How Long Is Forever? escrita por Anitra


Capítulo 2
Página em branco


Notas iniciais do capítulo

Esse já é o último! Espero que gostem :)



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— Bom, acho que agora é um adeus definitivo, certo? - Ciborgue colocou uma mão na nuca, sem saber como agir. 

Depois que ele soltou a bomba, todos ficaram em silêncio por um tempo, perdidos em seus próprios pensamentos. Por fim, conversaram e decidiram por algo que não era comum entre eles: não fazer nada.

Nenhum dos antigos Titãs queria realmente fazer alguma coisa para impedir que a realidade que viviam desaparecesse, essa era a verdade. A vida de todos havia se tornado uma completa droga. 

Ravena enlouquecia mais a cada dia que passava, às vezes vivendo semanas sem perceber onde e quando estava. Seus momentos de lucidez costumavam ser raros, agora.

Ciborgue praticamente desistira da vida há anos. Enferrujado, sozinho e cansado, não tinha mais nada pelo qual valesse a pena lutar.

Mutano era uma atração de circo. Se escondia em uma jaula para que crianças não o puxassem pelo rabo e para que adultos não pudessem mexer nele como se não fosse um ser vivo.

Asa Noturna existia para prender bandidos, e era só isso que fazia há anos. Não tinha amigos, perdera o contato com seu mentor - porque, incrivelmente, Batman acreditava que ele era sério demais e deveria se dar uma folga - e pensava em Estelar todos os dias. Desde que ela aparecera, naquela manhã, não conseguia deixar de pensar em como teria sido sua vida se ela ainda estivesse com eles.

Os Titãs nunca teriam se desmanchado. Provavelmente, ele teria criado coragem para chamá-la para sair, superando o medo bobo que tinha de relacionamento. Ciborgue estaria atualizado, provavelmente namorando, ou talvez não - quem sabe? Mutano e Ravena poderiam estar juntos. Depois de muita coragem da parte do metamorfo, ele provavelmente a chamaria para sair e faria algo especial. E ela provavelmente demoraria meses antes de aceitar.

Uma página em branco. Um futuro todo pela frente, incerto, maravilhoso. Era perfeito. 

Não era como se todas as pessoas do mundo fossem morrer. Elas voltariam a existir, um dia. Nem sentiriam quando a realidade se apagasse, sendo substituída lentamente por outra.

Sim. Uma página em branco. Era isso que todos eles estiveram esperando por 20 longos anos.

— Não é um adeus, Ciborgue - Asa Noturna sorriu, colocando a mão no ombro de seu amigo. Seu irmão. Sua família - Nós vamos nos reencontrar em outra época. 

Eles sorriram, com a promessa de um futuro melhor em seus olhos. Até mesmo Ravena se arriscou a dar um sorriso mínimo, um simples repuxar de lábios que fez Mutano se perder completamente. Ela era tão linda!

— Titãs… - a voz de Asa Noturna embargou e ele pigarreou para tentar disfarçar, sorrindo. Sem se importar em estar sendo clichê ou meloso demais (o mundo acabaria dali a 18 horas e 13 minutos, não importava realmente o que ele fosse falar), completou - Abraçar!

Mutano sorriu largo, sem pensar duas vezes antes de se jogar em cima de seus amigos, considerando seriamente se transformar em um polvo para poder abraçá-los ainda mais.

— Vem, Rae! - chamou, ao perceber que ela continuava parada no mesmo lugar, flutuando baixinho e olhando para eles com os olhos desfocados. Como se não estivesse ali.

Devagar e com cuidado, ele estendeu a mão e a puxou com carinho, erguendo os braços dela até que envolvessem todos. Abraço grupal. Quem diria. Eles não tinham feito isso nem mesmo quando eram adolescentes. 

Ficaram ali por alguns minutos, apenas aproveitando a presença um do outro, felizes em estarem juntos pela última vez. E então se separaram.

Asa Noturna precisava fazer algumas coisas antes que o mundo acabasse. Tinha arrependimentos demais por uma vida, e agora que tinha reencontrado os Titãs e aproveitado um tempo ao lado deles, percebeu que realmente estava com saudades de seu… pai.

Ciborgue queria gastar suas últimas horas fazendo algo que não conseguia há anos: praticar esporte. Futebol, basquete, corrida, tênis - qualquer coisa. Queria se sentir vivo uma última vez.

Eles se despediram, afastando-se da Torre. Mutano ficou olhando até que não conseguisse mais enxergá-los, tentando criar coragem para falar com Ravena. Suspirando, voltou-se para onde ela estava um minuto atrás, mas não havia mais ninguém ali. 

Assustado, olhou ao seu redor e se aproveitou de seus instintos aguçados para procurá-la, farejando o ar. Por sorte, ela não havia se teleportado para nenhum lugar, e estava só há alguns metros de distância, flutuando devagar em direção ao seu apartamento pequeno.

— Ei, Rae, espera! - correu até ela, derrapando no chão até parar em sua frente. Passou as mãos no cabelo, nervoso, assim que ela o encarou, impassível. - Não ia se despedir de mim?

— Não.

— Por quê? - perguntou, magoado.

Ela ia mentir, ou só continuar seu caminho sem falar nada, mas as emoções dele a atingiram com força. Tristeza, saudade, e aquela maldita afeição de novo, confundindo sua cabeça.

— Dói - disse, simplesmente.

Ele arregalou os olhos. Essa era a última resposta que esperava.

— Então não vá embora - sussurrou, tomando coragem para erguer uma mão e tocar nos cabelos roxos que tanto amava. Ela não o impediu. - Eu sei que você se lembra do que eu te pedi vinte anos atrás. E o pedido ainda está de pé.

Ravena se lembrava. Se lembrava todos os dias. “Fica, por favor. Não vá embora. Fica comigo. Por favor, Rae. Eu… eu gosto de você”. 

Ela fechou os olhos com força, tentando pensar, mas não conseguia. Estranhamente, sua cabeça estava mais quieta do que nunca. Nenhuma de suas emoções se manifestavam verbalmente - só fisicamente. Seu coração batia acelerado no peito, suas mãos suavam e ela queria inclinar a cabeça em direção ao toque dele para sentir mais o calor. Aquele calor maravilhoso que limpava sua mente e a fazia sentir coisas estranhas.

— Rae… - ele segurou o rosto dela com as duas mãos, erguendo-o até que ela encarasse aqueles olhos verdes. - Fica comigo, por favor. Não há nada que eu queira fazer agora mais do que passar o último dia do mundo com você.

As palavras dele tiveram um estranho efeito sobre o corpo da empata. Timidez se manifestou, fazendo-a fechar os olhos de novo, constrangida demais para olhá-lo. Felicidade saiu de sua mente e percorreu todo o seu corpo como uma flecha, fazendo cada canto formigar - da cabeça até os dedos dos pés. E Afeição foi parar em seu coração, derretendo o gelo que o cobria há anos. 

E só. Sem Raiva, sem Conhecimento, sem Tristeza… só Ravena. E suas emoções mais puras.

Até Bravura tomar o controle. Empurrando Timidez para o lado, a emoção fez o que queria há muito tempo.

Ravena ergueu os braços, segurando o rosto de Mutano da mesma forma que ele segurava o seu. Ficou na ponta dos pés, esquecendo que podia flutuar, e se inclinou até encostar os lábios nos dele.

E foi o que faltava para que Nevermore explodisse de vez.

Todas as suas emoções gritavam, eufóricas - e, incrivelmente, silenciosas. A barreira entre a empata e Nevermore existia outra vez, e ela não conseguia ouvir o que suas emoções diziam. 

Felicidade e Afeição deram as mãos e dançaram, rodopiando em volta de todas as emoções, que sorriram. Até mesmo Raiva se arriscou a repuxar os lábios, escondendo as presas, e Tristeza se permitiu descansar pela primeira vez em anos - já que era a emoção que mais tomava o corpo da empata em duas décadas.

Mutano, depois de alguns segundos de choque, percebeu o que estava acontecendo. Era quase impossível acreditar que Ravena e ele estavam se beijando. O metamorfo sonhava com isso há tanto tempo que tinha medo de acordar em sua jaula de novo, sozinho. Mas era real. Aquilo era mesmo real. Nem em seus melhores sonhos beijar Ravena era tão bom quanto estava sendo agora.

Então ele a beijou de volta.

Aquilo era, como diria Estelar, glorioso. 

— Cara... - foi a única coisa que conseguiu dizer, daquele jeito tão característico que ele tinha de dizer essa palavra, quando se afastaram.

Ela sorriu timidamente, um sorriso tão lindo que ele não conseguia desviar o olhar. Colocou uma mecha do cabelo dela atrás da orelha, deixando seu rosto mais visível para que ele pudesse admirar.

— Ahn… Ravena - sussurrou, temendo que qualquer palavra mais alta pudesse estourar a bolha em que estavam vivendo. - O que você diria se eu fizesse minha dança da vitória agora?

A boca dela se abriu, em choque, e ele se arrependeu imediatamente de ter pensado alto. Idiota! Tinha acabado de estragar o clima perfeito, o momento mais maravilhoso de toda a sua vida. Idiota!

E foi então que Ravena fez algo que o deixou mais chocado do que o beijo. Ela começou a rir. 

Sua cabeça se inclinou para trás, enquanto ela ria tanto que seus olhos se encheram de lágrimas. Ele ficou perdido no som, realizando um de seus maiores sonhos.

— Eu te fiz rir - disse, completamente abismado. Ela apenas sacudiu os ombros, rindo tanto que não conseguia respirar. - Eu te fiz rir! Eu fiz! Eu finalmente fiz! Vinte anos! Caralho, eu te fiz rir!

E então ele realmente dançou.

Ravena riu ainda mais, incapaz de fazer outra coisa enquanto ele se afastava alguns passos dela, mexendo as mãos de um lado para o outro e arrastando os pés em uma dança tão desengonçada que ela se curvou, apoiando as mãos na barriga que começava a doer pelas risadas. Ele tornou a cena ainda melhor, se transformando em tigre, panda, gorila, girafa, elefante, T-Rex, polvo - sem nunca deixar de sacudir as patas ou arrastá-las pelo chão em um ritmo que só ele conhecia.

Se transformou novamente em humano, se aproximando dela tão rápido que Ravena nem teve tempo de reagir antes de ser erguida no alto.

— Eu te amo! 

Ela parou de rir abruptamente, chocada demais para fazer algo além de arregalar os olhos. 

Mutano a colocou de volta no chão, ainda segurando sua cintura. Se aproximou mais de Ravena, lhe beijando de novo.

— Você… o… que? - conseguiu perguntar em meio ao beijo, confusa. Suas emoções faziam literalmente uma festa em sua cabeça, pendurando bexigas por toda Nevermore e cozinhando salgadinhos. Não tinham motivo para comemorar há muito tempo, então aquele momento merecia uma verdadeira festa.

— Eu te amo, Ravena. Te amo muito. Te amo há vinte anos - ele a olhou nos olhos para que ela pudesse ver toda a verdade, segurando uma das mãos delicadas em seu peito, sobre seu coração acelerado. Ela corou, sentindo as emoções dele a atingirem com força. Era verdade.

Ele realmente a amava.

— Eu… - ela não fazia ideia do que dizer. Sequer falava com pessoas há muito tempo e nunca tinha vivido uma situação como essa para saber o que deveria fazer.

Não era mais a Ravena de quinze anos que ele conhecera. Não era mais a criança ensinada a não sentir. Ela sabia, sim, que suas emoções eram perigosas - elas a fizeram enlouquecer, afinal.

Mas também sabia que tinham pouco mais de dezessete horas para viver. E depois disso, mais nada.

— Você não precisa dizer nada - ele sussurrou, um pouco sem graça. - Eu só precisava que você soubesse.

Ravena tinha muitos arrependimentos. Não iria criar mais um.

Devagar, segurou uma das mãos dele e a levou até seu peito, sobre seu coração tão acelerado quanto o dele. Encarou os olhos verdes com atenção, ignorando Timidez e invocando Bravura.

— Eu te amo, Mutano.

Os olhos dele, aos poucos, ficaram tão brilhantes que pareciam faróis acesos. O brilho que ela tanto admirava secretamente no passado estava de volta, ainda mais forte do que antes.

— E não há nada que eu queira fazer agora mais do que passar o último dia do mundo com você - Ravena repetiu as palavras dele, esforçando-se para passar toda a sinceridade em sua voz.

Ele sorriu tão largo que algumas rugas pequenas se formaram ao redor de seus olhos, ficando tão adorável que Ravena sorriu de volta, tendo uma ideia. 

Sem falar nada, deu as costas ao caminho que a levaria até seu apartamento e segurou a mão dele, entrelaçando seus dedos. Começou a puxá-lo delicadamente em direção à Torre.

— Onde nós vamos? - Mutano sussurrou, com medo de estragar o momento, como sempre conseguia fazer.

Ravena se limitou a sorrir, sem responder. 

Eles entraram na Torre e foram até o antigo quarto da empata, que digitou a senha para abrir a porta. Lá, ignorou todas as lembranças que a atingiram e se esforçou para controlar as alucinações que queriam aparecer, conseguindo explodir apenas a janela de seu quarto. Mutano apertou sua mão com mais força, querendo mostrar que estava ali. 

Grata pelo apoio, Ravena abriu uma das gavetas de sua cômoda, ignorando a quantidade de poeira presente em todos os móveis. Pegou algumas velas que guardava ali, de todos os tamanhos imagináveis, e entregou algumas para o metamorfo, ainda sem falar nada. Então começou a seguir em direção ao seu lugar favorito na Torre: o terraço.

Aquele era, com certeza, o lugar ideal para esperar a chegada do fim do mundo.

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O céu ainda estava escuro. 

Nem mesmo a lua tinha dado as caras naquela noite, preferindo se esconder atrás de nuvens escuras que bloqueavam todo o céu e não deixavam nem uma estrela ser vista. Somente as luzes da cidade, ao longe, e as dezenas de velas que Ravena e Mutano tinham espalhado pelo terraço iluminavam o lugar.

Se Mutano estivesse certo, ainda eram 2 horas da manhã - e, segundo o cronômetro que apitava em seu comunicador dos Titãs, eles tinham 15 horas e 23 minutos até que o vazio atingisse Jump City.

O tempo estava correndo depressa, mas os dois não ligavam. Estavam em seu paraíso particular, conversando baixinho sobre tudo e sobre nada, trocando beijos ocasionalmente.

Depois de espalhar as velas pelo lugar, os dois voltaram para buscar algumas almofadas e cobertas limpas - foi difícil, mas encontraram algumas lavadas no quarto de Ciborgue. 

Agora estavam deitados na cama improvisada, Ravena em cima do braço esticado de Mutano, enquanto admiravam a cidade e as nuvens escuras que nublavam o céu. Ravena amava noites assim.

— Você achou algum dia que ficaria tão próxima de mim? - sussurrou Mutano, acariciando os cabelos roxos da empata. Ela sorriu para ele, negando.

— Quando éramos crianças, eu fugia do que você me fazia sentir. Sabia que, se me deixasse levar pelo seu jeito espontâneo e alegre, não conseguiria mais controlar minhas emoções. Então eu me afastava de você - confessou, tomando coragem para fazer desenhos imaginários no peito do metamorfo com os dedos.

Ele sorriu, mexendo as orelhas, fazendo-a rir baixinho.

— Eram as orelhas, né? Você sabia que não ia conseguir resistir às orelhas. 

Ravena manteve um sorriso no rosto, passando a mão pelas orelhas dele, fazendo-o se contorcer com as cócegas.

— Quem poderia resistir a essas orelhas pontudas e verdes? 

— Como você é sortuda.

— A mais sortuda de todas.

Eles riram baixinho mais uma vez, percebendo que estavam muito próximos. Mutano se aproximou, beijando-a com carinho.

Sem nem mesmo perceber como aconteceu, o metamorfo se viu em cima dela, prendendo o corpo pequeno em baixo do seu e sentindo o cheiro de seu perfume único - incenso, chá e morango. O cheiro mais gostoso que ele já sentira na vida.

— Opa - murmurou, sem graça. - Acho que me empolguei.

Bravura novamente tomou o controle e Ravena se viu puxando o rosto dele até o seu. Aproveitando a onda de coragem que a tomou, agiu rápido antes que Timidez conseguisse se fazer ouvir e passou uma das mãos pelas costas de Mutano, segurando seu cabelo com a outra. Ele gemeu com o contato, afastando-se de novo para encostar a testa na dela, ofegante. Seus olhos verdes estavam mais escuros que o normal e as luzes das velas iluminavam sua pele de um jeito tão atraente que Ravena se perguntou se beijar o corpo dele seria tão gostoso quanto a boca.

— Rae… - o sussurro dele a trouxe de volta à realidade, fazendo-a corar com o rumo de seus pensamentos. - Nós não precisamos fazer isso. Não é porque o mundo vai acabar daqui algumas horas, nem porque nos amamos ou porque o terraço está perfeitamente romântico que nós precisamos, você sabe, fazer isso. Nós não precisam…

— Garfield - ela o chamou pelo nome pela primeira vez, fazendo-o arregalar os olhos. - Cala a boca.

Então voltou a beijá-lo.

Pela primeira vez em muito tempo, Ravena não se sentiu mal por ter suas emoções se manifestando. Tudo o que Mutano a fazia sentir, todas as sensações que os toques dele causavam, era bom. Muito bom. 

Ela se sentia a ponto de perder a sanidade, apenas a um passo da loucura - mas, dessa vez, ela queria aquilo. A confusão de ofegos e gemidos, os pensamentos nebulosos, as emoções distintas, a proximidade dos corpos - aquela era a loucura mais perfeita que a empata já sentira na vida.

Desesperada para sentir o toque da pele dele na sua, tentou puxar a camisa do uniforme dele para cima, mas não teve sucesso. Frustrada, começou a resmungar e amaldiçoar o tecido colado demais. A roupa podia fornecer uma visão maravilhosa do físico do metamorfo, mas também se recusava a sair quando tudo o que ela queria era tirar aquilo e senti-lo por inteiro.

Mutano começou a rir baixinho, se afastando um pouco dela para puxar o tecido com dificuldade pela cabeça, ficando só com o cinto e a calça do uniforme. Sorriu para a empata, com os cabelos ainda mais bagunçados do que antes, e a viu corar. Ravena o puxou para outro beijo, tentando esconder seu constrangimento.

Ele tateou a capa dela até achar o botão que a prendia, soltando o tecido que se misturou com as cobertas e almofadas. Entre beijos e pausas, eles ficaram nus, e então sentiram um ao outro pela primeira vez. 

Um vento gelado percorria o terraço, arrepiando seus corpos. Mutano puxou uma das cobertas por cima deles, levando-os para um mundo particular. Aquele momento era só deles.

O desespero passou. Os beijos se tornaram calmos, os toques ficaram mais firmes e carinhosos, os gemidos e suspiros aumentaram de intensidade, embora mais baixos. E foi assim, debaixo do céu nublado, iluminados parcialmente pela luz de velas, escondidos do mundo sob as cobertas, em cima do único lugar que já chamaram de lar, que os dois se amaram pela primeira vez.

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Mutano piscou os olhos, gemendo com a claridade que atingiu seu rosto. 

O sol estava fraco, coberto por nuvens escuras e carregadas, mas existia. Resmungando coisas inaudíveis, o metamorfo se aproximou ainda mais de Ravena, escondendo o rosto em seus cabelos roxos.

O cheiro dela o atingiu com força, misturado com o seu, o que o fez abrir um largo sorriso sonolento. Ele queria viver aquele momento para sempre.

Ravena se aconchegou mais no corpo dele, tremendo de frio. Mutano puxou as cobertas mais pra cima, cobrindo seus corpos, e a abraçou mais apertado. Percebendo que não conseguiria voltar a dormir, abriu os olhos devagar e analisou a pessoa que mais amava no mundo.

Ela era… perfeita. Os cabelos roxos e bagunçados, os lábios avermelhados pelos beijos que trocaram a noite toda, os cílios grandes, o pescoço delicado - com algumas marcas deixadas por ele, o que o fez sorrir -, tudo nela era perfeito. Ele poderia ficar horas, dias e semanas apenas admirando a mulher de sua vida.

Infelizmente, eles não tinham todo esse tempo.

Alguns minutos depois, Ravena começou a soltar alguns resmungos desconexos, se mexendo devagar. Mutano estava fazendo desenhos aleatórios com os dedos em sua bochecha, o que causava cócegas. Franzindo o nariz, ela se encolheu, tentando fugir do toque, o que o fez rir baixinho. O som terminou de despertá-la.

Um pouco assustada e sem saber onde estava, a empata abriu os olhos, piscando para se acostumar com a claridade. Verde. Muito verde. Foi a primeira coisa que ela viu.

— Bom dia - ele sussurrou, lhe dando um beijo na testa, perto do chakra. Ela ainda parecia confusa, então ele pegou sua mão e colocou em seu rosto, sorrindo. - Oi. Sou eu, Rae.

As manhãs eram sempre confusas para Ravena. Normalmente, a empata passava horas em sua cama no pequeno apartamento alugado, tentando entender onde estava e o que deveria fazer em seguida. Às vezes, seus sonhos eram tão reais que acordava pensando estar dentro deles, confusa sobre quem era e em que época estava.

Mas essa manhã foi diferente. 

Assim que viu o rosto dele, o rosto incrivelmente verde e bonito, sorrindo para ela com os olhos brilhando de felicidade, Ravena soube exatamente onde estava, quem era e o que tinham feito. Corando, lutou para não desviar o olhar, invocando Bravura para poder olhá-lo nos olhos e lhe dar um sorriso pequeno.

O sorriso dele se tornou ainda mais largo ao ver o dela. Nunca, nem mesmo em seus maiores sonhos e desejos, Mutano conseguia imaginar algo tão perfeito quanto aquele momento.

— Bom dia - Ravena sussurrou de volta, apoiando uma das mãos no peito dele.

Os dois não precisavam de muitas palavras para saber que aquele momento era especial. Permaneceram apenas se olhando por um tempo, perdidos um no outro. Se deitaram de lado, um de frente para o outro, e Ravena começou a fazer cafuné nos cabelos dele, enquanto Mutano fazia carinho em suas costas. O silêncio não era incômodo - muito pelo contrário, era perfeito.

— Quanto tempo ainda temos? - incrivelmente, foi ela quem falou pela primeira vez.

— Quatro horas e trinta e oito minutos - ele respondeu, depois de se esticar para alcançar o antigo comunicador dos Titãs, programado com o cronômetro.

Ela suspirou, querendo que aquele momento durasse para sempre. 

— Eu queria ter tido coragem para te procurar antes - admitiu, mordendo o lábio inferior, mania que tinha adquirido com o nervosismo.

Mutano colocou uma mecha do cabelo dela atrás da orelha, erguendo o rosto da empata com carinho até que o encarasse.

— Eu também. Queria ter tido coragem de me declarar pra você antes, para te dar os meses necessários para pensar em sair comigo. Queria ter feito mais para te convencer a ficar, quando você saiu da Torre sem olhar para trás. Queria ter te chamado para sair ou te visitado nesses 20 anos - deu de ombros. - Não fiz nada disso. Mas, pelo menos, estamos aqui agora. Juntos.

Ela sentiu Felicidade e Afeição se agitando, o que a fez sorrir. Até mesmo seu coração parecia bater de um jeito diferente, o que era engraçado. 

— Me desculpe por todas as vezes em que gritei com você, fiz você se sentir mal e te ignorei. Você sempre me fez bem. Lamento não ter falado isso antes.

— Isso já passou. Tá tudo bem.

Eles começaram a conversar de novo, sobre tudo e sobre nada, relembrando velhos momentos e até mesmo rindo do mau humor antigo da empata. Ficaram ali, sem a mínima vontade de se afastarem, curtindo todos os segundos que ainda podiam viver juntos.

Longe dali, Ciborgue estava esparramado na grama, com suas partes metálicas estalando, chiando e até mesmo soltando fumaça. Todas as suas articulações metálicas protestavam pelo esforço empreendido. A fraca luz do sol acentuava ainda mais a ferrugem de seu corpo metálico. As partes humanas, em contrapartida, suavam - fazia tanto tempo que isso não acontecia que ele nem se lembrava mais de como era a sensação. Incrivelmente, tinha sentido falta disso.

Apesar de seu estado quase deplorável, seu sorriso era mais brilhante que o sol. 

Não conseguia sequer se levantar. Havia passado horas levando seu corpo até a exaustão - correndo, jogando, pulando, se exercitando como há muito não fazia. E não se sentia tão vivo há anos.

Ele ainda era… bem, ele. Ainda era, por baixo de toda aquela lataria velha, o Victor. Um homem que um dia já havia sonhado em se tornar um atleta. Um homem que um dia já tivera objetivos, metas, planos. Um homem que teve tudo tirado de suas mãos.

Mas um homem que ainda estava vivo.

Sorrindo, fechou os olhos e fez uma promessa a si mesmo. Ele não deixaria as coisas chegarem onde chegaram. Seu eu do passado não cometeria os mesmos erros. Não deixaria seus amigos irem embora, não sucumbiria novamente à depressão e, definitivamente, nunca mais se permitiria esquecer que ainda tinha um coração batendo em seu peito. Um coração que merecia ser cuidado.

Esses foram os últimos pensamentos dele, antes que sua existência fosse apagada. Não sentiu dor, não sentiu nada - simplesmente desapareceu, como se nunca houvesse existido. Em seu lugar, ficou apenas a incerteza. As inúmeras possibilidades. O que poderia ser.

Em um lugar próximo, no alto de um prédio luxuoso com um grande letreiro escrito WAYNE, Asa Noturna estava sentado no topo da grande letra E, encarando a cidade. A cidade que tanto lutara para proteger por mais da metade de sua vida. Agora ela sumiria e ele não poderia fazer nada.

Incrivelmente, não se sentia mal por isso. Tinha passado uma noite maravilhosa conversando com seu pai, relembrando todos os momentos bons que passaram juntos e agradecendo por tudo o que ele tinha feito. A reconciliação, ao contrário do que ele havia imaginado, foi fácil. Bruce estava tão triste quanto ele pelo afastamento dos dois - apesar de não admitir nem sob tortura.

Agora, Dick estava ali, encarando a cidade, pensando apenas em uma coisa.

Estelar. Kori. A mulher de sua vida.

Prometeu a si mesmo que não seria idiota novamente a ponto de perder a pessoa mais maravilhosa do mundo pela terceira vez. Se o Robin do passado vacilasse, Asa Noturna prometeu que daria um jeito de reconstruir sua realidade apenas para voltar ao passado e dar uns tabefes no seu eu de 16 anos. 

Rindo sozinho com o pensamento, tirou sua máscara, analisando o tecido que nunca saía de seu rosto. Era estranho não ter nada para cobrir sua identidade, mas não precisava mais daquilo. Era o fim do mundo, afinal, e ele queria acabar sendo ele mesmo. Não o Asa Noturna, não Robin, mas o Dick. 

Deitou, sem se importar se estava sujando sua roupa, e puxou uma foto do bolso de sua jaqueta. Analisou o estranho grupo registrado, passando a mão pelo rosto da garota ruiva, que parecia radiante.

A foto tinha sido tirada no primeiro natal que passaram juntos. Kori insistiu para que comemorassem todas as festividades que a Terra tinha para oferecer, já que se empolgava sempre com os feriados e amava presentear seus amigos. Na imagem, ela flutuava ao fundo, com um braço ao redor de Ravena e outro ao redor de Robin. A empata estava séria, como sempre, mas seu capuz estava abaixado - o que mostrava que estava se sentindo bem. Robin tentava sorrir, mas seu rosto estava contorcido em uma careta por causa do aperto forte que Estelar não conseguia controlar quando estava empolgada.

Ciborgue estava na frente, tirando a foto com uma mão e fazendo um sinal engraçado com a outra. Mutano, tentando ser discreto, tinha colocado os dedos acima da cabeça de Ravena, imitando chifres.

Sorrindo, Dick prometeu que Robin não deixaria sua família se separar dessa vez. Fechou os olhos, ouvindo seu cronômetro apitar ao seu lado, e soube que tinha pouco tempo. Passou seus últimos minutos lembrando-se de momentos importantes, rindo sozinho. Quando o vazio finalmente o alcançou, se deixou ir, sentindo-se leve como há muito não sentia. E sumiu. Sem dor, sem gritos, sem arrependimentos. Deixou apenas uma sombra de promessas que seriam cumpridas, um dia. O tempo se encarregaria disso.

Na Torre, Ravena e Mutano conversaram por horas, trocando beijos e carinhos ocasionalmente. Se amaram mais uma vez, querendo aproveitar cada segunda da companhia um do outro.

— Rae… - o metamorfo sussurrou, acariciando os cabelos dela, sabendo que não tinham muito tempo. Ela apenas resmungou, o que ele entendeu como um “pode falar”. - O Mutano de quinze anos, aquele que começou a gostar de você, lá atrás, sem saber direito o que fazer para conquistar sua atenção. Sabe, esse Mutano?

Ela assentiu, o olhando com atenção, querendo saber onde ele ia chegar.

— Bem, esse Mutano não sabe muito o que fazer. E ele vai te irritar, vai te atormentar e vai te estressar por muito tempo antes de conseguir entender o que tem que fazer para te conquistar, sabe?

— A Ravena de quinze anos, aquela que quer ficar longe de você e da confusão que você causa, vai te magoar muito antes de entender que tem que te dar uma chance para ser feliz - completou ela, fazendo ele sorrir.

— Sim, eu sei. Mas aquele Mutano, que não sabe direito o que está fazendo, sabe que você é o presente, passado e futuro. Não existe nenhum tempo sem você. Não existe uma realidade em que eu não te ame. E eu prometo que, não importa o que aconteça, aquele Mutano (mesmo sendo tonto) vai fazer de tudo para te conquistar. Nós vamos ficar juntos. Agora, antes, depois; em todos os tempos e em todas as realidades possíveis.

Ela sorriu, piscando para conter as lágrimas que queriam cair. Colocou uma das mãos no rosto dele, acariciando as bochechas macias, e lhe deu um beijo calmo.

— Eu sei. O meu eu do passado não sabe direito o que fazer com você, mas sabe que nunca vai conseguir se livrar - riu, fazendo ele rir junto.

— Eu te amo, Rae.

— Eu te amo, Gar.

E foi assim, juntos, abraçados e sorrindo, que eles foram sumindo aos poucos. No lugar dos dois, o que ficou foi o amor. E a certeza de que o tempo se encarregaria de uni-los.

Afinal, o tempo é perigoso. Mas nunca se esquece de uma promessa.


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Notas finais do capítulo

É isso. Minha primeira fanfic finalizada. Nem acredito que consegui.
Jovens Titãs é o meu desenho favorito e, de tempos em tempos, eu fico viciada nele de novo. To cheia de ideias para fanfics BBRae e não sosseguei enquanto não escrevi essa. Espero que tenham gostado. Ela é curtinha, mas foi feita com muito amor.
Se alguém tiver dúvidas, ficarei muito feliz em responder. Obrigada por terem lido, espero que tenham gostado :)



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