A Herdeira escrita por Nany Nogueira
No Palácio de Seráfia do Norte, Rainha Maria Cesárea já esperava por todos com a mesa do almoço pronta. Anita não queria comer e sim saber de seu pai:
— Mãe, eu não posso simplesmente sentar e comer como se nada estivesse acontecendo, a senhora me deve muitas explicações, a começar por onde está meu pai.
— Eu já disse, em Seráfia do Sul.
— Por que ele não veio nos receber?
Rei Augusto resolveu pôr termo à agonia da moça:
— Melhor falarmos logo a verdade, Dora, que o pai dela foi raptado pelos revoltosos.
Anita sentiu uma leve vertigem, mas indagou:
— Como assim? Quando? Por quê?
Dora explicou:
— O Palácio foi invadido e não conseguimos impedir, eles eram muitos e bem armados.
— Mas, como pôde o exército real não conseguir defender o príncipe de Seráfia do Sul? – questionou Jorge.
— O exército está desfalcado há anos, muitos debandaram e se juntaram aos revoltosos – explicou Augusto.
— E o que nós temos a ver com tudo isso? – perguntou Anita, suspeitando de algo.
Doralice explicou:
— Os revoltosos propuseram um acordo de paz que inclui a libertação do seu pai. E você, Anita, é parte importante nisso.
— Eu faço o que for preciso para libertar o meu pai.
Nesse momento, Açucena, Jesuíno e Heitor, de 23 anos, adentraram ao recinto.
Anita sentiu o coração disparar ao ver Heitor, há anos os jovens não se viam.
Uma forte cena veio à mente da moça: “Heitor beijando Raquel, filha de Rosa e Cícero, no jardim do Palácio de Brogodó, bem no dia que Anita completou 15 anos. O rapaz havia beijado Anita dias antes, prometido amor eterno e dançado a valsa com a debutante naquela mesma noite, havia sido a primeira inteiração romântica da menina. Naquele dia, suas ilusões se desfizeram e ela nunca mais dirigiu a palavra ao rapaz. Para o alívio dela, a família mudou-se no ano seguinte para Recife, quando seu pai venceu a eleição para o governo do Estado”.
Heitor não tirava os olhos de Anita, que, como de costume, desviava o olhar e fingia nem ter reparado na presença dele ali.
Rei Augusto falou:
— Aproveitando que os interessados estão presentes. Vou logo ao assunto: Anita e Heitor, os revoltosos exigem o casamento do herdeiro solteiro de Seráfia do Norte, Heitor, e da herdeira também não comprometida de Seráfia do Sul, Anita, para fazer cessar a guerra e libertarem príncipe Felipe.
— Isso não é possível! – manifestou-se Anita, irritada.
Heitor não esboçou qualquer reação.
Dora confirmou:
— É a exigência deles, minha filha.
Rei Augusto deu maiores detalhes:
— A princípio, eles queriam o casamento dos primogênitos, mas Margarida já está casada e grávida. Jorge tem namoro firme.
— Namoro não é casamento! Hortência pode ser casar com Jorginho! – apontou Anita, referindo-se à filha caçula de Açucena e Jesuíno (de 4 herdeiros).
— Valeu mesmo, maninha – disse Jorge, ironicamente.
Rei Augusto explicou:
— Hortência tem apenas 17 anos e a lei de Seráfia só permite o casamento a partir dos 20 anos.
— Então, nesse contexto, eu sou a herdeira perfeita para satisfazer os revoltosos!
— Infelizmente sim, minha filha. Mas, você não é obrigada a nada – expôs Doralice.
— Não sou mesmo! Meu pai é governador do Estado de Pernambuco. A captura dele gera um incidente diplomático com o Brasil. A pátria verde e amarela pode intervir nisso sem que eu tenha que me casar com ninguém. A senhora é advogada, mãe, sabe disso.
— Já pensei nisso, minha filha. Mas, um incidente diplomático leva tempo e eu não sei se o seu pai tem esse tempo, os revoltosos ameaçam decapitá-lo se tentarmos qualquer coisa.
— Não é justo me colocarem contra a parede, jogarem esse fardo nas minhas costas – desesperou-se Anita, deixando as lágrimas rolarem.
— Não estamos exigindo nada, apenas expondo a situação. A decisão é toda sua, minha filha.
Anita saiu correndo para o jardim, o pranto ameaçou ficar mais incontido e ela quis privacidade. Mas, Heitor foi atrás e a encontrou soluçando num banco de jardim, perguntando:
— É tão ruim assim se casar comigo?
— Você ainda pergunta!
— Pensei que a mágoa da adolescência já tivesse passado.
— Você acha que é possível eu me esquecer do que me fez na noite do meu aniversário de 15 anos?
— Eu era jovem, irresponsável e havia bebido além da conta. Raquel foi se aproximando e eu entrei na onda.
— Você havia me jurado amor eterno 3 dias antes.
— Eu sei e me arrependo.
— De ter me jurado amor eterno?
— Não, de ter beijado a Raquel depois disso. Eu não sentia nada por ela, amava você de verdade.
— Que bom que você conjugou o verbo no passado, porque eu não quero nunca mais ter nada com você, muito menos me casar com você.
— Nem pela vida do seu pai?
— Você está jogando baixo! Há de ter outro jeito legal e eu vou descobrir.
— Infelizmente, no estado que Seráfia se encontra, fica difícil fazer valer as leis, ainda mais que não reconhecem, no momento, o seu pai como príncipe. Mas, eu pensei em algo que pode lhe agradar.
— Nada que venha da sua cabeça pode ser bom.
— Mas, eu vou falar mesmo assim, depois você avalia se a ideia foi boa ou não. A gente casa e...
— Pode parar! Já é uma péssima ideia!
— Escute até o final. Eu estava dizendo que a gente casa, seu pai é libertado, volta para o Brasil e depois a gente separa. Vai ser um casamento só para os revoltosos se acalmarem. Prometo que será um casamento de fachada, não tocarei um dedo em você.
— Como posso saber que não está blefando? Depois do casamento você pode exigir os seus direitos de marido.
— Tem a minha palavra e se, quiser, podemos fazer um contrato de gaveta por escrito, só as nossas famílias saberão disso, os revoltosos não. E então, o que me diz?
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