Drania escrita por Capitain


Capítulo 27
Arauto


Notas iniciais do capítulo

yo! capitulo no prazo!
boa leitura!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/788789/chapter/27

A figura encapuzada caminhava lentamente, como se não tivesse qualquer preocupação, e sua voz profunda transbordava serenidade.

— Eu preciso dizer que fiquei bastante surpreso quando soube quem eram seus acompanhantes - a voz profunda melodiosa dele era familiar, tão familiar que me dava arrepios, mas eu não conseguia identificar de quem era - Goroth e Aurora, quem diria!

Ele conhecia Goroth e Aurora? Não só isso, ele se referia a mim como se fosse uma pessoa próxima, como se ele me conhecesse a anos.  olhei de soslaio para Goroth. ele parecia tão confuso quanto eu. Flutuando no ar com os braços e pernas abertos, os dedos esticados, e até o rosto, completamente imóvel, apenas os seus olhos iam de um lado para o outro, como se perguntassem qual a razão disso.

Tentei falar. Meus lábios não se mexiam. Olhei para aurora, também presa na mesma posição que o orc, e seus olhos contavam uma história diferente. Ela estava confusa, mas parecia reconhecer algo no homem, assim como eu.

Quem é você? Eu tentei vocalizar, mas apenas um grunhido incoerente deixou meus lábios cerrados.

O homem do manto negro como anoite pareceu intrigado ao notar minha expressão, mas foi interrompido por Rasth, que se ajoelhou em frente ao mago do mal em sinal de subserviência.

— Que Kraaz lhe abençoe, ó Xamã`- ele entoou - eu lhe devo a minha vida.

O mago não disse nada por um instante.

— Você continua sendo um desapontamento, Rasth. - Ele disse, por fim - por que todos os orcs são tão inúteis?

O orc permaneceu em silêncio.

— De qualquer forma, estou feliz que tenha encontrado Drania como lhe pedi, mesmo que não tenha tido sucesso em captura-la. - Ele continuou - e por isso, vou preservar a sua vida.

— Obrigado, grande Xamã.

— Já lhe pedi incontáveis vezes que não me chame assim - ele disse - eu sou O Arauto. Você me chamará de Mestre. Se eu ouvir você se referir a mim como xamã outra vez, vai desejar ter morrido.

— Sim, mestre.

O Arauto? Que droga era aquela?  Ele virou-se novamente para mim, e o espaço escuro sob seu capuz parecendo sugar a vida e a cor de tudo a sua volta, como se fosse o próprio representante do vazio. Havia um convite em algum lugar sob aquele capuz. Chegue mais perto, dizia, descubra quem eu sou. Em algum lugar lá dentro, era possível ver um par e olhos perscrutando o mundo em volta. os olhos brilhavam levemente em vermelho-sangue, dois círculos de fogo atravessando a escuridão que havia sob o capuz.

Ele voltou a se aproximar, retirando de algum lugar de sua túnica um grosso livro, que segurou na mão esquerda. O livro era tão grosso quanto um punho, parecia escuro e esfumaçado como o próprio Arauto, e tinha um leve tom arroxeado ao invés de preto. Com um movimento só, ele abriu o livro utilizando apenas a mão esquerda, e folheou algumas páginas, enquanto ainda mantinha o feitiço que nos segurava com a mão direita.

As páginas estavam completamente vazias. Não haviam letras ou ilustrações, apenas papel branco. Conforme ele folheava, indo do fim do livro para o começo, algumas palavras começaram a surgir, palavras soltas, com grandes espaços vazios entre elas, depois parágrafos, e por fim páginas inteiras. O Arauto parou em uma das páginas perto do início do livro, e moveu seus olhos sobre as frases.

— Ah, é claro - ele comentou, erguendo os olhos da página - você perdeu parte da sua memória quando morreu. Você tem sorte. A morte geralmente tira muito mais do que memórias.

Ele deu a impressão de olhar de relance para o espaço vazio onde minhas pernas deveriam estar, e por um segundo o vermelho dos seus olhos pareceu escurecer um pouco. o seu olhar voltou ao livro quase imediatamente, e ele começou a folhear na direção oposta, para as páginas incompletas. Quando ele chegou na última página inteira, ele parou e esperou.

De repente, letras começaram a aparecer, em idioma comum, devagar, como se uma mão invisível as estivesse escrevendo.

 As palavras diziam...

 A frase foi riscada como se a mão invisível tivesse decidido usar outras palavras. Quando notou que eu via o que estava sendo escrito, O Arauto ergueu o livro de forma a impedir-me de ler. Alguns segundos se passaram, e ele fechou o livro e o guardou. Dessa vez, ele foi até Aurora, ao invés de mim.

— Parece que eu devo ter deixado minhas amarras um pouco leves em você. - Ele disse - “entrem na cidade”... O que você está planejando, bruxa?

Ele podia ler pensamentos? Eu lembrei que Aurora havia dito para entrarmos na cidade mais cedo. Ela tinha um plano? Como O Arauto descobriu o que era? ele ergueu sua mão direita e a magia ao redor do rosto de Aurora se fortaleceu, forçando-a a cerrar os dentes.

— Devemos ter cuidado especial com magos - ele disse, calmamente - uma sílaba apenas pode dizer muita coisa, não é?

Drania e Goroth, senti a voz de Aurora na minha cabeça, como ela havia feito antes. Quando eu der o sinal, entrem na cidade. O que quer que aconteça, só entrem e fiquem lá.

Aurora? Como ele sabia o que Aurora ia dizer antes que ela dissesse? Como exatamente...

Agora! a voz de Aurora ressoou na minha cabeça. Tem que ser agora! percebi que ela não estava gritando só comigo e Goroth. Seu brado mental era para si mesma também. O Arauto não parecia perceber nossa comunicação. Ele não lê mentes? Então como ele ...

O livro.

Tinha que ser o livro. O livro que ele tinha contava o futuro.

Eu tentei me mover. Ainda não conseguia flutuar um centímetro sequer, a trilha de partículas que eu geralmente deixava para trás estava formando uma nuvem ao meu redor, controlada pelo Arauto. Aurora permanecia completamente imóvel além dos olhos e...

Os dedos da bruxa se moviam lentamente, tremendo, de fechando, colocando-se em posição. De alguma forma ela estava conseguindo vencer a magia do homem no manto negro. Ela estava tentando estalar os dedos.

Agora!

Um estalo audível se propagou pela caverna silenciosa, reverberando pelas paredes úmidas e angulosas. O Arauto afastou-se da bruxa, surpreso.

— O que você...

Uma imensa onda de choque formou-se ao redor de Aurora, explodindo em todas as direções, atirando pedras, Rasth e O Arauto para longe. De uma hora para outra, eu podia me mover normalmente.

Para a cidade! Vão!

Eu voei para entre os belos prédios de Ágora, com Goroth correndo logo atrás de mim. Levei um segundo apenas para perceber que Aurora não havia se juntado a nós. Quando a magia que a prendia foi quebrada, ela correu na direção oposta.

— Aurora? -Goroth gritou - O que você está fazendo?

Fiquem aí! A voz dela carregava uma emoção tão intensa que meus olhos fantasmas marejaram.

O Arauto levantou-se em meio á fumaça e escombros da magia de aurora, erguendo suas mãos para lançar outro feitiço...

Thalid yanaeni obsanë, Ágora-Ano!

Eu não entendia as palavras, mas de algum jeito eu sabia o que elas significavam. Ágora-mãe, proteja-nos.

O Arauto disse algo incompreensível, e Aurora foi arrancada do chão e trazida flutuando até ele.

— O que você fez? - o Mago perguntou, parecendo pouco mais do que levemente incomodado.

Nada parecia ter mudado. A caverna estava exatamente como era dois minutos antes, com a exceção das duas crateras que haviam sido abertas por Aurora e O Arauto.

— Eu venho estudando esse lugar a cinco anos - a bruxa disse - eu ainda não faço ideia de como funcionam, mas eu descobri como ativá-las.

— Do que você está falando, bruxa? - a escuridão sob seu capuz virou-se para mim e Goroth, e ele ergueu a mão para lançar um feitiço sobre nós - eu ainda posso...

Com espanto, eu percebi que ainda podia me mover. Goroth também. Aurora parecia ser a única afetada pela magia do Arauto. Tentei voar na direção da bruxa, mas algo me impediu, com uma sensação familiar. conforme eu avançava, ficava mais e mais difícil voar para longe da cidade, e quando eu me aproximei do perímetro...

O mundo virou de cabeça para baixo e eu caí na horizontal, para dentro da cidade. Entre nós e O Arauto havia uma barreira semelhante à do prédio submerso. Ele não podia nos alcançar fisicamente, nem com magia, e nós não podíamos sair. Estávamos seguros.

Só havia um problema. Aurora havia ficado do lado de fora.

O Arauto sussurrou algumas palavras, e uma fina névoa brilhante se estendeu sobre a caverna, ressaltando a barreira invisível ao redor da cidade.

— As muralhas de Ágora - Aurora sussurrou - não podem ser penetradas por magia ou força. Acredite em mim, eu passei cinco anos tentando atravessá-las.

A névoa se dissipou e a barreira voltou a ser invisível. Aurora tinha uma grande carta na manga quando resolveu que me traria até essa caverna. Aquilo me fez pensar em Zhar, por um instante. Sempre com um plano reserva. Nem sempre inclinado a me informar sobre ele. Acho que fazia sentido, já que ela não confiava totalmente em mim antes das perguntas. Ela teria onde me prender se eu fosse má.

Me pergunto se tudo isso passou pela cabeça da bruxa antes dela me trazer aqui. E percebo que eu não sei muto sobre ela. Não de verdade. Ela reconheceu O Arauto, a voz de Zhar disse na minha cabeça. você tem certeza de que confia nela?

Ela acabou de salvar a minha vida. Então, sim.

— Muito bem - a voz calma do Arauto me irritava - eu posso apenas esperar até o feitiço acabar. Eles estão presos lá dentro também. vão precisar de comida e água, ou pelo menos, o orc vai.

— Os muros só irão embora quando os inimigos o fizerem - Aurora acrescentou com um sorriso. Se voltarem aqui, eles ressurgirão. Não sou eu quem está alimentando o feitiço. é a Harmonia, magia dos elfos. Vai durar pra sempre.

O Arauto riu. Uma gargalhada sincera, sem nenhum sinal de sarcasmo ou malícia. A mudança foi tão repentina que sinceramente, me assustou mais do que qualquer outra coisa que ele tenha feito até então. Ele soltou o feitiço que prendia aurora, e ela caiu no chão, onde ficou.

— Você escolheu seu terreno com sabedoria, Aurora, minha querida - ele disse, ao fim da gargalhada - pois bem, que seja! Você não terá essa oportunidade de novo.

O mago do manto negro estalou os dedos, e Rasth aproximou-se dele, mancando. Ele devia ter sido atingido por uma das rochas que voaram quando aurora atacou, porque haviam várias feridas e arranhões espalhados pelo seu corpo, e um filete de sangue escorria da sua testa.

— Rasth, nós vamos embora. - Ele disse, de volta à sua voz entediada. Retirando o mesmo livro do manto novamente, ele folheou e leu por alguns instantes. Eu senti, claro como o dia, que havia um sorriso sob aqueles dois pontinhos vermelhos. Um sorriso cruel. - Eu não tenho nenhum uso para a bruxa. se quiser matá-la, fique à vontade.

— Não! - Goroth se jogou contra a barreira, apenas para ser lançado para trás pela força desconhecida. - Aurora!

Rasth sorria de orelha a orelha quando se aproximou de Aurora, caída no chão. Com apenas uma mão, ele a segurou pelos cabelos e a ergueu do chão. Aurora grunhiu de dor, e abriu a boca para proferir um feitiço.

— Nada disso - O Arauto fez um gesto com o dedo indicador, e um corte abriu-se no rosto de aurora, atravessando seu lábio superior e parte da sua língua. A bruxa cuspiu sangue, incapaz de proferir qualquer palavra coerente. Tentou estalar os dedos novamente, mas embora ela fizesse o movimento, nenhum som era produzido. - Rasth, ande logo com isso.

O orc passou a língua sob os lábios, claramente aproveitando o momento. ele virou-se e olhou diretamente para Goroth, erguendo Aurora como uma boneca de pano com uma mão, e uma adaga com a outra.

— Não! - Goroth berrava - Rasth!

Lentamente, Rasth ergueu a lâmina até o pescoço de Aurora, com o sorriso ainda em seus lábios. E então, com um único movimento, ele embainhou a adaga.

— Eu acho que vou leva-la comigo - ele disse, por fim - matá-la de forma rápida não vai acalmar os espíritos dos que ela matou. O Clã deve ter sua vingança segundo as tradições. - Um instante depois, ele acrescentou mais uma frase, inclinando-se na direção do Arauto - Com sua permissão, Mestre.

O Arauto, que ainda estava lendo, fez um gesto de concordância sem parecer prestar muita atenção.

— Que seja - ele disse - você pode fazer o que quiser, desde que não fique no meu caminho. Agora saia da minha frente, e faça o favor de não deixar a bruxa curar suas feridas. Ela deve permanecer muda.

— Sim, mestre. - Com um último olhar para Goroth, o Rasth jogou Aurora por sobre o ombro, e desapareceu na escuridão atrás do Arauto.

— Aurora! - o orc estava possesso - Aurora!

O Mago sem rosto fechou o livro, e aproximou-se da barreira, caminhando lentamente, até estar o mais próximo que ele podia estar dela sem ser jogado para trás. A fumaça negra que o cercava rodopiava ao redor da parede invisível, sendo repelida para longe.

— Você virá até mim, em minha fortaleza, antes da lua nova - ele disse - para que nós possamos terminar o ritual.

Nós? do que ele está falando? Eu não... eu...

— Antes que você pense em não comparecer - O Arauto virou-se para partir, e andou alguns passos para longe, antes de parar para completar a frase - saiba que estarei esperando na companhia de alguém de seu interesse.

Não.

— Qual era o nome dela, mesmo? - O vazio sob o capuz gargalhava em silêncio, se deleitando no meu desespero.

Eu senti as palavras dele como socos no estêmago.

— Ah, sim, acho que o nome dela é Alice.

 

 

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

a música que inspirou esse capítulo:
https://www.youtube.com/watch?v=O6zSnSMA6wg&feature=youtu.b
vejo vocês nos próximos!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Drania" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.