Entre Extremos escrita por Bella P


Capítulo 52
Capítulo 51




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Patrick nunca foi torturado com um Cruciatus na vida, só conhecia a experiência por tabela, pelo que Dallas lhe contou sobre o fatídico jantar com o Lorde das Trevas na mansão dos Malfoy, mas ele suspeitava que o efeito era parecido com o que estava sentindo agora. O seu corpo todo doía e a sua cabeça latejava com um pulsar constante que fazia a claridade de onde estava incomodar os seus olhos quando tentou abri-los, para fechá-los logo em seguida com força. 

— Apaguem a luz. — murmurou, mas a sua boca estava seca e rançosa, e o que os seus ouvidos captaram pareceu algo mais como "humhumhum". 

— Melhorou? — alguém perguntou e por detrás das pálpebras fechadas, Patrick percebeu que a claridade diminuiu um pouco e ele arriscou abrir os olhos. Quem havia ido ao seu socorro tinha sido Davon e o quarto em que ele estava não era o seu quarto em Godric's Hollow e menos ainda a ala hospitalar do St. Mungus. 

— Onde eu estou? — a sua garganta ardeu somente pelo esforço de falar e Davon veio ao seu socorro ao oferecer-lhe um copo com canudo e ele sorveu a água com avidez, e continuaria bebendo até esvaziar o copo, mas Davon afastou aquele bálsamo de si e Patrick soltou um resmungo de indignação do fundo de sua garganta. 

— Não vamos exagerar. Você está sem comer nada sólido há três dias, não vamos sobrecarregar o seu organismo. 

— Três dias? 

— O tempo em que você ficou desacordado. Você perdeu muito sangue. 

— Sangue? — e então, entre as profundezas de seu cérebro, a memória brotou com força o suficiente para ultrapassar a barreira criada por sua dor de cabeça. — Dallas?!

— Viva e nauseantemente irritante, como sempre. Mais um pouco e ela seria uma viúva desconsolada chorando sobre o seu caixão. 

— Não seria nada. — a própria resmungou à porta do quarto. O cabelo dela estava naquele mesmo tom platinado que ela usou no dia em que resgataram Lorraine do Ministério, e ela tinha algumas sacolas nas mãos. 

— Falando no diabo. — Davon resmungou com um rolar de olhos e foi até Dallas, recebendo dela uma das sacolas a qual ele revirou e tirou de dentro um pacote de soro. Patrick arqueou as sobrancelhas ao ver o remédio e foi então que percebeu que havia um acesso intravenoso preso no seu braço esquerdo. — Tivemos que usar da criatividade para mantê-lo vivo. Não estamos com muito acesso a poções ou ervas curativas no momento. 

— Como assim? — a garganta de Patrick ainda arranhava, mas não doía tanto para falar como minutos atrás.

— Somos procurados pelo Ministério da Magia por invasão a Hogwarts e ataque indiscriminado aos seus alunos e professores. O máximo que Davon e eu conseguimos fazer foi avisar a Aurora sobre o seu estado e que estava tudo sob controle. Mas Você-Sabe-Quem está fechando cada vez mais o cerco e temos que ser ainda mais cautelosos. Os Batedores não estão mais caçando nascidos-trouxas, estão caçando qualquer um que pertença a Resistência e os nossos nomes estão na lista. — Dallas explicou enquanto depositava a outra sacola ao pé da cama. — Por sorte muitas coisas para cuidar de você e nos manter podem ser encontradas em lojas trouxas e a Mansão Winford é o último lugar em que os Batedores pensariam em nos procurar, visto que ela está fechada e, até onde o público sabe, a minha família está escondendo-se na França. 

— Estamos na Mansão Winford? — Patrick rodou os olhos pelo quarto, que parecia abandonado à sorte. Os móveis estavam cobertos com lençóis brancos e somente a cama e duas cadeiras estavam em uso naquele momento. 

— No meu quarto, para ser mais exata. — Dallas explicou e foi até uma porta dupla na parede em frente a cama, a qual abriu e expôs um corredor onde ao fundo havia outra porta que dava acesso ao que parecia ser o banheiro. Patrick levou alguns segundos para compreender que aquilo era um closet, grande o suficiente para comportar centenas de peças de roupa. 

As vezes ele esquecia que Dallas era rica, até esses pequenos momentos acontecerem e ele lembrar que a amiga vinha de berço de ouro, apesar de sua concepção não ter sido dentro dos padrões da tradicional família britânica.

A atenção de Patrick foi para Davon, que trocava o seu soro, e então voltou para Dallas que retornou do closet e sentou ao pé da cama, com um livro nas mãos.

— Esse é… — Patrick deixou a pergunta vagando no ar.

— O livro de registro de Hogwarts? — Dallas o respondeu. — Sim. Davon e eu temos o analisado nos últimos três dias, enquanto você bancava a Bela Adormecida, e percebemos uma coisa alarmante. — ela abriu o livro em uma página divisória de capítulo, com o número 1997 em letras grandes e rebuscadas na folha. Na página seguinte, havia uma lista de nomes completos, com datas de nascimento, status familiar (sangue puro, mestiço e nascido trouxa), casas para as quais esses alunos foram sorteados e então Patrick notou, com alarme e nojo, que ao lado de alguns desses nomes também havia a data de morte.

Patrick vomitaria, se tivesse algo no estômago para pôr para fora, então no máximo o que conseguiu sentir foi náusea e repulsa. Eram crianças. Aquela era a lista dos primeiro-anistas daquele ano. Eram crianças de onze anos que foram ludibriadas para Hogwarts para então serem sequestradas e eliminadas como se fossem simples pragas domésticas. 

— Isso é doentio. — Patrick comentou, sentindo-se idiota por ainda surpreender-se com o nível de mau caratismo e psicose do Lorde das Trevas. O homem já tinha perdido toda a sua sanidade em busca do poder absoluto, isso se algum dia ele possuiu alguma. 

— Eu mandei uma mensagem para Ginny Weasley em Hogwarts. — Dallas comentou, folheando distraidamente o livro até que parou no ano de 1991 e viu, com renovado alívio, que não tinha surgido nenhuma data de morte ao lado do nome Harry J. Potter. Esta era uma verificação obsessiva que fazia nos últimos três dias, a única forma de saber que Harry ainda estava vivo, por aí, cumprindo a missão que lhe foi incubida por Dumbledore.

— Por quê? — Patrick questionou.

— Porque os nascidos-trouxas que conseguiram passar pelo crivo dos Comensais da Morte precisam ser retirados de Hogwarts, o quanto antes. — Davon explicou. — E precisamos de alguém interno para nos ajudar nesta missão. 

— Espera, espera! — Patrick ajeitou-se contra os travesseiros, sentando-se na cama para encarar melhor a dupla na sua frente.  — Missão, que missão? — Davon e Dallas trocaram olhares, Dallas mordeu o lábio inferior em um gesto nervoso que ele raramente viu a amiga cometer, e então ela finalmente respondeu:

— Aurora ordenou contato mínimo e a não confiar em ninguém. A Ordem está completamente escondida e é cada um por si neste momento. Não temos como contar com a ajuda deles para esses resgates, até porque eles estão ocupados lutando em outras frentes contra Você-Sabe-Quem. Então… Restou à nós essa missão já que o livro de registro está conosco. 

— Você está querendo arriscar a sua vida para salvar nascidos-trouxas? — Patrick disse com um tom incrédulo. A amiga não era uma má pessoa, mas também não era alguém que ele sempre visualizou como propensa salvadora da pátria. Essa carapuça geralmente servia a Harry Potter. 

— Nascidos-trouxas existem por uma razão, Patrick! — ela respondeu de forma calorosa, no mesmo tom que sempre usava quando queria convencer alguém de algum de seus argumentos. — Variedade e diversidade! Se ficarmos somente presos a sangue-puros, iremos a extinção! 

— Calma, garota. — Patrick quis rir da indignação dela, mas imaginou que o gesto não seria uma boa pedida diante de seu ferimento ainda cicatrizando. — Não estou questionando a sua lógica, ou o seu súbito altruísmo, mas somos três bruxos, dois com formação incompleta em magia, contra um exército de gente louca e com compulsão assassina. 

— Não seja modesto, Gordon. — Davon manifestou-se após ficar curiosamente calado diante do discurso acalorado de Dallas. — Você é um Corvinal, com certeza a obtenção de um diploma pelo Ministério seria apenas uma formalidade. 

— Isso é verdade. — Patrick não era um gênio como Dallas, mas era inteligente e dotado de vasto conhecimento em magia, muito obrigado. 

— Além do mais, três é melhor do que uma multidão. — o sonserino continuou. — Três chama menos atenção.

— E como, exatamente, faremos isto? — Patrick questionou. — Há esta altura Hogwarts e Hogsmeade devem ter feitiços de alerta o suficiente para avisar sobre qualquer intruso nas redondezas. — Dallas sorriu daquela forma que sempre fazia arrepios desagradáveis descerem pelas costas de Patrick. Era o sorriso de quem estava aprontando alguma coisa grande. E não deu outra.

Três dias depois, quando Patrick estava bem o suficiente para se declarado apto por Davon a seguir com a missão, Dallas os levou até a garagem da mansão, atolada de carros de luxo, esportivos e cinco enormes picapes GMC 4x4 pretas para as quais ela recolheu as chaves em um quadro de chaves perto da porta de entrada, e arremessou uma para Patrick e uma para Davon.

— Você sabe dirigir? — ele questionou a amiga. Havia tirado a carteira de motorista nas últimas férias e provavelmente com Davon o caso era o mesmo. Mas Dallas? Apesar de terem burlado o controle do Ministério, ainda sim ela estava a mais de um ano para alcançar a idade mínima para ser habilitada, o que não faria sentido ela saber dirigir.

— Desde os doze anos de idade. — ela respondeu, novamente surpreendendo Patrick com uma nova faceta sua. Claro, por que não a menina rica que vivia em uma mansão construída no meio de um gigantesco terreno com uma garagem que parecia um galpão, atolada de dezenas de carros, não saberia dirigir? Patrick que era idiota por pensar o contrário. 

Dallas foi até uma das picapes, a destravou e acomodou-se no banco do motorista. Quando girou a chave na ignição, o motor roncou alto e o ponteiro da gasolina subiu até indicar tanque cheio. Montgomery sempre tratou os carros da família como se fossem extensões de seu corpo, sempre os levando para manutenção periódica e sempre enchendo os seus tanques, para a sorte de Dallas. 

— Testem os outros carros. — ela apontou para as duas picapes à sua esquerda. — Vejam se eles também estão com os tanques cheios. — Patrick e Davon seguiram para as picapes para fazer o que lhes foi pedido e logo mais dois motores roncaram dentro da enorme garagem. Neste meio tempo, Dallas estava ajustando o rádio comunicador do carro, a procura de um canal confiável para transmissão. — Patrick, Davon, estão me ouvindo? — estática soou por alguns segundos antes da voz de Patrick soar no alto falante. 

— Por que os carros têm rádios comunicadores? 

— Meu avô era fissurado por picapes, principalmente essas grandonas como as da GMC, e costumava viajar em road trips pelo país com os amigos. Os rádios são uma forma de comunicação quando você está na estrada e serão agora a nossa forma de comunicação. Mantenham-se sintonizados no canal dois, será a nossa frequência. 

— Acho válido. — veio a voz de Davon do rádio. — Então, qual é o plano?

— Bem, como eu disse, eu mandei uma mensagem para Ginny Weasley. — Dallas explicou no rádio. Na verdade ela tinha mandado uma mensagem para Molly Weasley, que repassou para Ginny, sob o pseudônimo de Dorothy Williams, uma querida e antiga amiga que a grifinória fez durante o Campeonato Mundial de Quadribol. Ginny era uma garota sagaz e inteligente, ela com certeza entenderia as mensagens subentendidas em sua mensagem, informando quem verdadeiramente era o remetente daquela carta, a razão do contato, e suas intenções. E foi o que aconteceu.

Três dias depois, Dallas obteve a sua resposta, através de uma coruja que com certeza não fazia parte do corujal da escola ou pertencia aos Weasleys. Corujas eram confiáveis, difíceis de rastrear e leais até o fim em suas missões de entrega e aos seus mestres, mas ainda sim todo cuidado era pouco. E ver o animal causou um surto de saudades em Dallas. Osíris estava bem guardada na casa dos Gordon e inquieta por não ter a sua bruxa por perto e Dallas sentia o mesmo de volta. 

Ginny Weasley foi tão enigmática quanto Dallas em sua carta, colocando dentro de frases simples códigos de identificação, o mesmo usado por Dallas. O código era simples, na verdade, menções de textos e livros escolares, citações entre uma narrativa e outra, que ao serem consultados, obtinha-se a verdadeira mensagem que queria ser passada. Um Comensal da Morte mais esperto, que conseguisse interceptar uma coruja, conseguiria decifrar o código, mas o mundo mágico estava em completo caos, em ambos os lados, e Você-Sabe-Quem ou seus seguidores não perderiam tempo monitorando a correspondência entre duas jovens bruxas, uma que estudava em Hogwarts e outra que supostamente estudava em Ilvermorny. 

Ao menos Dallas esperava que este fosse o caso.

— Os alunos a serem resgatados já foram retirados do convívio social de Hogwarts. — Dallas explicou quando eles retornaram para a mansão, debruçados sobre a ilha central da cozinha, averiguando um rascunho do mapa de Hogwarts que eles desenharam a partir de suas lembranças da escola. — Estão todos escondidos na Sala Precisa. Mas será apenas uma questão de tempo para os Comensais darem por falta deles. Ginny explicou que os professores integrantes da Ordem que ainda estão em Hogwarts estão ajudando a manter essas crianças fora do radar, mas que o roubo do livro de registro deu aos Comensais uma ideia do que pretendemos fazer. 

— Ou seja. — Patrick interrompeu. — Os Comensais da Morte estarão nos esperando. Talvez isto, na verdade, seja uma armadilha. Talvez a verdade seja que alguns alunos escaparam do crivo deles não por falta de atenção, mas propositalmente, para servirem de isca. 

— Mesmo que este seja o caso, não podemos deixá-los lá. — Davon já havia pensado nesta possibilidade antes e isto não mudou a sua resolução em agir. Eram crianças que acharam que encontrariam um mundo de magia e fantasia e foram apresentadas ao inferno. O trauma seria permanente e para sempre nessas jovens almas.  

— Não falei em deixá-los lá. — Patrick rebateu em um tom ofendido. — Mas sim que temos que considerar a possibilidade de que não será tão fácil assim. O roubo do livro de registro foi sorte, regada pelo elemento surpresa. Mas agora os Comensais estarão esperando por uma nova investida nossa. 

— Uma nova investida mágica. — Davon ponderou e endireitou-se sobre o banco, percorrendo os olhos pelo mapa de Hogwarts e o outro que incluía Hogwarts e Hogsmeade e então o mapa da Escócia e o círculo vermelho que marcava a região em que ficava o castelo e o vilarejo mágico. 

— O que você está pensando? — Dallas perguntou quando Davon ficou muito tempo calado, de braços cruzados e mirando os mapas de forma intensa.

— Você sempre disse que o grande defeito dos bruxos sangue-puro é contar com magia para tudo e esses Comensais, em sua grande maioria, são sangue-puro. Eles irão esperar uma investida mágica nossa, chaves de portal, feitiços, aparatação em grupo… — Davon começou a explicar.

— Eles não esperarão que usemos picapes blindadas para resgatarmos esses alunos. — Dallas completou.

— Ou armamento trouxa. — Davon concluiu.

— Espera, espera! — Patrick desencostou da mesa, com as mãos erguidas em um pedido de pausa. — Armamento trouxa? Não acham que é demais? — Dallas e Davon trocaram olhares.

— Vamos ser realistas aqui. — Davon começou. — Somos três pessoas mal saídas da adolescência e não me interessa que Dallas tenha absorvido todo o conteúdo programático de sete anos de Hogwarts em sete dias, ou que você seja um Corvinal brilhante, ainda sim somos três adolescentes sem experiência alguma em combates diretos e que até o momento deram sorte em todos os confrontos que tivemos com Comensais. Estamos falando de bruxos e bruxas que lutaram na primeira guerra, muitos deles têm vasto conhecimento em duelos, portanto eu quero ter mais que alguns feitiços estuporantes em meu arsenal para garantir a nossa sobrevivência. Isso daqui não é livro de aventuras para crianças não, a chance de morrermos é grande e eu sou muito jovem e belo para bater as botas antes do tempo. 

Patrick não sabia se ficava incrédulo ou se ria do discurso de Davon. No final ele só conseguiu perguntar:

— E vocês por um acaso têm ou sabem usar armas trouxas? — Dallas e Davon mais uma vez trocaram olhares. 

— Acho que Montgomery tem alguma coisa na casa dele, de seu tempo no MI-6, mas a minha mira não é muito boa. — Dallas respondeu. 

— A minha é. — Davon esclareceu. — Caçada esportiva é um hobby da família Yale. Precisamos também fazer uma parada na B&Q antes de seguirmos para a Escócia.

— Por quê? — Dallas perguntou. Em que uma loja de produtos de decoração, construção e jardinagem iria ajudá-los?

— Bombas caseiras. — Davon explicou mais uma vez.

— Você sabe construir bombas caseiras com produtos de limpeza? — Dallas estava impressionada e Davon deu de ombros. 

— Outro hobby da família Yale. — explicou e Patrick riu antes de dizer:

— Que é qual? Entrar na lista do governo britânico como terrorista doméstico? — Davon rolou os olhos. 

— Vocês sabem que os Yale são ricos, não? Como, exatamente, vocês acham que foi construída a fortuna da família? — Dallas e Patrick trocaram olhares mas não tinham resposta para a pergunta de Davon, que rolou os olhos. — Armamentos. Nossa família é fabricante de armas desde a Primeira Guerra Mundial trouxa. 

— E você está treinando para ser curandeiro. — Patrick soltou com um leve tom de acusação na voz que ofendeu Davon, pela forma como ele franziu a sobrancelha em desagrado.

— Se você não sabe como a coisa quebrou, como espera consertá-la?

— Pessoas não são objetos para quebrarem e consertarem! — Patrick protestou diante de tirada tão causal vinda da boca de Davon. 

— Do que cacete você está falando? — Davon descruzou os braços e empertigou-se em seu banco. Havia ferocidade na voz e no olhar de Patrick, uma indignação que sinceramente Davon não fazia ideia de onde vinha e o por quê. 

— Que é pura hipocrisia você querer ser um curandeiro, salvar vidas, quando o nome e a fortuna de sua família foi feita sobre o sangue derramado de pessoas inocentes. Armas matam pessoas!

— Não! — Davon não estava nada feliz, porque aquele discurso não lhe era estranho, não era nem novo, mas era ridículo que Patrick Gordon estivesse justamente o discorrendo em sua presença. — Pessoas matam pessoas. Me diga, Gordon, quando eu cheguei aqui você tinha um buraco no peito, um pedaço de madeira cravado nele. Como conseguiu essa façanha? — Patrick não respondeu, porque Davon não deu à ele a oportunidade, continuando a sua tirada em um único fôlego. — Um ataque errante de um Comensal da Morte, não? Usando uma varinha. O que aconteceu com os Comensais que perseguiam vocês? Estão vivos ainda? — silêncio e ele mirou de Dallas para Patrick e de volta para Dallas. Ele sabia a resposta, a colega sonserina contou à ele o que foi preciso ser feito para que a dupla escapasse de Hogwarts. — Não! Estão mortos por feitiços proferidos das mesmas varinhas que vocês usaram para flutuar uma pena na aula de Flitwick no primeiro ano. Então não me venha com esse discurso batido como se você soubesse de alguma coisa! 

Patrick mordia o lábio inferior, as suas sobrancelhas estavam franzidas e Dallas conhecia muito bem aquela expressão teimosa. O amigo estava montando todo um argumento na mente e estava prestes a cuspi-lo na cara de Davon e a discussão que seguiria daí não seria nada agradável. 

— Ok, ok! — Dallas interrompeu, colocando-se entre os dois rapazes. — Somos todos amigos aqui, não há necessidade de queremos causar desavenças interna, até porque o momento não pede por isso. — enfatizou, olhando diretamente dentro dos olhos de cada um. Estavam em guerra, precisavam de união, não o contrário. — Davon, o galpão da garagem é um prédio de dois andares, Montgomery vivia no segundo andar. As chaves eu não sei onde estão, mas acredito que você conheça alguns feitiços de arrombamento, não? Veja se lá tem o armamento que você precisa. — ordenou e Davon hesitou por um segundo, como se ainda quisesse continuar aquela briga, mas felizmente pensou melhor no assunto e deixou a cozinha para fazer o que foi pedido. — E você? — Dallas virou-se para Patrick quando viu-se sozinha com ele. — O que foi isto? — questionou. Porque até ontem Patrick nutria uma paixonite por Davon e agora arrumava briga com o ex-sonserino?

Patrick não a respondeu de pronto, na verdade desviou o olhar de forma petulante para mirar uma borboleta que pousou na grama que nascia na jardineira do lado de fora da cozinha, entre as rosas espinhentas e mau cuidadas. Dallas ao menos teve o bom senso de avisar a avó que estavam usando a Mansão Winford como base de comando e que era para suspender todos os serviços de manutenção para a casa, para não correrem o risco de serem descobertos ali dentro por um jardineiro distraído. O pedido não agradou Amélia, que resmungou algo sobre a casa terminar como uma mansão decrépita quando eles finalmente retornassem para a Inglaterra, mas ainda sim atendeu a solicitação da neta. A mansão sobreviveu a um ataque em massa de Comensais da Morte, sobreviveria mais alguns meses sem ter gente podando os jardins ou limpando as piscinas interna e externa. Ao menos Dallas rezava para que esta guerra levasse apenas meses e não anos. 

— Patrick! — o chamou no mesmo tom que uma mãe usava para atrair a atenção do filho rebelde. Patrick resmungou algo inaudível sob a respiração antes de virar-se para ela.

— Você sabia que a fortuna dos Yale foi feita pela indústria armamentista? — ele questionou e a verdade era que não, Dallas não sabia. Provavelmente a empresa da família não deveria levar o nome Yale e fazia sentido pois eles misturavam-se e casavam-se com trouxas, nascidos-trouxa e a magia da família não vinha de muitas gerações passadas. Não era comum bruxos seguirem com os negócios e costumes de seus antepassados trouxas, mas uma raridade ocorria aqui e acolá. 

— Não, não sabia. Mas e daí? — Dallas realmente não entendia qual era o problema. Aurora era uma auror e o trabalho dela envolvia uma certo nível de violência. Patrick não era inocente e muito menos idiota, então por que do ataque? 

Patrick suspirou. 

— É idiotice minha. 

— É? Não me parece idiotice. 

— Não! É idiotice minha. Eu montei um Davon Yale na minha cabeça usando como base o pouco que sei dele e…

— Ah. — agora Dallas entendia. — Você criou um príncipe encantado perfeito, sem defeitos, puro de coração e alma, que vive em um palácio de algodão doce e dorme em uma cama de marshmallow. Saber que na verdade ele sabe atirar, construir bombas e que é rico e charmoso por causa da fortuna construída graças aos conflitos eternos entre a raça humana destruiu a sua visão perfeita dele. 

— É, isto o transformou em humano como eu e você, foi meio decepcionante. 

— Bem, o amor é cego, não é mesmo? 

— Totalmente. Eu vou pedir desculpas à ele mais tarde. — prometeu e cumpriu a sua promessa quando encontrou Davon no solário, limpo a muito custo com magia para retirar de seu chão branco azulejado a poça de sangue que Patrick deixou para trás quando Dallas os aparatou para a mansão. 

Davon estava sentado em uma das cadeiras do solário, com uma espingarda no colo, que ele verificava, e na mesa ao seu lado tinha três facas de caça e um caixa de munição. 

— Desculpe. — Patrick pediu quando sentou-se na cadeira oposta a Davon, que ergueu os olhos brevemente para mirá-lo e então voltou a atenção para a arma como se a presença de Patrick ali fosse insignificante para ele.

Patrick suspirou, exasperado. Sonserinos tinham o mesmo padrão de comportamento e se Davon fosse um pouquinho parecido com Dallas, seria preciso muito mais do que isto para conseguir o perdão do outro homem. Com isto, ele deixou a cadeira, ajoelhou-se no chão perto dos pés de Davon, retirou cuidadosamente a espingarda das mãos do outro rapaz e a depositou no chão entre eles. Sem uma distração, Davon foi obrigado a mirar Patrick quando estou tocou-lhe as mãos fechadas firmemente em um punho.

— Desculpe. — Patrick repetiu em um tom baixo, quase um sussurro, como se estivesse lidando com um animal assustado. Davon demorou para responder e quando o fez foi um contido "tudo bem" que fez Patrick arquear as sobrancelhas de incredulidade? — Tudo bem? — repetiu. Davon tinha feito uma tempestade em copo d'água por causa das críticas de Patrick e agora as dispensava como se não fossem nada. 

Davon suspirou.

— Você não disse nada que eu já não tenha ouvido antes. Nada que eu já não tenha dito antes, em um momento de petulância e arrogância juvenil, então, tudo bem. — ele explicou com um dar de ombros. — Apenas não achei que ouviria isto de você. — admitiu. 

Davon não conhecia Patrick a fundo, o que sabia dele não preenchia nem mesmo a página de um bloco de notas. Melhor amigo de Dallas, corvinal, jogador de Quadribol da casa, dezessete anos, que disputou uma partida com ele e os amigos na Copa Mundial de Quadribol. Mas foi na característica "melhor amigo de Dallas" que ele construiu toda a sua concepção de quem deveria ser Patrick Gordon. Alguém extraordinário, no mínimo, para fazer amizade com a sonserina com fama de arredia e gênio difícil, alguém que tinha a lealdade e o carinho dela, então não era um qualquer, não mesmo? Meninos e meninas da Sonserina que nutriam paixonites por Dallas Winford invejavam Patrick Gordon porque ele conseguiu o que eles jamais conseguiriam: a atenção de Dallas. 

A relação de Davon com Dallas era distante e informal. Colegas de casa, a única coisa que tinham em comum eram as suas visões sobre a atual situação do mundo mágico e o desprezo desmedido pelas criancices de Draco Malfoy quem Davon descobriu, com surpresa durante uma visita a antiga base da Ordem da Fênix na velha mansão Black, ser o irmão de Dallas. Um segredo poderoso que nas mãos de outra pessoa causaria desastre mas que, para Davon, era indiferente, pois a vida pessoal da colega em nada lhe interessava. Dallas e Patrick eram meros conhecidos de escola, não eram amigos, não eram próximos, mas no instante em que eles arriscaram as vidas para salvar Lorraine Yale, uma conexão formou-se entre eles. Era mais que uma dívida bruxa, era o destino deles entrelaçando-se e tomando um único caminho. Por isso Davon aceitou a proposta de Dallas em participar daquela missão louca de resgate de nascidos-trouxas, e por isso que ele ofendeu-se com a crítica de Patrick. 

— Desculpe. — Patrick pediu novamente e havia sinceridade na voz dele, o que quebrou as defesas de Davon desde o primeiro pedido. — Confesso que eu criei uma imagem sua um pouquinho perfeita demais e por isso fiquei surpreso ao saber que você é humano como qualquer um de nós. E você tem razão, o meu comentário foi indevido. Que tal encerrarmos este assunto por aqui porque temos problemas maiores com que lidar? — pediu, erguendo-se do chão e devolvendo a espingarda para Davon.

— Okay, mas… Como assim você criou uma imagem perfeita de mim? — Patrick corou diante do questionamento do outro rapaz e ficou ainda mais vermelho quando Davon ergueu uma sobrancelha diante desta reação a pergunta dele. 

— Isto é uma discussão para outro momento que não agora, ok? — Patrick informou e Davon não insistiu no assunto. 

Três dias depois, o trio deixou a mansão Winford em direção ao norte, cada um dentro de uma picape. Ginny havia enviado na noite anterior uma carta informando o local, horário e a quantidade de pessoas que precisavam ser contrabandeadas para fora de Hogwarts, para fora de Hogsmeade na verdade. O plano não seria fácil de ser executado, a começar pelos carros que eles usariam como transportes. Como veículos trouxas, eles não poderiam entrar no vilarejo, a magia que cercava e protegia o lugar destruiria os motores e sistema eletrônico dos carros e como eles não sabiam onde começava a barreira, a decisão tomada foi de seguir dirigindo até que a picape manifestasse a mínima interferência que fosse em seu sistema, indicando que eles estavam próximos de um campo mágico. A outra parte do plano incluía bombas caseiras, a camuflagem noturna, relógios cronometrados e muita sorte regada a coragem estúpida. 

— Estou me sentindo um grifinório neste momento. — a voz de Davon soou no rádio de Dallas. — Achando que posso conquistar o mundo com uma bomba de fumaça, uma espingarda de caça e uma varinha, sem noção alguma que tenho 99.9% de chances de morrer nesta empreitada. — Dallas riu e recolheu o rádio para responder. 

— E os 00.1% restantes? Garantia de sobrevivência? 

— Não, mutilação permanente. — Davon respondeu e ela gargalhou novamente. De nervoso e do absurdo da situação. 

Se há seis anos alguém viesse à Dallas e lhe dissesse que um dia ela estaria arriscando a sua segurança, a sua vida, por uma causa, para salvar a vida de terceiros, ela riria da situação. Mas agora? Enquanto cruzava a Inglaterra a caminho da Escócia, a única coisa que podia pensar era nas palavras de sua avó:

"Seja o Príncipe Encantado da sua própria história". 

E se Dallas estava sendo o Príncipe Encantado, como em todo bom conto de fadas, era a função dela salvar a donzela em perigo, não?


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