológico e vantagens oferecidas que o levassem ao topo e a construtora pela desenvoltura e habilidades condutoras, estratégicas, físicas e, principalmente, emocionais do seu condutor que permitissem alcançar o mesmo objetivo.

Contudo, há quem que opte por se deixar persuadir por quantias exorbitantes para patrocínio e vantagens privilegiadas para consolidar a sua equipe ao invés de talento e compatibilidade. E não é anormal ver a preferência por pilotos que oferecem valores monetários para se alicerçar uma vaga.

— Sei que quem define essas trocas é o chefe, - Guida comenta – Mas o Manen é sujo. Roubou a vaga do próprio amigo sem hesitação nenhuma.

A história de Vandemanen e Petrov: amigos, porém rivais, era antiga e bem conhecida no mundo automobilístico. O estreante que tomara a vaga do veterano e se apoderou dela com sucesso.

— Sinto um cheiro de remorso? – Liza questiona sorrindo contida.

A maquiadora cede aos risos, descontraída.

— Nem te conto. – ela diz entre dentes - Antes desse filho da mãe entrar eu pensava que o mais desagradável do grid era o próprio Petrov. Só que ele é meio fechado, frio e calado, mas porque é russo. Sabe o que dizem deles. – Guida arqueia uma das sobrancelhas esperta – Mas o Vandemanen supera o amigo em escalas inimagináveis do ridículo.

— É de quem estava falado com o Al? – Liza questiona observadora.

— Sim. – ela grunhe. – O moleque é uma perfeita Diva, só fala merda e é a criatura mais mimada que eu já vi, como se o mundo fosse dele e nós apenas vivêssemos aqui.

Guida arregala os olhos ao perceber que havia falado alto demais e tampa a própria boca. Ela olha ao seu redor e volta á Liza aos sopros: - Meu Deus, me desculpe. Ele consegue me tirar do sério sem nem estar aqui ainda. – ela olha no relógio de pulso – O que, aliás, faz dele um atrasado. Confirmando a minha fala sobre ele ser Diva.

Liza ri fraco.

— Tudo bem, eu preciso mesmo ter uma impressão feminina dos garotos. Saber quem é confiável ou não. – ela diz, recordando-se do acontecimento com Afonso e Felipe.

A ruiva sorri animada, Liza soube naquele estante que estava falando com a fofoqueira da corporação e que deveria tomar cuidado com o que revelava á ela.

— Sendo assim. – a maquiadora diz e começa a pentear os cílios da mulher com o rímel – Vou falar de quem tenho mais contato. Jogo rápido. – e toma ar antes de despejar seus comentários aos murmúrios: – Fica esperta com o Lance Spprol. Não por ele em si, mas sim pelo pai. Lawrence Spprol é dono da construtora Astro Martíni e faz de tudo para o filho terminar no pódio; Sebastian Weber é um cara gente boa, mas é mais introvertido que extrovertido, então se ele não falar muito com você não pense que você fez alguma coisa errada; Walter Korhonen, parceiro do Houston, é um homem que aparenta ser fechado, mas é bem simpático e gosta de soltar umas pérolas de vez em quando.

Liza arqueia as sobrancelhas, levemente surpresa com a quantidade de informações detalhadas. A mulher continua: - Fernando Rodríguez é a própria rainha, cheio de não me toques e se acha o rei do gado; - a pilota gargalha espontaneamente e Guida a acompanha – É sério. Mas ainda dá para ter uma conversa agradável com ele.

A maquiadora cessa o riso para prosseguir: – Orlando é um fofo, sempre me oferece petiscos mesmo que sejam exclusivos para os pilotos. Ele é um cavalheiro, mas é jovem e também gosta de tirar um sarro de vez em quando; Daniel é o próprio palhaço, como você pôde ver; Carlos Sánchez é uma versão mais contida do Daniel, mas ambos são gentis e atenciosos; O Gonzáles é do bem, mas igualmente fechado e introvertido; e, por último, mas não menos importante, Charlie: o menino de ouro. – Liza sorri automaticamente – Ele é um docinho e o próprio cavalheirismo em pessoa. É completamente focado no trabalho e competitivo, mas afinal quem daqui não é?! – Guida ri fraco – Dessa vez tô vendo ele mais relaxado e de duas uma, ou ele se sentia muito pressionado com o Weber como parceiro ou tem mulher envolvida aí.

A pilota não consegue conter o riso.

— Em resumo, acho que é isso. – a mulher suspira, recuperando o fôlego enquanto apoiava as mãos nas cinturas – Pelo seu jeitinho, vai se dar bem. Os homens se derretem por uma mulher educada e simpática, além de que você é maravilhosa e, pelo o que eu soube, é muito talentosa. Vai se entrosar rapidinho. – ela sorri e abre espaço para a pilota conferir o resultado da produção no espelho. – Terminei.

Eliza olha seu reflexo e sorri satisfeita.

— Obrigada. Ficou do jeito que eu queria.

— De nada, querida. – ela responde quando a pilota desce da poltrona. – Vai ser ótimo trabalhar com você.

Elas se despedem rapidamente e Liza tem em mente que havia sabido em menos de trinta minutos os perfis dos pilotos que as revistas de fofoca levavam anos para construir, e na maioria das vezes de forma errônea.  Ela ri consigo mesma.

Logo Eliza é direcionada às araras de roupas para se trocar.

Lá encontra Orlando.

— Essa droga emperrou. – ele reclamava com a mão no zíper do macacão, tentando puxá-lo para cima. Fazia tanta força que seu rosto já estava vermelho. – E olha que é novo, imagine se não fosse.

— Calma, Noward. Desse jeito vai quebrar. – ela diz e se aproxima do parceiro.

Ele solta o ar e deixa os braços caírem ao lado do corpo enquanto Liza movimentava o zíper para cima e para baixo para desemperrá-lo.

— Vou ter que usar esse macacão para sempre. – o rapaz resmunga. – Na hora de dormir, para tomar banho, para competir, na academia. – Liza ri – Nunca a expressão “mil e uma utilidades” soou tão literal.

— Para de ser dramático. – ela diz aos risos e se aproxima mais para ver o que segurava a peça. Notando que estava enroscada em um fio solto do tecido ela aumenta a velocidade do movimento para que desatrelasse.

— Pagar boquete no trabalho é legal? – eles ouvem uma voz rouca soar num inglês com sotaque enxuto holandês. Com o zíper preso na região da barriga do piloto, a impressão de quem via por trás não era a das mais apropriadas. Liza sente seu rosto esquentar imediatamente e se endireita. – Tenho quase certeza de que vocês podem ser presos por isso.

— Vai se foder, Manen. – Orlando responde rindo.

Liza força o zíper uma última vez e ele sobe com facilidade até o peito do parceiro. Custava ter colaborado antes, zíper maldito?

— Fecha com cuidado da próxima vez. – ela sopra ao parceiro e segue para a arara de roupas, para pegar o próprio macacão.

Como já estava com uma roupa leve , só teve que vestir o traje por cima. Ela passa as pernas pelas barras da calça, sobe o traje até o traseiro – onde tem que manusear o tecido vagarosamente para que moldasse ao corpo –, chega até a cintura e é só quando vai vestir as mangas que percebe o olhar feroz de Max em sua direção.

O holandês mal prestava atenção no que Orlando lhe dizia, apenas assentindo vez ou outra. Seus olhos estavam fixamente presos no busto da mulher e ela não pôde não se sentir incomodada com tal fato. Rapidamente tratou de fechar o zíper e tapar a visão do piloto pervertido.

Ponto negativo para você, Manen.

Ela fecha a gola no pescoço e caminha em direção à saída das araras, sendo obrigada a passar ao lado de Orlando e Max.

O Holandês a segura pelo braço, para a sua surpresa.

— Não vai me falar oi, coisinha linda?! – ele questiona com um sorriso cafajeste.

— Dá licença. – Liza puxa o braço da mão do rapaz com força e se afasta dele. – Existe um jeito decente de se cumprimentar uma mulher. E este com certeza não é ele.

Max parece intrigado pelo atrevimento, o choque em seus olhos só não supre o sorrisinho cínico em seus lábios como também o complementa.

— Não pensei que fosse do tipo afrescalhada, já que conseguiu chegar até aqui. – ele rebate. – Nenhuma maricas sobrevive a pressão desse campeonato. Neste caso a saída é cortesia da casa, meu bem. Vai para uma academia de balé que você ganha mais.

Liza ri desacreditada, sem desviar os olhos do azul sombrio que eram os dele, que era alguns centímetros mais alto que ela.

— Você vai tirar esse sorriso do rosto quando ver a traseira do meu carro passar a trezentos por hora por você na pista. – Liza diz cruzando os braços. – E quando vier me perguntar como fiz isso, eu vou ser generosa e te ensinar também a como chegar em uma mulher. Quem sabe aí você não para de bater punheta e começa a amadurecer.

Max fica sério, seu maxilar trava.

— Por que, vai querer me dar para subir de posição no grid? Esse é o seu lance?

Ela dá um passo para frente, de queixo erguido.

— Dar para você para subir de posição? – Liza ri debochada, arqueando uma sobrancelha – Desce desse pedestal Manen, você não é tudo isso nem como piloto, nem como homem. Não aguentaria o tranco.

Orlando tapa a boca para controlar a risada fulminante que sobe pela sua garganta e logo se adianta em intervir quando vê o holandês prestes a abrir a boca.

— Melhor calar a boca, Maximilian. Com essa aqui o buraco é mais embaixo. – Orlando se pronuncia e puxa a pilota pelos ombros delicadamente, guiando-a até a saída das araras. – O Vandemanen de boca fechada é um grande poeta, Lizzie. Faça como eu, ignore o primata que habita nele.

— Você ainda vai voltar atrás, princesa. – o holandês esbraveja por uma última vez, chamando a atenção de quem ainda não tinha se atentado a pequena confusão.

Orlando continua a empurrando até que tomassem uma boa distância. Liza respira fundo quando eles param perto da tela branca onde Carlos era fotografado.

— Não liga para o que o Max diz. – Orlando fala. – Ele tem todo esse jeito de babaca, mas no fundo, bem lá o fundo mesmo, é um cara do bem. Ele só não tem trava na porra da língua e é esquentadinho, mas poucos conseguem ver que é só isso.

— Que cara ridículo. – ela sopra, lembrando-se do que Guida tinha acabado de te relatar.

— Dizem que isso é “personalidade”. – Orlando abre aspas no ar. – O Danny diz que foi falta de surra.

Liza cede ao riso, descontraindo o clima tenso.

— Tá mais para falta de educação.

A atenção dos dois é voltada para Daniel, que se aproxima em passadas rápidas e empolgadas.

— Você mal começou e eu já te venero. – ele diz se direcionando à Liza. – Me conta, ver você jantar o Manen uma vez vai ser o ponto auge da temporada ou podemos esperar por mais?

Eliza ri.

— Não tenho a intenção de ter muito contato com esse tipo de pessoa, então espero que essa seja a única vez.

Ah, não. – Daniel resmunga – Dez segundos com ele e você já não gosta do cara. Acho que isso é um recorde.

Orlando e Liza riem.

— Mas, falando sério. – Danny diminui o sorriso – Ele tem um temperamento difícil e faz a gente querer socar ele, mas quando não está sendo arrogante até que dá para ter uma conversa agradável. Os primeiros dias são mais difíceis porque ele quer se exibir, feito um pavão. Mas logo isso passa.

— Ele que não tente se engraçar comigo de novo que eu corto as asinhas dele. – ela diz firme.

— Quando você era da Rang Blue ele era mais amigável. – Orlando comenta à Daniel. – Nunca pensei que isso sairia da minha boca algum dia, mas você fez dele uma pessoa melhor.

Liza observa atenta.

— É, porque eu sou o bom samaritano e gente boa para caramba. – Daniel sorri – Ficamos mais próximos depois que eu saí da Rang Blue do que quando estava lá, acreditem se quiser. Ele levava o que acontecia nas corridas muito pro lado pessoal, começou a ficar razinza e eu pulei fora porque, além de outros motivos, não curto estrelismo.

— Alguém tem que colocar esse cara no lugar dele. – Liza diz.

— Está tudo bem por aqui? – Charlie questiona quando se junta ao trio, fitando Liza diretamente.

— Só com o Manen que não. – Daniel diz sorrindo. – Acho que até ele está sentindo que as coisas vão começar a mudar por aqui.

Os quatro encaram Max, que está com o semblante fechado vidrado em algum ponto do carpete no chão.


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Notas finais do capítulo

Glossário

Hannah Montana é uma série de televisão estadunidense estrelada por Miley Cyrus. O seriado conta a história de Miley Stewart, uma garota do ensino médio que esconde um segredo de ser a pop star Hannah Montana. Um de seus hits de sucesso é Nobody is Perfect, que em tradução literal significa "Ninguém é perfeito".

Referências Bibliográficas

MONTANA, Hannah. Nobody is perfect. Walt Disney Records: 2008. Suporte: 3:21min;



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