How Long Is Forever? escrita por Anitra


Capítulo 1
Não mexa com o tempo


Notas iniciais do capítulo

Para quem não lembra, um resumo:
No episódio "Quanto Tempo É Para Sempre?" Estelar acaba viajando 20 anos no futuro e encontra seus amigos separados. Ravena enlouqueceu, Ciborgue se tornou antiquado e não pôde mais sair da Torre, Mutano se tornou uma atração de circo e Robin virou oficialmente Asa Noturna. Eu tomei a liberdade de escrever a minha versão do que aconteceu quando Estelar voltou para o seu tempo.
Algumas informações: eu não consigo imaginar o Mutano da forma que ele aparece no episódio, então mudei um pouco a aparência dele da forma que eu o vejo. A história vai ser curtinha; ainda não sei como vou dividir, porque a ideia era fazer uma one shot, só que acabou ficando muito grande. Provavelmente terá dois capítulos. E pra quem acompanha minha outra fanfic, eu não a abandonei. Sei que estou atrasada, mas ainda pretendo atualizar.
Espero que gostem :)



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Ela lançou a eles um último olhar cheio de palavras não ditas, sentimentos não expressados e promessas não cumpridas. Um olhar cheio de saudade, mas um sorriso cheio de esperança. Ela sabia que o futuro - o seu futuro, o futuro deles - seria diferente. E foi por isso que entrou no portal, pronta para reencontrá-los e reescrever a história.

O portal se fechou.

Aqueles que um dia já tinham sido os Titãs passaram a encarar, novamente, uma rua vazia. O vento balançava as árvores ao redor e um uivo ecoava pela noite, muito longe. Esses eram os únicos sons que tomavam o local.

— Ahn… e agora? - Mutano foi o primeiro a se pronunciar, completamente perdido. Não sabia mais como agir com aqueles que costumavam ser seus amigos e sua família. Ainda se lembrava do dia em que se separaram e de como ele foi o único que tentou impedir que isso acontecesse, apelando de todas as formas para que a equipe continuasse unida. Isso não aconteceu.

Ciborgue coçou a cabeça, nervoso. Cada parte do seu corpo - todas as partes metálicas - rangiam, protestando pela luta. Já fazia uns bons anos - se não décadas - que ele não tentava enfrentar algum vilão, e seu corpo robótico cobrava o preço.

— Que tal uma pizza? - sugeriu, sem saber direito como deveria agir. Também fazia uns bons anos que não falava com ninguém.

Asa Noturna, o antigo Robin, não respondeu. Tinha acabado de perder a única mulher que já amou em toda a sua vida. Pela segunda vez.

Ravena se encolheu ainda mais dentro de sua capa, agora branca. Desejou criar um portal para se teleportar para seu apartamento pequeno, silencioso e solitário o mais rápido possível, mas suas emoções estavam completamente descontroladas. Não conseguia se concentrar o suficiente para usar seus poderes com segurança. Até onde sabia, podia acabar criando um portal para qualquer outra dimensão, onde se perderia. 

Sem sequer um olhar na direção de sua antiga equipe, a empata começou a se afastar, flutuando lentamente. 

Mutano se desesperou muito mais do que achou que iria se desesperar. Não estava pronto para perdê-la de novo, agora que tinha acabado de reencontrá-la. Há anos não conseguia parar de pensar nela e todos os dias só acordava para ter esperança de que iria criar coragem para visitá-la. Nunca criou.

— Espera! - o desespero era claro em sua voz quando ele correu até ela, sabendo que não podia deixá-la escapar. Não dessa vez. - Qual é, Rae? Você sabe que quer sair com a gente!

Ela paralisou no lugar, ainda flutuando baixinho. Se virou lentamente, olhando para o garoto verde - que já não era mais um garoto - que costumava irritá-la, atormentá-la e, ela nunca iria admitir, animá-la. Foi o apelido que a fez se virar. Por mais que ela sempre tivesse insistido para que ele a chamasse de Ravena, ele sempre tentou se tornar alguém próximo, chamando-a por um apelido que ela nunca gostou. 

Até agora.

Rae. Três letrinhas que foram capazes de trazê-la de volta à realidade, devolvendo um pouco da sanidade que havia perdido há anos. Ela se lembrou das tardes em que o metamorfo passava na porta de seu quarto, nunca perdendo a esperança de que ela, um dia, fosse abrir e convidá-lo para entrar. Nunca perdendo a esperança de que um dia conseguiria fazê-la rir. 

Algo estranho aconteceu com seu peito e suas emoções, que costumavam gritar em sua cabeça todos os segundos do dia, se aquietaram como se nunca houvessem existido. 

Impressionada com o que Mutano conseguiu fazer com apenas uma frase, Ravena fez uma coisa que não fazia há muito tempo: tirou seu capuz. Queria vê-lo com atenção, e o tecido atrapalhava parte de sua visão. Ela conseguiu perceber a expressão dele mudar de um sorriso nervoso para uma cara de completo choque em segundos.

Fazia anos que eles não se viam e Mutano não estava preparado para encarar o rosto dela depois de todo esse tempo. Ravena não tinha mudado muito - e, ao mesmo tempo, tinha mudado muito.

Sua pele estava mais pálida do que ele costumava se lembrar, em um tom tão branco que não parecia ter visto um único raio de sol em décadas. Seus olhos, os lindos olhos exóticos e roxos que ele costumava secretamente admirar enquanto ela não estava prestando atenção, estavam rodeados por olheiras tão escuras e fundas que quase chegavam às suas bochechas. Havia algumas rugas, principalmente em sua testa, ao redor do chakra. E seus cabelos estavam bagunçados, como se ela puxasse os fios constantemente em desespero.

— Linda… - deixou escapar, todo bobo. Ravena franziu o cenho, o que o fez perceber que havia falado em voz alta. Completamente sem graça, tentou invocar o antigo Mutano, sorrindo de lado - Quer dizer… vamos, gatinha! Você sabe que quer uma pizza vegetariana extra grande.

Sem esperar pela resposta dela, Mutano fez aquilo que estava estritamente proibido em qualquer circunstância, no passado, presente e futuro. Ele a tocou.

Arregalando os olhos, Ravena não conseguiu se proteger das emoções que a atingiram com a força de um ônibus. Ele estava próximo demais, e tudo o que sentia passou a ser sentido também pela empata.

Nervosismo. Uma leve dose de desespero. Timidez. Euforia. Afeição.

A onda de afeição foi tão grande que ela quase caiu para trás, tonta. Aquele sentimento em específico era dirigido a ela. Somente a ela. E a ninguém mais.

Sem falar nada, Ravena se deixou ser puxada novamente até onde Ciborgue e Asa Noturna estavam, confusa com as emoções de Mutano - e as suas próprias, que haviam começado a se agitar novamente.

Os quatro se encararam, sem jeito. Asa Noturna ainda pensava em Estelar e em todos os momentos que nunca viveram, mas tentou blindar suas emoções como fizera tempos atrás. Voltou-se para os outros, analisando os rostos cansados e as mudanças que ocorreram em seus antigos amigos.

— Pizza seria ótimo - sorriu.

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Eles começaram agindo como completos estranhos. 

Pediram duas pizzas extra grandes, muito refrigerante e até mesmo mostarda. Muita mostarda.

O último pedido foi feito por Mutano e foi completamente sem querer. Por pura força do hábito, assim que se viu em uma pizzaria com sua antiga equipe, o metamorfo pediu o que costumavam pedir sempre. E Estelar não conseguia comer sem ter um enorme vidro de mostarda ao seu lado.

Curiosamente, foi isso que os fez parar de agir como se nunca tivessem se visto antes. Ciborgue puxou em seus arquivos de memória várias histórias que eles passaram juntos e Asa Noturna chegou até mesmo a sorrir enquanto acrescentava alguns comentários, mesmo que uma parte da sua mente ainda pensasse em Estelar.

Mutano se empolgou assim que uma conversa verdadeira foi iniciada, agindo quase como costumava agir. E Ravena até mesmo se arriscou a comentar uma ou duas das histórias, com sua voz arranhada e ainda mais rouca do que costumava ser - ela não falava muito, agora. Não conversava mais nem com as ilusões que insistiam em atormentá-la.

— Cara, a prisão de Jump City era um lixo! - exclamou Mutano, de boca cheia - Quantas vezes a gente teve que ver a cara feia do Cinderblock?

— Nem me fale! Fiquei sabendo que você trabalhou com a polícia uns anos atrás pra melhorar a segurança dos presídios, Rob… Asa Noturna. Pelo que eu me lembro, passou na TV. Logo você, que odiava tanto aparecer na mídia, agora é todo cheio de entrevistas, né cara? - Ciborgue bateu nas costas de Asa Noturna um pouco forte demais, fazendo-o sujar o rosto com a fatia de pizza que estava mordendo e sorrir, um pouco encabulado.

— Pois é… depois que comecei a trabalhar por conta própria, ficou mais difícil ter que lidar com todos os criminosos que fugiam. Foi bem menos trabalhoso tentar mantê-los presos - deu de ombros, como se não tivesse feito nada demais.

— Devíamos ter pensado nisso antes - acrescentou Ravena, sem emoção na voz. Mutano sorriu para ela, contente em vê-la se esforçando para falar alguma coisa.

— Mas aí perderíamos toda a diversão! Se os vilões não ficassem fugindo na nossa época de glória, o que nós iríamos fazer todos os dias? Nada! - concluiu, pegando a última fatia de pizza antes que Ciborgue a alcançasse, rindo sozinho ao lembrar das competições que faziam para disputar o último pedaço. Até Ravena costumava participar.

— Eu teria tido mais tempo para te vencer no videogame - provocou Ciborgue. Mutano preparou-se para revidar, mas seus instintos aguçados conseguiram perceber que Ravena ficou tensa de repente ao seu lado. 

Com medo de que alguma coisa tivesse feito ela pensar em ir embora, Mutano a encarou, mas ela não prestava mais atenção neles. Seus olhos estavam fixos na TV acima de suas cabeças. 

Aos poucos, todos os antigos Titãs se voltaram para o aparelho, curiosos sobre o que tinha chamado a atenção da empata.

— (...) notícia urgente. Cientistas estão intrigados com um imenso vazio que se aproxima de todas as partes do mundo. Alguns países, como a China e a Turquia, começaram a sumir como se nunca houvessem existido, e nem mesmo os maiores especialistas sabem o que está acontecendo. Alguns pesquisadores da Universidade da Califórnia acreditam que, seja lá o que for que está apagando a nossa realidade, atingirá por último Jump City, no final do dia. Ainda não há explicações ou soluções para o fenômeno, mas um consenso geral parece estar se formando entre os usuários das redes sociais: o fim do mundo finalmente chegou. Voltaremos com maiores informa…

— Fim do mundo? - Mutano não se conteve, olhando para Ravena com os olhos arregalados - Seu pai voltou?

Ciborgue sentiu seu queixo caindo com a falta de tato daquele que costumava ser seu melhor amigo.

— Cara… eu que fiquei sem ver pessoas por dez anos, mas é você que não sabe o que dizer pra elas. 

Mutano sentiu seu rosto corando e seus olhos quase saltaram das órbitas.

— Não, Rae! Não foi isso que eu quis dizer! Cara, me desculpa! - começou a dizer, enrolado, mas Ravena se limitou a olhar para ele, impassível por fora. Por dentro, suas emoções se agitavam, completamente eufóricas.

A empata podia sentir Raiva fazendo força para sair até a superfície com a simples menção de seu pai, querendo quebrar o fio de controle que Ravena conseguia manter com dificuldade. Bravura se agitava, lembrando de como a luta com Trigon se desenrolou. Timidez se encolhia, pensando em quantos estragos foram feito por Ravena. Conhecimento repassava mentalmente a notícia que acabara de ser transmitida, tentando analisar os fatos. Afeição… estranhamente, a emoção se mostrava mais forte do que todas as outras, apenas por ter ouvido Mutano se dirigindo a Ravena.

Esse era o problema com ela: depois que se separou dos Titãs, suas emoções se tornaram cada vez mais descontroladas. Sem distrações, sem pessoas que a prendessem ao chão, todas começaram a ganhar mais força do que deveriam, e de repente Ravena se viu sentindo todas as emoções juntas, o que nunca havia acontecido antes. Não demorou para que começasse a perder o controle de seus poderes e, aos poucos, sua sanidade.

Nem mesmo a meditação era capaz de ajudá-la.

Não houve um dia durante os últimos vinte anos em que Ravena não odiou a si mesma por ter sugerido a separação dos Titãs, quando as emoções embaralhadas de todos e o desespero por se verem longe de trazer Estelar de volta começaram a enlouquecê-la. Era difícil ficar perto deles e, principalmente, de Robin - ou Asa Noturna. Ele se tornou ainda mais obsessivo do que era com Slade, ao tentar arranjar maneiras de encontrar Estelar.

Ravena se arrependia todos os dias do momento em que decidiu sair da equipe. Se arrependia de ter ido embora sem olhar para trás. E, principalmente, se arrependia de não ter escutado as súplicas de Mutano para que ela ficasse com ele. 

“Por favor, Rae. Eu… eu gosto de você”. Ela conseguia se lembrar das exatas palavras que ele lhe disse naquela noite. Também conseguia lembrar de seu tom de voz hesitante, de seus olhos atormentados e da falta do sorriso tão característico em seu rosto. E também se lembrava de não ter olhado para ele enquanto fingia não ter escutado, deixando sua família e um coração partido para trás.

— Meu pai não está forte o suficiente para voltar - se limitou a responder, ignorando as lembranças. Mutano respirou fundo, aliviado ao perceber que ela não parecia ter se ofendido.

— Titãs… - Ravena, Ciborgue e Mutano olharam para Asa Noturna, surpresos. Nem mesmo a empata esperava que ele fosse usar esse título para se referir a eles. - Acho que temos mais uma missão.

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A Torre continuava exatamente igual. Tirando, é claro, as teias de aranha, os móveis apodrecidos e a falta de luz - Ciborgue disse que não via sentido em trocar as lâmpadas quando seu olho robótico enxergava no escuro. 

O fato de estarem sem luz acabou se tornando positivo, visto que Ravena estourou algumas lâmpadas ao entrar na Torre novamente. Suas emoções se tornaram incontroláveis, gritando coisas em sua cabeça, e a empata se viu enxergando a sala principal em sua época de glória.

— Amiga Ravena, o filme já vai começar!

Ravena encarou a imagem de Estelar, tão radiante, linda e real que ofegou, se aproximando para tocá-la. Antes que pudesse, porém, um Mutano de quinze anos passou correndo ao seu lado, quase fazendo-a cair. 

— Cadê a pipoca? E os doces? E o refrigerante? 

Robin revirou os olhos perto da TV, segurando o controle remoto e esperando que todos se sentassem para que pudesse ligar o aparelho. 

— Chega pra lá, verdinho! Você ta no meu lugar - reclamou Ciborgue, segurando um balde de pipoca tão grande que Mutano (o mais baixo entre eles) poderia se sentar ali dentro confortavelmente.

Mutano foi para o lado, relutante, para não ser esmagado pelo enorme corpo de metal de seu amigo. E então todos os quatro se viraram para ela, que continuava pregada no chão, com os olhos arregalados e a boca aberta. Seu peito retumbava com tanta força que Ravena temia explodir toda a torre com suas emoções descontroladas.

— Você não vem, Ravena? Só falta você - Robin apontou o sofá com o controle, sorrindo gentilmente.

Ela piscou rapidamente para conter as lágrimas, se afastando com pressa. A parte de trás de seus pés bateu em um degrau e ela quase caiu.

Aos poucos, as imagens se desfizeram diante de seus olhos e ela se esforçou para não derramar as lágrimas. As ilusões eram tão reais! E doíam tanto, tanto…

— Rae? Você ta bem? - a voz de Mutano conseguiu quebrar a barreira de ilusão criada por sua cabeça, e ela pôde sentir as mãos dele segurando seus braços. Se concentrou nisso, sentindo o calor que ele lhe passava, tentando voltar à realidade. Após alguns minutos, finalmente conseguiu vê-lo em sua frente, parecendo aflito e preocupado.

Mutano era o que mais tinha mudado com o tempo, depois de Asa Noturna. A puberdade lhe fez finalmente crescer, e agora ele era bons centímetros mais alto do que ela, que teve que levantar a cabeça para conseguir enxergar seu rosto. Alguns músculos surgiram em seu corpo, que continuava tão verde quanto antes. Mas a maior mudança estava em seus olhos. As íris verdes não continham, nem de longe, o brilho que sempre estava presente quando ele tinha quinze anos.

— Eu… - sussurrou, desviando o olhar de seu rosto. Timidez tomou o controle de seu corpo, sobressaindo-se, e isso a ajudou a se acalmar. Era muito melhor lidar com uma emoção só. - Você é real?

Não pôde evitar que a pergunta saísse de seus lábios, encolhendo-se. Tinha medo de tudo não passar de mais uma grande ilusão - a volta de Estelar, a pizza com seus antigos amigos, pisar na Torre novamente. Parecia bom demais para ser verdade. 

— Eu sou, Rae. Sou real. Mutano, em carne e osso, ao seu dispor - brincou, deslizando as mãos por seus braços até segurar as dela. Estavam geladas. Ignorando o arrepio que sentiu por estar tocando na empata, coisa que nunca fora capaz de fazer direito, levou as mãos dela até seu rosto, deslizando os dedos por seu nariz, boca, olhos, orelhas. - Eu estou aqui.

Ela o encarou de novo, surpresa pela atitude dele, que funcionou perfeitamente. Ravena conseguia sentir cada traço dele, desde a presa que insistia em se sobressair até a extensão das orelhas pontudas. Era real. 

— Obrigada - sussurrou, concentrada em deslizar os dedos pelos fios verdes do cabelo dele, que estava maior do que ela se lembrava. Ele parecia tão… velho. Tão maduro. E, ao mesmo tempo, ainda parecia a mesma criança que ela conhecera.

Um pigarro ecoou pelo cômodo, fazendo ela se retrair e flutuar para longe de Mutano tão rápido que parecia estar fazendo algo muito errado. Corou, sentindo suas emoções se agitarem de novo, assim como as dele - frustração, um pouquinho de raiva e, de novo, afeição. 

Ravena olhou para Ciborgue e Asa Noturna, que a encaravam em um misto de diversão e preocupação.

— Os dois pombinhos querem ficar sozinhos? - debochou Ciborgue, cruzando os braços. Mutano abriu a boca para retrucar, mas Ravena foi mais rápida.

— Você não vai ligar esse computador velho? - murmurou, mudando de assunto. Ele abriu um sorriso ainda maior, divertindo-se com o constrangimento dela. Ravena e Mutano eram um casal que ele nunca imaginaria na sua vida, se o próprio Mutano não tivesse lhe contado o que sentia, anos atrás. Ciborgue não os via há muito tempo, mas sua memória não o permitia esquecer (e, pelo jeito, o coração do metamorfo também não). 

Ele não se deu ao trabalho de responder a empata. Virou-se para o computador, realmente muito velho, mas que ainda tinha a capacidade de rastrear todos os cantos do mundo e continuava sendo eficiente na hora de descobrir problemas. 

Eles poderiam ter ido até a nova base de Asa Noturna, mas pareceu uma ideia melhor se juntarem em sua antiga casa. Além do mais, Ciborgue precisava recarregar suas baterias, já que as improvisadas estavam acabando.

— Você está bem, Ravena? - a diversão sumiu do rosto do antigo líder dos Titãs, ficando só a preocupação. Ciborgue prestou atenção na conversa, enquanto trabalhava para descobrir o que estava acontecendo com o planeta. Afinal, considerou Ravena sua irmã mais nova por muito tempo, e agora que estavam juntos novamente era difícil não voltar a enxergá-la desta forma.    

Ela encolheu os ombros, desconfortável. Outra lâmpada explodiu, logo acima de Mutano, que se transformou por reflexo em uma tartaruga, deixando que os cacos de vidro atingissem inofensivamente seu casco.

— Depois que fui embora, minhas emoções ficaram cada vez mais instáveis - resolveu explicar, achando que seria justo com eles. - Por mais que eu meditasse, não tinha ninguém para conversar além de mim mesma, e a influência de… Trigon… - o nome dele saiu engasgado de sua garganta. Ainda era difícil mencioná-lo - começou a ficar mais forte. Ele se alimentou de mim, da minha sanidade, da minha raiva, do meu desespero, e quanto mais eu perdia o controle, mais ele conseguia entrar na minha cabeça. O resto, vocês sabem.

Sim, eles sabiam. Era difícil esquecer do fim do mundo.

Quando Ravena fez dezesseis anos, Slade apareceu para buscá-la e colocar as marcas de Trigon em seu corpo. Os Titãs já haviam se separado na ocasião, e Estelar já havia sumido há tempos. Ela estava sozinha. 

Robin acabou rastreando o vilão, que foi seu arqui-inimigo por tanto tempo que era difícil não querer caçá-lo. Os sensores de Ciborgue captaram ondas estranhas na cidade, e Mutano acabou sentindo o cheiro conhecido do vilão enquanto patrulhava as ruas, tentando bancar o herói sozinho. 

Acabou que todos eles se encontraram novamente, sem combinar, e conseguiram libertar Ravena. Ela teve que contar a eles o que estava acontecendo e, quando o fim do mundo finalmente chegou, eles trabalharam juntos pela última vez. 

Trigon foi derrotado apenas por um motivo: Raiva estava solta em Nevermore. Ravena perdeu o controle sobre ela, que se soltou das correntes que a prendiam há anos e assumiu grande parte da mente da empata. 

Trigon se alimentava de sua Raiva, sim. Mas ele também sucumbiu a ela. 

A emoção representava o lado demoníaco de Ravena, grande parte da sua força e de seus poderes. Foi Raiva quem impediu que a empata fosse destruída quando se tornou um portal, e foi ela quem conseguiu acabar com Trigon enquanto ele ainda estava fraco para assumir todos os seus poderes.

— Depois que Trigon foi derrotado, foi muito difícil controlar Raiva e prendê-la de novo. Até que eu desisti. Ela começou a se fazer mais presente, então, atiçando minhas outras emoções, que começaram a emergir juntas. Até que eu perdi o controle sobre todas - continuou Ravena, ainda olhando para baixo. Avistou uma bolinha prateada, coberta de poeira no chão. - Depois vieram as alucinações. Vocês, Trigon, minhas emoções, lembranças, vocês, coisas que nunca aconteceram, coisas que poderiam ter acontecido… 

Ela deu de ombros, sem graça, percebendo que tinha falado mais em alguns minutos do que nos últimos dez anos.

— Por que não nos procurou? Você não precisava ter passado por tudo isso sozinha! - exclamou Mutano, já de volta à sua forma original. Ele voltou a segurar as mãos dela, que incrivelmente não reclamou ou puxou-as de volta. Era bom sentir o toque dele, que a mantinha no chão. Diferenciava o que era real do que era ilusão.

— Por que Ciborgue não pediu ajuda quando suas peças se tornaram obsoletas? Por que você não nos chamou quando precisou se tornar uma atração de circo para sobreviver? - retrucou ela, deixando-o sem resposta.

Orgulho e medo da rejeição eram os motivos dela, e supunha que eram os deles também. Asa Noturna foi o único que continuou a ter sucesso como herói - o que não significava que estava bem nos outros campos da vida. Acabou se tornando ainda mais solitário e sério que seu mentor, depois de perder o amor de sua vida e ajudar a desmanchar sua segunda família. Mas algo também o impedia de procurar seus amigos e tentar restaurar a equipe que tanto prezou um dia.

— Ahn… gente - a voz de Ciborgue se fez ouvir, fazendo eles se voltarem para a tela enorme do computador. - Acho que vocês vão querer saber o que eu descobri.

Asa Noturna se colocou ao seu lado antes que qualquer um pudesse perguntar alguma coisa, ordenando que Ciborgue lhe passasse um relatório completo das descobertas. Ele continuava tão mandão como sempre.

— Eu tenho uma notícia boa e uma ruim. Qual vocês querem primeiro?

Mutano gritou “boa!” antes que qualquer um pudesse se pronunciar, correndo para o lado de Ciborgue e encarando a tela onde costumavam jogar videogame todos os dias.

Asa Noturna deu de ombros, pedindo para que ele falasse tudo de uma vez, e Ravena apenas flutuou silenciosamente até eles, sentindo falta do toque do metamorfo em suas mãos. 

— Ok, a boa primeiro: eu descobri o que está acontecendo. - Ciborgue abriu um mapa parcial na tela. Um estranho círculo recortava os países, e a beirada do mapa estava completamente branca. Algumas regiões estavam faltando. - Esse é o mapa atual do nosso planeta. Estão vendo essas partes em branco? São os países que literalmente não existem mais. Sumiram. Desapareceram como se nunca tivessem estado aqui. Agora estão vendo esse pontinho vermelho piscando no centro? É Jump City. O canal de notícias não mentiu quando disse que nossa cidade seria a última a ser afetada. 

— E o que está causando isso? O que existe nessa parte branca?

— Nada. Existe literalmente nada. As regiões foram apagadas. Agora só existe uma página em branco - explicou Ciborgue, da melhor maneira que conseguiu.

Mutano coçou a cabeça, confuso.

— E por quê? Que vilão está por trás disso?

— Nenhum - a fala de Ciborgue confundiu ainda mais os antigos Titãs, que esperavam impacientemente que ele continuasse a explicar o que estava acontecendo. - O computador captou estranhas interferências nas linhas temporais. Elas não estão apenas instáveis: estão se desfazendo. O tempo está mexendo com o planeta, fazendo ele desaparecer aos poucos. Me arrisco a dizer que isso não está acontecendo só aqui, mas em todo o universo.

Asa Noturna assentiu devagar, finalmente entendendo.

— É a Estelar, não é? A volta dela para o passado afetou o futuro. Por isso o tempo está confuso. Ele está se desmanchando para consertar a realidade, que não é mais essa que estamos vivendo.

Ciborgue confirmou, mexendo novamente no computador até que um cronômetro aparecesse na tela, marcando 19 horas e 43 minutos.

— Esse é o tempo que temos até que o vazio atinja Jump City. E agora a notícia ruim…

— Cara, aquela era a notícia boa? - Mutano abriu a boca em choque. Todos o ignoraram.

— Fala, Ciborgue - foi Ravena quem se pronunciou, querendo que ele acabasse com a tensão antes que as vidraças da Torre explodissem por causa de suas emoções alvoroçadas.

Ele suspirou, virando-se para encarar sua antiga equipe.

— Não tem nada que possamos fazer para impedir que a nossa realidade desapareça.    


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Notas finais do capítulo

Se quiser me dar sua opinião, eu ficaria muito feliz :)



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