Colônias Galácticas escrita por Aldneo


Capítulo 42
Café da manhã




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Após mais de três meses e meio de longa e, cada vez mais, monótona viagem, enquanto atravessava um dos conveses da nave, Karine acabou por se atentar para as janelas de um dos mirantes, percebendo que, na imensidão negra pontilhada de pequenas estrelas, quatro pontinhos brilhantes, tão próximos uns dos outros que, por vezes, chegavam a parecer um único ponto, começavam a se destacar dos demais. Comentando o fato com seus companheiros de viagem, Marcus lhe explicaria:

— Ah sim, deve ser Júpiter. Já estava mesmo pelo tempo de começar a ficar visível. Agora faltam só mais algumas semanas para chegarmos ao nosso destino.

A possibilidade de finalmente chegar ao destino da viagem acabaria por trazer algo de ânimo a jovem duquesa, o que a faria frequentar os mirantes da nave diariamente. Por vezes, ela passou horas buscando mudanças no panorama que via, ainda que tenha levado mais umas duas semanas de viagem até que um quinto pontinho brilhante se destacasse dos demais e se pudesse perceber os característicos tons alaranjados e avermelhados em meio a luz refletida pelo planeta e suas maiores luas. No dia seguinte, logo ao acordar e ir ao mirante, a garota teria uma admirável surpresa: o gigantesco planeta gasoso já se mostrava perfeitamente visível, acompanhado por alguns pontinhos ao seu redor, os quais, comparados a ele, pareciam insignificantes, e seriam suas maiores luas. Naquele horário matutino, Júpiter mostrava-se com cerca do tamanho da unha do polegar de Karine, porém, a medida que a nave se aproximaria, seu tamanho aumentaria de forma exponencial e, ao final daquele mesmo dia, já se mostrava do tamanho de seu punho fechado. Três das luas de Júpiter seriam deixadas para trás pela nave, embora, devido a distância, nenhuma delas se veria de forma diferente a um indistinto ponto (de fato, destas três luas, a que a nave chegou a se aproximar mais, esteve a, no máximo de sua aproximação, cerca de meio milhão de quilômetros). Em uma das passadas de Karine no mirante, ela se encontraria com Marcus, o qual também parecia ter ido observar a aproximação da nave ao planeta. Este, comentaria com ela:

— É realmente bonito não é? - recebendo a concordância da jovem, ele continuou: - É uma pena que a Grande Mancha Vermelha esteja na outra face do planeta e não possa ser vista… Mas ainda sim, é uma bela visão… Bem, amanhã mesmo já devemos desembarcar. - ele aparentava querer falar de outra coisa, porém, não conseguindo, se limitou a admirar a vista por mais alguns segundos antes de deixar o mirante, exclamando um indiferente “Aproveite a vista…”

O mal disfarçado incômodo de Marcus era motivado pelo fato de que ele e seus companheiros ainda não haviam decidido como lidar com aquela passageira acidental que tinham. Mesmo com a viagem durando mais de quatro meses, eles sempre adiaram a discussão de o que fazer com Karine ao chegarem em Europa. De forma que, ao deixar o mirante, ele buscaria se reunir com Klás e Ivana, com o propósito de chegarem a uma decisão (Iuri e Zara não participariam da conversa, pois foram deixados na cabine, acompanhando a aproximação ao destino, para o caso de ocorrer qualquer imprevisto; bem, ele estava ali realmente por isso, enquanto que ela, como de costume, estava ali porque ele estava).

Europa logo se destacou visivelmente diante da nave, mostrando sua grande e esbranquiçada face, cujos detalhes (como o intricado sistema de linhas, em variados tons, que iam de cinza-amarelados a róseos, e que lembravam as veias de um sistema sanguíneo) iam se revelavam a medida em que se aproximava. Para além de Europa, também se poderiam notar outras três luas (todas como simples pontinhos, distantes e indistintos), uma a sua esquerda e outras duas a direita, porém, a medida que chegavam mais perto, a lua eclipsaria a visão do próprio planeta Júpiter, assim como das demais luas que o co-orbitavam.

Uma última “noite” se prolongaria naquela nave, na qual praticamente todos a bordo tiveram dificuldades para chegar ao sono (com exceção, obviamente de Iuri e Zara, já que para eles não faria muita diferença chegarem ao destino, afinal, eles não sairiam da nave). Karine só conseguiu adormecer muito após se recolher a seu dormitório, o que também a levaria a acordar muito após o horário do desjejum (apesar que, sem o despertador de seu aparelho portátil, ela constantemente tinha dificuldades para acordar no horário correto mesmo). Naquela provável última manhã a bordo, ela despertou apenas ao colidir suavemente contra o teto de seu dormitório. Aquele acordar flutuando no ar a fez sentir um leve desespero, a forçando a se concentrar e esforçar consideravelmente na busca pela habilidade de se deslocar em gravidade nula, o que fora, por falta de uma expressão melhor, como aprender a nadar no ar (por sorte ela não corria o risco de se afogar, ainda que tenham ocorrido algumas tantas incomodas, frustrantes e dolorosas colisões com as paredes e alguns objetos que também flutuavam pela cabine). Após quase uma hora do que poderiam ser descritas como hilariantes “acrobacias” pelo dormitório, Karine finalmente começaria a dominar a habilidade de se deslocar flutuando e sairia da cabine para buscar alguém que lhe dissesse o motivo daquela situação (além de também buscar algo que comer, já que o esforço que fizera lhe aumentou a tradicional fome matinal). Avançando lentamente, porém com cada vez mais confiança, pelos corredores da nave, ela primeiramente foi ao banheiro (como quase todo mundo quando acorda), onde, o fato de ninguém nunca lhe ter explicado como fazer a toilette sem gravidade acabaria lhe trazendo alguns inconvenientes, porém nada que ela não tenha conseguido contornar, ainda que tenha, para isto, gasto bem mais tempo do que o habitual. Do banheiro ela seguiria para o refeitório. Ao se aproximar da porta, Zara cruzaria seu caminho, saindo do refeitório carregando uma garrafa na mão direita. A garota, que trajava uma camisa bem larga e flutuava com incrível destreza, demonstrando já estar muito habituada com aquela situação, pôs um olhar de surpresa sobre Karine, como o de alguém que é pego fazendo algo questionável, e lhe exclama:

— Hã… você ainda está aqui. Pensei que tinha ido com os outros… Eu e o Iuri desligamos a gravidade para… eh… ficarmos mais à vontade…

— Eu deveria ter ido com eles?

— Bem… acho que sim… ontem, eles passaram um bom tempo discutindo o que iam fazer com você agora que chegamos… Daí, quanto eles saíram, pensei que tinham te levado junto…

— Acho que não quiseram esperar que eu acordasse…

— É, deve ter sido isso mesmo… Se quiser, peço pro Iuri religar a gravidade… A gente pensou que estávamos sozinhos na nave…

— Não tudo bem… eu já estou me acostumando a flutuar – Karine comenta forçando uma expressão de bom humor. - Só o que estou precisando é comer alguma coisa.

— Ah tá. Então tá… Eu vou voltar pra junto do Iuri então… é… Até mais. Bom café da manhã. - Após a despedida, a outra garota saiu pelo corredor, demonstrando claramente sua grande maestria em viver livre da gravidade, enquanto que Karine adentrava ao refeitório para o seu desjejum.


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