Tô Nem Aí escrita por Youth


Capítulo 12
012. Tenho Até Amigos Que São




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Teresa estava animada – em partes, desesperada. Havia combinado a prova do bolo do casamento – que Alexei havia se prontificado de antemão à presentear os noivos, feito pelas próprias mãos – na confeitaria com a sogra e o noivo naquela manhã, dois ou três dias após a conversa reveladora com Roman.

Nesse meio tempo Alexei sentiu-se aliviado por não ter tido mais nenhum sinal do tal “Nimbus”, mas não achou seguro deixar que Ramona voltasse para a própria casa, praticamente obrigando a irmã a permanecer consigo no apartamento. Não havia visto Dominic ou Ignácio haviam dias, mas não sentia – muita – falta da imagem dos dois, em especial do ex, que ficou extremamente escrachado como uma pessoa horrível nas lembranças de Alex. Já, o homem dos braços bonitos, ainda deixava saudades nas reviravoltas do destino e no caminhar lento das lembranças indesejadas: por mais que tentasse seguir em frente e deixar tudo fluir naturalmente, o vampiro não conseguia se livrar por completo do peso na consciência de ter o magoado... Se livraria menos ainda do perfume da paixão que coloriu seus pensamentos quando com ele estava.

                Havia tido uma rápida conversa com Versa Coumarine via telefone, minutos após ter descoberto a história por trás de todo mistério e toda ternura de Roman. A terapeuta foi clara, simples e direta:

                − Cuidado para não se envolver em algo que você sabe, porém ignora, que está fadado à machucados maiores que você pode aguentar — Alexei engoliu seco com a intensidade daquelas palavras. Provavelmente teria sido a coisa mais pesada que ouviu da terapeuta nesses dois meses de terapia.

                Roman Medina, por sua vez, de vez em quando aparecia na confeitaria para comprar um pedaço de bolo – uma desculpa evidente para poder conversar com Alexei e sentir a presença inabalável e marcante do vampiro colorindo seus dias de escuridão e solidão. Era inegável, aos olhos de Alex, o amor que Roman carregava pela vampira Tori, mas, por ventura de forças reveladoras que ele sequer conseguia entender, ainda sentia que havia algo reservado para si no coraçãozinho carinhoso do homem de quase dois metros de altura – algo que Medina tentava lutar, mas não podia fugir muito facilmente.

                Havia conversado com Edric exaustivamente naqueles últimos dias. Como eram os três, eles e Ramona, marcados por um chefe do crime de feições ainda desconhecidas e planos misteriosos, se tornaram cumplices e amigos de fofoca e conversações sobre a vida. Nada além que dois vampiros cultivando uma amizade inesperada e estranha – afinal, quem além de Alexei viraria amigo do homem que foi o estopim do seu término? Edric costumava aparecer sempre no fim da tarde para tomar café e contar do seu dia, das suas histórias de vida e dos seus amores insuperáveis. Teresa, em razão dos preparativos do casamento, quase não havia conversado com Alex naqueles últimos dias. Ele sentia falta da amiga – e sentia que Edric não era suficiente para tapar aquele buraco.

                Terminava de cobrir um bolo com pasta americana verde-água quando Teresa chegou à cozinha, com olhar ofegante e exageradamente arrumada e maquiada para um dia comum de trabalho. Alexei arqueou as sobrancelhas, confuso, colocou os braços na cintura e encarou a amiga: uma imagem tão bem modelada e arrumada, enquanto ele jazia de avental de gatinhos, cabelo desgrenhado num rosa desbotado e farinha por toda extensão visível – e escondida – de seu corpo.

                − Quando a rainha chega? – Alexei questionou. Teresa revirou os olhos, irritada, e correu pela cozinha, mexendo nas prateleiras, com um caderninho na mão.

                − Tô procurando essência de baunilha para jogar nos doces que a gente vai experimentar hoje – ela disse, sem tirar os olhos da prateleira. Alexei cruzou os braços, confuso.

                − Puro? – questionou. Teresa anuiu – Não é mais simples, sabe, pegar algum doce de baunilha direto?

                − Não porque eu odeio baunilha – ela afirmou. Alexei sabia desse detalhe, mas havia esquecido – Mas minha querida sogra quer porque quer que tenha baunilha no bolo... Ela quer se lembrar do casamento dela, que o bolo foi de baunilha, que ela mesmo fez, porque ela era muito pobre e pipipi pópópó... – Alexei riu inconformado.

                − E você quer jogar essência de baunilha dos bolos para ela acreditar que eles são de baunilha, sendo que são de outra coisa?

                −Exato – ela afirmou, sorrindo ao encontrar o vidro cilíndrico e rosado de baunilha. Alexei riu.

                − Brilhante – ele disse, se aproximando e tirando o frasco das mãos da amiga – Mas não é melhor falar: Ei, sogrinha querida, é meu casamento e eu não gosto de baunilha. Meu casamento vai ter bolo do que eu quiser! – Teresa revirou os olhos, pegou o frasco das mãos de Alex, irritada, e saiu, pisando firme no chão. O vampiro foi atrás.

                − Não, não é – ela disse – Não quero ninguém me atazanando... E ela é rainha nisso! – afirmou, diante do balcão, colocando o caderninho e o frasco de lado, se limitando a contar os bolos na vitrine – Cadê a Day Flores? Pedi sete bolos na vitrine e tem oito! – afirmou exaltando nervosismo. Alexei riu – Eu só quero que tudo seja perfeito para mim e para o David... – ela disse num tom mais preocupado que nervoso. Alexei sorriu, compadecido, e envolveu a amiga num abraço amistoso.

                − Calma, vai dar tudo certo – ele disse, tentando passar uma paz que ele mesmo não tinha há pelo menos dois meses. Teresa suspirou profundamente, fechou os olhos e se deixou levar pelo carinho do amigo.

                − Ela não sabe sobre meu passado – ela afirmou, entristecida. Alexei engoliu seco. Lembrou-se vagamente de quando conheceu Teresa, ainda extremamente dependente química na clínica de reabilitação, junta de Ramona. Pensou em como a viu melhorar cada dia, superar a dependência, renascer como uma nova pessoa e se tornar a melhor versão de si mesma.

                Momentaneamente, lembrou-se do próprio passado. De como poucos o conheciam, tal qual o de Teresa, e de como ele tanto lhe trazia dores, mágoas e arrependimentos. Se lembrou de Nico, de Mônaco, da Romênia, da União Soviética, de Dominic, da Europa... De tudo. Engoliu seco e lutou contra as próprias memórias para lidar com o problema da amiga.

                − Não importa – Alexei disse de antemão – Seu passado não define quem você é – afirmou. Queria ele acreditar nas próprias palavras, mas era difícil quando suas memórias lhe torturavam dia após dia. Teresa suspirou e se desvencilhou do abraço.

                − Já digo que ela é uma versão piorada dos velhos preconceituosos do clube de bingo – ela afirmou, já recuperada – A última vez que estive com ela precisei ouvir cinquenta minutos de comentários sobre o porquê é perigoso aceitar imigrantes de outras raças no nosso país. Ela ficava repetindo que recebeu no WhatsApp a notícia de que os vampiros estavam tentando transformar todas as pessoas “normais” em vampiros por meio de um “kit vampírico” – Alexei riu, inconformado. No fundo ele sabia que muitos dos idosos da casa de bingo estavam inclinados a acreditar nesse tipo de baboseira.

                − Adoro essas notícias – ele afirmou, aos risos – Minha favorita é a que os vampiros iam ter um “Salário Sanguíneo”... Um salário mínimo por serem vampiros – ironizou. Teresa chacoalhou a cabeça, em desdém, e riu baixinho.

                − Meu deus eles acreditam em qualquer coisa – ela sentenciou, por mim. Em seguida, olhou o relógio no pulso e sentiu uma tensão percorrer a espinha – Quase na hora... E ela é extremamente carrasca com horários. Você vai passar na mesa depois? David disse que não te vê desde... – Teresa engoliu seco, envergonhada.

                − Desde nosso jantar com o Dominic... – Alexei riu – Teresa, não precisa tratar como se ele estivesse banido... Bem, ele está, mas a gente ainda pode falar o nome dele, oras, afinal como a gente ia falar mal dele? – questionou. Teresa riu e deu um tapinha no ombro do amigo.

                − Vai fazer seus bolos! – ordenou.

                − Você quem manda.

                Alexei terminava a primeira leva de croissaints de coco com doce de leite do dia, por volta das duas da tarde, quando decidiu fazer uma pausa e almoçar. Checou o celular, que jazia no silencioso enquanto ele trabalhava, e se surpreendeu ao ver três ligações perdidas de Vivi. Suspirou, imaginou que devia se tratar de mais alguma bobagem de Dominic, a qual ele obviamente não teria nenhum interesse, e deixou o celular de lado.

                Encontrou Dayana Flores e os gêmeos Joshua e Jerichó almoçando nos fundos da confeitaria. A mocinha comia arroz, um tipo de pasta de feijão com cheiro apimentado e carne de porco. Os irmãos dividiam sanduíches de ovo e sardinha. Sentou-se com eles, abriu a marmita e começou a comer um pedaço do assado de porco que havia comprado no restaurante para que ele, Ramona e Edric jantassem na outra noite.

                − E como vai sua história, Day? – um dos gêmeos questionou. Alexei chutou mentalmente que era Joshua, pois acreditava que ele tinha olhos um pouco mais claros que os do irmão. Day corou, envergonhada.

                − Aos cacos – afirmou – Não consigo dar nenhum clímax entre o protagonista e o pretendente dele... – contou. Jerichó pigarreou.

                − Talvez devesse adicionar alguém para ser um segundo a competir pelo coração dele – Jerichó interveio, mastigando rapidamente – Isso sempre dá certo nas novelas – Jerichó era o gêmeo que amava novelas e Joshua o gêmeo que amava séries. – Ou então faz ele descobrir que é filho de um milionário prestes a morrer... Clímax perfeito! – Day Flores encarou o gêmeo comum olhar odioso e julgador.

                − Pelo amor de deus que coisa mais tosca – afirmou irritada. Os gêmeos deram de ombro ao mesmo tempo. Alexei riu baixinho – Eu estava pensando em, não sei, mostrar para o protagonista como ele é feliz sozinho, mas, ao mesmo tempo, não precisa estar sozinho sempre... Que o amor do pretendente dele também pode ser parte importante da vida dele – afirmou. Alexei, pela primeira vez, ergueu as orelhas e espiou os três pelo canto do olho, observando como aquela simples conversa estava indo para uma área em que ele era especialista.

                −Ah, não sei – Joshua disse, desanimado, enquanto coçava o queixo – Você tinha dito que ele tinha de escolher entre conseguir o emprego dos sonhos ou ficar com o cara, certo? – questionou. Day anuiu – Então não vejo sentido em insistir em algo que pode ou não dar certo, como esse relacionamento com esse cara, em vez de seguir algo que é cem por cento de certeza que vai ser perfeito, como o emprego... E ele queria mesmo se sentir mais livre...

                Day Flores pareceu pensativa por alguns instantes.

                Alexei se viu naquela conversa alguns dias atrás: insistir numa coisa que estava fadada a dar certo ou errado com Ignácio, ou em algo que, na teoria, daria cem por cento certo, com Roman. As consequências ele já conhecia muito bem: acabou sem nenhum dos dois.

                − Sim, mas estar livre não significa estar sozinho – Day interveio, convicta – Significa estar bem consigo mesmo e ter a convicção que pode fazer tudo que quiser, sem a interferência de ninguém... Não é algo que se tem unicamente estando sozinho... Tem como conseguir isso, sei lá, tendo certeza das próprias escolhas, por exemplo – afirmou, com um olhar confiante. Alexei engoliu seco. Os três estavam narrando sua história e ele não havia percebido? – Ser livre é diferente para cada pessoa. Eu por exemplo me considero livre por poder fazer todas as minhas escolhas, sem ter ninguém querendo limitar elas. Mas, bem, se eu tivesse um namorado, eu continuaria livre...

                − E se seu namorado quisesse mandar você fazer alguma coisa que você, tipo, não quer? – Jerichó questionou. Day riu.

                − Arrumaria outro – afirmou. Os gêmeos se entreolharam.

                “Sim, mas estar livre não significa estar sozinho” as palavras de Day Flores permaneceram nos pensamentos de Alexei durante toda hora de almoço. Se questionou como odiava ser tão dependente de colo, ao passo que também não desejava estar sempre sozinho para poder se ver livre dessa dependência. Lembrou-se de Nico e de como tudo que ele lhe fez foi parecido com o que Dominic fez também anos mais tarde, as vezes em medidas até maiores. Alexei havia se regrado tanto de relacionamentos com pessoas tóxicas, controladoras e abusivas... Que achava que todos seriam assim no fim das contas. Nas últimas cinco décadas viveu com um homem que o fez desacreditar do próprio potencial, que o fez pensar que não encontraria ninguém além dele mesmo, que era dependente de correntes... para ser livre! Quanto mais pensava sobre, mais indignado com a própria burrice e ingenuidade ficava. Era tão claro! Dominic e Nico haviam fodido com toda sua cabeça, sua autoestima, sua sanidade. O fizeram crer que o sentimento de liberdade só existia quando estava preso por completo às amarras de uma paixão doentia.

                Alexei se sentia como um pássaro preso à gaiola, que acredita que a vida além dela era impossível.

                Quando finalmente sentiu a liberdade, e estava tão traumatizado pelas experiências anteriores, não conseguiu se entregar por completo... Por que tudo parecia convergir para uma nova gaiola.

                − Caramba – Alexei disse a si mesmo, surpreso com as próprias conclusões. Engoliu seco, terminou o almoço, lavou as mãos e voltou aos afazeres.

                Já era finzinho de tarde quando terminou a última remessa de bolos do dia. Como o trabalho nunca terminava, Alexei pegou uma bandeja de quindins e levou à vitrine, observando, de longe, que Teresa estava sentada numa mesa com David, um homem de cabelos escuros e longos, com olhos redondos e nariz arrebitado, e uma senhora, num tom loiro de farmácia, lábios exageradamente vermelhos e olhar prepotente. A sogra, pensou.

                Quando o viu, Teresa correu da mesa de imediato e foi a seu encontro.

                − Pelo amor de deus me fala que você tem um tempinho – ela suplicou assustada, mas forçando um sorriso para que a sogra não visse seu desespero. Alexei anuiu – Você vai para lá comigo, por favor! Ela não para de falar um minuto! – afirmou, olhando para os lados, observando se a sogra não havia a seguido – E o David perguntou de você.

                − Tudo bem – foi tudo que Alexei disse, tirando o avental de gatinhos e limpando as mãos. Teresa sorriu aliviada.

                − Só me desculpa se ela falar alguma coisa muito péssima...

                − Vou sobreviver – Alexei disse. Havia passado por tanta coisa que uma velha reacionária não ia lhe derrubar tão fácil. Teresa engoliu seco, pegou o amigo pelo braço e levou para a mesa.

                − Ellen... Esse é o Alexei, que havia falado – ela apresentou. Ellen estendeu a mão com um sorriso amigável e cordial. Alex apertou.

                − Ellen Guttenberg, muito prazer. Você só pode ser o dono dessa confeitaria adorável! – ela disse num tom amistoso. Talvez Teresa tivesse exagerado e a sogra não era tão ruim. – Sente-se, querido, por favor! Gostaria de lhe falar algumas coisas!! – suplicou. Alexei aceitou, sentando-se ao lado de Teresa e David.

                − Oi David – ele cumprimentou.

                − Ei! Sinto muito pelo Dominic! – ele sussurrou. Alexei sorriu em agradecimento.

                − Não sinta. Tô melhor assim – afirmou. David pareceu levemente aliviado, como se tivesse medo de que citar o nome de Dominic transformasse Alexei num poço de sentimentos. Ellen bebericou um pouco de chá.

                − Provamos todos os bolos! Meu deus! Incríveis! – ela afirmou, entusiasmada – Ainda não conseguimos sequer decidir o sabor...

                − Bem, ainda há tempo para isso – Teresa interveio. Ellen sorriu para a nora.

                − Quanto antes decidirmos melhor... – ela afirmou – Ai fico muito feliz por vocês terem optado por essa confeitaria adorável! De um gay ainda... Com certeza tudo aqui deve ser feito com muito amor, brilho e Madonna – aquele comentário era ligeiramente irritante e ofensivo aos ouvidos de Alexei, que fingiu não se importar e riu, observando o olhar de “Me desculpe” de Teresa. – Mas soube de algumas coisas desagradáveis...

                − Mãe... – David tentou dizer, sendo cortado pelo olhar metralhador de Ellen.

                − Sabe, não me veja mal, não sou preconceituosa... Jamais! Meu deus! Que coisa terrível – ela sibilou como uma cobra atriz, fingindo em cada tom das palavras. Alexei sentia que não vinha coisa boa por aí – Mas uma amiga minha me contou de um boato de que haviam, bem, vampiros trabalhando aqui – Alexei engoliu seco – Mas fico feliz em perceber que eram só boatos... Oh! Esses bolos tão bem feitos, um dono tão doce e gay... Não, jamais – e riu sozinha. Alexei encarou Teresa, envergonhado. A amiga parecia querer fugir da própria pele – Mas não me veja como racista, não, jamais! Deus me perdoe! Você me entende, Alexei? Eu só penso no melhor pra minha família, sabe. Esses vampiros são perigosos para nós humanos de bem! Tenho até amigos que são, sabe, mas não posso admitir que eles continuem vivendo da maneira que vivem...

                − Ah... Entendo, claro – Alexei respondeu num tom irônico, desejando entrar no jogo de loucuras da mulher extremamente preconceituosa, ainda que dissesse o contrário. Ellen se empopou, orgulhosa das próprias palavras, como se falasse consigo mesma.

                − Oh! Que bom que você me compreende! David e Teresa vivem reclamando, sendo que só falo a verdade, entende? Mas nos dias de hoje não se pode falar mais nada que já te chamam de racista. Bons tempos eram o passado... – O passando onde vocês morriam por falta de vacina ou na guerra? Alexei pensou – Sabe, eu não tenho problemas com vampiros, jamais! Inclusive acharia belíssima sua atitude de dar a eles uma oportunidade... – ela se aproximou de Alexei e sussurrou – Mas não precisam ser vampiros diante de nós, pessoas de bem. Imagina se a juventude decide querer começar a chupar sangue? Deus me livre! Não bastasse aquele livro imbecil... Como chama David??

                − Crepúsculo, mãe – David respondeu à contragosto, extremamente envergonhado. Alexei ria da ironia.   

                − Crepúsculo!! – ela exclamou indignada – Meu deus que absurdo! Contra nosso espírito cristão! – ela murmurou alguma coisa num tom inaudível.

                − Um absurdo mesmo – Alexei disse, dando corda das maluquices de Ellen. Teresa estava atônita.

                − Soube que eles passam até doenças! Terrível! – ela afirmou. Alexei teve de se segurar para não rir.

                − Também ouvi falar disso – Alexei respondeu, fingindo surpresa e indignação – Soube de uma doença, Ellen, chamada Hemo-idiota-filia— ele disse, num tom forçosamente aflito. Ellen arregalou os olhos, assustada. Alexei tocou a mulher no ombro – Dizem ser uma doença terrível! Que é só um vampiro tocar uma pessoa normal, que a pessoa vai acreditar em qualquer idiotice que ele diga!

                − Não acredito!! – mas ela acreditava. Alexei teve de segurar o riso com todas as suas forças. Ellen estava absurdamente surpresa.

                − E o pior: ela nem vai perceber que está sendo enganada! – afirmou. Ellen fez o sinal da cruz, assustada.

                − Graças a meu bom deus que esse tipo de coisa não acontece na minha família – afirmou, olhando Teresa e David – Os meus são bem-criados! – e sorriu.

                Era hipocrisia, fascismo e preconceito demais para os ouvidos de Alexei. Havia extrapolado sua cota de baboseiras a ouvir no dia, sendo que nem havia tido a primeira visita de Dulla Swanna – que Alexei acreditava ser um ótimo par para Ellen Guttenberg. Sorriu forçosamente, olhou todos na mesa, se levantou e foi embora sem nem dizer tchau.

                − Oh! E ele nem respondeu se seriam vampiros que fariam o bolo! – Ellen afirmou. Teresa encarou a sogra com um olhar de raiva, chacoalhou a cabeça em desdém e correu atrás do amigo.

                − Hemo-idiota-filia? – Teresa questionou quando estava a sós com Alexei. Os dois se encararam por longos segundos e se debulharam em risos frenéticos e incontroláveis. O vampiro chegou a chorar de tanto rir. – Meu deus você se superou dessa vez.

                − Sempre bom enganar uma Barbie fascistoide da terceira idade – afirmou, voltando a botar o avental de gatinhos – Meu deus eu ouvi tanta merda por minuto que meus ouvidos quase sangraram – afirmou, se recostando na bancada ao lado de Teresa.

                − Eu te disse... Agora imagina minha situação: tendo que ouvir isso todos os dias.

                − Coitado do David... – Alexei afirmou. Teresa suspirou.

                − Ele nem tem muito contato com ela – afirmou convicta, enquanto alisava o próprio braço – Ela é mais mãe por obrigação que por vontade. Até agora não entendemos esse interesse inesperado dela no nosso casamento...

                − Com certeza quer impedir que os vampiros passem Hemo-idiota-filia para os convidados do seu casamento – brincou. Teresa deu um tapinha no amigo e riu.

                − Agora sério... Desculpa por isso. Meu deus... Ela é impossível! – afirmou. Alexei deu de ombros.

                − Foi divertido... Estava precisando distrair a mente.

                − Nossa, quem dera pra mim isso me distraísse... Tô quase explodindo tendo que ouvir essa mulher reclamar de absolutamente TUDO! – afirmou irritada – Ela me faz ter saudades da minha vó Carmina...

                − A que jogava a dentadura em você?

                − A própria! – Teresa suspirou – Acho melhor voltar pra lá. Antes que ela ataque mais alguém... – Alexei anuiu, abraçou a amiga para lhe desejar forças e acompanhou seu caminho de volta ao limbo pessoal.

                Quando já estava só e pronto para começar a próxima fornada de cupcakes de brigadeiro com geleia de uva, o celular tocou na mesa – onde Alexei havia o esquecido havia horas, entretido com o próprio trabalho. Se aproximou, pegou e percebeu que era Vivi, novamente, numa décima ligação. Engoliu seco, suspirou e atendeu, a contragosto:

                − Meu deus Alexei você tava onde? – a mocinha questionou. Alexei revirou os olhos.      

                − Trabalhando! – respondeu impaciente. Vivi pigarreou.

                − Auge... – suspirou – Ah, enfim! É importante! – exclamou. Alexei cerrou os olhos, desconfiado.

                − Pode dizer.

                − É o Dominic... Ele fez uma transferência de cinquenta mil ontem! – Alexei arregalou os olhos, assustado – E foi da conta conjunta de vocês dois!

                Meu deus. Como eu podia ter sido tão burro, idiota, retardado, acéfalo? Alexei se questionou. Estava tão centrado em tudo e em todos, focando em resolver todos os problemas do cotidiano pós-Dominic, que se esqueceu de tomar precauções contra o mais óbvio dos problemas: O PRÓPRIO DOMINIC!

                Não podia crer que havia esquecido da conta com dinheiro que pertencia aos dois... E que, aparentemente, ele havia rapado no outro dia.

− Merda – foi tudo que ele pôde dizer.


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