A Garota dos Meus Sonhos escrita por Foster


Capítulo 5
05. Uma iminência de um clímax, um clímax e uma resolução


Notas iniciais do capítulo

MEU DEUS EU ESTOU EMOCIONADA DEMAIS, SÉRIO. Eu mal consigo acreditar que chegamos AO ÚLTIMO CAPÍTULO.
E em tempo com a playlist kkkk (já editei os capítulos anteriores incluindo o link, mas quem já tinha lido e não chegou a ver, segue: https://open.spotify.com/playlist/5WApc53CnzwWmZ5l3u2u3H) É uma mistura de Scorose e Al e Nina.
Bem, a proposta é que ainda tenha um epílogo, mas a gente conversa lá nas notas finais haha
Espero que gostem ♥



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05. Uma iminência de um clímax, um clímax e uma resolução

...

 

Sabe quando dizem que sua vida inteira passa na frente dos seus olhos quando você está em uma situação de quase morte? Bem, obviamente é uma mentira. Você não vê como se fosse um filme, isso é ridículo. Mas você sente sim aquela impressão de ter cruzado com a morte. A única coisa que eu pensei quando senti meu corpo suspenso foi: “Só pode ser brincadeira”. 

Isso mesmo, sem dramas, sem romance, sem outras percepções da vida ou coisas do tipo. Só essa baita realização de que aquilo estava realmente acontecendo. Eu realmente havia acabado de ser atingido por um veículo e estava indo ao chão depois de alguns segundos suspenso no ar. 

Sempre achei que quando eu fosse atropelado eu iria dar um jeito de juntar as partes do meu corpo enquanto estivesse no ar para proteger meus órgãos e colocaria minha cabeça entre minhas mãos ou meus braços para impedir uma batida mais forte que pudesse me matar ou pior, me deixar vegetando em uma cama por anos a fio. 

Nos filmes e nas séries, ou até mesmo nas cenas de acidentes que eu lia ou escrevia, eu sempre achava um absurdo o personagem só voar pateticamente, sem fazer nada para tentar impedir o acidente.

Mas acontece que não dá tempo. Só para você entender o que está acontecendo levam alguns segundos e reagir imediatamente à isso é quase impossível. 

A segunda coisa que eu pensei, assim que caí no chão, sentindo cada parte do meu corpo doer, é que aquela era, sem dúvida nenhuma, a pior dor da minha vida. Daquelas pancadas rápidas que te deixam desnorteados pra depois dispor de uma dor horrível e latejante. 

Fiquei estirado pelo o que pareceram longos minutos até que outras pessoas se juntaram perto de mim. Até que Ruby surgiu com os olhos azuis esbugalhados, o rosto sujo de tinta e o cabelo desgrenhado em um rabo de cavalo mal feito. Eu teria perdido a respiração ao vê-la se ela já não estivesse comprometida. 

A última coisa que pensei antes de fechar os olhos foi que era patético o fato de eu estar estirado e com dor pelo corpo inteiro na frente dela. Eu a conhecia muito bem, ou ao menos achava que sim, mas para ela eu provavelmente era só um cara aleatório com quem ela conversou em uma festa qualquer. 

Talvez fosse melhor fechar os olhos e fingir que aquele encontro desastroso não havia acontecido. Por que eu estava sempre caído quando ela me via? Não gostava nada daquele hábito e, para meu desgosto pela ironia da vida, se parecia demais com um roteiro clichê de uma comédia romântica qualquer. 

Talvez eu devesse parar de assistir a tantos filmes. Até porque naquela altura eu já tinha entendido muito bem o significado de se apaixonar.

 

 

Abrir os olhos exigia um esforço muito grande por conta da claridade que inundava o quarto e eu já estava irritado de delirar com algumas situações. Primeiro eu vi meu pai de pé e até cogitei acreditar que talvez ele estivesse finalmente conseguindo levantar, mas do nada ele começava a fazer polichinelos. Em outro momento Nina e Albus entraram de mãos dadas… Com uma penca de cinco filhos atrás. Mas quando Ruby apareceu na minha frente eu fiquei realmente amargurado.

— Ah não, de novo não. - reclamei de frustração. A Ruby ilusória estava lá, de pé, com uma camiseta verde limão. 

Mesmo a variação de seu vestuário não iria me enganar, pois aquela visão parecia muito com a que tive no meu quarto, que eu julgo ter sido um delírio ocasionado pela batida de cabeça e pelo álcool. Agora que eu estava ciente de tudo que tinha acontecido era natural que meu cérebro tentasse me enganar. Mas eu não iria deixar.

— Não posso continuar sonhando com você desse jeito, ainda mais agora que eu sei que você é real, Ruby. Não posso correr o risco… - um gosto amargo parecia preencher minha boca. - De continuar me apaixonando baseado em situações que podem ou não serem lembranças. - seus olhos gigantes conseguiram ficar ainda maiores depois do que eu havia dito. - É ridículo se apaixonar por sonhos.

Minha cabeça ainda doía e manter os olhos abertos parecia simplesmente impossível. Não queria começar a divagar sobre a veracidade das minha lembranças com Ruby. Era tudo verdade? Ou parcialmente verdade? Ou realmente fantasiei em cima de uma situação que aconteceu, mas que na realidade foi bem diferente?

Eu queria respostas, mas não naquele momento. 

— Preciso de um remédio mais forte. - murmurei antes de fechar os olhos completamente.

Não tive outros delírios depois daquele. 

 

 

— Você foi longe demais dessa vez. 

— Se eu soubesse que tudo isso acontecer teria falado na hora!

— Se você tivesse sido um bom amigo, você quer dizer.

— Eu já falei que sinto muito, o que você quer que eu faça mais?

— Pare de ser um idiota egocêntrico, só isso. 

A primeira coisa que escuto após meu acidente tinha que ser uma briga entre Albus e Nina, é óbvio, porque eles não sabem que existe lugar para determinadas coisas. Se eles tivessem a mínima noção de como minha cabeça doía, iriam fazer o favor de calarem a boca.

— Isso nem tem a ver com a gente, Nina!

— Scorpius é nosso amigo, Al, claro que tem a ver! E aconteceu porque seu orgulho idiota falou mais alto.

— Vocês querem… - minha voz praticamente não saiu, então tossi um pouco para recuperá-la. - Vocês querem calar a boca, por favor. 

Os dois se assustaram ao me ouvir, mas somente Nina correu até mim, desesperada. Albus parecia em choque e… Arrependido? Notei que Mia também estava no ambiente, com cara de poucos amigos, e se aproximou também. 

— Scorpius, como você está se sentindo?

— Como se um carro tivesse me atropelado. - respondi e Nina sorriu, acompanhada de Mia. 

— Eu não vou nem começar sobre você ter atravessado a rua de um jeito tão descuidado. Você não é de fazer isso, Scorpius. O que deu em você? - Mia indagou, cruzando os braços. Franzi o cenho, tentando me lembrar. Foi quando o clarão laranja invadiu minha mente. Eu jamais poderia me esquecer dela novamente. 

— Eu a encontrei. - falei simplesmente, sorrindo um pouco. - Ruby. 

— Eu falei que tinha sido por isso que ele atravessou a rua correndo. - Nina bufou se virando para Albus, socando seu braço. - O que significa que isso é culpa sua, seu idiota.

— O que o Albus tem a ver com isso? - perguntei me sentando, mas minha cabeça começou a latejar com força, fora toda a dor avassaladora por todo meu corpo, então fui forçado a deitar novamente. Se o momento do acidente havia sido ruim, o pós estava sendo péssimo. Eu sentia dores em mais locais agora do que eu conseguia me lembrar no momento do acidente. 

— Não é a melhor hora pra falar disso. Você precisa descansar mais. - Mia colocou a mão no meu ombro, sorrindo amavelmente, enquanto apertava um botão, provavelmente para solicitar a enfermeira. 

Como eu iria pagar por aquela estadia eu tinha lá minhas dúvidas, mas naquele momento eu só conseguia sentir dor. Só precisava descansar.

 

 

— Espero que esteja pronto para ir embora. - Mia entrou pelo quarto, sorrindo, mas minha expressão era péssima e ela sabia muito bem o porquê. 

Fiquei seis dias no hospital, depois de uma série de tomografias que constataram que estava tudo bem com meu cérebro e que a batida não havia causado muitos danos. 

Mesmo sem ter tido tempo para cair da maneira que eu sempre imaginei que cairia caso sofresse um acidente, os danos não foram dos piores, porque ironicamente caí em uma posição boa, e o carro não estava a toda velocidade. Meu braço esquerdo estava quebrado e meu queixo precisou de uns bons pontos, mas antes isso do que minha espinha ou meu pescoço. 

Mas por que eu estava tão bravo? Pelo simples fato de que Nina, Albus e Mia desapareceram da minha frente por todo esse tempo, logo depois daquela briga estranha entre o ex-casal ou casal - eu já não conseguia mais acompanhar -  em que ela jogava na cara de Albus toda a culpa pelo meu acidente.

Eles me visitaram, separadamente, pouquíssimas vezes, e sempre davam desculpas esfarrapadas sobre o que eu precisava saber ou sobre Ruby. E por falar nela, estava ligeiramente desapontado que ela não tivesse ido me ver, o que só confirmava meu receio: ela havia me achado um louco por ter sido atropelado daquela maneira. Ou só não sentiu a mesma ligação que eu.

Me arrependi imensamente de ter pedido para parar de delirar ou sonhar com ela, pois sentia uma falta enorme daqueles momentos. Por mais que eu me esforçasse, a única coisa que eu sonhava durante a noite era com um carro desgovernado vindo em minha direção, mas nada de Ruby.

A respeito do mistério todo que Mia, al e Nina estavam criando, eu cogitei inúmeras teorias diferentes na minha cabeça e estava pronto para confrontar Dominique quando percebi que minha mãe estava atrás dela, junto com Anthony. 

— Mãe? Tony? - meu primeiro pensamento foi: onde está meu pai? 

Não fui capaz nem de articular palavra alguma com tantos pensamentos me ocorrendo, mas minha mãe era extremamente perceptiva e atenciosa.

— Oi, querido. Seu pai está na casa de sua tia Daphne. É lá que vamos ficar até a sua recuperação. Desculpe não ter vindo mais cedo, mas seu pai insistiu em vir, então precisamos arranjar as coisas para a viagem e, bem… - ela encarou Tony de maneira amorosa. - Anthony foi muito gentil em dispor uma carona para nós, já que alugar um carro ficaria muito caro. É um amigo de ouro!

— Imagina, senhora Malfoy. Scorpius é como um irmão para mim. - ele sorriu para minha mãe. - Eu falei para ela que você é duro na queda, Scorpius, mas sua mãe estava louca pra te ver. - Tony se aproximou rindo, enquanto abraçava minha mãe pelos ombros, que segurava minha mão amavelmente. 

— Eu disse para a Dominique que não precisava preocupar vocês à toa. - resmunguei encarando a loira que sorria abertamente para mim, sem um pingo de vergonha. 

— À toa, Scorpius? - minha mãe ralhou, segurando meu rosto para avaliar o tamanho do curativo no meu queixo. - Isso certamente vai deixar uma cicatriz enorme. E nem preciso falar sobre seu braço. Tem sorte de não ter sido o direito. 

— Mia me ligou desesperada. Acho que ela pensou que você precisaria de um transplante ou coisa do tipo. - Anthony ria em meio aos protestos de Dominique, que revirava os olhos. - Quando contei para seus pais eles ficaram mais desesperados ainda.

Espere aí. Por que Mia entraria em contato diretamente com ele antes dos meus pais? Anthony estava em Cambrigde, a quilômetros de distância de Hogsmeade, que por sua vez ficava extremamente longe daqui. 

E o mais importante: como ele sabia que ela se chamava Mia? E qual era a razão deles parecerem tão íntimos? 

— Tony foi um anjo, Scorpius. - minha mãe olhou amorosamente para Anthony, que sorria sem jeito. - Obrigada por todo o apoio, não sei como agradecer.

— Me agradeça com uma das suas telas incríveis, senhora Malfoy. Adoraria ter uma em Cambridge.

— Apenas Astoria, já lhe disse. 

É claro!

— Vocês estão juntos. - soltei sem pensar muito. Os três me olharam apreensivos, como se eu tivesse realmente enlouquecido. 

— Filho… Que absurdo é esse? Eu jamais…

— Não, mãe. Não você. - neguei com a cabeça, fazendo uma careta de desgosto. Só cogitar aquilo me deixava enojado. - Os dois ali. 

— Do que você está falando? - Mia arriscou uma risada nervosa, mas eu não iria cair naquela. 

— Mas é óbvio! - aumentei meu tom, como se tivesse feito a descoberta do século e todos tivessem que ouvir. - O namoro secreto, a intimidade, você ligando para ele… Tudo faz sentido.

— Scorpius… - Mia tentou falar, mas ouvimos batidas na porta. 

— Com licença. - uma garota loira baixinha colocou a cabeça para dentro, arregalando os olhos castanhos. - Amor, eu posso entrar? 

— Claro. - Tony respondeu enquanto coçava a nuca. Olhei de Mia para Tony e, finalmente, para a garota que agora estava bem a minha frente.

— Meu Deus, é você mesmo! - ela sorriu abertamente, estendendo a mão. - Sou Angelina McLaggen. Uma fã. E namorada do Anthony, claro. - soltou uma risadinha nervosa. Encarei sua mão, um pouco confuso com tudo aquilo, e ela soltou um gritinho. - Ah, mas é claro, como sou distraída. - achei muito atencioso da parte dela pegar um álcool em gel para higienizar as mãos antes de voltar a estendê-la para mim, mas me perguntei o quanto aquela garota deveria saber sobre mim. 

Não tive coragem de falar mais nada por um tempo que dissesse respeito à Tony e Mia, pois eu já havia feito estrago demais em um relacionamento para a vida inteira. Dizem que dá azar você destruir um namoro, então eu não queria arriscar, pois de azar minha vida já estava repleta. Me limitei a apenas responder as respostas de Angelina, que além de minha fã era uma jornalista, e queria porque queria fazer um perfil meu para a revista que trabalhava. 

Mas por mais que eu tentasse entender, não conseguia achar a ligação entre Mia e Tony. Comentei sobre ele com ela apenas uma vez e há pouco tempo. Eu definitivamente não estava entendendo nada. 

Quando vi o carro de sete lugares de Anthony me perguntei quanto dinheiro ele realmente tinha. Talvez mais do que eu pudesse me lembrar. 

Não questionei o fato de ficar na casa de tia Daphne, pois eu ainda não estava no clima de encarar o Albus, apesar de estar desesperado para descobrir mais sobre o que estava acontecendo. Além do mais, mesmo que ela morasse relativamente perto, eu a via muito pouco, pois ela costumava viajar demais. 

Meu pai parecia muito melhor do que da última vez, apesar de nitidamente cansado pela viagem. O humor estava intacto, pois quando me viu de muletas disse que eu estava cada vez mais parecido com ele, mas que só não poderia me inspirar demais. Bem, eu estava caindo de paixão por uma artista também, então realmente tínhamos mais semelhanças do que o comum. 

— Pois bem, agora você pode me contar. - pedi quando Anthony nos deixou após o jantar, que tia Daphne insistiu para que todos ficassem, e foi embora com a namorada - que prometeu entrar em contato para me fazer mais algumas perguntas quando eu estivesse melhor, o que eu certamente não tinha dúvidas que ela faria. Minha mãe nos lançou um olhar de quem iria nos deixar sozinhos e pediu para que tia Daphne mostrasse o jardim para ela e para o papai. 

Agora éramos só eu e Mia e não teria mais nenhum segredo entre nós.  

Ela não se irritou comigo nem nada, pelo contrário, me olhou até um pouco alegre. 

— Você até que não é um escritor de mistérios muito ruim. Percebeu que eu tenho… Uma ligação especial com o Anthony. 

— Vocês são amantes? - foi a primeira coisa que me ocorreu e Mia riu, negando com a cabeça.

— Nem pensar.

— Desculpe se te ofendi. - falei sinceramente. Ultimamente estava chateando muitas pessoas, então era bom garantir que as coisas estavam bem.

— Não ofendeu. Na realidade, é algo que eu deveria ter te falado há algum tempo. 

E Mia finalmente me revelou a identidade secreta de seu namorado. Ou melhor, de sua namorada, que era ninguém menos que a prima mais velha de Anthony, Louise, irmã de Clementine, meu primeiro beijo. Aquela era uma coincidência que eu jamais teria previsto. 

Louise era uns bons cinco anos mais velha, fato pelo qual eu nunca a conheci pessoalmente, e havia se tornado sócia do primo e participado junto com ele da organização do TEDX de Anthony que ocorreu em Oxford. Foi assim que elas se conheceram, em um after no Três Vassouras. Aparentemente é um excelente bar para se apaixonar.

— Eu não tinha me assumido para meus pais ainda, então não podia correr o risco de que a informação vazasse. É o karma de ter uma penca de primos espalhados por aí. - ela se ajeitou no sofá, jogando a cabeça para trás. - Eu sei que eles não falariam por mal, mas eu queria contar primeiro para eles. Só que com tantas dificuldades lá em casa eu nunca achei a oportunidade certa. - Mia mordeu os lábios, suspirando profundamente. 

E eu a entendi completamente. Não, eu não precisava me assumir para minha família, mas eu sabia como era ter que estrangular certas informações porque tudo parece ser mais urgente no momento. 

Nós dois vínhamos de famílias humildes que passaram por poucas e boas, então eu entendia muito bem como era reprimir os sentimentos e qualquer traço de felicidade que fosse, só porque as coisas em geral não estavam muito boas. 

— Fico feliz por você. - falei finalmente, percebendo que ainda não a tinha parabenizado por isso. Seus olhos se voltaram para mim e ela sorriu, agradecendo. - Você é uma pessoa que merece ser verdadeiramente feliz. Imagino que esconder as coisas não estava sendo fácil. 

— Você não imagina o quanto.  

Ficamos por alguns segundos sorrindo enquanto nos olhávamos. Queria ter metade da força e da coragem dela. E sinceramente, o quão incrível era termos em comum fortes laços com a família Zabini? Eu poderia não conhecer Louise, mas Anthony sempre falou bem dela, não à toa eles trabalhavam juntos.

— Não é estranho namorar com alguém que tem o nome tão parecido com o do seu irmão? - questionei com uma curiosidade genuína, mas também para descontrair um pouco, e Mia riu alto. 

— Perfeitamente normal. - ela pegou minha mão por um momento, analisando-a. - Estou feliz por compartilhar com você. Acho que vocês vão se dar bem.

— Tenho certeza que sim. - apertei sua mão de volta e flagrei-a limpando uma possível lágrima.

— E antes que você pergunte de novo… - ela apertou minha mão mais forte, desmanchando o sorriso. - Eu vou te dizer o que sei sobre a Ruby. 

— Finalmente. - suspirei, tentando ficar mais aliviado, mas o fato de Mia não estar sorrindo me preocupou.

Eu estava preparado para a realidade de que Ruby me conheceu sim, mas que delirei a maior parte do tempo e que ela me achava um idiota completo por ter sido atropelado de qualquer jeito.

Independentemente de qual fosse a verdade, eu precisava acabar com aquela angústia, mesmo que meu coração falhasse uma batida a cada vez que eu pensava em jamais vê-la novamente.  

— Se você somente tivesse vindo até mim primeiro… Eu saberia na hora de quem você estava falando, Scorpius. - ela riu, balançando a cabeça. - Ruiva tagarela e avoada com vestido azul marinho com desenhos feitos à mão? Olha, eu tenho uma penca de primas ruivas, mas excêntrica assim uma só. 

— Você está de brincadeira que Ruby é sua prima. - eu praticamente não tinha voz de tão incrédulo que eu estava.

— Ruby não, Rose.

Rose. 

Um nome nunca antes me pareceu tão adequado à alguém. Ruby… Ou melhor, Rose, era como uma flor, realmente, em um clichê ridiculamente adorável que nem mesmo as mais complexas das minhas pesquisas a respeito do amor poderiam me antecipar. Cada vez mais eu tinha certeza de que minha vida havia se tornado um roteiro de comédia romântica, com todas as voltas e surpresas que se desenrolaram e, sinceramente, torcia para que fosse mesmo, pois o final feliz geralmente era algo garantido.  

Rose soava adequado, correto, bonito… 

Rose era real. Mas até que ponto?

Ao invés de ficar extremamente feliz, fiquei completamente assustado. Mia notou e tratou logo de tentar me tranquilizar, mas quanto mais eu ouvia, mais meu coração ficava acelerado e eu sentia que poderia morrer de desespero.

— Sabe, ela é uma das minhas primas mais próximas, a Rosie. Ela foi a primeira a me chamar de Mia, simplesmente porque gostava de ser diferente e sabia o quanto eu detestava Domi ou Nique. Obviamente eu adorei. 

Respirar estava totalmente impossível. Minha mente estava à mil por hora tentando unir a Rose e a Ruby em uma pessoa só, o que parecia uma tarefa impossível. Eram duas pessoas distintas para mim. 

 - Ela pode ser tagarela, mas é bem reservada no geral. Não contou nada sobre ter encontrado você na festa. E ela ama seu livro! 

Eu me sentia tão, mas tão constrangido quando alguém me dizia que amava meu livro, ainda mais ao saber que a garota com a qual eu estava fantasiando, e pior, gostando, partilhava dessa ideia só me deixava mais ansioso. 

— Sobre o restante da história, talvez seja melhor Albus te contar. - e então eu percebi a relação com o que Nina havia falado aquele dia quando acordei do acidente. Albus sabia. Sabia e não me contou. - Mas foi Rose que te acompanhou até o hospital. Ela te reconheceu na hora e me ligou. Aliás, ela disse que estava louca para ver você de novo, mas com toda a confusão… -  ela gesticulou e eu entendi que ela quis se referir ao fato de até pouco tempo atrás eu achar que a prima dela simplesmente não existia. - Eu disse que ligaria para ela quando você estivesse melhor.

Era muita coisa para processar e eu ainda nem tinha todas as respostas. Mas iria ter.

— E onde é que está o maldito do Albus? 

 

 

A visita de Nina junto com o pai não me permitiu entrar em muitos detalhes a respeito das atualizações sobre o que estava rolando entre ela e Albus, mas ela me garantiu que faria ele falar comigo nem que precisasse arrastá-lo.

Quando ele chegou deu uma desculpa esfarrapada para minha mãe a respeito do porquê ter ficado longe por quase uma semana sendo que seu melhor amigo estava quebrado. Se serviu de um prato enorme do ratatouille que ela havia preparado e ainda se atreveu a gravar um Tik Tok ao som da música Le Festin como se nada estivesse acontecendo. Como se ele não estivesse me vendendo algumas explicações. 

Mas o bom humor dele ia se dissipando conforme o tempo passava, pois minha mãe havia informado que sairia com Dominique e meu pai para conhecer melhor a cidade, então logo seríamos só nós dois, já que minha tia havia viajado novamente para checar uma coleção antiga. 

Estava relembrando todos os conselhos de Longbottom a respeito de como eu deveria observar mais as coisas pelo ponto de vista do Albus toda a vez que eu queria matá-lo quando ele se sentou na minha frente após fechar a porta para meus pais. Eu não iria falar nada, queria ver por onde ele ia começar. 

— Me desculpe. - foi um começo admirável, eu quis dizer, mas apenas fiquei em silêncio, esperando que ele prosseguisse. - Mia me disse que te falou um pouco sobre a Rose, mas deixou a pior parte para mim. E não estou reclamando! - acrescentou rapidamente quando percebeu que eu fiz uma careta.

— Eu só estou tentando entender. - falei dando de ombros e Albus assentiu, coçando a nuca. 

— Aquele dia em que você viu suas anotações sujas eu estava tentando te contar. Encontrei Rose acidentalmente na rua e ela me disse que estava com seus óculos. Ela me contou tudo e eu me liguei que ela era a tal Ruby. Eu fiquei horas colocando os assuntos em dia com ela porque, bem, você deve saber, a Rose é incrível com as palavras e também uma pessoa difícil de calar a boca. 

Saber que ela realmente daquela forma me aliviava e muito, pois talvez tudo o que eu sonhei fossem de fato memórias e não só alucinações minhas em cima de uma conversa de meia hora, talvez mais, com ela - que era o que eu estava temendo. No entanto, eu só teria certeza quando falasse com ela, e só de pensar na possibilidade meu estômago afundava.

— Ela me abriu muito os olhos a respeito da situação com Nina, do mesmo jeito que você estava tentando fazer, na verdade. - ele parecia um pouco envergonhado agora e não me encarava. - Eu percebi que tentar afastar ela somente por medo era ridículo. Eu sei lá o que pensei, eu sou um idiota.

— Concordo. - não resisti em acrescentar. Al resmungou, mas assentiu, ficando em silêncio. - Mas… - soltei um suspiro, chamando sua atenção. - Eu também não deveria ter falado aquelas coisas. Só queria te magoar. 

— Eu sei. Mas mesmo assim foi egoísta da minha parte não te falar sobre a Rose, ainda mais com você louco pra saber se ela era real ou não. Eu poderia ter evitado… Isso. - ele apontou para meus gesso e minha mais nova cicatriz no queixo, que já estava exposta sem o curativo e os pontos. 

Ri pelo nariz, mas eu discordava de Albus. 

— Você não poderia ter evitado. Não literalmente pelo menos. Quem não olhou antes de atravessar fui eu. E eu também estava fora da faixa. Mesmo se você tivesse me contado sobre Rose eu provavelmente teria ido correndo até ela e teria feito a mesma coisa, porque eu sou patético. No fim a culpa seria mnha de qualquer forma. - assumi com uma careta e Albus soltou uma gargalhada.

— Nunca pensei que o aspecto mais chato da sua personalidade iria ser responsável pelo meu perdão. 

— Só porque sou um pouco literal? 

— Um pouco? Scorpius, sua especialidade é a literalidade, não o eufemismo. 

— Alguém andou estudando. - alfinetei rindo e Albus deu de ombros. - E talvez eu tenha ficado um pouco mais com você e com Ruby. 

— Eu percebi, na verdade. - Albus riu. - Andei lendo seus rascunhos. - ele indicou com a cabeça a mochila dele, retirando uma pasta de lá. - Eu pensei em como poderia recuperar seus guardanapos de anotações, então depois que eles secaram eu procurei uma loja de fotografias para saber se eles poderiam fazer alguma coisa. - Albus me estendeu a pasta e eu vi que meus rascunhos agora estavam digitalizados e restaurados. As versões destruídas estavam anexadas e quando fui folheá-las senti o cheiro forte de leite.

Albus poderia me irritar o quanto fosse, mas ele era um bom amigo, afinal, e um pensamento ridículo me ocorreu, oriundo de algum - ou alguns - dos trinta filmes que acabei vendo em minha pesquisa a respeito do romance. Ele poderia ter sido egoísta em ter me escondido Rose, mas eu também errei em contar para Nina algo pessoal dele. No entanto, as coisas acontecem de um jeito porque precisam ser assim.

Mais de um mês atrás, quando o professor Davies me ofereceu o projeto, eu não acreditaria em nenhuma daquelas baboseiras e provavelmente teria socado a cara do Albus. Mas fosse devido aos filmes - em que um personagem sempre faz burrada e complica o enredo - ou graças às várias sessões de terapia com Neville Longbottom - talvez eu devesse avisar Albus de que o provável-futuro-sogro dele já o conhecia bem demais, ao menos todos os defeitos - que me fizeram entender que as pessoas tinham seus motivos e cometiam erros atrás de erros, e eu sabia que Albus tinha as batalhas dele. Eu fui egoísta ao querer magoá-lo e ele devolveu na mesma moeda. 

Acabei caindo na minha própria crítica, pois eu poderia ter contado tudo para Dominique desde o início e ela teria me dito, lá atrás, que se tratava de sua prima. Mas, ao mesmo tempo, isso teria, provavelmente, impedido que eu sonhasse por dias seguidos com a garota. Consequentemente, eu talvez não me apaixonasse. 

Era estranho usar aquela palavra. Paixão. Mas quando os sonhos - e lembranças - foram interrompidos enquanto eu estava no hospital que eu notei que estava sim apaixonado, pois sentia falta dela desesperadamente. 

Eu sabia do absurdo daquela afirmação, pois só havíamos nos encontrado pessoalmente três vezes. Uma, eu só me lembrava por meio de sonhos por conta da alta quantidade de álcool que ingeri no dia; a segunda, eu a vi de longe e achei que fosse uma miragem; e na terceira, sofri um acidente ridículo. E, sinceramente, a realização de que eu estava apaixonado por alguém que provavelmente me acharia louco depois de saber de todas essas confusões - isso se já não achasse - conseguia me fazer sentir pior do que quando fui atropelado. 

Desde quando eu havia ficado tão exagerado assim eu não sabia, mas desde de Ruby eu sentia demais em relação à muitas coisas. Talvez eu estivesse perdendo minha característica de ser literal. Era totalmente culpa de passar o último mês imerso em sonhos e na intensidade gritante de Rose Weasley. Mas eu não me importava nem um pouco.

Corri os olhos pelas anotações e ali estava. Passaria batido por qualquer outra pessoa, pois ao primeiro olhar parecia que eram somente numerações das páginas, mas para mim, alguém que metodicamente organiza as anotações por ordem alfabética e não numérica, era fácil perceber algo incomum. Se eu tivesse pensado em passá-las à limpo mais cedo, eu teria percebido o número 1 ao lado da letra A, o 5 ao lado do B, e assim por diante, formando o número de Rose Weasley bem diante dos meus olhos e com direito à uma assinatura em uma letra cursiva um pouco torta - talvez pelo efeito do álcool -, seguida de uma carinha feliz.

Não se esqueça :) 

 

 

Já estava de volta para o apartamento e meus pais haviam ido embora, pois minha mãe precisava reabrir a galeria, que felizmente tinha voltado a vender bem, e logo meu pai testaria um novo tratamento. O problema é que lá no apartamento eu ficava muito suscetível ao aparecimento de Rose lá, o que me deixava em pânico, de forma que precisei implorar para que Albus não resolvesse aparecer com ela por lá até que eu estivesse preparado. Achei que ele fosse ignorar e levá-la no primeiro dia, mas ele respeitou minha decisão. Talvez ainda tivesse um pouco arrependido do acidente e não seria eu a reclamar, já que ele estava muito mais proativo nas atividades de casa. 

Eu perdi a conta de quantas vezes tentei ligar para Rose e acabei desistindo de último instante.

— As plantas estão quase secas. - percebi com um pouco de tristeza quando fui conferi-las na varanda. 

— Mas é claro que estão. Você se esquece totalmente delas quando está escrevendo. - Al revirou os olhos e eu o fuzilei. - E eu não tenho talento nenhum pra cuidar delas.

— Sim, só tem talento para destruição. - indiquei algumas bitucas que estavam nos vasos e ele deu de ombros. - Se um dia você colocar fogo em alguma delas eu te mato.

— Você superestima demais minhas habilidades de destruição. Se eu não coloquei o apartamento abaixo enquanto você esteve fora, eu posso ser considerado um gênio de como viver a vida sem preocupações.

— Você tem é sorte, isso sim.  

A campainha tocou e quando Albus atendeu eu pude jurar que ele precisou se apoiar no batente da porta para não cair. 

Nina estava diante dele, mordendo os lábios, encarando-o sem parar. Eu duvidava muito que ela estivesse ali para me ver, apesar de ter me perguntado amenidades sobre como meu braço estava e se minha cicatriz de dava algum tipo de agonia. 

— Vocês querem ficar sozinhos? - perguntei ficando um pouco sem paciência com o fato de estar praticamente falando com as paredes já que os dois não paravam de se encarar. Nina pareceu constrangida e olhou para mim.

— Imagina, Scorpius, eu vim para ver como você está. 

— Nina. - apenas a olhei por cima dos meus óculos novos e ela revirou os olhos, assentindo. 

— A gente sai e você fica, não precisa se incomodar. - Al acrescentou rapidamente, mas eu neguei. Se eu ficasse, provavelmente eles conversariam em algum lugar e voltariam em algumas horas para o apartamento para fazerem as pazes, se é que me entendem, e eu provavelmente teria que sair de qualquer forma, ainda mais com a forma que eles se encaravam. 

Além do mais eu não via a cor da rua há um bom tempo, então não faria mal sair um pouco. 

 

— Moço, você está perdido? - a atendente de um empório me perguntou quando passei por lá pela terceira vez enquanto tentava decidir se entrava na galeria de Rose ou não. 

Os quadros dispostos interferiam minha visão ao que estava lá dentro e a porta de vidro estava fechada. Não queria correr o risco de me aproximar demais e ela me ver. Já estava envergonhado por não ter entrado em contato, mesmo com Al me perguntando vez ou outra se eu queria encontrá-la, ainda mais considerando que agora eu tinha o número dela.

— Não eu só… 

— Não foi você que foi atropelado há algum tempo? - ela se aproximou do meu rosto e eu me encolhi envergonhado. - Caramba, você está bem? 

— Estou. - murmurei desconfortável. 

— Você não estava… Tentando se matar né? Não vai tentar de novo, vai? - qual era o problema dela? Corei violentamente, negando enfaticamente com a cabeça. 

— Só estou procurando alguém.

— Quem? - olhei instantaneamente para a galeria e a garota acompanhou meu olhar. - Ah, mas é claro! A doidinha da galeria que te socorreu, não é?

Não gostava do tom intrusivo dela, muito menos da forma como ela havia falado de Rose. Estava prestes a rebater quando uma voz soou alta atrás de mim, fazendo com que eu congelasse no lugar. 

— Emma, você não precisa etiquetar direito os temperos, não? Da última vez que eu vim aqui você teria me vendido cominho ao invés de canela se eu não tivesse percebido. 

O sorriso forçado da garota foi a resposta antes dela se virar e me deixar sozinho, prestes a encarar verdadeiramente a garota com a qual eu sonhei por semanas. 

Meu coração estava acelerado, o suor escorria em minha testa, minha respiração estava descompassada e minha boca estava seca. Mesmo sem coragem nenhuma eu fiz força e me virei, pois apesar do medo, a vontade de finalmente vê-la com clareza me consumia.

Seu cabelo estava preso em um rabo de cavalo desgrenhado, com vários fios soltos. Os olhos azuis estavam reluzentes e, logo perto do enorme sorriso, uma mancha de tinta branca estava presente. O macacão amarelo estava manchado com uma paleta de cores praticamente completa, formando uma mistura de impressões muito semelhante ao que eu estava sentindo naquele momento: ansiedade, desespero, medo e alegria.

Estava tudo lá. Os lábios cheios e rosados, os dentes levemente tortinhos, a constelação de sardas… Tudo exatamente como eu me lembrava. 

— Oi! - seu tom de voz animado me fez arfar. Eu não queria estragar nada, então estava levando mais tempo que o seria considerado normal para responder. 

E se eu acabasse a chamando de Ruby sem querer? E se eu falasse de algum dos sonhos e ela não se lembrasse? Até porque ela estava bêbada também, possivelmente. 

Seus olhos tinham um ar de divertimento, então pigarreei e tentei encontrar minha voz. 

— Oi, Rose. 

— Não ligue para a Emma, sinceramente eu acho que foi uma péssima decisão o Hagrid contratar justo ela, que não entende nada de temperos. Francamente. – ela deu uma olhadela para dentro do estabelecimento, acenando para um homem alto, possivelmente o tal do Hagrid, que estava ao telefone. - Vem, vamos tomar um café. 

A sensação da mão dela em meu braço saudável me fez arfar e sentir todos os tipos de sensações esquisitas no estômago. Suas mãos eram exatamente como eu imaginava, ou talvez me lembrava: macias, geladas e levemente cheinhas. 

— Pelo amor de Deus, o gesso, verdade! - as orbes azuis se arregalaram. - Você está bem? É claro que está, se não estivesse não estaria aqui na minha frente. Mas sua recuperação demorou demais, não demorou? Estava começando a achar que você estava me evitando. Mas eu sei que é uma bobagem imensa pensar isso. Quero dizer, se você estava me evitando é definitivamente ruim a gente ter se esbarrado aqui. Mas se você não estava, talvez fosse só egoísmo da minha parte ficar esperando que a primeira coisa que você fosse fazer ao tirar o gesso seria me ver. Bem, só espero mesmo que você não estivesse me evitando. Se for isso eu não ligo de você arranjar uma desculpa qualquer e sair. 

Era Ruby. Definitivamente era a minha Ruby dos sonhos. 

Verborrágica, animada, exagerada e sem nenhuma papas na língua. Eu a reconheceria em qualquer lugar, com qualquer nome ou rosto que fosse. Não havia ninguém mais como ela no mundo inteirinho. Eu não ligava para o fato de que deveria considerar as possibilidades de que todo mundo possuía ao menos sete pessoas parecidas, ou que era extremamente fácil que personalidades se assemelhassem mesmo que um pouco. Eu não ligava para nada racional naquele momento. Eu só ligava para o fato de que meu coração parecia que iria sair pela minha boca e meu corpo inteiro tremia como uma batedeira. 

Quando nos sentamos frente a frente eu me senti um idiota por estar olhando para ela de uma maneira tão descarada, mas eu simplesmente não conseguia acreditar que ela estava de fato ali. 

Eu ainda estava inebriado pelo perfume doce misturado com o cheiro familiar de tinta que ela emanava em contraste com a essência de bambu - eu ao menos acreditava que fosse isso ou alguma coisa semelhante - que ela tinha no cabelo. Precisei beliscar meu pulso algumas vezes, me certificando de que aquilo era real. 

— Você está de óculos novos! - ela observou se inclinando em minha direção e eu voei para trás no ato, completamente assustado. Rose reprimiu uma risadinha, voltando a se sentar corretamente e eu quis me bater por ser tão idiota. 

— Os antigos estavam quebrados. Mas obrigado por entregá-los, Rose. - acrescentei rapidamente e ela riu, roncando levemente no final.

— Você fala engraçado mesmo quando está sóbrio. - observou e eu não contive um sorriso. Ela se lembrava então! - Me desculpe pelos seus óculos. Eu fiquei algum tempo com eles porque, bem, naquele dia você os tirou e acabou caindo neles, então pediu para eu guardar. - Rose apoiou o queixo nas mãos, sorrindo para mim. - Eu não estava em uma situação muito melhor, sabe, demorei uns dois dias para achar na minha bolsa. - seu olhar parecia pedir desculpas e eu assenti, sorrindo também, sentindo meu queixo tremer um pouco.

— Tudo bem, Rose, eu estava precisando trocar mesmo. 

— Pode ficar tranquilo que eu já dei uma lição no Albus, por não ter te contado de uma vez que eu existia. - a tranquilidade com que falou aquilo me deixou sem chão. Então ela sabia que eu achava que ela não era real. Meu Deus, que vergonha. 

— O-o quê você fez, Rose? - meu coração estava acelerado demais então eu precisava de tempo para me colocar nos eixos antes de abordar o assunto em questão. 

— Você está bem? - sua risada foi um pouco nervosa. - Já deve ter me chamado de Rose umas cinco vezes. - respirei pesadamente, engolindo em seco. Eu estava me controlando para não chamá-la de Ruby, já que ainda precisava me acostumar com a ideia de que Rose era… Bem. Rose.

— Na verdade foram quatro, Rose.

— Cinco com essa, Scorpius. - não soube se foi o sorriso maroto que ela me deu ou a forma como ela disse meu nome, mas eu senti que iria desmaiar ali mesmo. 

Felizmente ela era muito perceptiva, pois tratou de contar, com uma riqueza absurda de detalhes, como entregou alguns podres de Albus para Ginny Potter.

— Não foi nada grave, mas ela passou anos tentando descobrir quem é que tinha destruído o jardim dela. 

— Albus definitivamente não é chegado em plantas. Bom, só em uma erva específica. 

Rimos por alguns instantes e me deliciei com o som de sua risada por um bom tempo, até finalmente pedirmos algo para tomar. Eu não sei se seria capaz de engolir qualquer coisa além da minha própria saliva, de tão nervoso que eu estava, mas pedi um café forte, ao passo que Rose pediu um cappuccino cheio de chantilly. De alguma forma aquela escolha parecia adequada e eu não contive um sorriso, que não passou despercebido.

— O que é foi? - seu tom era de divertimento e eu dei os ombros, respirando um pouco mais confortavelmente agora. Mesmo assim, tomei o ar mais uma vez, para criar coragem e começar a falar sobre o que estava me consumindo nos últimos tempos. 

— É que… Bem, acho que você sabe só por cima, mas eu me lembrei de você por meio de sonhos. Diários. - pausei para respirar fundo novamente e tentar encontrar alguma reação nela, mas não teria sido necessário, pois ela sorria abertamente, indicando que estava curiosa e entretida. - E… Eu tive… - estava realmente difícil falar com ela me olhando daquela forma. - Tive…

— A sensação de que me conhecia bastante? - assenti mordendo os lábios e ela, pela primeira vez, demonstrou um traço de timidez. Tal reação fez meu coração saltar. - Eu meio que… Sonhei bastante com você, também. 

Achei que fosse desmaiar ali mesmo. O timing do café chegar não poderia ter sido mais propício, pois precisei de um enorme gole para tentar me acalmar, o que foi um erro, já que acabei queimando minha língua. 

— Você… Sonhou com o que exatamente?

— Nós dois. - ela sorriu minimamente enquanto encarava a caneca, dando de ombros. - Nossas conversas. Mas a diferença é que eu sabia que você era real e eu lembrava de você durante o dia. 

— Desculpe por isso. - eu realmente estava constrangido por toda aquela confusão, mas Rose apenas fez um gesto de quem não se importava. 

— Relaxa, eu também fiquei muito bêbada e até hoje não sei direito se lembrei de tudo certinho ou se imaginei algumas coisas. Eu sou uma pessoa muito imaginativa, se quer saber. 

— Me desculpe também por eu não ter conseguido ligar. - observei, me lembrando de que provavelmente havia prometido e Rose assentiu, semicerrando os olhos ligeiramente.

— Então você desvendou meu código nas suas anotações? 

— Sim. Recentemente na verdade.

— E não me ligou? - droga. Eu era um idiota.

— Eu… Me desculpe…

— Ei. - ela me chamou a atenção, pegando na minha mão. Não sei se poderia me acostumar aos toques dela, realmente. Talvez eu precisasse fazer alguns exames cardíacos para garantir que estava tudo em ordem, porque não era possível que meu coração saltasse toda vez que ela fizesse aquilo. - Você já pediu desculpas várias vezes, mas não precisa. Mesmo. - um sorriso gentil e pequeno brotou em seus lábios e eu respirei mais aliviado. 

Rose parecia ter um catálogo vasto de diferentes tipos de sorrisos e eu gostava daquilo. Queria saber identificá-los, queria conhecer todos. Queria ouvir todas as variações de suas risadas, queria rir de suas caretas exageradas. Aliás, quero. Rose me despertava coisas que eu tentava tanto reprimir quando sonhava com ela, com medo de que nada daquilo fosse real. Eu me sentia bem, apesar da sensação de que iria vomitar tomando conta de mim a cada cinco minutos.

— Fiquei pensando se eu havia… Imaginado a maior parte da nossa conversa. - admiti depois de um tempo e ela assentiu, mordendo o interior da bochecha. 

— Eu também fiquei pensando nisso, sabe. Queria ser uma testemunha um pouco melhor, mas eu estava só um pouco menos bêbada que você. Nós roubamos uma vodka de umas caixas que estavam no terraço, então a situação ficou realmente feia. 

— Nós fizemos o quê? Meu Deus, você estava definitivamente melhor do que eu, porque não faço ideia de que isso aconteceu.

— Foi sugestão sua. - eu mal podia acreditar no que ela dizia, mas Rose não parecia estar mentindo. - Disse que sua cabeça estava doendo demais e que aquilo precisava parar.

— Meu Deus… - coloquei a mão entre o rosto, envergonhado.

— Eu paguei para o Teddy depois, relaxa. - ela riu, finalizando o cappuccino e lambendo os lábios. - Mas nós podemos tentar reconstruir aquela noite com nossas memórias cortadas. 

Eu olhei atentamente a forma como a luz lá de fora estava iluminando nossas mãos e notei o quão elas estavam próximas. Eu sentia um formigamento, ansioso por juntá-las novamente. Foi quando eu percebi que, independente de como eu tivesse me sentido quando ela havia tocado minha mão antes, cada vez seria uma nova sensação, pois seria uma situação diferente, em contexto e intensidade, entre várias outras coisas mais. 

A vida era um pouco disso também, não era? Nenhuma conversa era igual à outra. Eu não era o mesmo de duas horas atrás, que dirá de um dia ou uma semana. Eu não precisaria reconstruir momentos, pois queria formar novos. E Rose, enquanto Ruby, foi quem me ter uma visão mais ampla a respeito de algumas coisas. Aliás, algumas era um eufemismo chulo. Eu havia mudado muito a respeito de muitas coisas.

Foi pensando nisso que eu sorri e, em um impulso de coragem, segurei sua mão. 

— Uma vez uma pessoa incrível me disse que não tinha muito sentido em querer falar sobre nós mesmos enquanto poderíamos falar sobre a vida em geral. Então por que falar do passado, quando podemos viver o presente? Ou… - suspirei, ciente de meu queixo e de minha mão tremendo. - Rascunhar o futuro? 

Rose abriu o que eu categorizei como seu maior sorriso até o momento que, para meu deleite, foi acompanhado de um suspiro pesado. Era bom perceber que ela tinha parte das minhas reações. Um ótimo sinal, na realidade. 

— Sabe, Scorpius, se não fosse a sua neura por germes eu provavelmente te beijaria agora. 

Puta que pariu.

— Quê? - foi a única coisa que eu fui capaz de balbuciar, mas Rose apenas riu da minha cara, se levantando.

— Digamos que seu pedido para roubar a garrafa de vodka também tinha relação com querer matar os germes do banheiro. - sua risada só me fez querer cavar um buraco para enfiar minha cabeça mais ainda. - Vem, vamos acertar a conta. 

Estávamos de frente para a galeria e eu havia ficado o caminho inteiro calado. 

— Meu intervalo da aula está quase acabando. - comentou olhando para o relógio e eu senti meu coração acelerar em ansiedade. - A senhorita Chang tem uma turma pequena de alunos e, bem, no final da semana vamos expor algumas obras nossas. - as mãos dela estavam para trás do corpo e Rose se balançava de frente para trás, distraída. - Se quiser, eu iria adorar que você viesse. 

Assenti ainda sem conseguir formular mais palavras e ela riu. 

— Ah, só um segundo. - ela correu para dentro da galeria e voltou quase no segundo seguinte com um grande canetão vermelho. - Vou anotar meu número aqui, só no caso de outro acidente acontecer com suas anotações. - quando ela terminou tentei ler o que mais ela havia escrito no meu gesso, pois parecia longo demais para ser só o número de telefone, mas ela abaixou meu braço, balançando a cabeça negativamente. - Vê só depois que eu for embora, por favor. - assenti novamente, de maneira patética, e ela riu pelo nariz, colocando o cabelo, agora solto, atrás da orelha. - Bem, vou entrar, então. 

Como estive observando os lábios dela pelos últimos minutos, me senti na obrigação de avisá-la sobre a tinta branca que ainda estava ali perto. Levei minha mão ao meu próprio rosto, indicando onde ela deveria limpar.

— Você tem tinta aqui… 

— Ah, isso sempre acontece. - comentou bufando, mas limpando no local errado.

Eu ri com a ironia da situação, pensando em mais ou menos quantas vezes eu deveria ter visto aquela mesma cena em um filme. 

Dei um passo para frente e limpei a tinta eu mesmo. Rose franziu o cenho, provavelmente estranhando que eu não havia utilizado a manga da minha camisa ou sacado meu fiel frasco de álcool em gel, mas havia um certo brilho em seus olhos azuis. 

Engoli em seco, sentindo meu coração bater ainda mais rápido com a realização da forma como ela tinha os pés - que até então estavam balançando para frente e para trás - elevados e de como meu corpo inclinava-se em sua direção. Cravei meus olhos em seus lábios e simplesmente os juntei com os meus. 

E aqui eu gostaria de retificar o que eu havia a respeito de beijos serem superestimados. 

Beijar Rose Weasley estava além de qualquer sensação que eu já havia vivenciado ou sequer imaginado. O gosto adocicado do cappuccino dela em contraste com o amargo que estava em meu paladar devido ao café amargo formou uma combinação interessante. 

Todas as borboletas no estômago que eu havia sentido até então pareciam inofensivas em comparação às que estavam tomando conta de mim naquele momento. Minha mão foi em direção ao rosto dela e eu a segurei com força, me certificando de que aquilo estava mesmo acontecendo e que Rose não escaparia por meus dedos. 

Não foi um beijo extremamente longo, mas foi o suficiente para nos deixar sem ar ao final dele. Grudei minha testa na dela, recusando-me a abrir os olhos. Não queria que aquilo fosse como os vários sonhos que tive com ela. Mas sua respiração entrecortada contra minha boca era real. Os fios de cabelo macios, que eu agora percorria os dedos gentilmente, eram reais. 

E eu sabia porque tudo aquila parecia tão irreal, mesmo sendo real e totalmente palpável. Após o beijo, e após eu finalmente ter aberto os olhos para encarar suas orbes azuis, eu percebi que estar com Rose era como magia. Não havia nenhuma outra definição melhor. Era simplesmente aquilo: magia, em sua mais pura forma. Era muito melhor do que qualquer representação que eu tivesse visto em minha longa pesquisa audiovisual. Era inexplicável. Era incrível. 

— Sabe. - ela começou depois de alguns instantes, mantendo nossas testas ainda grudadas. - No dia seguinte eu me remoí demais por não ter beijado você naquela noite. Mas agora eu entendi porque não pareceu certo fazer aquilo daquela forma. - eu sorri, compreendendo o que ela queria dizer. Fiz menção de depositar um beijo suave em seus lábios e ela suspirou alto. - Queria não ter aula agora. 

— Queria não ter que voltar para meu apartamento, onde provavelmente Albus e Nina estão fazendo as pazes. - comentei e Rose fez uma careta. 

— Nossa, torce para eles não resolverem fazer isso no seu sofá. 

— Considerando que eles provavelmente já fizeram na minha mesa, acho que o sofá não seria novidade alguma para eles. 

Nos separamos rindo, mantendo o contato visual. Rose apertou minha mão, olhando para os pés. 

— Eu te ligo. - garanti e ela levantou os olhos, assentindo.

— Eu sei que vai. Ainda mais depois do que eu escrevi. - com um sorriso misterioso ela roubou um beijo rápido, entrando rapidamente na galeria depois.

Conter meu sorriso era inútil, ainda mais depois que li o que estava anotado em uma caligrafia torta - aparentemente não era o efeito do álcool e Rose realmente tinha uma letra repletas de garranchos - logo abaixo do número que, naquela altura, eu já sabia de cabeça pelas inúmeras vezes que disquei e apaguei:

Sim, é ridículo se apaixonar por sonhos. Mas a paixão é ridícula. Sejamos ridículos juntos, então. 


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Notas finais do capítulo

Sobre a frase da Rose no gesso do Scorpius, caso alguém não tenha pegado a referência: SIM, ELE NÃO DELIROU COM ELA NO HOSPITAL, ELA REALMENTE FOI LÁ!!!
Eu queria dizer que terminei de editar o capítulo bem quando a última música da playlist acabou (não se enganem, eu não revisei assim tão rápido, ouvi umas três vezes no repeat KKKKKKKKKK) então eu chorei um pouquinho kkkkk Peço desculpas se tiver algum erro, mas terminar esse capítulo mexeu comigo demais, porque eu amei TANTO escrever essa fanfic aaa
Não me matem pelo que ficou não tão 100% resolvido, Al e Nina voltam no epílogo e vocês ficam sabendo se eles se desculparam ou não. Ele deve sair entre amanhã e terça - que é a data limite do projeto também KKKKKK -, mas já queria agradecer IMENSAMENTE a todo mundo que chegou até aqui ♥ Quem favoritou, quem comentou: MEUS MAIS SINCEROS OBRIGADA!!! Cada comentário foi um incentivo para produzir essa história deliciosa de escrever, então muito, muito obrigada!
Nos vemos logo para uma despedida apropriada ♥