Mais uma chance escrita por Sereia de Água Doce


Capítulo 17
Dezessete




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Não demorou muito para toda a turma do segundo ano entender que alguma coisa havia acontecido com Julie, com os professores fazendo perguntas. Shizuko e Bia respondiam apenas aos professores mais chegados, que se compadeciam com a situação.

—Eu entendo, Julie. De verdade.  - A professora de literatura tinha confortado a aluna no horário da saída. - O primeiro amor sempre dói.

—Mas ele não é meu primeiro amor… - Julie pensava em Nicolas.

—Mas primeiros relacionamentos costumam ser bem intensos, ainda mais na sua idade. Suas notas em literatura não andam muito bem e eu entendo a situação, mas faça um esforcinho para estudar para as provas. Ocupar a cabeça com outras coisas ajuda.

—Obrigada, professora….

E aquele tinha sido o melhor conselho que recebeu durante a semana inteira. Estavam na sexta feira, último dia que teriam aula até o horário normal. Ela poderia, deveria e iria passar o final de semana estudando, tentando ao máximo não pensar em Daniel ou na banda. Pedrinho estava com medo de se aproximar de Julie - aterrorizado pelos seus gritos na terça feira - mas estava curioso quanto ao seguimento da banda. Enquanto os músicos eram fantasmas, não importava o relacionamento da irmã com o guitarrista, ele sempre teria Félix e Martin para fazer companhia. Mas agora que estavam vivos…. Se eles acabassem com a banda, como ele ficaria? Os dois jovens adultos iriam até a casa dele apenas para saber como ele estava?

Pedrinho tinha muitas dúvidas, mas não queria perturbar a sua irmã com elas. Seu Raul tinha estranhado o comportamento da filha, mas era experiente com mulheres - ao menos era daquele jeito com sua ex-esposa. Se ela estava quieta e reclusa no quarto com eventuais crises de choro, o melhor era esperar o tempo dela até que se sentisse melhor.

Bia tinha ido até a casa da amiga na tarde de sexta. Viram um filme, votaram mais em Martin no site da capricho - e em mais vinte e cinco garotos. Todos os loiros de cabelo cacheado e barbudos Julie passava, se distraindo com os outros. Ela merecia, afinal de contas.

Não sabia que rumo seu relacionamento tomaria, mas votar em colírios sempre era uma atividade satisfatória.

Durante o final de semana, Juliana enfiou sua cabeça nos livros, aprontando fichamentos de todos os conteúdos das provas até a quarta-feira. Literatura, português, história e álgebra. Em determinado momento Julie já repetia que o descobrimento do Brasil tinha sido no período do parnasianismo, com as conjunções verbais sendo a peça chave na comunicação entre os indígenas e os colonizadores. Após ver a barbaridade que escrevia no caderno, ela abandonou as humanas, bebeu um copo d’água, se alongou e partiu para as exatas.

Ela conseguiu estudar exatos quarenta e sete minutos antes de entrar no conteúdo que Daniel tinha explicado para ela. Ver a sua letra em seu caderno, destoando tanto da própria tinha doído um pouquinho, mas ao notar um “você consegue, Julie! ♥” no final do último exercício que ele tinha passado, ela desatou a chorar.

Julie precisou se deitar e descansar por uma meia hora antes de reunir forças para ignorar  a caligrafia tão bonita do garoto e continuar  a estudar. Ela se recusava a se tornar a garota que chorava por matemática - de saudades de estudá-la, não por desespero - conseguindo se recuperar no domingo.

Quando mal percebeu a segunda-feira tinha chegado e com ela as provas de literatura e portugês. O esquema naquela semana seria diferente: as provas teriam início às sete e meia e quem as terminasse estaria liberado para ir para casa. Não era surpresa para ninguém como a escola magicamente ficava vazia até às dez da manhã, mas ninguém reclamaria daquilo.

Eram nove da manhã e os primeiros alunos começavam a entregar as provas e se despedir dos professores, indo embora. Obviamente que muito deles não iam imediatamente embora, permanecendo no pátio a espera dos seus amigos - e de vez em quando por desenrolos. Infelizmente Nicolas se encontrava naquela categoria.

Ou ao menos tentava não estar.

—Valtinho, eu já te disse! Não vou me aproveitar da Julie!

—Não é se aproveitar, Nicolas! É oferecer um ombro amigo! Você não disse que ela e o namorado brigaram feio?

—É.

—E ela não está cabisbaixa a semana inteira?

—É.

—Então eles não devem estar se falando. Se você se aproximar e oferecer um ombro amigo, ela vai confiar mais em você. E se não for burro, vai conseguir que ela se interesse por você antes de fazer as pazes com o panaca.

Mas panaca não era o Nicolas?

—Não acho justo brincar com os sentimentos dela desse jeito, Valtinho.

—Não é brincar, é apostar no seu lado! Você é um homem ou um rato, Nicolas?!

—EI!

—Você gosta dela, não é? Então lute por isso! Ela está brigada com o namorado, é a sua hora de tomar uma posição!

Ao menos sabemos qual dos dois teve a coragem de dar a cara a tapa e conquistar o coração de Julie. Daniel sabia que bancar o ombro amigo não daria certo, dizendo aquilo na cara lavada para a garota um mês e meio antes.

“     -Você odeia ele, não tinha que estar tentando me fazer esquecê-lo?

—Ah, mas o meu plano é esse, mas com uma abordagem diferente. - Daniel deitou-se na cama ao lado de Julie, olhando para ela com um sorriso presunçoso.- Veja bem, se conversarmos sobre isso você irá ressaltar mais uma vez como ele é um panaca e idiota, e isso vai contar pontos para mim. Se eu apenas te distrair, vai criar espaço na sua cabecinha para pensar melhor sobre ele, e não queremos isso, certo?”

Mas não significava que Valtinho e Nicolas soubessem daquilo, muito menos que o próprio Daniel havia feito aquilo para desviar a atenção de Julie de Nicolas e que ela certamente identificaria a jogada dele se prestasse atenção.

Até porque ele nem tinha precisado de muito, já que os sentimentos da garota tendiam mais para o ex-fantasma.

—É a sua chance, Nicolas! - Valtinho sussurrou, empurrando o amigo em direção à Julie, que acabava de sair do colégio, indo em direção ao portão da escola.

Tomado por uma coragem repentina, Nicolas tropeçou e foi em direção a amiga, chamando por ela.

—JULIE! ESPERA!

—Nicolas? Pensei que já tinha ido para casa.

—Eu queria saber como você estava. Perdi a hora hoje cedo e não consegui falar com você antes das provas. Aliás, como foi em português?

—Eu não tenho ideia. E você?

—Acho que dá para escapar da recuperação. - Ele disse com um sorrisinho, usando a carta de coçar o cabelo.

—Pensei que você não tivesse problemas com as notas. Nem com os professores. Nem com os alunos. Nem com as garotas.

—Aí que você está errada! Eu e JP não batíamos um com o outro, e depois que fiquei com a Talita as coisas ficarem bem estranhas com as garotas.

Com Julie, ele queria dizer.

—Mas a Talita, Nicolas? - Julie sem querer tinha caído na armadilha, dando trela para papo furado.

—Ela tava me dando mole, eu achava ela bonita…. Ai já viu, né? - Ele encolheu os ombros, envergonhado.

—Eu também achava o JP bonito, mas nem por isso fiquei com ele. Ao menos não por livre espontânea vontade.

—E nem por isso eu falo nada sobre você. JP, Julie?

Como Julie explicaria que tinha sido um meio termo entre ele e Daniel?

—Era o garoto novo, né?

A conversa tinha acabado ali e antes mesmo que o silêncio ficasse constrangedor, um forte trovão soou no céu.

—Acho melhor eu ir, Nicolas. Eu esqueci o guarda-chuva em casa hoje. - Julie respondeu engolindo seu cabelo com o forte vento que se arrastava pelo ambiente.

—Eu te levo! Meu guarda-chuva é um familhão, cabe nós dois aqui.

Julie ponderou por meio segundo, com outra rajada de vento em seu rosto.

—Não vou ser educado e recusar. Não to afim de ficar doente essa semana.

Com um sorriso no rosto, Nicolas acompanhou Julie até a sua casa, precisando abrir o guarda-chuva na metade do caminho, com os dois se espremendo contra a proteção para se molharem o mínimo possível.

Quando ele a deixou em casa, sua expressão estava mais relaxada, sorridente - e Nicolas cometeu o erro de achar que isso contava pontos para ele.

Mas na disciplina de roubar a atenção de Julie, Daniel era o professor. Nicolas tinha distraído Julie, fazendo com que ela pensasse no namorado após chegar em casa. Se ele tivesse ressaltado seus pontos negativos, ela teria pensado em Nicolas ao chegar em casa.

Pobre Nicolas123.

O tocador de cavaquinho ainda era mais inteligente do que ele, apesar de ter a mesma idade e experiência com garotas.

Tinha acertado quanto ao método de interesse tanto para ela quanto para Nicolas. Infelizmente Julie tinha ignorado o vivo para dar atenção ao fantasma, e agora o pobre coitado estava de quatro por ela.

Talvez ele devesse agradecer Daniel. Ou não.


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