Mais uma chance escrita por Sereia de Água Doce


Capítulo 13
Treze




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A segunda feira havia chegado e com ela o início da semana de provas. Por enquanto seriam apenas disciplinas mais fácil, como educação física e artes - o que possibilitava um último ensaio no dia seguinte - mas Julie não estava preocupada com aquilo.

Estava mais interessada na maneira como Nicolas Albuquerque a evitava, exatamente da mesma forma que dois meses antes. Se antes aquilo havia partido seu coração, agora só deixava com uma pulga atrás da orelha. O que raios estava ocasionando aquilo?

Decidida a dar um basta naquela situação, ela tinha passado a quinta e sexta passadas tentando falar com ela, mas ele desaparecia sempre que a via. Tentada a não ficar no vácuo mais uma vez, Julie combinou Bia sobre interceptar ele na hora do intervalo, quando o mesmo estivesse conversando com Valtinho. Não era dia de quadra do segundo ano, o que facilitou ainda mais a situação, já que eles não estariam distraídos com futebol.

A hora do intervalo chegou e como previsto Nicolas conversava com Valtinho próximo a cantina. Munidas com um sorriso no rosto, as duas garotas se aproximaram, praticamente os encurralando na parede:

—Valtinho, tem um minuto? - Bia enroscou seu braço no braço dele, o puxando levemente dali.

—Bia, meu amor, pode esperar uns minutinhos?

—Certeza, Valtinho? - Ela apertou seu braço e fez uma careta, indicando o outro casal com a cabeça.

—Sabia que o bebedouro lá da quadra é mais gelado que o do corredor? - Ele entendeu, dando uma desculpa para sair de perto.

—Sério? Pode me mostrar?

—Nicolas… - Julie segurou o cotovelo do garoto, se aproximando um passo. - Podemos conversar?

—Já nos resolvemos na loja, Julie… - Ele respondeu, não olhando para o seu rosto.

—Não, não resolvemos não. Aquilo foi só… Uma atitude bem infantil de Daniel, mas….

—Você sabe mesmo quem ele é, Julie? - Nicolas tinha preocupação no olhar.

—O que quer dizer com isso? - Ela não entendeu a pergunta estranha.

—...nada…. - Ele tinha medo de ser considerado louco.

Era claro que o namorado da garota que ele gostava podia ser um fantasma, claro que não!

—Nicolas, por favor! O que aconteceu entre a gente? Desde antes da festa do Valtinho você me ignora… O que foi que eu fiz?

Nicolas não era de ferro. ter visto o medo e preocupação nos olhos de Julie tinha destruído todas as barreiras que ele havia se auto imposto, o fazendo sentir vontade de abraçá-la naquele momento e não deixá-la se afastar nunca mais, mas…. Olhando para os lados receoso, ele tomou coragem e aceitou conversar com a antiga amiga.

—Pode me esperar na hora da saída? Não quero que mais ninguém escute a nossa conversa.

Julie o puxou para um abraço, não se contendo pela falta que sentia dele. Não viu a expressão de surpresa de Nicolas, mas sentiu o forte abraço que ele retribuiu, sendo observados de longe por Talita e Valtinho, com uma debochando do relacionamento deles interiormente, enquanto o outro torcia para engatarem um namoro.

Valtinho não levava muito a sério o namoro de Julie com o suposto guitarrista.

Mas Nicolas e Julie? Esse sim era um casal que ele achava que daria certo. Ele já tinha escutado Bia comentar sobre como Julie falava de Nicolas, com o mesmo acontecendo com o garoto. Tinha visto com seus próprios olhos a maneira como ele tinha ficado na época de JP e ainda mais com o guitarrista dos Insólitos. Infelizmente Julie o tinha recusado no dia em que ele tinha se declarado, mas a julgar pelo abraço íntimo que eles trocavam naquele exato momento aquilo não duraria por muito mais tempo.

***

Exatos 12h quando o sinal tocou, indicando o fim da aula. Julie tinha se enrolado com a matéria de biologia na lousa, demorando um pouco mais para terminar de copiar em seu caderno, tendo apenas Bia e a professora na sala quando ela terminou de fechar a sua mochila. Uma parte sua já dava como certa a fuga de Nicolas, mas voltou atrás quando o viu recostado na fonte no meio do pátio, esperando por ela. Bia se despediu da amiga e foi embora, não querendo atrapalhar aquela conversa.

—Oi. - Ela cumprimentou timidamente, chegando mais perto.

—Oi… Conseguiu terminar de copiar?

—Consegui sim.

Eles ficaram mais algum tempo em silêncio, apenas encarando o redor, constrangidos demais para falarem - o que não fazia sentido, já que eles mesmos tinham combinado de conversarem.

Não era como se os amigos deles tivessem forçado aquilo para quando se beijassem aparecerem gritando.

—Aquele cara tem mesmo dezessete, Julie? - Nicolas tomou coragem, olhando pela primeira vez em seu rosto.

Julie segurou uma risadinha

“Tecnicamente 47, mas não contamos os trinta anos…”

—Pior que tem, mas você não foi o único a desconfiar disso. Acredita que ele teve que mostrar a identidade para o meu pai?

—Até o seu Raul conhece ele?

—Nós ensaiamos lá em casa e ele acabou chegando um dia mais cedo, então…

—Espera, o seu pai não sabe sobre o namoro de vocês? - Nicolas sentiu uma faísca naquilo.

—Não, então eu ficaria agradecida se você não contasse. - Ela brincou com um sorriso zombeteiro. - Mas você quer mesmo falar sobre isso?

Nicolas entrou em uma sinuca de bico. Como contaria  a amiga que tinha pânico do seu namorado?

—É só que…. Eu não sei por onde começar. Nós estávamos nos dando tão bem, você era tão minha amiga, e de repente….

—De repente…?

—Eu comecei a gostar de você. - Ele tinha as bochechas rosadas.

—Quando exatamente? - Ela não se aguentou, gostava de ter para si memórias como aquelas.

—Eu não sei ao certo, foi em algum momento entre o lance do JP e a festa do primo da Bia, mas quando eu percebi…. E eu jurava que você também gostava de mim, achei que tivesse interpretado os sinais certos, mas…. Acho que levei a sério demais o que a Talita falava.

É, ela não era exatamente discreta quanto aquilo.

—Mas aí veio o lance do rpg, e aí….

—Eu já disse que não fui eu, Nicolas…

—E eu acredito em você, agora eu acredito… - Ele empalideceu mais uma vez.

Demétrius tinha aparecido para ele?

—Acredita? Me lembro muito bem de você ter espalhado para a escola toda como eu inventava histórias.

—Se você inventou aquilo eu não sei mais do que a minha imaginação é capaz de inventar.

—Como assim?

—Quais as chances de você namorar com um fantasma? - Nicolas perguntou divertido, se preocupando com a aparência de Julie.

Uma pequena queda de pressão, só isso.

Julie se apoiou nas mãos de Nicolas que se estenderam para ela, recuperando o equilíbrio.

—Talvez as mesmas de eu ter uma banda fantasma. - Porque ela não desmentia aquilo de uma vez? Não conseguia ficar quieta?. - Mas de onde tirou essa ideia absurda? Fantasmas não são tão….

Mas aí ela se lembrou de Marin e Shizuko e ficou quieta.

—É o que eu tô me perguntando desde a quarta feira, mas Julie….. Você tem certeza mesmo sobre quem Daniel é?

—Ele é bem vivo, Nicolas.

—Eu percebi do jeito que ele te beijou. - Nicolas revirou os olhos. - E ele tem aquela barba…. Nunca imaginei que por debaixo daquela máscara ele seria tão….. insuportável.

Julie riu alto com os ciúmes de Nicolas.

—Porque insiste em me perguntar isso?

—Você provavelmente vai me largar falando sozinho depois disso, mas aconteceram umas coisas dois meses atrás….

—Quando você parou de falar comigo.

—Exatamente o motivo de ter parado de falar com você. Eu sei que é loucura, mas…. Eu fui assombrado, Julie.

Demétrius, ela tinha certeza.

—Assombrado?

—É, com direito a derrubar as poltronas da minha casa, balançar os abajures, brincar de discoteca nas lâmpadas…

Até então uma assombração residual e zombeteira, aparentemente.

—E se já não fosse o suficiente, um fantasma apareceu bem diante dos meus olhos e ordenou que eu me afastasse de você. Ele me fez prometer que eu nunca mais chegaria perto ou tentaria falar com você na minha vida, senão…

—Senão…? - Julie estava desconfiada. Por que raios Demétrius faria aquilo.

—Eu não sei, ele deixou isso no ar. Mas eu tentei falar com você, eu juro. Naquele dia que eu covardemente  te humilhei no corredor com o lance de fantasmas, eu ia te contar, mas ele estava bem atrás de você olhando muito feio para mim. Sinto muito, Julie, não tive coragem de chegar perto de novo.

Julie estava quieta, absorvendo tudo o que ouvia.

—E quando eu finalmente me sinto em paz por não acontecer nada de estranho na minha vida além de você ter me rejeitado no meio da escola, eu decido me reaproximar e justamente quando eu faço isso, vejo você chamando aquele fantasma de namorado e ele te beijando bem na minha frente.

A pressão de Julie caiu mais uma vez. O que raios Daniel tinha feito?!

—Fan-fantasma…?

—Eu sei que não é ele, obviamente não pode ser ele. As roupas estavam diferente, ele não tinha olheiras, não era pálido e definitivamente aquela barba dá a impressão de ser mais velho, mas Julie… Quando olhei para ele eu só consegui ver aquele fantasma de cabelo gigante, pálido, parecendo um panda com um terninho e blusa vermelha me ameaçando!

—Terno com camisa vermelha…?

—Você não tá acreditando em mim, não é?

Julie não respondeu. Ela só conseguia encarar o rosto de Nicolas sem ter uma expressão formada. Todo aquele tempo tinha sido armação de Daniel? E aquele cretino…. Aquele cretino tinha um plano perfeito para ela esquecer Nicolas com ele!

—Julie? Você tá bem?

—Por mais idiota e aversivo ao sol que Daniel possa ser, te garanto que ele não é um fantasma, pode ficar tranquilo quanto a isso. E por mais que você tenha sido assombrado antes, te garanto que isso não vai acontecer mais, então não tem porque fugir de mim. - Ela tinha um sorriso falso no rosto, entregando o quanto estava mexida com aquilo.

—Como tem certeza disso:

—Confia.  - Foi a sua resposta.

Nicolas a acompanhou até em casa, estranhando o comportamento da amiga. Não era para ela rir dele? Ou ela estava chateada por ele ter sentimentos por ela? De todo modo, ele achou melhor a acompanhar até em casa, estranhando a maneira como ela tinha se apagado de repente.

Julie só queria ficar sozinha, esquecer a prova e educação física no dia seguinte. Ela queria muito não acreditar em Nicolas, mas ele tinha dado a descrição de Daniel como fantasma! Ela sabia que ele era cretino, idiota e estúpido quando queria, mas exigir que Nicolas a deixasse de lado?!

Por mais que ele provavelmente tivesse armado aquilo para Nicolas, ela não o atrapalharia naquela tarde, esperaria o ensaio do dia seguinte para conversarem civilizadamente e ele explicar a ela que tudo não passava de um mal entendido.

Por mais que seu cérebro soubesse da capacidade de ser uma anta do seu namorado, seu coração não queria acreditar que ele tinha brincado com ela desde o início.

Ela pouco se importava sobre os fundamentos do basquete ou sobre o cálculo de IMC, Julie só conseguiu encarar o teto do seu quarto o restante da tarde, fazendo uma retrospectiva de absolutamente todos os seus momentos com aquele fantasma - e infelizmente colocando na balança contra Nicolas, resultando nas primeiras lágrimas com o entardecer.

Julie adormeceu naquela noite pensando que se ela tivesse aceitado ficar com JP, nada daquilo teria acontecido.

Afinal, Daniel a tinha empurrado para o garoto problema.

Qual era o problema dele com Nicolas, afinal?


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