Vontades do Destino escrita por MayDearden


Capítulo 3
Culpa




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POV Felicity

Meu coração estava dilacerado, meu corpo ardia e eu não sabia como reagir. Sabe quando você entra em transe e tudo ao seu redor parece que entra no modo “pause”? Era exatamente assim que eu me sentia. A única certeza era a minha tremedeira, e meu desespero e eu também tinha consciência das minhas lágrimas.

A sensação de estar sendo jogada de uma penhasco e sobreviver a queda. A dor da queda. 

   Eu tentava a todo custo por meu pensamento em ordem, mas eu não conseguia. Eu olhava atônita o rapaz caído a minha frete.

Eu estava completamente agoniada com a demora de Billy a festa de noivado. Thea dizia a todo tempo que eu estava parecendo uma histérica, mas Billy não era de se atrasar em seus compromissos, ele havia ligado dizendo que o carro havia dado defeito. Logo hoje. Seu carro nunca havia dado defeito. Os convidados começavam a perguntar, quase uma hora de atraso. E quando me avisam que o carro dele havia estacionado... Quando disseram que ele havia chego meu coração se acalmou. Porém ele nunca entrava, e no lugar dele entrou esse homem. Esse desconhecido que me disse que ele havia... Que Billy havia...

Caí de joelhos e senti braços em minha volta, mamãe, certeza. Ela dizia palavras que eu não entendia, eu não queria entender. Eu queria Billy comigo.

Havíamos sonhado tanto, almejamos tanto... Não podia acabar assim.

Não sei quando tempo fiquei naquele transe, não sei quanto tempo deixei a dor me consumir... Mas algo dentro de mim me disse que eu precisava vê-lo, eu queria ter certeza. Poderia ser uma brincadeira de mau gosto.

Isso.

Era uma brincadeira de mau gosto!

Soltei dos braços de mamãe, me levantei e corri para fora da Verdant. Desviando do homem caído no chão. Tinham umas pessoas em cima dele, mas ele podia apenas estar participando da brincadeira de mau gosto do Billy.

— Srta. Queen - ouvi John me chamar, mas não parei. Continuei descendo as escadas. Até que senti seus braços em minha volta - Felicity, onde você pensa que está indo?

— Eu preciso ir brigar com ele - falei entre lágrimas - John, eu preciso vê-lo - me debati em seus braços - Ver que isso tudo é mentira - debati ainda mais

— Felicity, não é mentira - ele falou segurando meus braços e me colocando de frente pra ele - Olha nos meus olhos - olhei - Não é mentira. - me sacudiu de leve - Você acha que eu não queria que fosse? Acha que eu participaria de uma brincadeira assim?

— John - chorei praticamente gritando - Eu quero vê-lo

— Melhor não por...

— Por favor - me soltei de seus braços e olhei para um beco que tinha ao lado da Verdant, um som de sirene de polícia vinha de lá. Meu coração bateu mais forte e olhei para o carro dele estacionado em frente a boate, ele só podia estar naquele beco. Corri até lá e reprimi um grito quando o vi estirado no chão. Não muito longe de mim estava Billy. Morto.

Os policiais escoltavam o local provavelmente a espera de alguma ambulância, ou algo assim. Eu não tive coragem de me aproximar, me ajoelhei ali mesmo e chorei toda a angústia que estava dentro de mim.

Meu amor havia morrido.

Tudo que sonhamos, tudo que planejamos... Nada iria acontecer...

— Ele me salvou - uma voz fraca falou atrás de mim, eu sabia quem era, o olhei com certo desdém - Se ele não tivesse aparecido seria eu ali - o homem que entrou na boate desmaiando falou, reparei que atrás dele haviam mais pessoas que deveriam tê-lo seguido. Todos com o semblante aterrorizado vendo o meu amor naquele chão frio. Alguns familiares e outros apenas funcionários e curiosos.

— Eu queria que ele não tivesse aparecido nesse beco - falei com desdém e ele simplesmente abaixou a cabeça

Me virei novamente para a cena a minha frente, o corpo de Billy estava sendo carregado em uma maca e sendo colocado na ambulância do IML. Aquela cena fez com que eu chorasse mais ainda. Eu ouvi sussurros e murmurinhos atrás de mim, não me importava com nenhum. Porém um comentário específico chamou minha atenção:

— Vamos, meu filho - uma mulher dizia - Tudo que mais me alegra nesse momento é que você está vivo.

Como assim? Ela estava alegre com a morte do meu Billy? Que morreu por culpa daquele homem que ela chama de filho. Não tinha compaixão para com o próximo? Eu não sabia exatamente o que tinha acontecido, mas se ele não estivesse aqui o meu noivo estaria vivo. Estaríamos anunciando nosso casamento para todos e estaríamos felizes.

— Como ousa dizer isso? - esbravejei os olhando, Thea foi rápida e se pôs ao meu lado me segurando para não avançar neles dois - Como pode desmerecer uma vida? Seu filho só está vivo porque alguém morreu no lugar dele!

— Calma, irmã - Thea sussurrou

— Calma? - ri sem humor - Meu noivo está morto e me pedem calma?

— Mãe, - o homem falou fracamente - não é hora para esse tipo de comentário - ele estava chorando, porém eu não conseguia ver verdade em suas lágrimas - Eu sinto muito! - Olhei mais atentamente para ele, olhos azuis igual ao meu, loiro... Queria guardar na minha memória um dos culpados pela morte do meu amor. Ele fora uns que causara a pior dor que já senti na vida.

— Eu não quero suas lamentações - chorei - Nem de ninguém - olhei no rosto de cada um ali e me soltei de Thea, reparei que os pais de Billy não estavam lá. Talvez não quisessem ter a lembrança do filho morto no chão de um beco. Eu os entendia, se eu pudesse voltar atrás eu não teria visto. Na verdade, se eu pudesse voltar atrás eu teria impedido sua morte.

Um paramédico apareceu e tratou das feridas do homem o colocando sentado em outra ambulância. Minha irmã segurou minha mão e olhou em meus olhos profundamente, seus olhos azuis banhados em lágrimas, mas se segurando para ser forte por mim. Ela estava ali por mim, deixei que ela me rebocasse dali me enfiando em seu carro. Ela disse que me levaria para casa e eu não relutei, Billy não estava mais naquele beco, seu corpo havia sido levado. Não haviam mais motivos para eu estar ali. Queria minha casa, queria minha cama, queria morrer junto com meu amor...

Quando chegamos em casa não havia ninguém lá, todos haviam ganhado folga para ir ao noivado. Minha irmã me levou para meu quarto, me puxou para o banheiro, tirou toda a minha roupa e me colocou embaixo da água fria. E todo esse tempo eu só chorava, eu queria parar, eu tentava parar, mas eu não conseguia. Meu corpo tremia, ardia, doía. Era a pior dor que eu já havia sentido.

Thea me vestiu com um pijama qualquer e me dirigiu para cama, sem pestanejar eu me deitei, aceitei de bom grado o cobertor e também seu abraço. Ele acariciou meus cabelos e ficamos assim por um tempo.

—Obrigada- falei quando eu consegui controlar meu choro e recuperar minha voz - Obrigada por estar comigo

— Onde mais eu estaria, Lissy? - beijou minha testa

— Eu falei - chorei - Falei que não estava com um pressentimento bom

— Felicity, não poderíamos ter feito nada - me abraçou mais forte

— Eu sei...

— Vai ficar tudo bem - acariciou minhas costas - Eu to aqui.

— E onde estão mamãe e papai? - perguntei ao mesmo tempo que a porta do meu quarto abria e uma Moira de cara inchada e um Robert tentando se controlar apareceram

— Estamos aqui, querida - minha mãe falou - Ficamos resolvendo algumas últimas questões do... Pagamos todo o pessoal e Roy ficou para fechar a boate.

— Minha filha - papai começou a falar deitando ao meu lado e automaticamente me aninhei em seu colo e ele me apertou contra si, e mamãe abraçou Thea - Estamos juntos nessa - assenti sentindo as lágrimas voltando - Vamos passar por isso juntos, minha princesa - beijou meus cabelos e me apertou mais forte - Papai está aqui para você, pra sempre, e você sabe.

Eu não sabia... Billy havia prometido que estaria comigo para sempre e ele não poderia cumprir a promessa. Ele não ficaria comigo para sempre, eu nunca mais sentiria seu toque, nunca mais ouviria o som da sua voz ou sentiria seu cheiro. Ele nunca mais cantaria desafinado ou brigaria por eu passar tanto tempo na Queen Consolidated... Ele não ficou comigo para sempre. E eu sei que Robert também não ficaria.

Mas eu apenas assenti. Concordando.

Perguntei sobre os pais de Billy e eles disseram que estavam arrasados, mas foram fortes ao ir para o IML resolver tudo. Papai disse que se ofereceu para fazer todos os trâmites da situação, porém o meu sogro que tentava a todo custo manter a calma o tranquilizou dizendo que tomaria a frente. Meu pai não quis ser inconveniente e insistir, então veio pra casa.

— Não tenho forças para fazer nada - sussurrei

— Você não precisa ter - mamãe disse - Você tem o tempo que precisar para se recompor - assenti

— Mas lembre-se que o quanto é forte - papai beijou minha testa

— E que Billy não ia querer te ver assim - Thea completou sorrindo fraquinho, assenti para eles e me enfiei nas cobertas novamente

Mais tarde naquele mesmo dia recebemos a notícia que o velório de Billy seria no dia seguinte de manhã cedo, o plano funerário já havia cuidado de todos os detalhes. Só precisávamos estar lá e nos despedir.

Naquela noite eu não consegui dormir, a cada tentativa eu era assombrada pela imagem dele estirado no chão. Minha mente viajava em várias situações para sua morte, vários motivos de como aquilo havia acontecido e meu rancor por aquele homem de olhos azuis aumentava dentro de mim. Acabei fazendo o que eu não fazia desde pequena... Corri para a cama dos meus pais, que me acolheram com todo carinho.

POV Oliver

Quando cheguei em casa depois do acidente eu corri até meu filho e não desgrudei dele a noite inteira, eu poderia estar morto agora. Por um fio eu nunca mais iria ter aqueles bracinhos passando em volta de mim, eu não ia acompanhar seu crescimento. Se aquele homem que eu descobri se chamar William, mas conhecido como Billy, não tivesse aparecido... Eu estaria morto.

Connor quis saber a todo tempo o motivo dos meus ferimentos. Inventei uma história qualquer e ele aceitou de bom grado. Não queria assusta-lo com a verdade, ele era pequeno demais para entender.

Fui avaliado por um paramédico que achou melhor que eu fosse levado diretamente a um médico, que disse que o choque da minha cabeça com a máscara do bandido havia me causado um traumatismo craniano, ele explicou que quando temos contato com grande quantidade de adrenalina no organismo podemos ter mais força do que pensamos em determinados momentos. E eu sei o quanto meu corpo gritava adrenalina na hora que apaguei o desgraçado. Por sorte minha tomografia não relatou um traumatismo grave, alguns remédios e repouso e eu ficaria bem.

Amanhã a tarde eu iria na delegacia esclarecer qualquer tipo de dúvida que o delegado Lance tenha sobre o caso. A intimação chegou quando eu ainda estava no hospital. Eles queriam saber como exatamente Billy foi morto.

“Seu filho está vivo porque alguém morreu no lugar dele!”

O desespero dela não sabia da minha cabeça.

As palavras de Felicity, noiva de Billy, não saia da minha cabeça. Ela estava desesperada com a situação... Quem não estaria? Eu me sentia extremamente culpado, eu me abaixei. Eu causei a morte dele. Se eu não tivesse me abaixado ele estaria vivo, teria ficado noivo e seria feliz. Mas eu não sabia que ele estava vindo. Eu não sabia que ele estava atrás de mim. Se não, eu não teria me abaixado... Certo? Eu teria morrido.

Se Billy não estivesse lá, se o bandido não tivesse se alarmado em ter matado um rico e saído correndo, ele tentaria acertar em mim novamente. Eu estava abaixado, ele desceria a arma até mim e terminaria o serviço. Billy me salvara da morte certa, e a morte foi certeira para ele. Foi certeira nele porque eu me abaixei.

Eu precisava me redimir com sua noiva, dizer que ela estava certa. Que a morte dele era sim minha culpa. Precisava contar a ela como seu amor havia morrido.

Mamãe estava aliviada, sorria, contava a todos que seu filho estava vivo e bem. “Graças a Deus” ela havia dito e eu simplesmente a corrigi e disse “Graças a Billy”. Me doía ela não demonstrar tanta compaixão para com aquela noiva desesperada, e a família do rapaz. Sei que ela não ia gostar se eu tivesse morrido e a família rica fosse indiferente com isso.

Não sei quanto tempo fiquei observando Connor dormir, me assustei com algumas batidas na porta e minha mãe apareceu de pijama. Ela iria ficar aqui em casa essa semana, Donna insistiu muito.

— Vim ver ser estava tudo certo com nosso bebê - sussurrou baixinho beijando a testa do neto que se remexeu mas continuou dormindo. - Achei que você já estava deitado

— Eu não consegui - suspirei me levantando da cadeira e indo em direção a porta sendo seguido por ela - Presenciei um assassinato - andei até o sofá e me joguei no mesmo. Mamãe se sentou ao meu lado e acariciou minha cabeça

— Pode me chamar de fria - começou - Mas agradeço por ter sido ele e não você. Como eu viveria sem você? E Connor...

— Eu sei, mãe - suspirei - Mas aquele homem tinha alguém por ele, uma família, uma vida, uma noiva...

— Você está inquieto pelo assassinato ou pelas coisas que a noiva dele falou? - perguntou intrigada - Sobre você ser culpado? Sobre ela querer que fosse você no lugar dele

— Mãe...

— O que aconteceu lá pra te deixar desse jeito? Ele não se colocou na frente da bala por você? - neguei com a cabeça. Era isso que as pessoas estavam achando? - O que aconteceu, Oliver?

Respirei pesadamente e contei para ela tudo. Desde a hora que o bandido com máscara do Pânico apareceu até a parte em que entrei na Verdant e apaguei. Parecia que eu tinha tirado um peso das costas, porém eu não se sentia totalmente aliviado. A culpa ainda tomava conta de mim. Eu me sentia uma pessoa ruim.

— Filho a culpa não é sua - mamãe falou querendo chorar - Se o destino pôs aquele rapaz atrás de você, é porque era pra ter sido assim. - acariciou meu rosto - Se fosse para você morrer hoje você teria morrido, com Billy sendo baleado ou não.

— Dói, mãe - lágrimas escorreram involuntariamente - Não sei como se livrar dessa culpa. O olhar dela de desdém sobre mim...

— O problema é a noiva? - perguntou olhando em meus olhos, não respondi - Procura ela, conta o que me contou, ela vai entender.

— Será?

— Eu tenho certeza - sorriu fraquinho - Eu só não entendo porque pesa tanto o que essa mulher pensa ou não de você - dei de ombros

Nem eu sabia o motivo.

Naquela noite dormir foi difícil, pesadelos com o acontecido e aqueles par de olhos azuis assustados me assombraram a noite toda.

Era um sentimento muito ruim carregar a morte de alguém nas costas. Por mais que eu não tivesse puxado o gatilho eu me sentia extremamente mal com tudo isso. Eu precisava contar a família dele como ele havia morrido. Precisava tirar esse peso das minhas costas. Talvez ouvindo deles, ouvindo dela, que eu não era o causador da morte do Billy eu ficaria paz comigo mesmo.

Com uma pesquisa rápida na internet eu descobri o horário do enterro, ponderei muito se devia ir ou não. Mas eles precisavam saber como aconteceu. Ela precisava. A imagem dela era constante na minha mente e uma parte de mim gritava dizendo que isso era só desculpas para vê-la. Mas outras parte de mim dizia que não era, dizia que eu precisava me esclarecer e me aliviar. Eu não conseguiria viver tranquilo com esse peso.

Deixei Connor com minha mãe na manhã seguinte e parti para o Cemitério de Starling. O dia estava ensolarado, céu azul brilhante, poucas nuvens. Um belo dia para um casal comemorar seu noivado. Fazer planos para esse casamento e para uma vida juntos. Mas não, lá estava a ex-futura-noiva com seus cachos loiros emaranhados e um vestido preto que balançava com a pouca brisa. Aquela mulher ela literalmente linda, independente da ocasião.

Observei de longe por um tempo, o padre fez uma pequena reza e quando terminou algumas pessoas se dissiparam e poucos continuaram ali. Passando mais alguns minutos ficaram apenas Felicity e um casal que acreditei serem os pais do falecido, até que eles se despediram dela com um beijo e foram. Ela continuou, chorava e falava algumas coisas que de longe eram inaudíveis para mim. Ela segurava um lenço e algumas vezes limpava as lágrimas com ele.

Percebi ser minha deixa.

Eu precisava falar com ela.

Precisava me libertar dessa agonia que tomava conta do meu interior.

Com os olhos focando nela eu me aproximei. Parei atrás dela, apesar do cheiro de terra molhada que emanava do cemitério, o cheiro de Felicity era forte. Um cheiro doce, de morangos. Um cheiro bom. Respirei fundo aquele cheiro e a chamei.

— Srta. Queen - disse baixinho, mas o suficiente para ela ouvir. Ela se assustou e virou para trás me olhando, ela me analisou bem. Seu olhar era triste e seu rosto inchado, com algumas olheiras. Ela me olhou por um tempo e então o reconhecimento veio, seu olhar triste foi tomado por raiva e rancor.

— Você... - falou com raiva

— Eu preciso falar com você - falei ainda baixo olhando em seus olhos, eu evitava olhar para a lápide, me causava uma sensação ruim. Sensação de que devia ser eu ali. - Meu nome é Oliver e…

— Eu não tenho nada pra falar com você - se desvencilhou de mim e se distanciou, fui mais rápido e segurei seu braço. Toca-lá me causou uma sensação completamente diferente de tudo que eu já tinha sentido, aquele simples toque fez meu estômago revirar em êxtase e toda uma corrente elétrica passou pelo meu corpo. Parece que ela sentiu o mesmo, pois puxou o braço em alerta e olhou por alguns segundos para onde a toquei - Você escolheu uma péssima hora para falar - falou ainda com raiva voltando os olhos para mim

— Por favor escuta o que eu tenho para te dizer...

— Olhar para você me faz mal - seus olhos encheram de lágrimas - Te olho e só penso na vida que perdi ao lado do Billy, se você não tivesse aparecido no nosso caminho de alguma forma ele estaria aqui.

— Felicity, escuta o que eu tenho para te dizer - supliquei novamente

— Você acabou com tudo!

— Por favor... - supliquei mais uma vez e ela me interrompeu

— Não me procura mais, por favor - deu as costas e saiu

Não insisti em falar com ela, não a chamei. Apenas deixei a culpa me tomar ainda mais. Era nítido que ela me culpava pela morte de seu amor. Ela havia planejado  uma vida inteira com ele e tudo havia de dissipado com um tiro certeiro no peito. Tiro esse que era para mim.

Eu não havia puxado o gatilho, mas me desvencilhei e ele fora acertado. Acho que a culpa realmente fora minha.

Na vida temos escolhas, e a minha escolha resultou na morte dele. Mas como eu saberia que ele estava atrás de mim? Ele chegou tão devagar que nem o assaltante o vira se aproximar no beco escuro.

Respirei fundo e olhei para, enfim, para a lápide.

— Sinto muito - sussurrei - Mas eu não sabia que você estava lá - permiti que as lágrimas escorressem um pouco, saísse junto com o peso que estava no meu peito - Se eu tivesse como prever, eu teria... - solucei

Eu realmente teria? Se eu soubesse que estava atrás de mim, eu teria me desvencilhado da bala mortal?

Quando cheguei em casa fui recebido por um abraço de urso vindo de Connor. Minha mãe disse que ele havia se comportado muito bem e me deu o recado de que a polícia havia ligado. Para pegar mais informações do caso e para que houvesse um reconhecimento do assassino. Amanhã mesmo eu iria.

Era totalmente impossível saber quem estava por trás daquela máscara. Nem tatuagens eu poderia indicar, pois o filho da puta estava de casaco moletom. Os dois estavam. E no desespero quem repara em detalhes?

— Papai, podemos ver filme? - Connor perguntou já no final do dia, havíamos jantado e minha mãe já estava dormindo.

— Podemos - sorri fraquinho - Que tem o desenho do Arqueiro Verde?

— Não papai, o Super Homem

— Então tá né - saquei o controle e prontamente coloquei no filme que ele pedira

Estava na cena em que o Homem de Aço leva um tiro e a bala não o mata quando Connor disse:

— Papai, você é o Super Homem

— Sou? - perguntei sem entender

— Sim - falou sorrindo sem tirar os olhos da TV - Meu herói, as balas não te machucam, papai - continuou sorrindo e assistindo o filme.

Aquilo fez com que eu respondesse a pergunta que fiz a mim mesmo mais cedo.  Eu faria de tudo para sempre estar ao lado dele. Do meu filho.

POV Felicity

Ontem foi o pior dia da minha vida. Enterrar Billy fez com que a pouca sanidade que eu tinha fosse embora. Eu estava devastada. Eu me perguntava que mau eu havia feito para merecer tanta dor, tanto sofrimento. Que mau Billy havia feito para merecer um fim tão triste, tão trágico.

Sei que não escolhemos como a vida vai ser, sei que não é um programa que escolhemos como vai agir e sua finalidade. A vida é um caixa de surpresas, em um momento está tudo em mil maravilhas, e num segundo tudo se estraçalha. Como uma bala num tiro perfeito, como uma bala certeira no coração.

Quando eu cheguei no cemitério eu me tranquei no meu quarto, não deixei que ninguém entrasse, eu não queria ser consolada, eu não queria carinhos, eu não queria palavras. Eu queria o Billy, e eu sabia que não teria.

Passei a noite em claro, não conseguia dormir sem ter pesadelos presenciando o tal ato. Pesadelos em que Oliver estava suplicando para o assaltante matar Billy ao invés dele, e assim o assaltante o fez.

Esse sonho fez com que meu rancor com Oliver aumentasse. Eu sentia tanta raiva por ele ter tido o desaforo de aparecer no cemitério. De querer desesperadamente falar comigo. Ele não tinha o direito.

A polícia estava atrás do assassino do meu noivo, o meu pai havia dito que eles interrogariam mais a fundo Oliver Smoak. Oliver quem deveria estar morto, essa era a minha única certeza. Billy quem deveria estar vivo, não ele. A bala era pra ele, o assalto era pra ele. E não pro meu amor.

— Filha se acalma - meu pai falou enquanto eu andava de um lado para o outro na nossa sala de estar

— Eu não consigo - suspirei - Quem aquele homem pensa que é para ir até o enterro? Enterro que devia ser dele

— Que horror! - Thea indagou

— Não deseje coisas ruins aos outros, Lissy - Robert segurou meus ombros me parando e olhou em meus olhos - Tudo que desejamos de mau, atraímos de ruim para nós mesmos. Pense nisso - me soltou

— Meu noivo morreu - chorei - Atrairei mais o que de ruim? - solucei. Papai suspirou e me abraçou acariciando minhas costas - Eu estou exausta. Nós tínhamos tantos planos e um vida inteira juntos pela frente, papai

— Eu sei, meu amor - falou devagar - Mas não transforme essa dor em rancor ou em raiva. Vai ser pior.

Thea se aproximou de nós e se encaixou no nosso abraço. Eu me sentia bem ali. Me sentia reconfortada. Eu sabia que eu tinha tudo, mas eu não conseguia me conformar com a perda. Eu não conseguia ver minha vida sem realizar tudo que eu e Billy planejamos.

Ficamos uns minutos abraçados, até que o telefone do papai tocou e ele ignorou fazendo com que eu e Thea soltássemos um leve risada.

Quando éramos pequenas e tínhamos esse momento nós três, eu e ela obrigavamos o papai a nunca atender o telefone. Dizíamos que esse era o memento com as filhas e não com as empresas. Ele gostava de receber ordens nossas. Pelo visto ele não esqueceu. Muito tempo que não fazíamos isso.

— Não deposite essa raiva, esse rancor nesse rapaz - Thea começou - Nesse Oliver. Ele não tem culpa.

— Mas...

— Querida, ele fora tão vítima quanto Billy, quanto você. - o celular dele voltou a tocar e ele se distanciou do abraço. Pegou o celular e viu quem era - É o Lance - colocou no ouvido e saiu.

Mamãe estava na casa da mãe de Billy, dando todo apoio que ela precisava. Desde qualquer afazer doméstico até ombro amigo. Minha mãe gostava muito dela e estava muito feliz com a união da família.

O pai de Billy estava na delegacia junto com Oliver, ele queria acompanhar tudo de perto. Acredito que seja um modo de ocupar a mente. Mas sei que ele será o que mais sofrerá depois.

Thea me encarava com pena, e eu odiava esse olhar. Eu sabia que ela não fazia por mau, sabia que ela estava preocupada comigo e só queria meu bem. Mas eu não gostava. E o pensamento de que todas as pessoas a partir de agora me olhariam assim, me fazia ficar puta da vida.

— Me desculpa - ela falou me olhando agora culpada

— Pelo que?

— Eu não te olho assim por mal, eu tô preocupada com você. E as outras pessoas a gente manda se foder.

— Eu falei tudo em voz alta? - ruborizei

— Falou - riu fraquinho - Eu só quero te ver bem.

Assenti tentando dar um sorriso para tranquilizar minha irmã. Mas sem sucesso. 

Papai voltou minutos depois e disse que o tal Oliver não conseguira identificar nenhum dos assaltantes, pois ambos estavam com máscaras de personagens de filmes de terror. E que essa dupla já estava sendo investigada pela polícia. Papai disse também que no depoimento Oliver confirmou que a bala seria para ele, se Billy não tivesse aparecido. 

Se eu pudesse voltar no tempo… 


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