Born To Repeat History escrita por Mileh Diamond


Capítulo 6
Amor


Notas iniciais do capítulo

Ainda é Ano Novo em algum lugar, okay? Okay.
Chegamos ao capítulo final de Born to Repeat History! O que vocês acharam dessa jornada?
Boa leitura~~



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Houve uma época em que só de ouvir o nome "Yuuri Katsuki", Yakov começava a passar mal. Principalmente quando vindo da boca de Victor. Seu aluno já o fizera passar muita raiva por causa de um certo patinador japonês que dançava pole dance em festas da ISU. E ele nem estava contando a vez em que Victor casualmente deu uma pausa na carreira para ir treinar o dito cujo no Japão.

 

Quando Victor, com o mais idiota dos sorrisos, anunciou que ele e Yuuri estavam noivos e que Yuuri viria morar na Rússia com ele, Yakov esperou o mais novo sair da sala para abrir uma garrafa de vodca nova. Não tinha como reagir àquilo sem álcool. Era muito para o seu coração de velho. Victor definitivamente queria lhe matar.

 

Felizmente, suas expectativas apocalípticas sobre como a presença de Katsuki afetaria a rotina do rinque em São Petersburgo não se concretizaram. Pelo contrário, o resultado foi muito bom. Yakov podia não ser o treinador oficial de Yuuri, mas ele já entrara na lista de patinadores mais comportados e educados que Yakov já acompanhou de perto em só uma semana. Não que fosse muito difícil entrar naquela lista, para dizer a verdade. Seus alunos tendiam a ser um tanto caóticos.

 

Katsuki definitivamente era um bom par para Victor. Seria ótimo se eles realmente se tornassem algo oficial e não, Yakov não contava "dividir um apartamento" como algo oficial. Ele queria ver a maldita certidão de casamento devidamente assinada e com um selo do governo. Quem sabe ele até pedisse uma fotocópia para emergências. Só assim ele ficaria em paz depois de todo o estresse que passou com aquele casal.

 

Mesmo assim, ele achava que Victor poderia guardar um pouco de todo aquele amor para depois dos treinos.

 

— Yuuri~, você não cansa de ser maravilhoso desse jeito? - Victor perguntou apoiado sobre o muro do rinque, olhando para o asiático com cara de paspalho. - Eu não consigo pensar em algo mais incrível do que você.

 

— Vitya, menos. - Yuuri respondeu com um suspiro, suas bochechas há muito tempo já cansadas de ficar vermelhas de vergonha. - É o seu intervalo, eu posso me virar sozinho aqui...

 

— Mas a Lilia já monopolizou você a manhã inteira! - Victor reclamou com os olhos quase lacrimejando. - Não sobrou nem um tiquinho de Yuuri pra mim. Eu tô com saudade.

 

— Vitya, eu te vejo o dia inteiro. - Yuuri agora teve que rir. Ele arranjara um noivo tão dramático. - Como alguém pode ficar com saudade assim? Eu estou bem na sua frente.

 

— Mas não é perto o suficiente. - Victor fez um bico, mas endireitou a postura com um sorriso logo depois. - Eu preciso de algo mais assim...

 

O "assim" de Victor incluía puxar o pobre coitado de nome Yuuri para um beijo. Mesmo para alguém que queria treinar em paz, Yuuri até que era liberal demais com toda aquela melosidade. Os beijos de Victor pareciam ser uma motivação extra para ele melhorar nos treinos.

 

Para Yakov, cada amasso era uma vontade de jogar tudo pro ar e ir embora. Talvez fosse inveja. A pessoa com que ele mais tinha vontade de fazer aquilo nem dava "Bom dia" dependendo da posição dos astros.

 

E porque gente invejosa gosta de estragar a felicidade alheia, Yakov decidiu que todo aquele açúcar já estava de bom tamanho.

 

— Victor. - ele chegou batendo no rapaz com a prancheta. Victor olhou para trás como quem acabara de acordar. - Vai sentar. Deixa o seu namorado treinar.

 

Aquilo fez o olhar de Victor brilhar com uma chama quase assassina.

 

— Yakov, ele não é meu namorado, ele é meu noivo!— Victor respondeu alto e devagar, apontando a aliança no próprio dedo. Yakov quase tampou os ouvidos com o grito. - Olha aqui, isso aqui é de noivado, okay?! Eu já não falei pra você? Ou você esqueceu? Se for, eu não tenho problema em repetir, eu sei que a idade afeta a sua memória: eu e o Yuuri estamos noivos, a gente vai casar,  ele vai ser meu marido e...


— Eu ouvi da primeira vez, Victor. - ele disse com suspiro. Era tanta energia numa pessoa só que ele até se cansava de falar com Victor. - Só arranje algo produtivo pra fazer. Algo que não gire em torno do seu noivo.

 

Victor ficou de boca aberta, como se quisesse contestar mas não soubesse como. Yuuri, atrás dele, disfarçava olhando para o lado para não rir.

 

— Com licença, tudo que eu faço perto de Yuuri é produtivo...!

 

— Não é, não, Vitya. - Yuuri disse em voz baixa, com uma cara de pena. Era triste admitir que Victor não ganharia naquela briga.

Os dois começaram a discutir, da forma mais amorosa e gentil possível, sobre a produtividade discutível de Victor e Yakov desistiu de ficar ali. Vitya não tinha vergonha de fazer papel de trouxa e ele não podia fazer nada sobre isso.

Só esperava que ele guardasse todo aquele amor para ele e poupasse o mundo, só um pouco.


— - -

 

— Não tinha uma qualidade de imagem melhor? - Yuri perguntou franzindo a testa para o celular.

 

— O que você espera de uma gravação de 1968? - Victor perguntou. - Eu estou surpreso que já tinham inventado câmeras.

 

— É fascinante ver ele com cabelo. - Georgi comentou com admiração. - A escolha das roupas foi muito boa também.

 

— Não foi, não. - Victor rebateu.

 

— Shh, só assistam! - Mila interrompeu a discussão e todos voltaram a prestar atenção.

 

Yakov viu o grupinho à beira do rinque à primeira vista, mas não deu importância. Passando atrás dos mesmos, ele tinha a intenção de ignorar, mas a música tocando fez ele parar.

 

Chuck Berry. Quem ainda escutava Chuck Berry?

 

O "Wow" coletivo do grupo seguido de um Yuri Plisetsky exasperado não explicaram muito bem a situação.

 

— Vocês viram esse cantilever?! Ele realmente encostou a cabeça no gelo num cantilever?! - Yuri exclamou em choque. - Volta o vídeo, eu quero-

 

— O que vocês estão vendo aí? - finalmente a curiosidade fez Yakov interromper o evento.

 

Eles não pareciam insatisfeitos, pelo contrário.

 

— Treinador, nós conseguimos te achar nas Olimpíadas! - Mila explicou animada.

 

— A sua técnica era muito a frente do tempo, Yakov. - Victor elogiou. - Mas a moda não ajudou ninguém.

 

— O que foi aquele cantilever?! - como se pode ver, Yuri ainda não tinha superado o cantilever. - Como que você não quebrou a coluna?!

 

Era muita informação de uma vez e Yakov só realmente entendeu quando colocaram o celular na cara dele e soltaram o vídeo.

 

— Ah. - foi tudo que ele conseguiu dizer, identificando a figura na imagem preta e branca. - É isso que vocês estão vendo.

 

De fato, era Yakov, com seus quase 23 anos nas Olimpíadas de 1968. Era a apresentação de Gala, que no caso dele não teve direito a uma gravação colorida mesmo que ele tivesse levado o ouro.

 

Ele não lembra de ter visto aquela gravação específica, nem imaginava onde as crianças poderiam ter encontrado, mas tudo era possível com a Internet. De alguma forma, a relíquia de um Yakov Feltsman vestido à moda hippie (bocas de sino, colete de couro com franja e a faixa na testa) patinando ao som de Chuck Berry com um sorriso nada modesto agora era domínio público.

 

— É, o cantilever era bom. - ele disse fazendo pouco caso.

 

— Isso aqui poderia ser um programa competitivo hoje... - Yuri disse ainda não acreditando nos próprios olhos.

 

— Vocês esperavam que eu fosse ruim? - Yakov perguntou sarcástico. - Pode parecer absurdo, mas eu tive que aprender a patinar para ser treinador.

 

— A gente sabia que você era bom, só nunca conseguimos ver a Gala antes. - Mila disse com um bico, lamentando não ter visto aquilo antes. - Oh, acabou.

 

O programa de fato havia acabado, restando ao jovem Yakov do vídeo agradecer a platéia... E pegar os presentes... E sair do rinque...

 

Yakov começou a ficar inquieto. Aquele vídeo ia acabar quando?

 

— Acho que tem as entrevistas ainda. - Mila disse olhando quantos minutos faltavam ainda, como se pudesse ler a mente do treinador.

 

Oh, não.

 

Yakov rezava para que não fosse aquela entrevista.

 

Algumas mudanças de cena e um repórter americano aparecia cumprimentando Yakov que estava ainda recuperando o fôlego da apresentação.

 

Oh, não. Yakov reconhecia tudo. O repórter, o símbolo da emissora americana no microfone, até a garrafa d'água que deram para ele tomar.

 

Era aquela entrevista.

 

Ele decidiu que era um ótimo momento para sair dali.

 

A pior parte? Ele se virou de costas para dar de cara com Lilia.

 

— Olá. - ela disse inexpressiva como sempre, mas com certa curiosidade no olhar ao tentar entender o motivo do furdunço. - O que estão fazendo?

 

Aquela também seria uma ótima oportunidade para sair dali e impedir que Lilia descobrisse o que eles estavam assistindo, mas Mila ainda foi mais rápida.

 

— Own, Treinador, você estava tão bonitinho aqui!

 

Aquilo fez Lilia arquear as sobrancelhas. Yakov engoliu em seco.

 

— Ah, madame Lilia, você está aí? Vem ver uma coisa! - Mila disse animada.

 

— Lilia, por favor, não...

 

— O quê? - Lilia perguntou passando por ele sem dar o mínimo de atenção.

 

Mila pausou o vídeo por um momento para explicar.

 

— Conseguimos um vídeo do Treinador Yakov nas Olimpíadas de 1968. - ela despausou agora. - Agora está na parte das entrevistas. A senhora lembra dele sendo uma gracinha assim?

 

Lilia piscou algumas vezes tentando situar a imagem e som na sua memória.


 ...Vamos falar com o ganhador da medalha de ouro, o soviético Yakov Feltsman! - o entrevistador disse animadamente.

 

— Meu Deus. - ela disse mais para si mesma. Aquilo era tão velho. - Onde vocês acharam isso?

 

— Treinadora Lagutina mandou, disse que era de algum documentário dos anos 1980. - Victor explicou.

 

Fora da roda, Yakov amaldiçoou Irina cinco vezes mentalmente e uma verbalmente. É claro que seria ela a guardar um negócio desses. Eles tinham visto aquele documentário uma única vez e esquecido completamente por uma simples razão: as entrevistas.


— ...Sr. Feltsman, você poderia comentar sobre o que essa medalha significa para você? - o repórter perguntou.

 

— Posso, mas você tem que me chamar de "Yakov". - o jovem patinador disse com um sorriso de lado. - "Sr." me faz me sentir velho.

 

Todos os alunos começaram a rir imediatamente. Lilia segurou o riso. Yakov quis morrer.

 

— Haha, é claro, Yakov, fique à vontade. - o repórter disse gostando do bom humor do rapaz.

 

Bom, essa medalha significa muito trabalho e dedicação minha e da equipe. - ele disse essa primeira parte de forma ensaiada, pois era o que o Governo queria que ele falasse. - Eu sou muito grato pela chance que o governo dá a nós, atletas. É uma honra representar a União Soviética...


— Vai começar a bajulação. - Yuri comentou.


— ... E trazer orgulho para o meu país. - terminada a fala robótica, ele disse um pouco mais animado. - Também é ótimo trazer orgulho para as pessoas que me apoiaram até aqui: meus pais, meu treinador, meus amigos... e a minha namorada, também.

 

Yakov já deveria ter ido embora antes, mas depois do "Oh" coletivo dos patinadores, ele não tinha mais forças. Lilia continuava imóvel. Ela sabia que o pior estava por vir.

 

— Isso é incrível de ouvir. Sua exibição de gala esta noite foi também muito inovadora. Você pode dizer o que a inspirou?

 

O sorriso de Yakov aumentou ainda mais.

 

— Eu fiz a coreografia com a ajuda da minha namorada. A gente queria fazer algo que divertisse e impressionasse a platéia. Acho que eles gostaram, não?

 

— Caraca, que exibido. - Georgi disse com o cenho franzido. - Parece o Victor.

 

— Ei! - Victor reclamou.

 

— Com certeza! - o repórter riu. - A sua namorada parece ser uma moça muito especial.

 

Foi como se algo acendesse nos olhos de Yakov, sinalizando que aquele assunto, sim, lhe interessava falar.

 

— Minha namorada é incrível. - ele começou com a seriedade de quem brigaria com quem discordasse. - Ela é solista do Bolshoi, uma bailarina maravilhosa. Ela também é uma ótima coreógrafa e nós trabalhamos juntos desde a escola. Nesse último programa longo, ela...

 

Lilia cobriu o rosto pela vergonha alheia, enquanto os patinadores não deixaram barato.

 

— Não economizou no vocabulário. - Mila comentou. - Só palavra difícil. "Marvellous", "Incredible", "Astounding".

 

— Ele aprendeu inglês só para esse momento. - Victor alfinetou, nem se importando com o treinador vermelho de raiva (?) ao seu lado.

 

— É muito bom ver que vocês se apoiam tanto. - o repórter teve que interromper Yakov, que parecia poder falar infinitamente sobre a namorada. - Voltando para os Jogos, o que achou da cidade de Grenoble? Naturalmente não é a sua primeira vez no exterior.

— Eu achei o lugar muito bonito, é a segunda vez que eu venho para a França. - ele deu de ombros. - Na próxima, eu quero vir com a minha namorada. O sonho dela é conhecer Paris.

 

— Eu já contei cinco vezes a palavra "namorada". - Yuri disse mostrando os dedos.

 

— Vai ver ele não sabia pronunciar "fiancée". - Mila sugeriu e todos riram mais uma vez da desgraça alheia.

 

O americano a essa hora já estava com um sorriso meio forçado, se arrependendo de ter dado brecha para Yakov falar da tal garota.

 

— Acho que já ficou bem claro que você gosta muito dela...

 

— Eu não gosto, eu amo. - Yakov rebateu sério.

 

Os patinadores foram a loucura e foi a vez de Lilia querer morrer um pouco. Yakov finalmente recuperou as forças para ir embora antes do grand finale.

 

— Que homem. - Victor disse quase batendo palmas. - A determinação, a paixão! Não se fazem mais românticos como antigamente.

 

— Shh, deixa eu ouvir! - Mila reclamou.

 

As próximas perguntas eram estritamente sobre a competição, provavelmente porque o repórter se cansou de ouvir Yakov falar sobre a namorada dele. O problema foi que Yakov percebeu isso e decidiu fazer a vida do repórter mais difícil.


— ...Para fechar as perguntas, Yakov, você pode nos dizer a melhor parte das Olimpíadas para você?

 

— Acho que conhecer novos lugares e pessoas é uma boa resposta, mas quer saber de uma coisa? - ele perguntou retoricamente. - A melhor parte é voltar para casa.

— Sério? - o homem perguntou minimamente surpreso, a próxima parte sendo dita com certa malícia. - O Oeste, com todas as suas regalias, não te conquista nem um pouco?

 

— Não. - ele deu de ombros mais uma vez, com um sorriso que de inocente não tinha nada. - Prefiro minha casa. Afinal, é em casa que tá a minha namorada.

 

Agora sim, todos os patinadores ovacionaram e bateram palmas, como o final de uma verdadeira e emblemática apresentação. Lilia se sentia com febre. Talvez porque suas bochechas simplesmente não pararam de ficar vermelhas por um segundo desde o início daquela entrevista.

 

— O camarada consegue enaltecer a namorada, humilhar o Oeste e evitar ir pra cadeia, tudo de uma vez. - Yuri disse impressionado. - Muito gay. Merece meu respeito.

 

Lilia limpou a garganta.

 

— Interessante relembrar a história da patinação. - ela disse quase numa palavra só, querendo sair dali antes que mais coisas comprometedoras aparecessem. - Voltem a treinar. Estão perdendo tempo.

 

Ela já estava longe demais para ouvir qualquer retaliação, os saltos finos fazendo um "click clack" apressado para longe dali.

 

Afinal, ela não queria estar perto quando o documentário apresentasse a chegada de Yakov no aeroporto de Moscow sendo recebido pela sua muito animada namorada.


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Notas finais do capítulo

- É mais fácil vocês verem um cantilever do que eu tentar explicar :'v: https://youtu.be/bsdjc999GuI . Sim, é o movimento da apresentação do Yuri que ele quase fica sem camisa, é.
— Tenho mais nada pra falar aqui não, esse povo é tudo gado.


E começamos 2022 finalizando uma fic de mais de ano de produção! Kkkkcry. Piadas a parte, fico muito feliz de ter conseguido concluir essa fic, algo que é bem difícil de fazer considerado meu ritmo de escrita :'vv Para a dona do aniversário/natal/ano novo, Nat, espero que eu tenha conseguido te alegrar com esse presente beeem demorado e que ele possa resgatar alguns dos momentos bons que nós tivemos com Philia :>
É só isso por hoje, pessoal, espero que tenham gostado de Born to Repeat History! ❤️ ❤️

Até a próxima~~
XOXO



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