Blue Heart escrita por dpsilva


Capítulo 2
Meghann Cobalto




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O ônibus nos deixou na porta da Escola Estadual Senador Astholf Benito, onde Kris estudava há 2 anos. Descemos na calçada em frente ao grande gramado onde dezenas de estudantes de uniforme e seus leedwees passavam em grupos em direção ao portão principal. Kris caminhou, esbarrando em um ou outro, até onde um homem alto de uniforme azul e quepe estava parado. Próximo a ele estava Meg, a melhor amiga que meu amo já tivera.
Meghann Cobalto, ou simplesmente Meg, era uma menina baixinha, magra e loura de 10 anos. Tinha o rosto salpicado de sardas, labios finos e rosados e olhos azuis. Em sua bochecha direita ela ostentava uma cicatriz vermelha em forma de lua crescente. Como sempre, ela estava sorrindo quando Kris se aproximou. Nas costas ela levava sua mochila lilás e nos braços um embrulho verde em forma de paralelepípedo, envolto em um laço vermelho. Havia também um selo com os dizeres: "Para Kris, de Meg e Júpiter".
Meg mal esperou Kris chegar e correu para abraçá-lo com um dos braços, o outro segurando o presente.

—Parabéns aniversariante! - disse eufórica - 10 anos! Enfim conseguiu me alcançar! Aqui - disse erguendo o embrulho. Kris sorriu.

—Você não devia, Meg. Não precisava.

—Não ouse dizer o que posso ou não fazer! Vamos, abra!

Meu amo desatou o laço e rasgou o embrulho de papel para ver o que tinha dentro. Era um exemplar de Contos de Fadas e outras lendas, de Enderson Corduroy. Senti que meu amo ficara corado e com o coração acelerado. Meg tornou a sorrir de orelha a orelha.

—Eu sei que você gosta de ler e vi que ficou de olho nesse livro quando passamos na frente da livraria do Sr Klay uma vez.

—Meg... Eu adorei! Muito obrigado! Mas esse...

—Não é o livro que vimos na livraria, né? - realmente não era. O outro que vimos era mais fino e tinha a capa mole. Já este era maior e mais grosso, tinha uma capa feita de algo que parecia ser couro tentando imitar os livros antigos da idade média. As letras eram grandes e douradas. No centro da capa havia uma figura dourada da silhueta de uma mulher com asas de membrana - Esta é uma versão estendida - continuou Meg - tem 102 páginas a mais e comentários do autor.

—Uau! É incrivel! Nem imagino o quanto deve ter custado! - disse Kris, boquiaberto, não conseguindo conter a emoção.

Meg desfez seu sorriso e lhe lançou um olhar furioso.

—Sério que está pensando em dinheiro? Cara, eu te dei um presente!

—Ah...! Tem razão, foi indelicado da minha parte, me desculpe. - Kris baixou a cabeça, desejando não ter dito aquilo.

Meg sorriu e passou o braço pelo pescoço de meu amo.

—Ei, eu tô brincando. Relaxa. Vamos para a sala de aula.

Só naquele momento, com o braço da sua amiga o envolvendo, Kris percebeu que ele estava enfaixado. Meu amo observou melhor e notou que ela também tinha um longo e fino arranhão avermelhado na canela.

—O que houve? - perguntou preocupado.

—Ah, isso? - ela apontou para o braço enfaixado - Adivinha quem caiu da bicicleta enquanto voltava da livraria com seu presente? - ela riu - Fui desviar de uma pobre tartaruga que estava tentando atravessar a rua e bati em duas lixeiras paradas na calçada. Não é mesmo Júpiter?

—De fato. - respondeu com voz pomposa.

Só quando Meg se dirigiu a ele, percebi que estava ali, voando por cima dela. Júpiter era o Leedwee da Meg. De cabelo e vestes alaranjadas, ele não era o maior exemplo de simpatia e não mostrava interesse em conversar com os outros.

—Bom dia, Júpiter. - sorri, cumprimentando-o.

—Saudações. - respondeu seco. Ele estendeu um pequeno embrulho verde, do tamanho de uma caixa de fósforos, envolto em um cordão vermelho. Havia um pequenino selo impresso com os dizeres: Para Bluey, de Meg e Júpiter.

—Senhorita Meghann insistiu em lhe comprar um agrado. - disse sem olhar diretamente para mim.

Olhei para baixo. Meg sorria.

—Afinal, também é o seu aniversário, certo? - disse a lourinha.

Senti um calor confortável em meu peito, e era uma sensação genuinamente minha. Nunca recebi presentes de pessoas que não eram da família de Kris.

—Eu fico muito agradecida, Meg.

Peguei o presente das mãos de Júpiter e rasguei o embrulho. Era um kit de limpeza de asas. Através da caixa transparente pude ver o que continha: uma escova de cerdas ultrafinas, um frasco de shampoo especial, uma tesoura para aparar e, por fim, uma loção para deixar as plumas macias e brilhantes, tudo em versão miniatura.

—Eu adorei Meg, muito obrigada. - apesar de eu não precisar tomar banho, gosto muito de cuidar das minhas asas.

Enfiei o kit dentro da mochila de Kris e nós quatro seguimos em direção à sala de aula. Durante o percurso num corredor vazio Meg e Kris conversaram bastante sobre o livro. Meg disse que lera algumas páginas da versão em pdf que ela baixou, e sobre como ficara encantada ao ver as histórias e contos sobre as lendárias fadas. Kris ia dizendo o quanto estava ansioso para começar a ler quando um garoto chegou dando um encontrão em meu amo, que foi ao chão, derrubando o livro.

—Acredita em fadas, Karino?! - vociferou o garoto. Era Arnon Trox, um dos colegas de turma de meu amo. Um garoto corpulento, quase sem pescoço, de cabelos castanhos e grossos, olhos pequenos e cinzentos e um um largo nariz vermelho. Estava sempre implicando Kris por ser menor que a maioria dos garotos. Arnon se adiantou e pegou o livro do chão.

—Devolve! - berrou Meg, enquanto ainda estava de joelhos, ajudando meu amo a se levantar.

—Isto é história para bebês! Por quê lê isso, Karino?

Meg se levanta rapidamente e arranca o livro das mãos de Arnon. - Aprenda a pedir permissão antes de tocar em algo que não lhe pertence, Trox! - disse ela.

—Que seja. Não quero mesmo ser visto com um livro de bebês! Por outro lado, adoraria que você me acompanhasse até a sala, Meghann. - Arnon abre um sorriso e estende a mão esperando Meg aceitar o convite.

Meg bate na mão de Arnon, o afastando. - Não saio com garotos que não respeitam os outros!

—Prefere ficar na companhia desse Zé Ruela? - vociferou indignado.

—Mais Zé Ruela é você, seu brutamonte!

Arnon agarra o braço da garota, o que não estava enfaixado, e aperta. Meg arregala os olhos, sua boca treme e uma lágrima lhe escapa. - Logo será minha, Meghann, não pode resistir a mim por muito tempo. - ele a olha fixamente.

—Ora, isto é um absurdo! Pare imediatamente ou serei obrigado a notificar seu comportamento abusivo à uma autoridade da escola! - disse Júpiter.

—Solta ela! - num ato de coragem rara e repentina, meu amo se pôs de pé e partiu pra cima de Arnon, lhe dando um empurrão. Nada aconteceu. Arnon era tão grande e meu amo tão menor em comparação a ele, que seguiu parado segurando o braço de Meg.
Arnon olhou para Kris como um monstro faminto prestes a devorar sua pobre e frágil presa. Ele solta Meg e se prepara para socar Kris. Meu amo cerra os olhos, esperando o golpe mas Trox muda de ideia.

—Quer saber? Não! Vamos resolver isso de outra forma. Eu te desafio, Karino! Você, eu e nossos ajudantes nos fundos da escola depois da aula para uma partida de Vetores Alados! Sua ajudante vai correr contra a Escrava. E é bom você aparecer caso não queira ser partido em dois!

Arnon se retira em direção à sala de aula.
Quando menos espero, uma leedwee de cabelo e vestes roxas se aproxima.

—Peço mil desculpas pelo comportamento do Mestre Arnon. Ele comeu pouco hoje, por causa da dieta que seus pais lhe impuseram, e está irritado com isso. - ela diz com sua voz macia.

—Escrava! Vamos! - o grito de Arnon ecoou pelo corredor.

A leedwee se curva em reverência para nós e vai em direção ao seu amo. Jujuba era a Leedwee de Arnon Trox. Apesar de seu amo ser a criança mais desagradável que já conheci, ela era um amor, sempre prestativa, fazendo de tudo pelo seu humano. Vez ou outra conversávamos durante a aula e por isso ela se tornou uma das minhas melhores amigas. Arnon nunca a tratou bem, pelo menos eu nunca o vi, e um dos seus últimos atos contra ela foi dar-lhe o nome de Escrava. Eu não aceitei tamanha covardia, portanto continuei chamando-a de Jujuba.

Kris foi até Meg quando Arnon sumiu de vista. Ela estava de joelhos no chão, com as mãos sobre a cabeça, soluçando baixinho, os olhos arregalados mirando o nada, em choque.

—Meg? - chamou.

Meu amo tocou ela no ombro e instantaneamente Meg recuou berrando:

—Não, por favor!!! - ela começa a chorar.

—Meg? O que foi? Sou eu, Kris!

Meg levanta a cabeça e olha para meu amo. Ela pareceu voltar ao mundo real pois ficou de pé num pulo e enxugou as lágrimas com a camisa. - Podemos ir para a sala? - disse naturalmente como se nada tivesse acontecido.

—O que houve? Por quê você estava chorando?

—Eu estava chorando? Nem notei. Deve ter entrado algo no meu olho, não importa. Arnon Trox é um babaca mesmo, vamos ignora-lo.

—Mas e a partida?

—Que partida?

—Você não ouviu? Arnon Trox me desafiou para uma partida de Vetores Alados, e que vai quebrar minha cara se eu não aparecer.

Meg ponderou por alguns segundos.

—Acho que você deve ir mesmo - disse com um sorriso malicioso - Ele é viciado nesse jogo e está fazendo de tudo para entrar no time da escola. Ele sempre treina depois das aulas. A Bluey é a Leedwee mais rápida que eu conheço e se ela conseguir vencer o Trox, vai deixá-lo de cara no chão.

O que Meg disse é verdade, sou muito veloz, mas não consegui deixar de pensar que ela pode ter dito isso para desviar do assunto sobre seu suposto estado de choque há pouco tempo. Não pensei muito nisso pois tinha que me concentrar em ganhar a partida de Vetores Alados!


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