Jornada nas Estrelas: Iguaçu escrita por Laertes Vinicius


Capítulo 10
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Chelaar e Hashimoto, auxiliados pela equipe de astrometria, haviam passado boa parte da manhã tentando resolver um problema nos sistemas de encadeamento de coordenadas espaciais que, desde o dia anterior, deixara de calcular corretamente a localização relativa da nave. Esse recurso, fundamental para manter a navegação precisa em relação ao Pêndulo de Xavier-Rose, fora danificado no dia anterior, quando a nave sofrera avarias ao passar por uma zona de atrito subespacial formada por um agrupamento de pulsares sincrotônicos.

— Experimente reiniciar o conversor FW agora. – Disse Hashimoto, espremido dentro de um anteparo.

— Sistema de encadeamento recuperando integridade relativa. – Informou Solek, a vulcana oficial de astrometria.

— A taxa de sincronização com os sensores de laterais se mantém em 96%. – Disse Chelaar, debruçada sobre um dos monitores secundários.

— Mantenha o sistema em funcionamento e aumente a saída em um quarto. – Ordenou Hashimoto.

— Sim, senhor. – Disse Solek.

— Taxa de sincronização subindo. – Disse Chelaar.

— Finalmente! – Disse Hashimoto. – Quanto temos?

— 98,7% e subindo. – Respondeu Chelaar.

— Alferes Chou, projete o encadeamento no índice 933,1. – Ordenou Solek.

— Sim, senhor. – Respondeu a alferes, e um mapa estelar foi projetado no observatório astrométrico diante deles.

— Parece bom. – Disse Chelaar, examinando a disposição das estrelas e nebulosas, que se movimentavam ligeiramente conforme a sincronia do encadeamento aumentava.

— Quanto temos? – Disse Hashimoto, ainda dentro do anteparo.

— 100%. – Respondeu Chelaar.

— Encerrar projeção, alferes. – Disse Solek para Chou. – É aconselhável que reiniciemos o sistema e façamos um diagnóstico pós sincronização.

— De acordo. – Assentiu Chelaar.

— Não tínhamos esse tipo de problema na Estação Espacial Carina. – Disse Hashimoto, saindo do anteparo. – Estávamos sempre no exato lugar em que deveríamos estar, perfeitamente sincronizados em relação a Acamaria. A exceção foi quando uma experiência malsucedida do nosso oficial de ciências transportou a estação inteira para um limbo subespacial próximo à nebulosa Azure.

— Isso fica há quase meio ano-luz do sistema acamariano. – Disse Solek, levantando as sobrancelhas. – Como conseguiram resolver a situação?

— Que bom que perguntou, tenente. – Começou Hashimoto e, pelos próximos vinte minutos, descreveu detalhadamente o plano que salvou a estação de um colapso estrutural enquanto ele, heroicamente, revertia manualmente a experiência malsucedida e levava a E.E. Carina de volta ao seu devido lugar.

— Soube que o senhor não quis se inscrever para o recital dos oficiais, comandante. – Comentou Chelaar, quando o chefe de engenharia finalmente encerrou sua explicação dramática e o diagnóstico indicou que os sistemas estavam funcionando perfeitamente.

— Está correta. – Sorriu Hashimoto. – Infelizmente não herdei a boa voz de minha mãe, então prefiro comparecer apenas como expectador.

Chelaar assentiu, sorrindo.

— Meu avô é um cantor lírico de renome em Tellar Prime. – Disse ela. – Ele jamais me perdoaria se eu não participasse do primeiro recital oficial da Federação promovido em outra galáxia.

— Então suponho que você escolheu interpretar uma canção lírica, talvez a ária de Intrusos, de Gaunl? – Perguntou Hashimoto.

— Fico surpresa que o senhor conheça os compositores clássicos tellaritas, comandante. – Respondeu Chelaar, admirada. – Mas vou interpretar algo mais recente: Nag Naag, de Subro.

— Pelo que sei, esta canção é uma versão da aclamada valsa boliana “Sobre a Tristeza”. – Comentou Solek.

— A qual, por sua vez, é uma versão da canção “Porto Solidão”, interpretada pelo cantor humano Jessé há quase quinhentos anos atrás. – Disse Hashimoto.

— É um apreciador de música de época, comandante? – Perguntou Chelaar, surpresa.

— A Estação Espacial Carina foi a sede temporária da Sociedade Arqueológica Musical por dois anos, após a inundação de Nova Viena. – Explicou Hashimoto. – Acabei fazendo bons amigos e aprendendo algumas curiosidades sobre a história da música na Federação.

Vernon para Astrometria. — Ouviu-se a voz do capitão. – Qual é a situação dos reparos?

— Finalizamos o trabalho há poucos minutos, capitão. – Respondeu Hashimoto, tocando em seu comunicador. – Podemos seguir viagem quando o senhor desejar.

Ótimo.— Disse o capitão. – Mas antes disso, gostaria que viessem a ponte e nos auxiliassem com um pequeno mistério.

Chelaar e Hashimoto se entreolharam e, como já haviam concluído os reparos, cumprimentaram Solek e deixaram a astrometria, rumando imediatamente para a ponte. Ao chegar lá, depararam-se com os colegas examinando a imagem do que parecia ser um módulo de fuga, ampliada até preencher totalmente a tela principal. O capitão Vernon acenou com a cabeça e fez sinal para que os dois recém-chegados assumissem suas posições.

— As sondagens não indicam formas de vida humanoide a bordo. – Disse Chelaar, assumindo a estação de ciências e examinando as informações disponíveis.

— A assinatura de energia é ínfima, como a captaram? – Perguntou Hashimoto, assumindo a estação da alferes Harman.

— Um tripulante a viu pela escotilha de seus aposentos, há mais ou menos quinze minutos, enquanto praticava theremin. – Explicou Shion. – Está há menos de seiscentos metros da Iguaçu, à bombordo da proa.

— É uma coincidência incrível. – Disse Hashimoto.

— De fato. – Disse o conselheiro Nhefé, pensativo. – A chance de algo assim acontecer é tão ínfima quanto a assinatura de energia do módulo.

— Não fomos capazes de detectar nenhum sinal de socorro e constatamos que não há vestígios de combate, transporte ou dano de qualquer tipo. – Disse o capitão. – Aparentemente, quem lançou esse módulo o fez por razão diversa das tradicionais, abandonando-o logo em seguida.

— Pode ter sido apenas um engano, ou talvez um teste. – Sugeriu Hashimoto.

— Talvez. – Disse Vernon. – Mas gostaria de transportá-lo para a área de carga, se possível, e examina-lo mais de perto.

— Sim, senhor. – Disse Chelaar, iniciando a sequência de protocolos preventivos e sondagens de segurança. – O módulo não tem sistemas de propulsão e armamentos e as emissões de partículas estão dentro dos padrões aceitáveis. Também não capto ameaças biológicas. Acredito que seja seguro trazê-lo a bordo com o raio trator.

— Execute. – Ordenou o capitão. – Srta. Kwa, calcule o ponto de origem do módulo e trace um curso, dobra 6.

— Sim, senhor. – Disse Kwa.

— Transporte concluído. – Informou Da’Far. – O objeto está na área de carga 2.

— Chelaar e Hashimoto, venham comigo. – Disse o capitão, andando em direção à saída. – Shion, a ponte é sua.

Os três chegaram rapidamente à área de carga 2, onde o módulo jazia imóvel, ao lado de um dos seguranças da nave. O objeto não tinha mais do que dois metros de altura e quatro de comprimento, certamente projetado para apenas dois indivíduos. Ele era feito de uma liga metálica levemente dourada e possuía apenas uma pequena escotilha circular na parte dianteira, que se abriu assim que Hashimoto acionou uma alavanca vermelha.

— A tecnologia deles não me parece tão obsoleta em comparação à nossa, mas o computador de bordo possui funções muito limitadas, até mesmo para um módulo de fuga. O sistema mais complexo é o de suporte de vida, e não capto quaisquer sistemas de comunicação, nem mesmo um rádio subespacial. – Disse Hashimoto, sondando o interior do módulo através da escotilha. – Como é possível que alguém projete um módulo de fuga tão precário e difícil de localizar?

— Talvez eles tenham uma forma de localização que nos é desconhecida. – Arriscou Chelaar.

— Vê algo de diferente aí dentro, comandante? – Perguntou o capitão Vernon.

— Apenas um traje espacial vazio no fundo do módulo, do tipo humanoide padrão. – Respondeu Hashimoto. – E não há nada na memória do computador de bordo, ele foi definitivamente projetado para apenas manter o funcionamento do suporte de vida.

— Talvez possamos obter as respostas quando chegarmos ao local de origem dele. – Disse o capitão.

— Posso estar enganado, mas minha experiência me diz que a maioria dos módulos de fuga com esse tipo de configuração costumam ser de estações espaciais. – Disse Hashimoto, indicando o formato do módulo e a posição das garras de atração. – Várias culturas conhecidas desenvolveram designs semelhantes, já que é obviamente mais adequado ao formato das estações espaciais do que às naves estelares.

O engenheiro-chefe estava correto em sua suposição, pois a USS Iguaçu não tardou a encontrar o ponto de origem do módulo: uma estação espacial de médio porte e formato cônico, parcialmente oculta em um agrupamento de asteroides. Eles deixaram o módulo na área de carga 2 e retornaram à ponte, onde passaram a examinar a estação.

— Parece desativada e deserta, senhor. – Informou Da’Far, após uma série de sondagens.

— É incomum construir uma estação espacial fora de um sistema estelar. – Disse Hashimoto.

— É altamente provável que estivessem trabalhando com algo extremamente perigoso, ou valioso. – Comentou Nhefé. – E é igualmente intrigante que, nesse caso, a tenham deixado deserta.

— Qual é a idade aproximada do módulo? – Perguntou Shion. – Talvez estejamos estudando uma relíquia de séculos atrás, e por isso ela esteja abandonada, assim como o módulo.

— Embora esteja completamente desativada, é possível identificar a flutuação residual da energia da estação, diferentemente do módulo. – Explicou Hashimoto. – Creio que ela foi desativada há menos de dois dias.

— Capitão, a estação possui quarente e quatro módulos de fuga e, com exceção daquele que se encontra na nossa área de carga, todos os demais permanecem acoplados em suas respectivas baias. – Informou Da’Far.

— Uma estação espacial vazia e estranhamente localizada que lançou um módulo de fuga vazio. – Disse o capitão Vernon, intrigado. – Como isso é possível? Há algum sinal de combate recente?

— Não, senhor. – Respondeu o tenente Rose. – A estação parece ter defesas mínimas, apenas alguns canhões de plasma e bombas de hidrogênio. Todos sem indicação de uso.

— Eu achei que obteríamos respostas ao chegar aqui, mas tudo o que conseguimos foram mais perguntas. – Disse Vernon, franzindo o cenho. – Quero sondagens completas dessa estação e, se for seguro, quero um grupo avançado lá dentro o quanto antes.

— Capitão. – Chamou Giulia.

— Sim, subtenente. – Disse o capitão, virando-se para ela.

— É estranho, mas parece não haver sistema de comunicação na estação. – Disse Giulia. – Eu tentei transmitir uma saudação e interceptar algum sinal emitido por ela, mas nenhuma das antenas e receptores parecem configurados para essa função.

— Então, apesar dessa opção estrutural não fazer sentido para nós, ao menos é coerente que o módulo de fuga também não estivesse equipado com sinalizadores ou sistema básico de comunicação. – Concluiu Vernon, balançando a cabeça. – Talvez estejamos lidando com uma espécie realmente incomum.

A tripulação se dedicou a investigar a estação por mais de uma hora, efetuando uma grande variedade de sondagens e obtendo poucos resultados relevantes. O lugar se parecia com uma estação espacial comum, com áreas de comando, alojamentos e alguns laboratórios, e sem indícios de radiação nociva, armas de grande potencial ofensivo ou patógenos mortais.

— Existem três laboratórios principais, todos localizados na parte inferior da estação, mas não sei dizer para que servem. – Informou Chelaar, apresentando um esquema tridimensional na tela principal. – Os equipamentos são estranhos e incompatíveis com os registrados em nossa base de dados.

— Teremos que olhar mais de perto se quisermos desvendar este mistério. – Falou Shion.

— De acordo, imediato. – Concordou o capitão. – Monte dois grupos avançados, transporte um para o comando da estação e outro para a área dos laboratórios.

— Sim, senhor. – Disse Shion.

Logo que deixou a ponte, a andoriana formou duas equipes para abordar a estação de pesquisa, liderando pessoalmente uma delas, enquanto a outra seria liderada pela comandante Chelaar. A oficial de ciências, auxiliada pelo engenheiro Re’Mi, pelo segurança Lachapelle e pelos tripulantes Szántó e Gonzales iniciou uma detalhada investigação na área dos laboratórios, buscando entender que tipo de pesquisa era desenvolvida neles. No comando da estação, a equipe de Shion, composta pela subtenente Giulia Naggi, pelo segurança Heeren e pelos tripulantes Soares e Thibault, iniciou uma interface com o computador principal, religado com uma célula de energia portátil.

— A linguagem computacional e a disposição de elementos de comando deles é muito diferente da nossa, mas assemelha-se à utilizada pela Aliança Nyberrita. – Disse Giulia, após examinar o computador da estação por alguns minutos. – Farei uma matriz de tradução guiada e disponibilizarei para nossos tricorders e para o computador da nave. Deve ser o bastante para que possamos entender com o que estamos lidando.

— Excelente. – Disse Shion, sondando os anteparos inferiores. – Shion para Chelaar. Informe.

Chelaar falando.— Ouviu-se a voz da tellarita. – Identificamos um grande conjunto de emissores energéticos de grande potência, além de defletores modulares e geradores de campos de força. Só posso imaginar que eles estavam realizando experimentos com radiação, energia ou partículas de propriedade quântica ou talvez subespacial, mas ainda não tenho ideia do quê.

— Entendido. – Disse Shion. – Estamos inicializando os computadores e a subtenente Naggi está preparando uma matriz de tradução. Parece que a linguagem deles é um tanto diferente da nossa. Se tiver alguma informação relevante, entre em contato.

Certo, comandante. Chelaar desliga.

Na ponte da USS Iguaçu, em órbita do asteroide e da estação espacial, o capitão monitorava o progresso dos grupos avançados, enquanto aguardava o retorno da nave auxiliar que fora despachada para investigar o agrupamento de asteroides em busca de naves ou outras instalações.

— As varreduras de antiléptons foram completadas, senhor. – Informou Da’Far. – Não há sinal de deslocamento gerado por naves camufladas num raio de seis milhões de quilômetros.

— Vernon para nave auxiliar Férula. – Chamou o capitão. – Informe.

Não há nada além de asteroides, senhor.— Informou o subtenente Thy'sak. – O mapeamento será concluído em doze minutos.

— Certo. – Disse o capitão. – Aguardamos seu retorno. Vernon Desliga.

Enfermaria para ponte.— Ouviu-se a voz do doutor Horvat.

— Prossiga. – Respondeu Vernon.

Capitão, gostaria que o senhor viesse à enfermaria imediatamente.— Disse o médico. – Detectei um problema que pode significar um grande risco para a nave e para a tripulação.

— A caminho. – Disse o capitão, levantando-se. – Senhor Da’Far, a ponte é sua.

O capitão seguiu apressadamente para a enfermaria, sentindo a estranha sensação de que ela estava mais distante do que o normal. Ao entrar, deparou-se com o doutor Horvat e com a enfermeira Yasna examinando um tripulante gauriano da divisão de engenharia que estava sentado em um dos leitos. Dois outros tripulantes, um da divisão de ciências e outro da segurança, também estavam sentados em macas, com expressões angustiadas em seus rostos.

— Qual é o problema, doutor? – Perguntou o capitão, sem enrolações.

— Capitão, se me permite. – Disse Horvat, examinando o capitão com seu tricorder médico e franzindo o cenho.

— Doutor Horvat. – Insistiu o capitão.

— Este é o alferes Bazo Kita. – Começou o médico, indicando o gauriano. – Ele veio a enfermaria mais cedo após uma pequena queimadura de plasma na engenharia. O estranho foi que ele se queixou de ter sofrido tal acidente ao não alcançar um dos controles manuais que ele costuma utilizar para desativar a transmissão de força entre conduítes cruzados. – Horvat fez uma pausa, detendo o olhar no topo da cabeça do alferes. – Para minha surpresa, após um breve exame, constatei que ele tinha 1,79m de altura.

— Não entendo onde quer chegar, doutor. – Disse o capitão.

— O alferes Bazo Kita deveria ter 1,81m. – Disse Horvat, levantando as sobrancelhas. – De alguma forma, ele encolheu dois centímetros. Aliás, neste momento ele já está com 1,76m.

— Como isso é possível? – Perguntou Vernon.

— Não sei ainda, capitão. – Respondeu Horvat, virando-se para os outros dois tripulantes que estavam sentados nas macas. – Mas o mesmo aconteceu com os alferes Retk e Henriques, ambos perderam cerca de cinco centímetros nas últimas horas.

— Isso está afetando toda a tripulação? – Perguntou o capitão.

— Sim, senhor. Eu mesmo estou com 1,90m, quando deveria ter 1,95. – Respondeu o médico. – E o senhor perdeu quase seis centímetros.

— Então foi por isso que a enfermaria pareceu estranhamente mais distante enquanto eu vinha para cá. – Concluiu o capitão Vernon. – Como minha altura foi reduzida, meus passos ficaram mais curtos.

— Exatamente. – Assentiu Horvat. – Por enquanto a tripulação ainda não percebeu a diferença por estarem todos diminuindo proporcionalmente, mas em breve ficará evidente que há algo de errado.

— Está me dizendo que esse encolhimento ainda está acontecendo? – Perguntou Vernon.

— Infelizmente, sim. E a taxa de encolhimento tem aumentado gradativamente. – Respondeu o médico. – Pelos meus cálculos, em menos de duas horas a tripulação terá apenas três quartos de sua altura original, e em três horas terá menos de um quinto. Isso representa um risco operacional imenso para a nave. Recomendo um alerta vermelho e a concentração total de nossos esforços para descobrir a causa e uma possível solução para este problema.

— Certo. – Assentiu o capitão Vernon, e tocou o comunicador em seu peito. – Alerta vermelho. Tripulação não essencial dirija-se aos seus aposentos e permaneça lá até segunda ordem. Demais tripulantes apresentem-se aos oficiais responsáveis e aguardem orientações. Vernon desliga.

— Requisitarei a ajuda da doutora Brexdan, e pedirei ao restante da equipe médica para que monitore a tripulação enquanto trabalhamos para resolver o problema. – Disse Horvat.

— De acordo. – Disse o capitão Vernon. – Trarei os grupos avançados de volta e quero que os examine assim que possível, algo me diz que este encolhimento tem algo a ver com a estação de pesquisa que estamos investigando.

Chelaar estava abaixada ao lado de um grande equipamento cilíndrico no laboratório principal da estação espacial, examinando um conjunto de amplificadores internos. Com a matriz de tradução guiada desenvolvida pela subtenente Naggi, estava sendo relativamente fácil desvendar a estranha configuração utilizada na construção daqueles equipamentos, e com isso ter acesso a pistas que aos poucos permitiam um maior entendimento do seu funcionamento e propósito.

— É como eu suspeitava. – Disse Chelaar fechando o anteparo e se levantando. – Este dispositivo amplifica níveis de energia equivalentes aos de um reator de dobra convencional, redirecionando-a através do feixe dianteiro e produzindo uma emissão concentrada de partículas núcleo-estimulantes. – Ela deus dois passos em direção aos defletores e tocou a superfície de um dos geradores de campo. – Este sistema deve ser o responsável por conter a emissão de partículas e estabiliza-la nos níveis desejados, mas é altamente provável que o choque cause rupturas subespaciais intensas.

— O consumo de energia em um procedimento assim é gigantesco. – Disse o subtenente Re’Mi. – Um simples teste possivelmente consumiria mais do que a própria estação é capaz de produzir.

— Exato. – Concordou Chelaar. – Presumo que eles produziam e armazenavam energia por dias antes de utilizar este mecanismo. A pergunta é: por que?

— Não sei, mas tenho a impressão de que esse emissor parece maior cada vez que olho para ele. – Disse Re’Mi, mexendo o pescoço como se sua roupa estivesse desconfortável.

Chelaar olhou para os equipamentos alienígenas e percebeu que tinha a mesma impressão que Re’Mi. Enquanto estava concentrada em descobrir mais sobre eles, a oficial de ciências não percebeu nada, mas olhando agora, notava que eles pareciam inexplicavelmente maiores, o que lhe causava um leve incômodo. Até mesmo seu tricorder parecia desajeitado e menos ergonômico, como se não pudesse segurá-lo confortavelmente com apenas uma mão.

Shion para Chelaar.— Ouviu-se a voz da andoriana.

— Prossiga, comandante. – Respondeu a tellarita, de pronto.

O capitão ordenou nosso retorno imediato, preparem-se para serem transportados. — Disse Shion, em tom sério. – Parece que foi detectada uma potencial ameaça à nave e à tripulação.

— Sim, senhora. – Disse Chelaar, com um mau pressentimento.

Dentro de poucos segundos, o grupo avançado liderado pela oficial de ciências se agrupou no centro do laboratório e foi transportado de volta à USS Iguaçu. Para a surpresa de Chelaar, ao invés de uma das salas de transportes, ela se viu na enfermaria, onde também se encontravam Shion e os membros de seu grupo avançado, além dos doutores Horvat e Brexdan e da enfermeira Yasna. Esta, munida de um tricorder médico, iniciou um exame nos recém-chegados, com o semblante preocupado.

— O que está havendo, doutor? – Perguntou Chelaar, notando que havia sido declarado alerta vermelho.

— Temos um problema seríssimo em mãos e estamos lutando contra o tempo para resolvê-lo. – Respondeu o médico. – Aliás, sua ajuda será muito bem-vinda.

— Não entendo. – Disse Chelaar confusa, correndo os olhos pelo ambiente e sentindo-se estranhamente desconfortável, como se aquela não fosse a verdadeira enfermaria.

— Diga-me, comandante, sempre usou um uniforme dois números acima do seu? – Perguntou Horvat, pegando no punho da camisa de Chelaar e fazendo-a perceber que o mesmo estava muito mais folgada do que deveria.

— O que isso significa? – Perguntou Chelaar, alarmada.

— Estamos todos encolhendo. – Explicou Horvat. – Ainda não sei como e ainda não sei porquê, mas em breve estaremos tão pequenos que será impossível conduzir a nave.

— Isso deve estar relacionado com o emissor de partículas no laboratório da estação alienígena. – Supôs Chelaar.

— É nossa principal hipótese. – Admitiu o médico. – Todavia, mesmo que estejamos corretos, se não encontrarmos logo uma forma de reverter o processo, a Iguaçu dependerá de uma tripulação de micro-organismos para leva-la de volta à Via Láctea.

— Precisamos reunir uma equipe e teorizar sobre a relação entre as pesquisas conduzidas na estação espacial alienígena e este encolhimento bizarro. – Disse Chelaar, repassando mentalmente os oficiais mais indicados para contribuir com o desenvolvimento dessa tarefa.

— Concordo totalmente, mas recomendo que primeiro a senhora vista um uniforme feito em polímero de elasticidade variável. – Disse Horvat. – Estamos sintetizando para toda a tripulação. Eles não são nada confortáveis, mas “encolherão” conosco e se manterão funcionais enquanto tivermos 30cm de altura ou mais.

— Certo. – Concordou a tellarita, sem opções.   

As duas horas que se seguiram foram angustiantes, pois à medida em que a tripulação encolhia, tornava-se cada vez mais difícil executar as operações necessárias para o funcionamento da nave e para a pesquisa de um método que revertesse o processo. As distâncias pareciam aumentar enquanto a força e a habilidade pareciam diminuir, uma vez que as ferramentas ficavam mais pesadas e difíceis de operar, e qualquer desatenção resultava em um toque equivocado nos comandos de um painel.

— Agora que temos certeza que o encolhimento está afetando toda a matéria orgânica a bordo, incluindo alimentos em estase e plantas ornamentais, poderemos testar uma possível solução sem ter que utilizar um tripulante como cobaia. – Disse Chelaar, sentada na sala de reuniões da ponte. Sua voz estava mais aguda em decorrência do encolhimento.

— Antes de pensarmos em fazer testes, precisamos chegar a uma possível solução. – Disse Horvat. – E nada do que pensamos até o momento é promissor.

— Ao menos nós apuramos que o encolhimento está diretamente relacionado à presença de partículas núcleo-estimulantes. – Disse Chelaar. – Quem quer que estivesse por trás dessa estação de pesquisa, certamente desenvolvia experimentos de redução de matéria em níveis submoleculares.

— Até onde sei, esse tipo de pesquisa já foi feito pela Federação em várias ocasiões. – Disse o capitão Vernon. – O que nos impede de reverter o processo?

— Sabemos que esse tipo de tecnologia de encolhimento de matéria é possível, embora seja ineficiente e inviável, mas não existem registros de nada semelhante ao que está acontecendo conosco. – Comentou Hashimoto, com a voz estridente. – Por isso nós acreditamos que os sistemas de defletores e campos de força instalados nos laboratórios da estação são, de alguma forma, responsáveis pelo encolhimento constante e exponencial que é incomum a experiências desse tipo.

— Hashimoto e eu revisamos a base de dados e encontramos menções sobre incidentes semelhantes. – Completou Chelaar.

— Senhor, acredito que devamos mandar um grupo avançado para tentar descobrir o que for possível do computador da estação. – Disse Shion. – Estávamos fazendo um progresso considerável e seria questão de tempo até termos decifrado completamente a linguagem utilizada.

— Não gosto da ideia de ter alguém fora da nave nessas circunstâncias, mas não tenho outra escolha. – Assentiu o capitão. – Mas quero que Hashimoto, Horvat e Chelaar permaneçam aqui e tentem descobrir um meio de ganhar tempo.

Ponte para capitão Vernon.— Ouviu-se a voz do subcomandante Da’Far. – Os sensores captam a aproximação de três naves não identificadas.

Os oficiais se entreolharam, concordando em silêncio que esta era uma péssima hora para o surgimento de naves alienígenas desconhecidas.

— Tempo para interceptação? – Perguntou o capitão.

Vinte e dois minutos.— Respondeu o chefe de segurança.

— Teremos, em média, menos de um metro de altura quando chegarem. – Comentou o doutor Horvat.

— Imediato, monte um grupo e se transporte até à estação, vocês têm quinze minutos para obter o máximo de informação possível. – Disse o capitão Vernon. – Dispensados.

Todos deixaram a sala de reunião, caminhando apressadamente para compensar as passadas diminutas. Horvat rumou para a enfermaria, onde trabalhava em um soro para amenizar a confusão motora e sensorial causada pelo encolhimento. Chelaar e Hashimoto, na engenharia, discutiam com alguns engenheiros e oficiais de ciências as possíveis soluções para o problema, e Shion se transportara para a estação, acompanhada por Giulia e outros três tripulantes. O capitão Vernon, por sua vez, assumiu a ponte e examinou a leitura das naves que se aproximavam.

— Ainda não entraram em alcance visual, mas pelo que pudemos observar as naves possuem configurações semelhantes às do módulo de fuga e da estação espacial. – Informou Da’Far. – É provável que pertençam à mesma espécie.

— Quero tentativas contínuas de contato, talvez possam nos ajudar. – Ordenou o capitão.

— Sim, senhor. – Respondeu o tripulante que substituíra Giulia no posto de comunicações.

— As naves aumentaram a velocidade, capitão. – Informou a alferes Harman, equilibrando-se sobre o monitor. – Tempo para interceptação: oito minutos.

— Devem ter identificado nossa presença. – Disse o capitão Vernon. – Espero que não cheguem atirando.

— Estaríamos em grande desvantagem, senhor. – Disse o tenente Rose. – Estarmos em menor número não é o que me preocupa, mas sim o fato de que nossos controles de armas e sistemas defensivos não foram feitos para crianças de seis anos. Além do mais, o encolhimento gradual me deixa desorientado e me causa tontura.

— Capitão Vernon para enfermaria. – Chamou ele. – Doutor Horvat, obteve progressos com o soro inibidor?

Sim, senhor. Estou sintetizando uma grande quantidade e pretendo liberá-la no sistema de ventilação em de menos de cinco minutos, vai ser mais rápido do que distribuir pessoalmente à tripulação. – Ouviu-se a voz, agora fina, do doutor Horvat. – Como está sendo difícil alcançar todos os equipamentos e painéis de controle, ativei o HME e vou mantê-lo operacional por tempo indeterminado.

— Excelente. Vernon desliga. – Disse o capitão. O HME nada mais era do que o holograma médico de emergência, equipamento padrão em todas as naves estelares. Como ele era apenas uma projeção fotônica comandada por um sistema operacional instalado no computador da enfermaria, obviamente não sofreria os efeitos do encolhimento e poderia auxiliar nas situações em que o doutor Horvat se visse limitado pela insuficiência de altura.

— Senhor, creio que possamos nos preparar para a chegada das naves sem termos que nos preocupar com o tamanho incompatível dos controles da ponte. – Disse o conselheiro Nhefé que, assim como os demais, estava sentado em sua cadeira sem encostar os pés no chão.

— Estou ouvindo, conselheiro. – Disse o capitão.

— Poderíamos criar uma simulação da ponte no holodeck que tivesse as proporções de nossa altura atual e que diminuísse na exata medida em que nós diminuímos. – Explicou o conselheiro, com a voz aguda e fanha. – Bastaria que transferíssemos os controles principais e os executássemos diretamente de lá.

— É uma ideia extraordinária, conselheiro! – Disse o capitão, satisfeito. – Sr. Da’Far, providencie esse programa imediatamente.

— Sim, senhor. – Disse Da’Far.

A situação na USS Iguaçu estava caótica devido ao encolhimento acelerado, e a tripulação tinha dificuldades para alcançar os painéis e operar os mais simples equipamentos, razão pela qual uma equipe de engenharia havia sido incumbida de produzir e distribuir degraus extensíveis e escadas, os quais foram posicionados em áreas estratégicas, e em setores vitais da nave. As duas salas de transportes, ainda mais importantes agora que caminhar pela nave se tornara uma tarefa árdua e demorada, foram completamente adaptadas e os responsáveis por todos os turnos estavam trabalhando simultaneamente, já que os botões e alavancas estavam relativamente muito maiores do que antes, impossibilitando que uma só pessoa conseguisse operá-los com a eficiência e agilidade necessárias.

Com a chegada iminente das naves alienígenas e o tempo da comandante Shion quase se esgotando, o programa de Da’Far foi concluído e a tripulação da ponte passou a comandar a nave diretamente do holodeck.

— Como é bom poder sentar na minha cadeira e conseguir tocar o chão com os pés, mesmo que seja apenas um holograma. – Disse o capitão, assumindo seu posto e testando os comandos no braço da cadeira. – Alguma resposta às nossas saudações?

— Não, senhor. – Respondeu o responsável pelas comunicações. – É como eu temia, mesmo as sondagens mais próximas não revelam conjuntos emissores ou receptores. Eles parecem não ter nenhum tipo de sistema de comunicação.

— Insisto que isso é altamente improvável, capitão. – Falou Nhefé. – Mesmo se estivéssemos lidando com uma raça de telepatas formidáveis, capazes de se comunicarem entre si com eficiência sem igual, ainda assim seria necessário um aparato de comunicação para longas distâncias e para transferência de grandes volumes de dados. O que eu acho é que nós apenas não fomos capazes de identificar a tecnologia que eles utilizam.

— Infelizmente não temos tempo para isso, agora. – Disse o capitão. – Vernon para Shion. Preparem-se para retornar.

Sim, senhor.— Ouviu-se a voz da andoriana em resposta.

— Espere, capitão! – Disse Chelaar, afoita, entrando no holodeck. – Nós descobrimos um método que talvez permita reverter o processo, mas será necessário que o grupo faça modificações no conjunto de emissores de partículas da estação.

— Comandante, tem certeza? – Perguntou Vernon, com urgência. – As naves estarão aqui dentro de instantes e não sabemos qual será seu posicionamento. É possível que disparem contra nós ou até mesmo contra a estação.

— Tenho sim, senhor. – Disse Chelaar, firme. – É nossa única chance.

O capitão ponderou por um instante, franzindo o cenho.

— Certo, execute. – Disse ele, por fim, e a tellarita assumiu a estação de ciências da ponte. – Imediato, siga as instruções de Chelaar.

Sim, senhor.— Ouviu-se novamente a voz da primeira oficial. – Shion desliga.

— Sr. Da’Far, levante os escudos e estenda-os para abranger a estação, se possível. Tenente Rose, aguarde meu comando para energizar os armamentos. – Ordenou o capitão e, em seguida, falou à toda nave. – Tripulação, aqui fala o capitão. Todos aos postos de batalha! Equipes de engenharia e suporte, procurem se manter nos locais adaptados e priorizem o deslocamento interno por meio do teletransporte. Vernon desliga.

— Teremos grandes dificuldades se sofrermos avarias, capitão. – Disse Da’Far. – O conserto de alguns componentes e sistemas pode se tornar impossível em decorrência da altura reduzida da tripulação.

— Então tentaremos não sofrer nenhuma avaria. – Disse Vernon.

— As três naves já estão dentro do raio de alcance das armas, senhor. – Informou a alferes Harman.

— Os escudos deles estão levantados e capto picos de energia na parte inferior da proa, possivelmente disruptores de média potência. – Disse Rose. – Eles definitivamente não vieram para conversar.

Mal o tenente concluíra a frase e as naves iniciaram uma série de disparos contra a USS Iguaçu.

— Escudos aguentando. – Informou Da’Far.

— Tenente Rose, armar fêiseres dianteiros. Mire nos conjuntos de armas e propulsores. – Ordenou o capitão. – Chelaar, informe.

— O grupo de Shion está tendo dificuldades para concluir as alterações na estação. – Informou a tellarita. – Muitos dos componentes são difíceis de acessar com os braços mais curtos, mas tudo deve estar preparado em cinco minutos.

— Cinco minutos pode ser muito tempo. – Disse o capitão, no momento em que a nave recebeu alguns impactos fortes.

— Escudos a 75%. – Informou Da’Far.

— Tem mais uma coisa, capitão. – Disse Chelaar. – Nós chegamos à conclusão que o encolhimento é originado por uma espécie de vibração intramolecular causada pelo rompimento subespacial gerado pelos testes realizados na estação. Devido à natureza volátil dessa forma de vibração, ela afeta apenas seres orgânicos, mas é conservada e alastrada por componentes inorgânicos, como o módulo de fuga que trouxemos a bordo. A solução que encontramos foi realinhar os módulos dos emissores da estação para uma frequência de superfase e desativar os defletores internos, permitindo a irradiação de uma onda vibratória reversa, que alinharia nossa estrutura molecular e dissiparia as rupturas subespaciais, eliminando completamente a propagação do fator causador do encolhimento.

— Isso exigiria uma grande quantidade de energia, e pelo que sei, a estação não tem essa capacidade. – Disse Vernon.

— De fato, senhor. – Disse Chelaar. – Para que o nosso plano funcione, será necessário um disparo fêiser de transferência de energia para religar a estação e desencadear a onda vibratória reversa.

— Tiro direto no conjunto de armas da nave líder. – Informou Rose. – Ela está com metade da potência agora.

— Nossos escudos também. – Comentou Da’Far.

— Continue atirando, precisamos enfraquece-los o máximo possível antes de podermos direcionar a energia restante para o fêiser de transferência. – Ordenou Vernon.

— Eles passaram a mirar na estação, senhor. – Informou Da’Far.

— Srta. Kwa, posicione a Iguaçu entre eles e a estação. – Disse Vernon. – Se nossos escudos caírem abaixo de 30%, será impossível mantê-lo em torno das duas, e não quero deixar uma janela de tiro aberta.

— Sim, senhor. – Disse a piloto.

— O grupo de Shion concluiu as alterações. – Informou Chelaar, enquanto a nave sofria com o impacto do que pareciam ser torpedos ou ogivas.

— Alferes Harman, prepare uma trava de transporte e fique alerta para trazê-los de volta assim que houver uma brecha que nos possibilite abaixarmos os escudos. – Disse o capitão.

— Danos nos deques 3 a 8. – Informou Da’Far. – Escudos em 39%.

— Quando quiser, comandante! – Disse o capitão.

— Chelaar para Hashimoto! – Chamou a oficial de ciências, ofegante. – Iniciar transferências de energia!

A USS Iguaçu parou de atirar contra as naves inimigas, desviando toda energia disponível para o feixe de transferência, na forma de um disparo contínuo de fêiser. A ação teve sucesso e religou o conjunto emissor do laboratório principal da estação, o qual passou a irradiar a onda vibratória reversa da qual Chelaar havia falado.

— Está funcionando, senhor! – Disse Chelaar, aliviada. – A onda atingirá a Iguaçu em instantes.

— Excelente, comandante! – Disse Vernon, segurando-se em sua cadeira após um forte solavanco. – Sr. Da’Far, sua simulação é deveras realista.

— Capitão, recomendo que mande uma equipe de segurança à área de carga 2. – Sugeriu Nhefé.

— Conselheiro? – Falou o capitão, surpreso pela recomendação fora de contexto.

— Se eu estiver correto, o módulo de fuga que trouxemos a bordo carrega a equipe de pesquisa original da estação, ou ao menos parte dela. – Explicou Nhefé. – É lógico supor que eles passaram pelo mesmo processo de encolhimento que nós, mas horas, talvez dias antes, o que explicaria o porquê não fomos capazes de vê-los ou captá-los com os sensores.

— Entendo. – Disse o capitão. – Nesse caso, é possível que eles estejam microscópicos a esta altura.

— Exato. – Concordou o conselheiro. – No entanto, com a anulação do efeito vibratório e a restauração do subespaço, eles fatalmente recuperarão a estatura normal, lotando a área de carga 2.

— Sr. Da’Far, mande uma equipe de segurança completa para a área de carga 2. – Ordenou o capitão.

— Sim, senhor. – Disse Da’Far, rapidamente repassando a ordem para um de seus oficiais subordinados. – Escudos em 29%. – Informou ele. – Não somos mais capazes de proteger a estação.

— Sr. Rose, abaixe os escudos no primeiro intervalo de disparo inimigo. – Disse Vernon. – Alferes Harman, transporte o grupo avançado no mesmo instante.

— Escudos abaixados. – Informou Rose, segundos depois.

— Transporte concluído! – Informou Harman, com a voz muito aguda.

Todos na ponte suspiraram aliviados, e os escudos foram levantados a tempo de resistir a uma nova saraivada dos disruptores alienígenas.

— A emissão foi forte o bastante para abranger toda a área ao redor da estação e da Iguaçu. – Disse Chelaar. – A taxa de vibração intramolecular está reduzindo rapidamente e o subespaço está recuperando a integridade. É o suficiente para que voltemos ao normal.

— Isso é tudo que eu preciso saber. – Disse o capitão. – Srta. Kwa, tire-nos daqui. Dobra 9.

— Sim, senhor. – Disse a miresita, sorrindo, e acionou os motores.

A USS Iguaçu deu meia volta e partiu do campo de asteroides, enquanto a tripulação voltava ao tamanho normal muito mais rapidamente do que havia encolhido.

— Eles destruíram a estação e estão nos seguindo. – Disse Rose.

— Deixe que venham. – Disse o capitão Vernon, aliviado em poder retornar para a ponte de comando verdadeira. – Não há como rivalizarem com a Iguaçu em termos de velocidade.

Enquanto se distanciavam das naves perseguidoras, Hashimoto e a equipe da engenharia deram início ao conserto das avarias sofridas durante o confronto, especialmente geradores de escudos. Doze tripulantes haviam se ferido, entre eles o próprio doutor Horvat que, a contragosto, deixou que a doutora Brexdan examinasse seu ombro esquerdo deslocado. Para ele, a dor era suportável e seu primeiro dever era continuar a tratar dos tripulantes que vinham à enfermaria. Na área de carga 2, aos poucos um grupo de mais de trinta alienígenas começou a crescer no módulo de fuga, vigiados de perto por Da’Far e uma equipe de segurança atenta. Eles estavam dentro do capacete do traje espacial, e assim que foi possível a comunicação com eles.

O capitão Vernon fez o primeiro contato pessoalmente e constatou que eram apenas cientistas pacíficos e não apresentavam perigo para a nave. Os alienígenas haviam estado no módulo de fuga por mais de dois dias, reduzidos ao tamanho de ácaros e agrupados em torno de uma ração inorgânica de emergência, que os manteve alimentados durante esse período. O cientista-chefe informou que mais da metade da tripulação da estação havia perecido durante um teste malsucedido do dispositivo de encolhimento de matéria, e que, como eles não haviam encontrado um meio para reverter o processo, prepararam o traje espacial e o módulo de fuga, programando um transporte automático para quando atingissem o tamanho necessário. Informaram ainda que, a escolha do capacete foi devido à possiblidade de se manter nele um ambiente salubre, capaz de preservá-los em segurança até que o socorro viesse.

“Diário do capitão, suplemento. Os moranitas demonstraram ser um povo ordeiro e pacífico, e o cientista-chefe da estação prontamente se ofereceu para contatar as naves que nos perseguiam e explicar a situação, levando-nos a um encontro extremamente produtivo. Após uma reunião entre os cientistas moranitas e nossa equipe de ciências, realizada a bordo da Iguaçu, descobrimos que tanto o módulo de fuga quanto suas naves possuíam sistemas de comunicações baseados em dissonância harmônica subespacial, razão pela qual não éramos capazes de identifica-las em meio ao ruído natural do espaço. Essa simples, porém genial tecnologia, foi compartilhada de bom grado conosco, e representará um importante incremento para a segurança das comunicações da Federação quando retornarmos à Via Láctea. Para retribuir, compartilhamos o nosso conhecimento sobre encolhimento de matéria e seus principais problemas, bem como nossa tecnologia de sintetizadores, já que o objetivo principal da estação era encontrar um meio de encolher alimentos e assim poder transportar grandes quantidades para suas colônias sem a necessidade de comboios gigantescos. Por fim, o comandante da nave líder nos convidou a visitar seu planeta natal, onde pretendemos permanecer por pelo menos três dias, finalizando os reparos na Iguaçu e aprendendo mais sobre nossos novos amigos moranitas.”.


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