Amnesia escrita por Giovanna


Capítulo 3
Capítulo 3




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Peter gostaria de dizer que teve uma boa noite de sono, mas havia sido ensinado a não mentir.

Fechar os olhos era fácil, o difícil era conseguir acalmar a ansiedade em seu peito para algo assim. Havia marcado de ver Wade depois da reunião e queria estar descansado, mas seu corpo parecia pensar o contrário. Com toda a energia que tinha no momento, seria fácil construir um outro cômodo dentro do quarto de hotel se desejasse.

Irritado por não conseguir dormir, Peter se levanta e faz uma xícara de café para si mesmo na máquina de expresso. Logo, se senta na mesa e abre seu laptop. Já que não iria dormir, poderia pelo menos acabar com a curiosidade que estava.

Não stalkeava alguém a anos. Podia dizer que era um profissional no ramo na época do colégio, porém havia perdido parte do interesse e das habilidades de busca quando foi para a faculdade. Contudo, sempre haveria um momento para resgatar um hobbie antigo.

Passou horas buscando informações públicas sobre Wade Wilson e para sua surpresa, quase não encontrou nada.

Suas contas antigas tinham sido desativadas, nenhum dos amigos do colégio conseguiam entrar em contato com ele e o único vestígio de que ele ainda existia era seu rosto lindo e seu cabelo loiro reluzindo em uma foto de família em frente a mansão Xavier.

Peter já havia visitado o local algumas vezes. Charles e Erik eram os donos e eram considerados os avôs de Wade, mesmo que o loiro fosse adotado, eles não pareciam ligar para isso. Tinha boas memórias do lugar e imaginou se Wade ainda morava ali.

— Pelo amor de Deus, Peter, você tem que parar com isso. – O castanho repreende a si mesmo. – Passando a madrugada toda buscando por informações do ex-namorado, parece até que eu sou louco. Bom, estou falando sozinho, então talvez eu seja.

O castanho abafa um grito frustrado no travesseiro. Como poderia ter uma vida em New York, se estava obcecado para saber coisas do ex-namorado? Ele balança a cabeça, precisava parar com isso ou ia se tornar um caso perdido.

O telefone toca, mostrando que o sol já havia nascido.

— Ótimo, passei a noite em claro. – O castanho deixa o corpo cair na cama uma última vez, antes de se levantar para ir ao trabalho.

[ . . . ]

O dia mal havia começado e a cidade parecia que nunca tinha dormido.

O prédio da Stark Enterprise se encontrava no meio de todo aquele formigueiro que era New York e Peter conseguiria reconhece-lo a quilômetros de distância. Seu pai nunca foi adepto dos modelos comuns de prédios.

Apesar de já terem um prédio, Peter estaria encarregado de uma construção em larga escala bem longe do centro. O local seria enorme, com espaço para construir até mesmo 4 estádios de futebol americano se quisessem. Esse era o tipo de construção que Tony confiava a Peter, mesmo sendo seu primeiro trabalho.

O castanho entrou no prédio prateado do centro e enquanto se dirigia ao elevador, conseguia sentir toda a atmosfera do local mudar. Seu corpo queimava como fogo com os olhares, mas a pressão parecia ainda mais fria. Ele era o filho do dono, não esperava ser recebido com nada mais do que falsa carisma e olhares tortos de ódio.

— Olá, bom dia, eu estou aqui para ver...

— Peter Stark! – Um homem alto, de cabelos castanhos arrumados em um corte limpo e impecável se aproximava em seu terno preto e caro. – O homem que eu estava esperando.

Peter dá um sorriso para a secretária que nem mesmo moveu um músculo desde sua chegada a aquele andar, ela parecia hipnotizada pelo status à sua frente.

— Quentin Beck, eu presumo. – Peter abre um sorriso simpático enquanto tem sua mão apertada.

— Serei seu aliado na construção da nova sede. – Quentin, que tinha olhos tão azuis quanto Wade, tem a delicadeza de não comentar sobre o rosto cansado do novo chefe. – Tudo o que precisar, pode contar comigo.

— Obrigado. – Peter passa a caminhar com o homem, tentando ignorar os olhares que recebe. – Todos estão prontos para a reunião?

— Sim, senhor. Estávamos esperando o senhor. – Ele fala de forma cordial, porém percebe que aquilo pode ter parecido uma afronta. – Não que o senhor esteja atrasado, na verdade, está no tempo correto, mas nos adiantamos para deixar tudo pronto e...

Peter levanta a mão, pausando o homem, enquanto abre um sorriso.

— Não se preocupe, Sr. Beck. Eu não levei isso como um insulto. – Peter tranquiliza o homem. – E se possível, me chame de Peter, vamos passar muito tempo juntos, é melhor se livrar das formalidades.

Quentin assente, enquanto abre a porta para o garoto.

A visão da sala de reuniões com certeza era cômica. Peter era o menor e mais novo, mas ainda assim se sentava na cadeira da ponta, indicando ser o chefe. Todos os outros homens e mulheres, se submetendo a alguém tão novo, era engraçado de se ver.

Peter estava orgulhoso de si mesmo, por não ter desabado com a pressão inicial. Sabia que nada daquilo seria fácil e teria que lutar para descontruir a imagem ruim que já tinham construído sobre si, sem nem mesmo conhece-lo.

Entretanto, enquanto ouvia as ideias para a nova sede sendo apresentadas, não podia deixar de desejar que tudo aquilo passasse rapidamente, havia outro local ao qual ele queria ir e logo.

[ . . . ]

— Não se preocupa, Fê. – Peter assegura a amiga pelo telefone. – Eu não vou fazer isso. Ok, até mais tarde.

O castanho desliga o telefone e segura o volante apreensivo. Não era costume seu mentir aos amigos e Felícia conseguia lê-lo com facilidade, estava surpreso por ela não ter ligado antes.

Havia contato sobre o encontro que teria com Wade e a loira conseguia imaginar o quão apreensivo Peter estaria. O pequeno era a pessoa mais insistente e teimosa que Felícia podia conhecer e era claro, que ele estaria se matando pela demora para o horário do encontro.

Peter olhou uma última vez pela janela do carro, talvez tudo aquilo fosse realmente uma péssima ideia, ele nem sabia se Wade morava com os avôs ainda.

— Só uma olhadinha, não vai arrancar pedaço. – Ele promete a si mesmo enquanto sai do carro.

Estava no quarto do hotel tentando se ocupar com os planos da nova sede, porém a chave em cima de sua escrivaninha parecia chamá-lo. Se pegou fantasiando como seria o encontro com Wade e com o que conversariam. Seria uma conversa agradável ou algo forçado? Talvez eles nem mesmo fossem conversar, quem sabe Wade só pegasse a chave de volta e o ignorasse completamente.

Medo ou curiosidade, não importava como Peter chama-se, precisava tirar aquela chave de sua pose ou jamais conseguiria se concentrar no que devia realmente fazer. Precisava tomar uma decisão e achou que o melhor, para ambos os lados, é que não se encontrassem novamente. Ele poderia devolver a chave, se esquecer de Wade e de seu olhar vazio. New York era um local grande, seria impossível encontra-lo por acaso novamente.

O garoto avalia o cercado do casarão. Não se lembrava de nenhuma cerca existir antes, por isso imaginou que Erik devia ter se intensificado em seu hobbie de jardinagem, o que resultou em quatro gigantescas e grossas paredes verdes de plantas com espinhos. A casa anteriormente amigável, agora parecia um forte protegido pela mãe natureza.

A casa está silenciosa e parece vazia, mesmo assim, Peter caminha até o portão e pressiona o botão da campainha. Ele aguarda e por instinto arruma os cabelos e verifica uma última vez como seu hálito estava, queria estar apresentável para rever Charles e Erik, o castanho tentava convencer a si mesmo de que o melhor era realmente não encontrar Wade.

Sem respostas a seu primeiro chamado, Peter pressiona a campainha mais uma vez. Se questiona se devia ter trazido um presente ou flores. Steve o mataria se soubesse que ele apareceu na casa de outra pessoa sem um presente em mãos, o loiro era intenso sobre formalidades desde sempre.

Peter passa a estalar os dedos em um vai e vem intenso, um tique que havia herdado de seu pai. Olha a sua volta, imaginando o quão esquisito devia ser estar ali parado, aquilo tudo parecia uma ideia terrível agora que pensava bem. Talvez o melhor fosse fugir dali e fingir que nunca havia visitado a mansão e, infelizmente, encarar Wade.

Achando que aquela era a decisão correta, Peter passa a caminhar de volta para o carro. Caçoa de si mesmo por sequer ter imaginado em não encontrar Wade no horário combinado, eles haviam terminado. Fora isso, sabia que trataria o loiro de forma descente e mesmo que Wade não o tivesse reconhecido na primeira vez que trocaram olhares, isso não queria dizer que o trataria de forma diferente. Pelo menos esperava que não.

Um som chama a atenção de Peter que estava com a chave pronta para abrir o carro. Parecia vir do jardim da mansão. Ele se vira, imaginando que talvez, a campainha estivesse com problemas, quem sabe Erik ou Charles realmente estivessem na casa.

Seu cérebro automaticamente passa a rejeitar a ideia de ver Wade novamente. O correto é deixar as chaves com eles e avisar Wade por telefone, Peter confirma a si mesmo, como uma criança se convencendo de que estava tudo bem dedurar a travessura de um amigo a um dos pais, se pelo menos ele não saísse com a reputação manchada, tudo ficaria bem.

Como imaginado, as paredes grossas de vegetação deixavam impossível que Peter conseguisse ver qualquer coisa dentro do jardim. Ele precisou se abaixar até o único ponto aberto, para só então constatar que o barulho ouvido era referente a um sprinkler de jardim.

— Péssima decisão, Peter, como sempre. – Ele rola os olhos, já se convencendo de que devia ter encontrado Wade desde o começo. – E agora, com os joelhos molhados pela grama, bravo.

Ele se parabeniza ironicamente, impaciente consigo mesmo. Qual era o sentido de tudo aquilo? Indo até a casa dos avôs do ex-namorado, só para evitá-lo. Era um homem crescido, formado e com um trabalho que exigia ser um dos mais ferozes em campo, o que devia menos temer era trocar algumas palavras com Wade Wilson.

— Gostando da vista? – Uma voz com um quê de confusão o arranca de seus devaneios.

De quatro na grama, bisbilhotando o quintal de uma casa que não era sua e que provavelmente estava vazia, Peter sabia exatamente o que Wade Wilson deveria estar pensando.

Ele levanta a cabeça e quando o sol para de cegá-lo, praticamente perde o fôlego com a visão. Os fios loiros reluzindo a luz do sol, a pele lisa parecendo tão macia, os olhos azuis como o céu ganhando um charme a mais pela sobrancelha esquerda estar levantada. Ele suspira só de olhar para a boca de Wade com atenção e se lembrar dos doces beijos que costumava receber dele. Era como o paraíso.

Wade pigarreia e só então, Peter percebe que ainda está com as mãos na grama. Ele se obriga a levantar o mais rápido possível, sentindo o molhado nos joelhos começar a se espalhar pelo restante da calça. Por um segundo, inveja Wade por estar com os joelhos secos e faz uma nota mental de como era diferente ver o loiro de roupas sociais. Apesar de não vestir o paletó e as mangas da blusa branca estarem dobradas até os cotovelos, precisava admitir que aquela era uma visão e tanto.

— Juro que não é o que você está pensando. –, Peter começa a explicar, enquanto tenta controlar a vontade de rir e o vermelhidão que sobe para suas bochechas. – Eu só estava...

E é naquele momento que Peter trava. Como explicaria para aquele homem que estava ali porque queria evita-lo? Seu intuito inicial de não ver o loiro sendo completamente destruídos.

— Você só estava...? – Wade incentiva, colocando uma das mãos na cintura.

Peter morde o lábio. O loiro não parecia estar achando aquilo engraçado, como o Wade do ensino médio claramente acharia. A oportunidade de pegar Peter de quatro em seu muro, era quase como um sonho para Wade, Peter sabia disso, pois o mesmo havia usado essa expressão ridícula diversas vezes como desejo de realização de aniversário – o que nunca aconteceu - enquanto namoravam. Porém agora, ele não parecia feliz com a cena, muito menos revivendo as memórias impróprias dos dois como ele sempre fazia.

— Esse silêncio não está te ajudando. – O loiro fala o olhando de cima a baixo, provavelmente se perguntando, o que um menino como aquele estava fazendo ali.

O castanho sentiu um gosto amargo na boca. A rejeição visível no corpo de Wade parecia até mesmo ofensiva, como se Peter fosse um simples estranho. Ele encara a íris azul abaixo das sobrancelhas franzidas e engole em seco ao notar: um vazio frio e gigantesco.

Aquilo era brutal. Sabia que haviam terminado de forma péssima, mas ele havia superado. Entretanto, Wade não só parecia ter superado, como parecia ter apagado qualquer memória e sentimento de Peter de si. Era como se ele fosse uma pessoa completamente diferente.

— Eu vim devolver sua chave. – Ele a pega do bolso e balança na frente do corpo.

— Como você sabia que eu morava aqui? – O loiro questiona, com um som esquisito de risada saindo de sua garganta.

— Perguntei para o pessoal do hotel, demorou, mas eles me confirmaram. – Peter decide mentir, era melhor do que revelar que estava ali na esperança de entregar isso aos seus avôs e não vê-lo, não queria piorar a situação. – Eu sei que a gente tinha combinado, mas achei que você precisaria e eu estava com um tempinho livre.

Wade o avalia por um segundo, mas logo perde a pose de intimidador, abrindo um sorriso simpático.

— Obrigado, poucos teriam feito isso. – Ele pega a chave da mão de Peter.

— É meio que minha “coisa” ainda. – O castanho comentada dando de ombros, se referindo a época em que discutiram sobre isso. Peter sempre fazia o que era melhor para os outros e não para si.

— Hum, ok. – Wade dá um riso nervoso. – Acho que só fomos pegos em uma situação esquisita, mas obrigado mesmo.

— Não tem de que.

O silêncio reina por um segundo. Peter não sabe se deve perguntar sobre a família dele ou se devem começar a falar do clima quando o assunto acaba. Estava tão abalado com o olhar vazio de Wade, que não consegue pensar direito.

Sente que aquilo não devia atrapalhá-lo, tiveram um relacionamento a tantos anos atrás, mas ainda assim Wade era seu primeiro namorado. Como poderia se esquecer dele?

Peter fica mais alguns longos segundos parado, sendo observado por Wade, como se o loiro estivesse olhando para uma peça em um museu que nunca tivesse visto. Ele engole em seco, tentando forçar o sentimento ruim em seu peito para baixo, longe de seu rosto.

— Ok, acho que eu já vou então. – Peter anuncia, cortando o silêncio.

— Ah, claro. – Wade concorda saindo de um transe.

Peter nem mesmo tenta iniciar um abraço ou qualquer toque de despedida, com a vergonha que sentia, não queria ficar ali por mais nenhum segundo. Ele se afasta indo para o carro.

— Ei! Espera! - Wade chama.

O castanho pensa por um segundo em não virar e somente seguir com sua vida, como se nunca tivesse encontrado Wade. Porém ele não estava próximo o suficiente do carro para isso e estaria mentindo se dissesse que um pequeno pedaço de esperança floresceu em si. Ele para e espera.

— Qual o seu nome mesmo? – Wade questiona, com um sorriso sem graça no rosto.

O mundo parece desabar, Peter precisa fechar os olhos por um segundo e se belisca para se certificar de que aquilo é real. Era real e ainda por cima, humilhante.

Ele infla, de raiva e vontade de socar Wade Wilson. O olhar, a posição, as palavras eram ruins, mas aquilo, aquilo era golpe baixo. Ele sente vontade de gritar e iniciar uma briga ali mesmo, porém porque devia se dar ao trabalho? Se o loiro não havia se dado ao trabalho de lembrar seu nome, porque ele continuava se importando com aquele bastardo?

— Peter. – O menino responde se virando somente para olhar Wade nos olhos, com uma expressão de fúria. – Muito prazer em vê-lo, Wade Wilson, adeus.

Peter nem mesmo espera por uma resposta e vence os poucos passos até o carro, se enfiando nele o mais rápido possível e arrancando dali desejando nunca mais ver aquele homem outra vez.

— Tchau, eu acho. – Wade roda a chave no dedo, encabulado. – É cada doido que me aparece.

Ele dá de ombros e abre o portão, esquecendo a cena e o olhar de fúria do homem que havia acabado de conhecer.


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