Paralelo 22 escrita por Gato Cinza


Capítulo 6
6




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Não tinha o hábito de frequentar casas noturnas, não era o tipo de lugar que pudesse diverti-lo, não gostava da música alta, não gostava das pessoas empurrando umas as outras e não dançava. Só as bebidas e algumas mulheres valiam o preço de gastar seu tempo naquele lugar. E foi por isso que ele aceitou o insistente convite de Ulisses para irem à recém-renovada Seduza que estava com nova direção. Ulisses dispensou a fila enorme e entrou sem problemas, Nicolas revirou os olhos, o amigo sempre achava que era dono do pedaço – não que ele fosse reclamar, não gostava de filas.

— O que achou? – Ulisses perguntou, depois de tê-lo arrastado por todos os lados.

— Igual qualquer outra boate que eu já tenha ido – comentou sincero.

Ulisses era a decepção personificada.

— Igual? Tá, eu vou te deixar por ai e pergunto amanhã o que achou.

— Não mesmo – ele agarrou o amigo pela camiseta – Queria que eu viesse com você e até que eu arranje companhia mais interessante vamos ficar juntos. E o que tem de mais nesta boate?

— Tem que eu sou sócio – Ulisses confessou – Por que acha que passo tanto tempo convidando para vir conhecer?

— Achei que fosse carência – olhou ao redor de modo analítico – Quando foi que resolveu virar sócio de uma boate?

— Quando fui pro oeste e conheci um pessoal, na volta soube que estavam fechando a esta casa e resolvi entrar em contato com os caras de lá e fazer negócios. Uma filial da rede de boate mais badalada do país – disse orgulhoso – Então? Ainda acha que é só mais uma entre muitas?

— Eu não vou mudar minha opinião tão rápida só por que você é sócio daqui.

A opinião dele não mudaria, não via nada de diferente na Seduza que já não tivesse visto em outras dezenas de casa noturnas que ele já tivesse ido. Ele acabou ficando sozinho no bar quando Ulisses disse que ia resolver uma coisa e não voltou mais, por isso resolveu fazer o que fazia quando era um adolescente inseguro e saia com os amigos despojados, sentou no seu canto e ficou observando as pessoas ao redor se divertindo. Uma mulher de cabelos platinados sentou ao lado dele e sorriu com delicadeza, os lábios tingidos de rosa claro.

— Boa noite – a cumprimentou depois de dar uma vagarosa olhada em seu corpo curvilíneo coberto por um vestido preto justo e curto, estendeu a mão para ela – Nick.

— Lucy – a voz era melodiosa, ainda que um pouco aguda.

Lucy não era uma companhia desagradável, sabia o que dizer e o quanto dizer, e a vulgaridade se seus gestos ficavam encobertos pelo amplo conhecimento em pequenas coisas. Uma estratégia da parte dela para atrair certo tipo de homem era ter uma vaga informação sobre tudo de modo que podia falar sobre música, arte, politica e esportes sem parecer uma completa estúpida ao mesmo tempo em que não parecia uma sabe tudo arrogante, só precisava manipular a conversa para seguir a direção que lhe convinha. O que ela não sabia era que a atenção de Nicolas tinha sido roubada por outra pessoa, uma que tinha acabado de chegar acompanhada.

Ele tinha á visto entrar e a primeira coisa que passou por sua cabeça que era uma de suas gêmeas, então notou a pessoa que estava com ela. Roberto. Um mês antes ele não sabia que a invocação-do-mal tinha irmãs e nem que eram trigêmeas, mas quais as chances de Roberto conhecer uma das cópias de Malvina? A lógica dizia que as chances do advogado conhecer alguém que ele não conhecia era a mesma no sentido inverso, porém algo dizia que aquela acompanhada de Roberto era sua secretária. Os seguiu com o olhar, enquanto assentia e sorria para seja lá o que Lucy dizia. Se a dedução não o traia, Roberto estava apresentando Malvina para seus amigos, um casal que estava sentado do outro lado.

Roberto abraçou Malvina por trás, encostando o queixo no ombro dela e a ocultando quase por completo. Não havia nenhuma regra que impedisse relacionamento entre funcionários de sua agência e mesmo que houvesse, estavam fora do local de trabalho e ele não podia interferir na vida pessoal de ninguém, mesmo assim não gostou daquilo e por um breve momento desejou que nunca tivesse afrouxado as normas da empresa.

Roberto devia ter dez anos á mais que Malvina, ele era divorciado e ela solteira, nada os impedia de ter qualquer relacionamento, mas... Não havia um “masnaquele assunto, ele não tinha nada haver com quem saia com quem. Que coisa idiota, estava desperdiçando a companhia de uma loira gostosa para ficar analisando o comportamento alheio, parecia um stalker sem acesso á vida virtual dos outros.

Quanto mais tentava se concentrar em Lucy mais se pegava procurando por Malvina entre as pessoas, ficou ligeiramente perdido quando não a viu com o casal da mesa e a achou na pista dançando com Roberto. Dançavam bem, bem demais para a sanidade dos homens ou das mulheres. Ele conhecia Roberto há anos e não tinha noção de que ele dançava.

O casal estava atraindo atenção com aquela dança que mais parecia um show de sensualidade e nem estavam seguindo o ritmo da música. Aliás, por que aquela música não terminava logo? Será que Malvina não estava notando que era o centro das atenções? Precisavam ficar tão colados daquele modo para dançar? Não podiam dançar como todos os outros, com braços para cima e á uma distância enorme do parceiro?

— Caramba! – Lucy exclamou seguindo o olhar de Nicolas para o casal – Aquilo redefine a dança do acasalamento.

O comentário da loira fez Nicolas desviar a atenção do casal. Com certeza ele estava enganado, sua secretária era uma mulher inexpressiva que raramente demonstrava algo além daquele sorriso falso que parecia uma máscara. Malvina Coelho não dançava daquele modo, ela nem parecia ser do tipo que ia a boates acompanhadas de colegas de trabalho. Devia ser a invocação-do-mal ou a gêmea cozinheira do restaurante.

Se esforçou para manter sua atenção em Lucy e fingir que não tinha visto aqueles dois, só que no momento que a música mudou, ele se virou para ver se iam continuar com o espetáculo. Droga! Eles estavam vindo em direção do bar. Não pode nem tentar passar despercebido, devia ter sentado longe do bar.

— Hey, Nick – Roberto o cumprimentou alegre.

Nicolas respondeu á animação do advogado com um aceno rígido, seus olhos estavam presos á Malvina que estava pedindo suas bebidas ao barman.

— Me deve um buquê de escabiosas – ela informou sorridente e seu sorriso morreu ao ver o moreno – Olá.

— Oi – retorquiu seco.

Nas duas semanas que se passaram desde seu jantar não-encontro, as coisas tinham mudado entre eles. Ela foi de a irmã de Dandara, o que significava que devia ser mantida sobre vigilância, para apenas Malvina, estranhamente comum. Não tinham virado amigos nem nada, mas a convivência tinha ficado bem mais agradável. Era quase como se fossem colegas daqueles que são quase amigos, mas não mantem nenhuma relação pessoal fora do ambiente do trabalho, aparentemente com Roberto o coleguismo ultrapassou as paredes do escritório.

— Roberto e Malvina – o advogado os apresentou para a loira que estava quase agarrada á Nicolas.

— Lucy – ela sorriu – Vocês formam um casal incrível e dançam tão bem. São dançarinos?

— Não, só gostamos de dançar – Roberto informou.

— Estão juntos há muito tempo?

— Nos conhecemos a menos de um mês – Malvina disse entregando o copo de seu amigo – E não somos um casal, só uma dupla com boa sincronia.

— Ela sabe como partir o coração de um homem – Roberto brincou.

Malvina riu, o som ecoou na mente de Nicolas lhe causando um incomodo profundo, ela não ria daquele modo com ele. Ela sequer lhe dirigia um sorriso verdadeiro. Os olhos marrons dela cruzaram com o dele e desviou rapidamente para a pista de dança, bebendo de seu copo.

— Eca – ela fez uma careta para sua bebida – Eu acabo de descobrir que não gosto de vodca.

— Nunca bebeu vodca antes? – Lucy quis saber.

— Meu antigo trabalho não tolerava e antes eu era menor e não tinha permissão para beber.

— Você tem quantos anos? – a loira curiosa questionou a avaliando.

— 26, o que isso tem haver com eu beber não vodca?

— Eu tenho 23 e já bebi todos os tipos de bebida existente.

Malvina piscou, a expressão confusa deu lugar a sua inexpressividade usual.

— Coloque um quase antes de todos. Com sua idade é improvável que tenha bebido todas as combinações possíveis de bebidas, alcoólicas ou não. A menos que beba á cada hora do dia desde sua adolescência, aí você não teria essa aparência saudável, na verdade teria morrido de cirrose.

Nicolas riu. Foi involuntário, ele não conseguiu ficar sério diante do jeito de Malvina. A falta de expressão dela tornava difícil saber se estava sendo engraçada ou maldosa ou só informativa. Lucy se irritou com ele, sabia quando estava sendo feito de idiota, por isso largou seu refrigerante na cara de Nicolas e saiu á procura de suas amigas. Não era sempre que conseguia o que queria, mas a noite era uma criança e tinha sempre um alvo mais fácil ainda que não tão atraente quanto aquele que agora estava molhado por refrigerante de laranja.


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