The Last Christmas escrita por deboradb


Capítulo 1
Capítulo 1




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“Se nada nos salva da morte, pelo menos que o amor nos salve da vida.”

— Javier Velaza

[...]

Peeta sentia o ar se tornar escasso em seus pulmões, assim como também sentia seu coração bater fortemente contra sua caixa torácica, dando a ele a leve impressão de que o mesmo poderia sair de seu peito a qualquer momento. Sua boca estava seca e suas mãos soavam. Ele torcia com todas as suas forças para que o que acabara de ouvir não fosse verdade, e sim, somente uma peça sendo pregada pela sua mente fraca e idiota. Contudo, o olhar sério que o homem a sua frente lhe direcionava provou-lhe que aquele pesadelo era mesmo real. Ele achou que toda a angústia e sofrimento que vinha sentindo durante aqueles cinco meses valeriam a pena se no final ele fosse curado, mas agora, tudo o que ele sentia era sua esperança ser esmagada pela triste e sufocante verdade de que o tratamento não havia surtido efeito, e que a partir daquele momento seus dias de vida estavam mais do que contados.

— Peeta, querido, você está bem? — Evelyn perguntou com a voz embargada, preocupada com o silêncio do filho.

Peeta piscou algumas vezes tentando reprimir as lágrimas, mas foi uma tarefa inútil já que as mesmas – sem a sua permissão – já banhavam suas bochechas.

— Então é isso? — perguntou ao homem sentado a sua frente — Você me diz que vai ficar tudo bem. Que tudo vai se resolver. Dá-me esperanças... mas para quê?! Para depois tirá-la de mim e dizer que a droga do tratamento não sutil efeito e que eu vou morrer?! — cuspiu as palavras com raiva, sentindo o gosto salgado das lágrimas entrarem em contato com seus lábios — Você é um mentiroso, Doutor! A porra de um mentiroso! — Peeta levantou-se da cadeira exaltado e Evelyn o acompanhou, pondo a mão em seu ombro para tentar acalmá-lo.

— Querido, por favor, acalme-se. — pediu docemente, mesmo que por dentro estivesse destruída. Ela, assim como Peeta, também tinha esperanças de uma cura e saber que não haviam conseguido a estava matando.

— Sr. Mellark, eu realmente sinto muito... — começou Haymitch se pondo de pé — Mas como eu havia dito meses atrás, seu Aneurisma Cerebral é de um tipo raro, da qual fazer uma cirurgia seria muito arriscado devido ao seu tamanho, por isso optamos pelos medicamentos. Eles reteriam o crescimento e impediriam o Aneurisma de se romper. Entretanto, eles não surtiram efeito e... Olha, eu estou me sentindo um lixo por ter dito a vocês que ficaria tudo bem. Eu errei, sei disso, mas infelizmente não a mais nada que eu possa fazer. Eu queria muito Peeta, muito mesmo que você se curasse e que pudesse viver uma vida saudável e feliz, mas... a casos que não estão ao nosso alcance, mesmo sendo médicos. — disse calmamente, mas estava se sentindo horrível por não ter conseguido ajudar Peeta. Ele era somente um garoto, tinha tanto ainda para viver. Mas a vida era imprevisível e quando menos se esperava ela lhe dava uma baita rasteira.

— Obrigado, Doutor... — Peeta sorriu sarcástico — Obrigado por absolutamente nada! — completou movendo o corpo e saindo em passos rápidos do consultório. 

Ao fundo pôde ouvir os gritos de Evelyn, pedindo para que ele parasse, mas ele não parou. Ele não queria parar, só queria que aquilo terminasse, só queria poder abrir os olhos e acordar daquele maldito pesadelo. Quando seus pés alcançaram o lado de fora do enorme hospital, Peeta correu, correu cegamente pelas ruas, sem saber ao certo para onde ir. Mas naquele momento tudo o que ele mais queria era simplesmente desaparecer.

Uma vez estavam Cato, Finnick, Gale e ele na casa de férias de seus pais. Era início de verão, estavam todos bebendo e resolveram ir para a cachoeira. Ela tinha pelo menos três metros de altura e a correnteza estava bem forte, contudo, Peeta não ligou muito para isso e pulou mesmo assim. Ele tentou ao máximo ser cuidadoso na queda, mas não adiantou muito e seu corpo bateu com força contra as pedras que estavam no fundo. O baque foi tão forte que ele sentiu o ar sumir completamente de seus pulmões fazendo com que ele mal conseguisse respirar. Seu nariz ardia por não ter prendido a respiração ao saltar e um frio doentio lhe subia pela espinha, fazendo com que ele ficasse completamente imóvel e entregue aquela estranha sensação. Ele chegou a pensar que nunca mais haveria de presenciá-la novamente depois de ter sido resgatado, mas estava completamente errado. Ele podia senti-la agora, ainda mais crua, fria e doentia do que antes, como se acabasse de saltar de um avião sem paraquedas. Indo direto para a morte.           

Há exatos cinco meses Peeta estava na quadra de basquete bebendo um pouco de água, tentando se livrar de um mal estar que há algumas semanas vinha se tornando cada vez mais constante. Mas era só concentrar, respirar fundo que passava, sempre passava. O segundo tempo se deu início e o resultado era completamente insatisfatório, estavam jogando como se tivessem 50 quilos de chumbo sobre os ombros e Peeta sentia uma forte dor de cabeça. Gale lhe passou a bola em certo momento e ele começou a se desviar dos jogadores adversários, até que restasse somente ele, a bola e a cesta. Entretanto, antes mesmo de ele conseguir erguer os braços para marcar os pontos, sua visão ficou turva e seus joelhos foram de encontro ao chão. Havia sangue escorrendo de seu nariz, seu estômago se revirava com náuseas e seus olhos estavam doendo, fazendo com que sua visão se tornasse ainda mais embaçada. Peeta sentiu seu corpo amolecer e antes mesmo de se questionar que porra estava acontecendo, foi levado pela escuridão. Horas mais tarde, já no hospital, ele foi diagnosticado com um Aneurisma Cerebral de um tipo raro. Em outras palavras, ele tinha uma bomba relógio dentro de sua cabeça que poderia explodir a qualquer momento. Seu mundo veio a baixo a partir daquele momento, os amigos que se diziam amigos se afastaram, sua namorada lhe deu um pé na bunda e o treinador lhe tirou do time para que ele pudesse se “tratar”. Um mês após a descoberta da doença Peeta saiu da escola, já cansado dos olhares de pena, repulsa ou nojo. Os únicos que ainda permaneciam ao seu lado – além de sua família – eram Cato e Finnick. Seus únicos e verdadeiros amigos.

Peeta diminuiu a velocidade de seus passos quando seus tênis afundam-se na areia. Ele se aproximou um pouco mais das ondas, apreciando a brisa marítima que sobrava levemente contra seu corpo. Sem perder tempo ele retirou os tênis e sentou-se sobre a areia. A praia havia se tornado seu refugio, seu ponto de paz em meio ao caos que estava sua vida. Foi ali que ele descobriu o quanto amava o pôr do sol e o quanto o tom alaranjado do entardecer lhe acalmava. Era uma manhã ensolarada de sábado e os pais traziam seus filhos para se divertirem, enquanto alguns adolescentes aproveitavam para dar um mergulho ou até mesmo pegarem algumas ondas. Aquilo era algo que Peeta normalmente faria se estivesse em sua antiga vida. Sim, antiga vida, porque aquelas eram as duas palavrinhas que ele usava para se referir a sua vida antes do Aneurisma. Aquela que não envolvia remédios, injeções, grupos de apoio, crises e dias no hospital. Dentre aqueles meses Peeta havia perdido um pouco de peso, estava mais pálido e com a pele arroxeada em algumas partes por causa das implantações de células para seu tratamento, que no final das contas, não serviu de muita coisa, somente adiou um pouco mais o inevitável, a sua morte.

Peeta sentiu algo molhado em suas bochechas e logo tratou de levar os dedos até as mesmas para verificar o que era. Lágrimas. Ele já havia até se acostumado com aquelas que, naquele período de sofrimento, haviam se tornado suas fieis companheiras. Era até meio irônico se fosse parar para analisar. Ele, que sempre fora tão destemido e audacioso, agora era fraco e medroso. Vivia trancado dentro de seu quarto, escondendo-se do mundo, escondendo todos os seus temores. Para seus pais e amigos estava sempre se fazendo de forte, tentando demonstrar que estava tudo bem, quando na verdade ele estava desmoronando por dentro, afundando-se cada vez mais em sua própria dor e angústia. Peeta sentia-se como um garotinho com medo do escuro. Ele nunca havia parado para refletir sobre a morte e agora que esta estava cada vez mais próxima, ele se sentia encurralado, completamente apavorado. Era como estar preso dentro de um cubo, somente esperando o oxigênio acabar para finalmente ser jogado no rio do esquecimento.

Peeta estava tão inerte em seus pensamentos que nem se deu conta da aproximação de Cato, que não perdeu tempo e logo se sentou ao lado do amigo.

— Hey, cara. — falou apertando levemente o ombro de Peeta, uma forma te tentar lhe passar conforto. Ele odiava ver o amigo tão deprimido.

— Oi. — limitou-se em dizer.               

— Sua mãe me contou o que aconteceu. Ela estava prestes a arrancar todos os cabelos de tanta preocupação. Você não deveria ter saído daquele jeito, cara. — advertiu, atraindo os olhos azuis de Peeta para si.

— Eu sei. É só que... — suas palavras morreram no ar e ele suspirou pesadamente, sentindo um nó se formar em sua garganta — Eu só queria ficar um pouco sozinho.

— Eu entendo, de verdade. Mas dá próxima vez... Só tenta avisar antes, está bem? — Peeta assentiu brevemente e Cato sorriu — Ótimo, agora vamos. Está muito quente aqui.

Peeta tentou retribuir o sorriso do amigo da melhor forma que pôde e os dois se levantaram, seguindo em passos silenciosos até o carro de Cato, que não perdeu tempo e logo deu partida pelas ruas de Vancouver. Peeta pôs seu rosto para fora da janela e fechou os olhos. Ele adorava a sensação do vento batendo contra seu rosto, era quase como voar e, de alguma forma, aquilo lhe dava um certo ar de liberdade. Porém toda aquela sensação libertadora se dissipou quando ele percebeu que estavam seguindo um caminho diferente do que levava a sua casa.

— Para onde estamos indo? — indagou, direcionando seus olhos para Cato.

— Para casa do Finnick. — respondeu e pela visão periférica viu Peeta franzir o cenho confuso — A Katniss e a Johanna chegaram hoje pela manhã para passarem uma temporada na cidade, esqueceu? Combinamos de fazer uma festa de boas vindas para elas.

— Não combinamos não. Vocês combinaram. — resmungou — Você poderia, por favor, me levar para casa? Não estou a fim de me socializar. — pediu emburrado e Cato bufou.

— Nada disso, você vai sim! — disse seriamente e Peeta revirou os olhos — O que está acontecendo, cara? Eu não estou mais te reconhecendo. Você não é mais o mesmo, fala como antes e é como antes, mas... algo em você mudou e... — Peeta soltou uma risada fria, o interrompendo.

— Já passou por sua mente que eu tenho uma bomba relógio na cabeça?! — despejou com raiva — Não acha que é a porra de um motivo suficiente para eu ter mudado?! Eu vou morrer, Cato! — a visão de Peeta ficou turva por conta das lágrimas — Vocês saem por aí com suas namoradas, vão a festas, estudam para entrarem em uma boa faculdade... Todos vocês têm um futuro pela frente! E qual é o meu?! Levar agulhadas até meu corpo não aguentar mais e então ser enfiado a sete palmos de terra! — completou enraivecido, quase gritando.

Seu peito subia e descia rapidamente devido a exaltação, mas foram preciso somente dois segundo para que Peeta se arrependesse de ter explodido com o amigo. Já Cato, por outro lado, tragou a saliva e apertou o volante com força, sentindo o baque daquelas palavras caírem sobre seus ombros.

— Me desculpa, cara. Eu não queria...

— Não, está tudo bem. — Cato o interrompeu, engolindo em seco — Mas eu acho que você deveria fazer algo da sua vida ao invés de ficar por aí se lamentando e se escondendo. O mundo não vai ficar mais justo com você trancafiado em seu quarto, Peeta... então, só por hoje, pelo menos hoje, permita-se ser livre, feliz... por mim... pelo Finnick. — pediu calmamente.

Peeta o encarou, absorvendo cada mínima palavra dita pelo amigo, dando-se conta de que Cato estava certo. Ele devia aquilo a eles, seus verdadeiros amigos, aqueles que estavam dispostos a fazerem tudo por ele, sempre.

— Tudo bem... — soltou um longo suspiro antes de os cantos de seus lábios se erguerem em um pequeno sorriso — Vamos para a casa do Finn.

[...]

— Peeta, Cato! Que bom que vocês vieram! — exclamou Clara dando um rápido abraço nos dois — Como você está, querido? — perguntou ao afastar os fios loiros e rebeldes da frente dos olhos de Peeta.

— Estou bem, tia... — sorriu minimamente — Onde está o Finn? — indagou, tentando tirar o foco de si.

— Está lá dentro com as meninas. Vamos, entrem! — puxou os dois pela mão e os arrastou até a cozinha.

Finnick e Johanna, que estavam em meio a uma completa bagunça, pararam o que estavam fazendo para encararem os dois loiros de olhos azuis na companhia de Clara.

— Meu Deus! Como vocês conseguiram destruir minha cozinha em dois minutos? — questionou boquiaberta arrancando uma risada da morena de mexas vermelhas.

— Relaxa mãe, depois limpamos... — falou Finnick indo em direção aos amigos para cumprimentá-los — E aí cara, como você está?

— Bem... eu acho. — respondeu e Finnick lhe lançou um sorriso triste, porém compreensivo. Cato havia lhe telefonado horas antes contando sobre os resultados dos exames de Peeta e ele havia ficado bem abatido.

— As coisas vão melhorar. Você vai ver. — murmurou somente para Peeta, que se limitou a um breve aceno — Hey, Johanna, você se lembra dos meus amigos? — indagou para a morena a poucos metros de distância.

— Talvez... — disse meio duvidosa e logo se aproximou para cumprimentar os dois com um beijo na bochecha.

Peeta, ao ver que os olhos castanhos da morena pararam por alguns segundos nas manchas arroxeadas em seus braços, logo tratou de puxar as mangas compridas para baixo antes de enfiar as mãos nos bolsos, meio agoniado. Cato percebendo sua ação lhe lançou um olhar tranquilo, para passar-lhe conforto, o que de certa forma funcionou.

A porta da varanda foi aberta violentamente e uma morena sorridente, toda suja de farinha passou pela mesma. Seus cabelos – tão ou mais escuros do que os da Johanna – estavam presos em um coque desajeitado, dando a ela um ar despojado e desleixado. Peeta lembrava-se dela, porém muito pouco já que Katniss viveu praticamente sua vida inteira em Londres com o pai. Eram raras às vezes em que ela vinha visitar Clara e Finnick.

— Finnick! As pizzas ficaram uma droga! — reclamou sem notar a presença dos dois garotos.

— Claro que ficaram irmãzinha, você não cronometrou o forno direito. — debochou, rindo da careta que a mesma fez — Mãe, vamos ter que ligar para um restaurante. — avisou fazendo Clara bufar.

— Vocês realmente não servem para serem cozinheiros. — resmungou indo em direção à sala.

— Hey! Não sabia que teríamos visitas. — Katniss sorriu indo em direção aos dois — Oi, Cato. — ela o abraçou bem apertado, fazendo o loiro reclamar.

— Oi, Everdeen... Olha só, você cresceu! — debochou e Katniss lhe deu um soco no peito.

— E você permaneceu um idiota. — rebateu antes de se virar para Peeta. Ela lembrava-se dele, vagamente mais lembrava — E você deve ser o Peeta, estou certa? — indagou e o loiro assistiu, estendo-lhe a mão para cumprimentá-la. Mas ao invés disso a morena o puxou para um apertado e caloroso abraço.

Peeta logo sentiu seus músculos ficarem tensos devido à surpresa. Fazia tempos que ele não aceitava nenhum tipo de afeto de qualquer que fosse a pessoa, incluindo sua mãe. Para ele aquilo poderia simbolizar pena e tudo o que ele mais odiava era que as pessoas sentissem pena dele. Mas com a Katniss estava sendo diferente, ele podia sentir na forma como os braços da morena estavam abraçando tão protetoramente seus ombros. Foi então que ele permitiu-se relaxar ao envolver a cintura da mesma e, pela primeira vez em meses, ele deixou-se ser abraçado. Katniss sorriu e afastou o rosto da curva do pescoço de Peeta para poder olhá-lo nos olhos. Ela podia ver perfeitamente através das orbes extremamente azuis do loiro que ele não estava bem. Ele parecia cansado e um pouco abatido, mais ainda assim, ela não pôde deixar de notar o quão bonito ele era.

— É bom te ver novamente, Peeta. — disse bem humorada, fazendo Peeta abrir um mínimo, porém verdadeiro sorriso. O primeiro em semanas.

— É bom te ver também... Katniss. — devolveu completamente hipnotizado pela imensidão acinzentada que eram os olhos da morena.

[...]

Estavam todos sentados no chão da sala após um almoço bem descontraído. A TV estava sintonizada em um canal qualquer, que nenhum dos que estavam ali prestavam muita atenção. Estavam mais concentrados nas histórias que Katniss e Johanna contavam sobre suas vidas em Londres. Peeta estava calado e, quando não, falava apenas o necessário. Ele preferia assim. Estava mais uma vez ouvindo atentamente uma das histórias malucas das meninas quando seu telefone tocou. Ele pediu licença e dirigiu-se até a cozinha, vendo a foto de sua mãe brilhar na tela.

— Oi, mãe. — falou em um tom baixo.

Peeta Mellark, onde você está que ainda não apareceu em casa?! Quer me deixar maluca?! — indagou do outro lado da linha. Evelyn estava quase enlouquecendo de tanta preocupação com o filho.

— Desculpa, mãe. Estou aqui na casa do Finn, a irmã dele e uma amiga acabaram de chegar, mas não se preocupe, já estou indo para casa. — avisou.

Nada disso! — Evelyn se apressou em dizer. Pela primeira vez em meses seu filho havia saído com os amigos e ela não poderia estar mais feliz — Fique aí e se divirta um pouco, você precisa se distrair filho... só não se esqueça de suas vitaminas, já está quase na hora. Beijos, te amo. — se despediu.

— Também te amo, mãe. — Peeta encerrou a ligação e respirou fundo.

Ele não deveria ter dito onde estava, agora teria de ficar ali mais do que pretendia. Não que ele não estivesse gostando de estar ali, na verdade ele adorava passar um tempo com os amigos, entretanto, naquele exato momento tudo o que ele mais ansiava era poder estar debaixo de seus lençóis, refletindo sobre sua vida e no que faria antes de partir.

Em passos preguiçosos Peeta dirigiu-se até a geladeira e retirou da mesma uma garrafa de água. Logo em seguida retirou do bolso os dois frascos de vitaminas e os tentou abrir, porém suas mãos começaram a tremer levemente, fazendo com que a tarefa momentaneamente simples se tornasse quase impossível. Tentou mais uma vez e praguejou baixinho quando, novamente, não conseguiu.

— Precisa de ajuda? — perguntou Katniss e Peeta quase deixou os frascos com as vitaminas caírem ao chão tamanho susto.

Peeta moveu o corpo e deu de cara com a morena apoiada na porta da cozinha, com um doce e singelo sorriso desenhando seus belos lábios. Ele estava tão concentrado na tarefa de abrir os frascos que nem percebeu quando a morena se aproximou.

— Não, está tudo sobre controle. — ele lançou a ela um sorriso amarelo e tentou mais uma vez retirar a tampinha do remédio, em vão.

Katniss soltou uma leve risada antes de se aproximar de Peeta para retirar os frascos de suas mãos, abrindo os mesmos sem esforço algum. Ele resmungou dizendo que havia facilitado a tarefa com suas três tentativas falhas e Katniss riu novamente, mas logo ficou séria enquanto o observava atentamente tomar algumas das pílulas.

— Obrigado. — Peeta agradeceu em um sussurro após tomar o último gole de água que havia no copo. Ele se sentia um pouco desconfortável por tê-la ali o observando, mas diferente do que ele imaginou, ela não o olhava com pena, e sim com um olhar caloroso e compreensivo.

— Tudo bem. — ela sorriu mais uma vez — Você está com fome? — indagou, fazendo Peeta direcionar seu olhar para ela um pouco confuso — É por que eu notei que você comeu muito pouco e... sei que o bolo de chocolate que fiz estava horrível, mas você nem mesmo provou para fingir que ficou bom como os outros fizeram. — disse com humor, mas seu tom continha também um certo ar de indignação. Peeta sorriu de lado e guardou os frascos de vitaminas no bolso da calça.

— Desculpa, não foi minha intenção ofender. O bolo estava com uma aparência deliciosa, mas... É que meu estomago anda um pouco revoltado essas semanas. — explicou, se surpreendendo com o tom divertido que saiu de seus lábios.

— Tudo bem, eu te perdoo. Mas só porque sua desculpa foi muito boa. — pontuou empurrando de leve o ombro do loiro e então os dois riram.

Peeta estava surpreso consigo mesmo. Fazia tanto tempo que ele não soltava uma risada tão sincera quanto aquela que já havia até esquecido o quão boa poderia ser sensação. Já Katniss, por outro lado, apreciava o brilho espontâneo e vivo que surgiu nos olhos de Peeta por alguns segundos. Ela estava fascinada pelas orbes azuis do loiro e achava um ultraje elas estarem tão tristes e vazias.

— Bom, acho melhor eu ir para casa... — comentou Peeta após cessar as risadas, se sentindo um pouco sem graça por Katniss o estar encarando tão fixamente, mas ao mesmo tempo se sentindo leve. Aquela era a primeira conversa de verdade que ele tinha com alguém sem se sentir deprimido.

— Ahn... Casa? — ela questionou um pouco confusa ao sair do seu “transe” momentâneo — Ah, sim! Casa! — exclamou ao se dar conta do que Peeta havia dito e então sorriu — Vou com você até a esquina, assim você saberá que tem a obrigação de voltar para me ver. — avisou, deixando Peeta um pouco surpreso, mas mesmo assim ele sorriu.

— Certo. Como você preferir, Srta. Everdeen. — fez uma reverencia exagerada que arrancou uma gostosa gargalhada da morena.

— Assim que eu gosto. — ela ergueu o polegar de forma positiva e Peeta riu enquanto saia da cozinha, com Katniss em seu encalço.

Ele se despediu de Johanna e dos amigos que, imploraram para que ele ficasse um pouco mais, já que eram raras às vezes em que Peeta saia de casa e aquilo era um grande feito para Cato e Finnick. Mas o loiro não cedeu e seguiu para fora da casa acompanhado de Katniss. Os dois caminhavam lado a lado em passos silenciosos pela rua.

— Então, Peeta... me fale um pouco sobre você. — Katniss pediu, quebrando o silêncio.

— O que você quer saber? — devolveu, chutando uma pedrinha que estava em seu caminho.

— Quais são seus hobbies, sonhos... desejos bizarros. — falou curiosa e Peeta a encarou, vendo que a morena mais parecia uma criança ansiando para que seu desenho favorito começasse logo.

— Hmm... Deixa-me ver... Acho que jogar vídeo game. — ele deu de ombros e ela riu — O quê? É sério! Eu sou muito bom nisso.

— Claro que é. — ela debochou — Vamos lá, Peeta. Quero saber de coisas produtivas... — pediu novamente e ele riu do biquinho fofo que ela havia feito.

— Tudo bem... — Peeta parou alguns segundo para pensar — Bom, eu adoro desenhar, muito mesmo. E pintar também. Foram formas que encontrei de me acalmar e de ficar mais relaxado. Agora, quanto a desejos bizarros... — ele riu — Bem, eu não tenho nenhum. — completou.

— É isso aí, começamos bem. — Katniss sorriu e Peeta se deu conta de que já estavam em frente a sua casa.

— Bom... esse é o ponto final. — avisou, indicando a casa com a cabeça.

— Então é aqui que você mora? — indagou e Peeta assentiu — É uma bela casa... — a morena voltou seus olhos para o loiro — Bom, então até a próxima, Peeta. Foi muito bom conhecer você, ou melhor, reencontrar você... Droga! Eu já nem sei! — exclamou confusa e Peeta riu para valer.

— Acho que os dois... — sorriu — Até a próxima, Katniss. — acenou, mas então a morena se aproximou, apoiando-se em seus ombros para depositar um beijo demorado em sua bochecha.

Sentir os lábios quentes de Katniss entrar em contato com sua pele fez com que o coração de Peeta se aquecesse, e ele estranhamente adorou aquela nova sensação.

— Te vejo por aí. — disse ao se afastar do loiro, seguindo animadamente pela rua.

Quanto a Peeta, bem, ele ficou ali parado, a encarando. Odiando admitir o quão adorável Katniss estava naquele vestido azul claro.

— Pare de olhar para a minha bunda seu pervertido! — a voz da morena ecoou pela rua, fazendo o loiro rir.

— Não estou olhando para a sua bunda! — rebateu bem humorado.

— Ah, você está sim, Mellark! — devolveu com a voz repleta de divertimento, ainda sem parar para olhar para trás.

Peeta riu novamente e balançou a cabeça de modo negativo, enquanto subia os degraus da varanda de sua casa, pensando no quanto àqueles minutos ao lado de Katniss haviam sido um dos melhores que ele já tivera em meses. Ela, de alguma forma, havia conseguido arrancar-lhe mais sorridos do que seus amigos conseguiram em semanas. Mas bastou adentrar sua casa para que todo aquele momento de leveza, incluindo seu sorriso, se dissipasse. Sua visão começou a ficar turva, enquanto o mal-estar se instalava em seu estômago. A dor de cabeça não demorou a chegar, fazendo com que Peeta cambaleasse devido à tontura. Ele já deveria ter se acostumado com aqueles sintomas, afinal de contas, ele já os vinha sentindo há meses, mas mesmo assim, cada vez que eles surgiam era como se fosse à primeira vez. Era torturante e o deixava deprimido, pois ele sabia que cada vez que sentia aquilo era mais um passo que dava em direção ao precipício chamado de morte. Peeta tentou caminhar até o sofá, porém suas pernas fraquejaram no meio do caminho e ele se viu indo de encontro ao chão, já sentindo sua consciência ser levada pela escuridão.


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