(Re) Nascer escrita por EsterNW


Capítulo 17
Casa cheia


Notas iniciais do capítulo

Música do capítulo: Tocando Em Frente do Almir Sater.



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Leigh saiu do banheiro coçando os olhos naquela manhã. Era tão cedo, que os primeiros raios de sol tocavam o piso de tacos da sala. Rosa ainda dormia e não acordaria tão breve, provavelmente. Dias sem aula precisavam ser aproveitados, ela com certeza diria, se estivesse desperta.

O estilista colocou os pés em seus chinelos de dedos novos sobre o piso de caquinhos da cozinha e encheu uma xícara com café preto. Não havia leite, logo, Lysandre deveria estar ordenhando a vaca naquele momento. Sentia-se na obrigação de ajudar o irmão, mas, conhecendo-o bem como apenas ele conhecia, sabia que era melhor assim.

Abriu um dos potes sobre a mesa e cortou um pedaço do pão caseiro, passando manteiga. Apreciou o sabor e maciez do alimento em silêncio, ouvindo apenas o galo cantar ao longe em algum momento. Lysandre era um bom cozinheiro, não podia negar.

A porta dos fundos foi aberta repentinamente e o próprio entrou, carregando um balde de alumínio cheio de leite. As mangas da blusa de lã dobradas até a altura dos cotovelos deixavam à mostra os músculos do braço esquerdo, tencionando ao segurar o peso.

— Deixe que eu te ajudo — Leigh disse, ajudando Lysandre a colocar o balde sobre a pia.

O estilista pôs um pouco do leite dentro de uma jarra e o fazendeiro deixou o restante dentro do recipiente de alumínio, cobrindo-o com um pano e pondo-o no chão em um dos cantos da cozinha.

— Como anda a produção do queijo? — Leigh questionou, voltando a se sentar à mesa e colocando leite em seu café.

— Chico teve a ideia de vender o queijo na quermesse. Ele irá conversar com seu Juca amanhã. Obrigado — o fazendeiro explanou e agradeceu quando o irmão despejou um pouco de leite na xícara de café preto que ele colocou sobre a mesa.

O estilista passou-lhe o pote com o pão caseiro, faca e manteiga.

— Clarice disse que irá examinar Julieta quando vier amanhã — Lysandre continuou a conversa, passando manteiga no alimento. — Exame de rotina, agora que está totalmente recuperada depois do parto.

— Ela vem com frequência à fazenda? — Leigh questionou, terminando de engolir o que comia. 

O galo cantou mais uma vez do lado de fora, porém, dessa vez a casa não estava mais no completo silêncio.

— Dia sim e dia não — Lysandre respondeu e o estilista apenas assentiu com a cabeça.

Era bom ver que o irmão mantinha contato com mais pessoas na fazenda. Ele vivera bem isolado no ano interior, indo poucas vezes à vila e pouco conversando com os outros moradores. 

— Bom dia, seu Lysandre, seu Leigh — Chico logo cumprimentou ao entrar na cozinha de supetão, trazendo uma cesta com alguns ovos.

Os irmãos devolveram a saudação e Lysandre se levantou para ajudar o caseiro.

— Provavelmente não teremos ovos tão cedo — o fazendeiro afirmou e acabaram de guardar todos os ovos. A cesta vazia foi deixada sobre a mesa.

— Agora só mês que vem — o caseiro afirmou, lavando as mãos na pia.

— Não quer tomar café conosco, Chico? — Leigh ofereceu, terminando de comer de seu pão.

— Já que o senhor tá oferecendo, eu aceito — ele respondeu e se sentou à mesa com os irmãos.

O fazendeiro passou-lhe a comida e a faca, além de ir pegar outra xícara no armário para colocar café.

— Antes que eu me esqueça, seu Lysandre... — o caseiro começou, assim que ele retornou para a mesa. — Posso tirar o dia de amanhã de folga? Meu filho vai vir pra ficar até o fim do mês com a gente e queria passar o dia com ele.

— Almir já entrou de férias da faculdade? — Leigh logo perguntou.

— A faculdade dele entrou um pouco mais cedo, essa semana agora — o caseiro explicou, colocando leite no café puro. — Ele vai ficar até dia 30 aqui e depois vai pro Rio, ficar com os parentes da mãe dele — finalizou, bebendo um gole do café.

— Pode tirar o final de semana de folga, Chico — Lysandre afirmou com um sorriso, deixando o caseiro espantado.

— Não precisa de tudo isso não, seu Lysandre! Só o sábado já tá bom. Tenho que ajudar o senhor com a fazenda — Chico protestou.

— Lysandre terá um par de mãos a mais até domingo, Chico — Leigh se meteu na conversa, oferecendo os próprios serviços. — Aproveite o final de semana com o Almir.

O caseiro olhou sem jeito para os dois irmãos, que sorriam amigavelmente para ele. Chico coçou a cabeça, tendo esquecido o boné na casinha.

— Já que vocês insistem… — Deu de ombros. — Obrigado.

Após o agradecimento, os irmãos ergueram suas respectivas xícaras em sincronia, iniciando um brinde.

Finalizado o trabalho exaustivo na fazenda naquela manhã de sábado, Leigh resolveu descansar um pouco, sentado na varanda da frente. Lysandre insistiu em continuar com o serviço, recebendo Clarice quando esta se apresentou e seguiu com ela para o curral. 

Já Rosa… Não era difícil perceber que estava um pouco emburrada, sem ter muito o que fazer no interior. Provavelmente estava conversando novamente com Alexy pelo WhatsApp. Vai saber…

— O que você tá fazendo, amor? — A namorada surpreendeu-o com a voz quase ao pé do ouvido. Leigh virou o rosto, vendo Rosa abaixando o rosto ao seu lado.

— Lysandre deixou essas palavras cruzadas em cima da mesa. Estava toda vazia, então resolvi preencher — explicou, mostrando a ela a revista e caneta que tinha em mãos.

A moça se sentou ao lado dele na escada da varanda da frente.

— Cadê ele, falando nisso? — ela questionou, deitando a cabeça sobre o ombro do estilista e observando a natureza.

Apesar de entediante, não dava pra negar o quão era lindo aquele lugar. O verde ia até onde a vista alcançava, o céu limpíssimo e sem nuvens, os pássaros voando ao longe.

— Foi receber Clarice — disse sucinto, mais absorto em completar os quadradinhos na folha. — Aquilo que brilha por todos os lados? — disse mais para si mesmo. — Omniful…

— Eles são bem próximos, né? — Rosa puxou assunto de repente, distraindo-o da palavra. — E são tão lindinho juntos também. — A moça ergueu o olhar, encontrando os olhos castanhos do namorado a observá-la. — Que foi?

Ele não respondeu, colocando a caneta entre as páginas da revista e fechando-a.

— Nem tente fazer o que está pensando, Rosa — ele alertou. — Deixe que aqueles dois se resolvam no seu próprio tempo.

— Eu nem falei nada — ela se fez de desentendida. — Só ia dizer que eles formam um bom casal — tentou evitar, por fim.

Leigh se viu obrigado a concordar, porém, permaneceu em silêncio, passando o braço esquerdo sobre o ombro da namorada.

— Quem é aquele lá vindo com o Chico? — ela perguntou, mexendo a cabeça para apontar ao longe.

Um pouco após a entrada da fazenda, a caminhonete vermelha de Lysandre parou, saindo de lá o caseiro e um rapaz na casa dos vinte anos. Ele foi para a parte de trás do veículo, retornando de lá com um enorme pedaço de arame. O caseiro o ajudou a transportar, segurando a parte de trás e deixando-o guiar o caminho.

— É o filho do Chico, o Almir — Leigh explicou. — Você estava dormindo quando ele chegou, hoje de manhã. Depois os dois foram passar algumas horas juntos na vila. — O estilista postou-se de pé, estendendo uma mão para ajudar a moça a se levantar. — Ele ficará até o final do mês na fazenda.

— Ah, não é aquele rapaz que veio aqui bem rápido no natal do ano passado? — Rosa questionou, recebendo uma aceno de confirmação. — Não parece muito com o Chico — comentou, assim que ambos pai e filho estavam mais próximos da casa.

Almir era alto e com porte atlético, ao contrário do pai, e possuía os cabelos com alguns cachos e quase loiros, cortados na altura do queixo e presos em um rabo de cavalo naquela ocasião. Os únicos traços semelhantes com Chico eram os olhos escuros e os lábios finos. Almir parecia demais com a própria mãe, Madalena Lemos.

— Leigh — Almir cumprimentou o estilista, assim que chegaram à varanda. — Olá — disse para Rosalya, vendo-a ao lado do namorado.

— Trouxemos a tela pra trocar a do galinheiro, seu Leigh — Chico explicou.

— Deixem nos fundos, por favor — o estilista orientou, vendo os dois começaram a se afastar. — Querem entrar pra tomar um café? 

— Claro! — Almir respondeu de pronto. — Acabamos não comendo nada depois do almoço na vila — explicou, deixando claro que estava com fome.

Pai e filho sumiram pela lateral da casa e Leigh e Rosalya entraram.

— O Lys-fofo já passou o café? — ela questionou assim que chegaram à cozinha e tomou seu lugar à mesa.

— Ainda não… — Leigh começou a dobrar as mangas da camisa e pegar os utensílios de preparo. — Mas ele está ocupado com Clarice. Eu mesmo irei fazer — disse, tirando a chaleira do armário e enchendo-a com água.

— Você quase se queimou da última vez que tentou fazer café sem cafeteira — ela relembrou, colocando o queixo sobre a mão e apenas observando o namorado pôr a chaleira sobre o fogo, tentando acender o fogão a lenha.

— Ué, seu Lysandre tá com a doutora Clarice ainda? — Chico questionou ao entrar e não ver o patrão presente. Àquela hora, normalmente o cheiro de café já estaria presente em todo o ambiente.

— Deixa que eu te ajudo com isso — Almir ofereceu, entrando logo atrás do pai e fechando a porta. 

— Clarice terá um pouco mais de trabalho hoje. Irá examinar Julieta também — o estilista explicou, colocando a chaleira sobre uma das bocas do fogão e esperando o rapaz acender o fogo, abaixando e alimentando-o com a lenha.

Chico apenas fez um "ah" e se ofereceu para preparar o coador e as demais coisas para o preparo do café. Já seu filho, afastou-se do fogão e deixou Leigh para cuidar de ferver a água.

— Olá — Rosa disse, fazendo o universitário olhar para trás. — Sou Rosalya — apresentaram-se e ambos trocaram um cumprimento, com Almir sentando-se em uma das cadeiras livres.

— Almir — respondeu com seu próprio nome, observando Leigh ocupar o lugar ao lado da namorada, esperando a água ferver.

— Eu lembro de ter te visto rapidinho no último natal. Só não paramos pra conversar — Rosa relembrou, deixando claro que o conhecia apenas de vista.

— Acabei passando bem rápido por aqui no final do ano, só pra desejar feliz natal pro meu pai — explicou, apontando para o caseiro, que foi sentar-se ao lado do filho, finalizada a organização dos utensílios sobre a pia. — Mas dessa vez vou aproveitar melhor a companhia do meu velho — finalizou, sorrindo para Chico.

A conversa casual dentro da cozinha foi interrompida quando dois novos pares de vozes se aproximaram.

— Acho que alguém já tomou seu lugar, Lys — Clarice disse para o amigo, assim que colocou os pés no cômodo, com o fazendeiro parando logo atrás.

Ambos foram saudados por acenos e meneares de cabeça dos quatro presentes à mesa. 

— Vocês demoraram tanto hoje, que o Leigh acabou indo preparar o café no seu lugar, Lys-fofo — Rosalya foi a primeira a explicar, com a veterinária e o fazendeiro ocupando as últimas duas cadeiras livres. — Ainda bem que você subiu, senão…

— Eu não iria me queimar dessa vez, Rosa — o estilista interrompeu, um pouco aborrecido pela exposição de sua falta de habilidade culinarística. 

— Bem, acho que já está no ponto — Lysandre afirmou, levantando-se e indo em direção ao fogão.

—… Chover amanhã — A voz de Chico foi mais audível na conversa paralela com o filho quando todos ficaram em silêncio por alguns segundos.

— A previsão do tempo diz que teremos um tempo agradável até a virada do mês — Lysandre afirmou, retirando a chaleira e levando-a para perto da pia, pronto para passar o café.

— Eu tava planejando de ir pescar com o Almir amanhã, seu Lysandre — Chico explicou o objetivo do diálogo que travava pouco antes.

— E estávamos pensando em convidar vocês — o rapaz completou. — Será mais divertido com mais gente.

— É só não espantar os peixes — o caseiro completou, trazendo algumas risadas à mesa.

Logo, o cheiro de café começou a tomar conta da cozinha, fazendo alguns dos presentes suspirarem. Rosa foi a única a se levantar, perguntando para o fazendeiro onde poderia conseguir o queijo que provara no dia anterior.

— Eu e Rosa vamos ter de recusar, infelizmente. Vamos embora amanhã à noite e resolvemos preparar as malas mais cedo — Leigh explicou.

— E não queremos deixar nada pra trás dessa vez, né? — Rosa completou, voltando para a mesa com um queijo sobre um prato. Deixando-o sobre a mesa, pegou uma faca para cortá-lo.

A verdade é que não estava minimamente a fim de envolver-se com peixes e pescarias, mas não diria isso em voz alta. Leigh estava consciente disso, logo encontrando uma escusa.

— Se quiser pode vir também, doutora Clarice — Chico ofereceu junto de um sorriso para a veterinária. Clarice observava mais do que falava daquela vez. Normalmente, ocorria o contrário.

— Bem, acho que minha vó vai gostar de ter um peixe pra fazer no jantar — respondeu junto de uma risada e viu o fazendeiro retornar para perto da mesa, trazendo a garrafa de café quente e o pote com biscoitos. — E você, Lys? Vai vir também?

Lysandre observou os presentes que o encaravam, esperando pela resposta. Perdido no sorriso de Clarice, foi rápido a afirmar:

— Eu vou.

Com isso, deixou os objetos sobre a mesa e voltou para a cadeira que ocupava.

— Vamos precisar de mais iscas então — Almir continuou o assunto, que logo dividiu-se em várias pequenas conversas paralelas.

Havia muito tempo desde que aquela casa não presenciava uma tarde cheia de vida como aquela.

 


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Notas finais do capítulo

Tocando Em Frente, Almir Sater: https://youtu.be/W0Im-TppkHM
E temos mais um novo personagem nessa história! Já temos opiniões sobre o Almir?
Até mais, povo o/



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