Tô Nem Aí escrita por Youth


Capítulo 2
002. Muita Clara em Neve




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/785240/chapter/2

O divã de veludo negro era macio como uma nuvem, perfeito para Alexei descansar a consciência que pesava mais que mil elefantes em um navio. Estava inquieto, batendo os pés freneticamente contra o chão e arranhando o móvel, enquanto mordiscava os lábios e se deixava consumir pela ansiedade pré primeira sessão com a terapeuta. A mente palpitava em um frenesi desenfreado, recordando todos os momentos que ocorreram desde o momento que decidiu virar a página ao sair do médico ao momento que jogou um bolo de comemoração de bodas de ouro na cara do ex, Dominic, que havia ido à confeitaria e loja de doces de Alex, acompanhado de um vampiro jovem.

− Você não tem vergonha? – Alexei gritou, às costas de Dominic, que até então não havia percebido sua presença nos quinze segundos que foi encarado com ódio pelo ex. Domi virou-se, assustado, segurando um pedaço de bolo vermelho-rubro e um garfo.

− Alex – ele disse, limpando o glacê rosado dos lábios carnudos e abrindo seu clássico sorriso sedutor e canônico – Precisava conversar com você. Sobre nós – ele afirmou. Alexei revirou os olhos com tamanha audácia e riu.

− E por isso trouxe ele? – questionou, apontando para o rapaz, com quem outrora flagrou Dominic aos beijos. O jovem vampiro se encolheu envergonhado.

− Sim! Para explicar tudo, sabe, eu preciso que você entenda que – ele começou a dizer, com um olhar desesperado. – O que eu fiz... Sabe... Todas as coisas tem um motivo, Morceguinho – Teresa ficou boquiaberta com o fato de que Dominic teve coragem de invocar a mais suja e baixa das armas: o apelido carinhoso. – E eu... – e antes que pudesse terminar, seu rosto foi pintado com as cores branco, rosa e dourado em tons glacê, pelo bolo de bodas de ouro de um casal de idosos, que Alexei atirou em seu rosto sem que sequer ele pudesse reagir. – ALEXEI! – ele gritou possesso, limpando os olhos e os cabelos que estavam sempre perfeitamente alinhados. Alex olhou com um olhar confiante, de braços cruzados, e deu uma risadinha de deboche. Dominic bufou de ódio, pegou um bolo da vitrine de vidro que rodeava toda a bancada de pagamento, de amora e morangos, e atirou no ex com a força e velocidade de uma bala de canhão, acertando em cheio no moletom carmesim e pintando-lhe de roxo. Teresa riu. Domi atirou parte do glacê do bolo de bodas nos cabelos da moça. Alexei, vingativo, pegou o recheio de frutas vermelhas do chão e enfiou na cara do rapaz vampiro que acompanhava Dominic.

Estavam todos os quatro nos fundos da confeitaria, sujos como crianças após uma guerra de comida. Bolo escorria pelas pernas e cobria o piso branco, com um forte aroma doce como mel, geleia, açúcar e chocolate. Alexei ajudava Teresa a limpar os cabelos e Dominic tentava a todo momento, inutilmente, fazer com que Alex entendesse seu lado da história. O rapaz mexia no celular e comia do bolo que manchava seu corpo, a quem da situação.

Houve um longo instante de silêncio após a última súplica de Dominic. Alexei continuava irredutível.

− Irônico, não é? – ele disse, cortando o silêncio – O bolo que joguei em você ser logo o de bodas de ouro. Podia ser o nosso bolo – afirmou, com o labor da amargura explícito nas palavras, como um escárnio desumano, mas com palavras mais bonitas e bem mais dolorosas. Dominic engoliu seco.

− Ainda pode ser – ele suplicou, desesperado.

− Não! – Alexei gritou, alertando a todos da confeitaria e fazendo com o que o rapaz tirasse os olhos do celular pela primeira vez. Teresa olhou para os lados, coçou os olhos, se levantou, puxou o rapaz pelo braço e levou em direção à porta.

− Vem, tem um banheiro ali – ela disse, dando a deixa para que Domi e Alex pudessem conversar.

− Você não... – Alexei tentava encontrar as melhores palavras, mas parecia um absurdo tão grande ter de se explicar sobre algo tão óbvio que elas lhe fugiam. As lágrimas saíam involuntariamente dos olhos – Tudo que eu passei nas suas mãos. Tudo que eu ignorei porque você dizia que me amava...

− E amo! – cortou.

− NÃO AMA! – Alexei gritou possesso – Você não ama ninguém! Mas também não odeia! – Alexei caminhou pelo local, agitando os braços com o frenesi de sua ansiedade correndo pelas veias – O máximo que posso acreditar que você sinta sobre mim é o amor que você tem por não estar sozinho. Você tem medo da solidão e por isso continua insistindo em mim. VOCÊ SABE QUE HUMANOS SÃO PASSAGEIROS E VOCÊ É ETERNO! Você tem medo da eternidade, de voltar a vagar por aí, sozinho, de país em país, fodendo com todo mundo, mas nunca tendo alguém para contemplar a infinitude da vida e fazer planos que você sabe que sempre vai ter tempo de cumprir. Você tem medo de se apegar com alguém e esse alguém envelhecer, pois humanos envelhecem, são passageiros, mas eu não... – Alexei riu em tom nervoso, como se estivesse incrédulo com as próprias conclusões – Como eu não percebi isso antes? Todas as vezes... Todas as vezes que você foi embora e sempre voltou com o rabo entre as pernas pedindo perdão e dando mil e uma explicações... Tudo porque você sabe que eu sou a única coisa que você tem e que vai sempre estar aqui, diferente dos humanos que você se apegava, mudavam em questão de dias, meses, anos e você já os considerava descartáveis.

− Não! Isso não é verdade! – ele começou – São deslizes do meu lado ruim, você sabe, a parte de mim que não consigo controlar. Meus sentimentos são confusos e eu...

− Ah, por Deus! – Alexei limpou as lágrimas dos olhos e riu de nervoso – Seu maior medo sempre foi a solidão, você sempre me disse isso. Então, quando seus humanos de cansam de seu vampiro de estimação, ou morrem, ou ficam velhos e feios... Então você tem que ir embora e ficar sozinho de novo... E você finalmente volta pra mim. Sabe porquê? Porque você não sabe ser suficiente para si mesmo e procura sempre alguma coisa para preencher essa sua vidinha e esse seu coraçãozinho fragilizado de merda – sentenciou, após ajeitar os cabelos e cruzar os braços, escorado numa bancada cheia de tigelas de farinha – Eu sempre me fiz de cego quando você estava com humanos porque sabia que mais cedo ou mais tarde você voltaria pra mim... – Alexei encarou Dominic nos olhos pela primeira vez. O lilás de seus globos oculares brilhava com a luz da paixão apagada – Mas te ver com outro vampiro... Ah! Foi a gota d’água.

Dominic se desesperou, suou frio e engoliu seco. Se aproximou de Alexei, com lágrimas nos olhos, pegou sua mão e levou ao peito.

− Por favor, Morceguinho – ele suplicou apavorado – Eu... – Alexei se desvencilhou da mão de Dominic com ódio e desprezo.

− Não me chame mais assim. Nunca mais – e se afastou – Pois bem! Grande Dominic-que-não-consegue-ficar-com-o-pau-na-calça! Agora você tem outro vampiro para passar a eternidade: DIVIRTA-SE! – encarou o ex pela última vez antes de sair, cuspiu no chão e sorriu – Vamos ver quanto tempo passa até você se entediar dele e ir atrás de outro humano. Ou de mim – e saiu.

Dominic não teve reação a não ser dar um murro na parede de concreto branca e abafar seu grito de raiva. Alexei chorou a noite toda.

− Eu chorei a noite toda – ele informou à terapeuta Versa Coumarine, uma mulher de cabelos grisalhos e pele meio ressecada que usava um par de óculos com armação amarelo-girassol. Versa anotou tudo na prancheta enquanto murmurava ininterruptamente um audível “Hum”, sem sequer mexer os lábios. Aquilo deixava Alexei nervoso.

                − Realmente, foram muitos anos – ela disse como se não soubesse exatamente o que dizer naquele momento, se ajeitou na cadeira e arrumou os cabelos. – Alexei... O quão você tem vivido para você desde que vocês romperam? – questionou. Alex podia mentir para não parecer tão obcecado, mas não o fez.

                − Muito pouco – respondeu – Quase nada. Acho que tenho estado falando sobre Dominic em noventa por cento do meu tempo e nos dez por centos restantes torço para que alguém fale sobre ele, para que possa falar também – era uma piada, mas só ele riu. Versa o encarou com um olhar crítico, analítico e preocupado – É Meninas Malvadas – ele explicou. A terapeuta pigarreou.

                − Ainda assim é preocupante – afirmou – Você veio aqui pois precisava se encontrar, correto? Saber como reestabelecer sua vida e como curar todas as cicatrizes que ficaram de lembranças, não? – questionou.

                − É, exatamente – respondeu – Meu médico indicou você. Disse que era a melhor – Versa se empopou e sorriu.

                − É, modéstia à parte... – e a expressão voltou a ficar frígida e séria – Mas não sei se sou a melhor com vampiros. Você é o primeiro que eu atendo – Alexei pareceu ficar preocupado. Versa continuou impassível. – Mas pode ficar tranquilo... sempre tive essa... “curiosidade” – e riu. Alexei engoliu seco, levemente assustado, e se ajeitou na cadeira. – Talvez devemos começar nosso tratamento falando de escolhas reprimidas. O que você tem vontade de fazer, mas nunca o fez por conta de seu relacionamento anterior? – questionou. Alexei riu.

                − Nossa... São tantas possibilidades – ele respondeu contemplando tudo nos pensamentos – Sabe... Quando você vive única e exclusivamente por alguém... Você se priva de tantas coisas...

                − E que tal começar se dando a oportunidade de fazer o que você tanto se privou? – propôs. Alexei engoliu seco novamente, seu estômago embrulhou e os pelos da nuca se arrepiaram.

                − Mas... e se...

                − Não – Versa cortou irritada – Apenas eu posso dizer essa palavra, “mas”, nesse consultório – afirmou convicta – Eu entendo seu medo, Alexei, acho que todo mundo passa por algo assim depois de uma perda grande.

                − Nem me diga... A tia da minha amiga morreu depois que o cachorro dela morreu... – disse como adendo. – Mas... Desculpa. Sabe, não é isso, o medo, é que... Não sei se é o momento.

                − E quando é o momento quando se tem a eternidade por completo pela frente? – e aquilo atingiu Alexei como uma flecha carregada de vergonha. Versa riu timidamente. Era uma risada pausada e tossida (De fumante, provavelmente) – Vamos combinar uma coisa... Assim que você sair desse consultório faça uma loucura que você jamais faria enquanto estava com Dominic. Vale de tudo, menos cometer crimes muito graves – afirmou. Alexei se perguntou o que ela quis deixar subentendido quando especificou os crimes proibidos, em vez de proibir todos – Sua consciência não vai pesar, pois ela serei eu. Tudo que você fizer pode botar como minha culpa. Você me conta na próxima sessão. Ah! Mas uma coisa! Pense o quanto isso te faz feliz e como seria bom se tivesse feito enquanto estava com ele – e cruzou as pernas sobre a mesinha de centro, enquanto terminava de fazer anotações na ficha de Alexei, que engoliu seco e alisou os cabelos.

                No caminho de volta para a confeitaria, Alexei ficou a repassar as palavras de Versa Coumarine na mente, atenuando sua imagem gélida e branca com ocasiões recentes, como a guerra de bolos e a briga com Dominic, ao passo que tentava também imaginar o que seria a “loucura ideal” para cumprir e relatar à terapeuta na próxima sessão. Definitivamente Alex havia achado Versa meio biruta e se perguntava como alguém com ela havia se formado – e logo para uma profissão tão complexa como a de psicólogo −, outrossim, questionava-se se poderia dar uma chance para suas indicações e tentar “viver algo que não viveria” enquanto namorava. Tudo já havia dado errado mesmo, o que de pior poderia acontecer?

                Alexei estava distraído com os próprios pensamentos, caminhando na calçada meio rachada do centro da cidade, observando nada além do horizonte cinza e branco da tarde chuvosa. Aluado, só acordou de seu transe pessoal quando bateu com todo o corpo em algo invisível, que mais tarde se revelou ser uma porta de vidro posicionada do lado de fora de uma clínica em construção na avenida, e caiu sentado sobre a calçada. Alexei vociferou um doloroso “Ai!” e alisou a testa, onde havia batido com mais força, enquanto tentava se recompor e entender como não havia visto o obstáculo no caminho.

                − Tem que ter cuidado com essas coisas – ele disse ao se aproximar, com um olhar vigilante e preocupado. Era um homem alto, másculo, vestindo regata e com o suor do trabalho deixando a pele lustrosa como se tivesse seu próprio brilho. Seu olhar era enigmático e carismático, tinha covinhas nos cantos do sorriso – Tudo bem? – questionou, estendendo a mão para Alexei, que coraria de vergonha e timidez se pudesse. O vampiro aceitou sua ajuda, se levantou e limpou os joelhos e tornozelos.

                − É, estou, muito obrigado – ele disse. O homem riu, encarou Alexei de cima a baixo e mordiscou o lábio inferior, com um olhar que poderia significar mil e uma coisas. Alex arregalou os olhos, envergonhado.

                − Mora por aqui? – ele questionou, alisando os próprios braços numa tentativa explícita de flexionar os próprios músculos, se empopando como um pavão vendo uma pavão fêmea. Alex engoliu seco e sentiu o estômago revirar com a ansiedade. Suas presas se agitaram na gengiva.

                − Ah, sim – respondeu, meio trêmulo, enquanto, inutilmente, tentava não pensar no belo pedaço de homem que estava diante de si. – Eu, ah, tenho uma confeitaria... Veludo Vermelho – contou. O homem sorriu novamente, seu cheiro era forte e instigante. Alexei, com um olfato apurado como o de um animal, sentia a fragrância ampliada em dez vezes (E isso o deixava mais tímido ainda). 

                − Acho que vi sua confeitaria esses dias – respondeu – Meu nome é Ignácio Cruz – contou, com um aperto de mão caloroso e carismático. Alexei sentia um calor tão intenso percorrendo suas veias que parecia poder derreter como gelo a qualquer instante. – Estou abrindo uma clínica de massagem aqui na vizinhança – Alexei engoliu seco e sorriu.

                − Sério? – disse sem saber exatamente o que dizer. Seus pensamentos alternavam entre “Quero beijar este homem” e “Quero fazer coisas obscenas com esse homem”, todavia, o fantasma de Dominic ainda assombrava suas decisões e dividia sua consciência em dois opostos antagônicos: fazer, e ser feliz, porém sob a perspectiva de um arrependimento futuro, e não fazer, e viver eternamente carregando o peso da vontade reprimida. Ignácio tirou um papel do bolso e entregou nas mãos de Alex.

                − Quando quiser relaxar com uma massagem só me procurar – disse em um tom sádico e cheio de segundas, terceiras, quartas, enésimas intenções – Talvez eu possa comer seu bolo um dia desses – Alexei arregalou os olhos assustado e Ignácio riu – Dá sua confeitaria, sabe – corrigiu. O vampiro engoliu seco, aliviado.

                − Seria um prazer... Eu preciso ir – e essa era a deixa para sua fuga triunfal. Alexei deixou Ignácio sozinho na calçada frente a clínica em reformas, botou os fones de ouvido e correu para sua confeitaria.

                Seu coração estava disparado como uma metralhadora incansável. Seu corpo ardia no calor de uma paixão e na intensidade gritante de uma vontade inexplicável. Seus pensamentos, outrora exclusivos à Dominic, davam espaço para Ignácio e seus enormes e bonitos braços torneados. Suas veias explodiam de energia, correu como um maratonista, até o momento que precisou respirar amparado pela boca. Seu corpo todo se agitou como o de uma criança serelepe. Não conseguia ficar parado – e precisava extravasar toda sua disposição de um jeito ou outro.

“Hummmm o clima tá gostoso... Hummmm eu vou comer seu bolo”— o celular tocava justamente essa música. Alexei suspirou, arrancou os fones do ouvido e entrou correndo pela confeitaria, indo direto para a cozinha. Teresa, confusa, foi atrás do amigo, que não parou um segundo desde que adentrou as paredes do Veludo Vermelho. Seu rosto estava marcado pelo suor, estava ofegante. Trajou rapidamente um avental branco, lavou as mãos, pegou uma tigela, quebrou alguns ovos, jogou as claras na vasilha e começou a bater freneticamente a mistura, como uma máquina propriamente dita.

                Não fez sequer uma pausa enquanto extravasava toda sua energia, transformando duas caixas inteiras de ovos em claras em neve. Teresa ficou encarando seu ritmo interminável durante longos minutos, sem nada dizer ou tentar fazer, apenas observando seu eterno descarregar de energias reprimidas se manifestar no surgimento daquela mistura branca e nevada.

                A confeitaria já dispunha de cinco novas tigelas de claras em neve feitas por Alexei, quando finalmente Teresa resolveu intervir.

                − Tá – ela sentenciou, acordando Alexei de seu transe, mas não o impedindo de continuar a bater – O que rolou naquela terapia?

                − Ela disse que eu devia fazer uma loucura que não faria enquanto estivesse com o Dominic – contou, quebrando mais ovos para separar a gema da clara.

                − E a loucura é fazer clara em neve até levar a confeitaria a falência por não ter mais ovos para os bolos? – questionou. Alexei suspirou.

                − Não... eu só... – tentou dizer, mas nada soube.             

                − Então isso é o que? Promessa? – questionou. Alexei parou seu frenesi açucarado pela primeira vez e encarou a amiga com um olhar irritado – Tá bom, não ta mais aqui quem perguntou...

                − Eu só preciso descarregar energia... Muita energia acumulada, sabe? – contou, o que não era por completo mentira. Os olhos de Teresa observaram o pequeno cartão de visitas de Ignácio Cruz sobre a bancada esquerda. A moça sorriu em tom devasso.

                − Muita energia mesmo, em? – debochou, aos risos tímidos – Também vi toda essa energia mais cedo... – contou, pegando o cartão da bancada e segurando nas pontas dos dedos. Alexei engoliu seco.

                − Não aconteceu nada... – ele contou.

                − Ele te deu o cartão.

                − Disse que se quisesse relaxar podia falar com ele... – contou. Teresa gargalhou.

                − Meu deus essa é mais velha que andar para frente! – afirmou – Não aconteceu, mas pode acontecer? – questionou curiosa. Alexei olhou meio tímido, voltou-se para sua tigela de clara em neve, sorriu envergonhado e observou a amiga de soslaio.

                − Ele pareceu bem sugestivo que sim – contou. Teresa riu, bateu palmas e comemorou como se fosse com ela. – Mas não vou tentar nada – disse, em um tom mais entristecido.

                − Garoto? – Teresa estava incrédula – Por que não???

                − Não sei se estou pronto pra isso... Eu... O Dominic, sabe – contou – E se a gente voltar... Eu sinto que vou me arrepender... – nesse momento o celular de Alexei, que até então tocava as músicas mesmo sem ninguém estar ouvindo, caiu no chão e desconectou o fone, deixando a música em alto e bom tom:

“Melhor se arrepender do que passar vontade”. Teresa olhou o celular, depois encarou Alexei com um olhar confiante, sorriu e disse.

                − Se o destino tá dizendo... Quem sou eu pra discordar? – Alex engoliu seco, encarou a amiga e nada soube dizer – Sério... Você não vai poder viver para sempre na sombra do “e se...”, cara, as coisas não são assim. Uma hora você vai ter que encarar sua realidade e, sei lá, fazer uma loucura – nesse momento Alexei parou tudo que fazia e encarou a amiga com um olhar curioso e pensativo. Ela tinha razão e ele sabia. Não podia deixar a sombra de Dominic apagar todos os dias de sol de sua vida.

                − Melhor se arrepender do que passar vontade? – questionou em tom cômico. Teresa riu com ele, o abraçou e arrancou o avental de seu corpo.

                − Vai embora daqui antes que você tenha clara em neve suficiente para acabar com a fome mundial – e empurrou o amigo para fora da cozinha. Alexei engoliu seco e encarou suas novas possibilidades.

                “Uma loucura na minha conta” – lembrou-se das palavras de Versa Coumarine. “Viver aquilo que não se permitiria viver”.

                Protagonistas costumam ser inteligentes e não cometer o mesmo erro duas vezes seguidas. Bem, Alexei não. Tanto quando digo do erro de voltar com Dominic todas as vezes que ele se dizia arrependido, quanto do erro de, novamente, se distrair nos próprios pensamentos e dar de cara com a porta de vidro na calçada frente a clínica de massagem de Ignácio, caindo com a bunda no chão e ferindo a testa.

O som do vidro se chocando com Alexei assustou Ignácio, que abandonou, correndo, as reformas de sua residência e correu para fora afim de prestar auxílio a mais um desafortunado. Tamanha sua surpresa quando percebeu que era o mesmo rapaz de minutos atrás. Ele riu, as covinhas do rosto e as rugas da testa marcadas.

− Você sabe que só precisava chamar meu nome que eu já viria, não é? – brincou. Alexei sorriu tímido e ajeitou os cabelos. Ignácio o ajudou a se levantar. Estavam cara a cara, finalmente, o calor voltava a corroer as veias de Alex, como mil sóis na atmosfera. O massagista tinha um sorriso devasso e sugestivo, o vampiro estava encolhido na própria timidez – Posso te ajudar em alguma coisa? – questionou, cortando o silêncio que se instaurou outrora.

− Talvez possa me ajudar a cometer uma loucura – disse. Ignácio pareceu estar confuso, mas adentrou na brincadeira com louvor e coçou a nuca.

− Que tipo de loucura você tem em mente? – questionou, se aproximando do confeiteiro. A fragrância entorpecia Alexei como uma droga alucinante e afrodisíaca. – Pois eu tenho pensado em algumas... – ele sussurrou no ouvido de Alex, uma voz lúdica e penetrante.

− Me mostre todas – Alex suplicou. Ignácio riu.

− Pode deixar – ele disse, pegando o vampiro pela mão e o levando para dentro da clínica em reforma.

...

− E o que aconteceu depois? – Versa questionou, durante a sessão da próxima semana. Alexei teria corado se pudesse.

− Fizemos loucuras – respondeu. Versa sorriu.

− E como se sente?

− Estranho – respondeu sem perder o olhar confiante – mas feliz comigo mesmo.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Tô Nem Aí" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.