III

abril – páscoa

Se ela se concentrasse em respirar, apenas em puxar o ar e soltar em seguida, apenas em forçar seus músculos torácicos a contraírem o suficiente para o ar entrar, tudo daria certo. E, claro, se ela controlasse seus dedos e não seguisse o impulso de olhar quão cheia a plateia estava.

Se bem que ela não precisava olhar diretamente para saber que tinha muita gente ali – o barulho constante que todas as vozes em conjunto faziam era alto o suficiente para uma amostra da quantidade de pessoas.

Concentrou-se na sua respiração mais uma vez, enquanto voltava para o camarim. Apesar de ser a protagonista, não tinha um só para si, o dividia com a garota que fazia a mãe de Julieta – uma veterana na NYU também – e com a que fazia a mãe de Romeu – recém-formada, sendo essa sua última apresentação com a equipe de teatro da NYU. Coincidentemente, entretanto, nenhuma das duas estava ali no momento, dando a ela a chance de se concentrar sozinha.

Estaria interpretando um papel que já conhecia, é verdade, mas isso não diminuía nem um pouco a ansiedade que começava a subir, começando na ponta dos dedos do seu pé, até alcançar a sua sobrancelha. A cobrança era surreal, e o nível da produção era exorbitantemente mais elevado do que sua peça no ensino médio – que, perto da que era parte agora, parecia uma brincadeira de jardim de infância.

Não podia se dar o luxo de errar aqui, ela tinha plena consciência disso. Havia sido uma oportunidade única: uma caloura no papel de protagonista? A última vez que isso havia acontecido foi a seis anos atrás – e a caloura em questão era ninguém menos que Anne Bartow, uma lenda viva nos corredores da NYU, então nem se comparava com a situação que estava vivendo agora.

Ela tinha de parar de pensar nisso, antes que a espiral se afunilasse demais e ela não conseguisse mais escapar. Estava já há ano sem ter um ataque de pânico, conseguindo controlar sua ansiedade e se virar bem. Não podia se permitir cair nesses trilhos novamente, especialmente tão perto da hora do espetáculo.

Pensou em toda sua família ali para vê-la: sua mãe estava ali, Jack estava ali, até mesmo seu pai tinha vindo. Assim como todos os Mendoza, e Spencer. E Joe, e a nova namorada do pai. Todos estavam ali, ela sorriu com os olhos cerrados, tentando mentalizar todos eles sentados na plateia.

Mas seu coração afundou um pouco, e seu sorriso vacilou, quando percebeu que em sua imagem mental, havia mais uma pessoa na plateia, sentada ao lado de Spencer.  

Não havia entrado em contato com ele desde então, e nem ele com ela. Talvez devesse deixar sua insegurança de lado e dar o primeiro passo? Talvez ele estivesse na mesma posição que ela, também querendo receber uma notícia e só esperando que ela tomasse a iniciativa? Ou talvez não. Talvez ele já tivesse superado – o que seria o esperado.

Já era um novo ano, já haviam se passado oito meses. Ela já devia ter superado – ela estava realmente sendo tão dramática sobre isso? Eles se davam bem, claro, mas ficaram juntos por poucos meses. E, até onde sabia, Aiden podia estar agora mesmo do outro lado do país, ou, não sei, fazendo um mochilão pela Europa. Podia estar noivo de outra pessoa, podia ter se descoberto um talento para mágica e estar performando shows na América do Sul.

— Ei, Katie – Mike, da produção, colocou apenas a cabeça para dentro do cômodo – Começamos em cinco.

Ela acenou em resposta, alisando o tecido bordado em predarias do seu vestido.

Era a protagonista de uma peça produzida pela NYU, estava na hora de assumir seu papel. Assim como era hora de assumir seu novo papel como estudante da NYU, abraçar sua nova vida em New York. De deixar o passado para trás.

Respira fundo, já em sua posição. Percebe o momento em que as cortinas se abrem, a plateia aplaude. É hora de entrar em cena.