Outro ano na escola, as mesmas pessoas, os mesmos professores, as mesmas redações sobre como foram as férias, as mesmas comidas nos mesmos dias, os mesmos grupinhos, o mesmo de sempre.

Acordei, fiquei alguns segundos olhando para o teto cor de amarelo queimado. Me sento na cama e olho para a minha janela levemente aberta, me levanto e vou até ela, olho para a rua, para a árvore no jardim da casa em frente à minha.

— Charles. — Ouço minha mãe me chamando. Fecho a janela, desço as escadas e ela está fazendo panquecas para mim e para meu irmão mais novo. — Já tomou banho? Daqui a pouco o ônibus escolar vai chegar.

— Eu não ligo de ir de bicicleta, pelo menos posso ficar um tempo sozinho. — Falo enquanto vou até a geladeira e pego um pouco de água. — Cadê o James?

— Ele teve que ir embora mais cedo para o consultório. — Ela responde enquanto coloca algumas panquecas para meu irmão.

— Tudo bem, eu vou tomar banho. Tchau. — Me despeço, mas ela vem até mim e me abraça.

— Calma, vai ficar tudo bem tá bom? Qualquer dia desses a gente pode ir ao cinema, só nós três.

— Você promete?     

— Eu prometo. — Ela me abraça mais forte e beija a minha testa. — Saiba que eu amo vocês demais e nada, nem ninguém, vai mudar isso.

— Eu também amo demais a senhora. — Subo as escadas para o banheiro e ouço o ônibus escolar buzinando lá fora, logo depois a porta da frente se abrindo e fechando rapidamente.

Entro no banheiro do meu quarto, coloco uma música para tocar enquanto faço minha higiene. Depois de uns dez minutos, saio do banheiro, visto uma calça jeans rasgada nos 2 joelhos, um all star preto e uma blusa preta escrito “don’t talk to me”.

Vou até a cozinha, como a panqueca que sobrou para mim, bebo o suco de laranja que minha mãe preparou. Saio de casa, pego minha bicicleta e vou pedalando até a escola. No caminho vou pensando sobre tudo o que aconteceu nos anos passados. O acidente, a mudança, as crises, os remédios, os encontros. Uma lágrima escorre do meu olho e limpo-a rapidamente.

Chego à escola, as mesmas pessoas colocando os mesmos carros nas mesmas vagas, os mesmos grupos conversando juntos. Coloco a minha bicicleta no lugar que ela deve ficar, entro na escola e vou até o meu armário. Talvez lá eu encontre a Martha ou o Cesar para conversar, mas não é isso o que acontece.

Do lado do meu armário há um garoto, ele está vestido uma calça azul, uma roupa branca de botões e um blazer xadrez vermelho, está usando coturnos e seu cabelo é preto com alguns tons de azul. Será se é um garoto novo?

Vou até o meu armário, não quero conversar com ele, apenas pegar as coisas no meu armário e só. Porém, o mundo me odeia.

— Com licença. — O garoto começa. — Pode me dizer onde é a sala 1303, por favor?

— Final do corredor, sobe as escadas, vira à direita, terceira porta. — Respondo sem olhar para ele enquanto pego o livro de história que vou usar logo.

— Obrigado. — Ele retruca e sai andando. Pelo menos foi bem rápido. Fecho meu armário e vou até a sala de aula.

Na sala, eu encontro com Martha e Cesar, eles estão rindo e com as mãos dadas, ainda não consigo acreditar que eles foram brincar de ter um romance de verão e nunca mais pararam.

— Vocês poderiam ter um pouco mais de respeito com a minha pessoa? — Falo enquanto me sento na carteira e coloco meus livros em cima dela.

— Ata. — Retruca Martha com deboche. — Então... Você e o James brigaram hoje de novo?

— Não. — Suspiro. — Ele foi pro consultório dele mais cedo, então foi bem de boa.

— Quando que você vai começar a tratar o James bem? O que ele te fez pra merecer esse ódio gratuito? — Cesar me questiona.

Me fecho e não respondo, vejo ele abrir a boca para falar alguma coisa, mas na hora o Professor Hendricks chega na sala.

— Bom dia classe, na aula de hoje iremos falar sobre mitologia grega, abram seus livros na página 57.

A aula de história foi bem dinâmica, mitologia grega é uma matéria que realmente me fascina, e o professor Hendricks também é ótimo ensinando esse assunto, além de ser um dos melhores professores de toda Amityville.

A aula de história acaba e vamos até o ginásio, onde acontece a nossa aula de educação física. Primeiro temos que correr algumas vezes ao redor da quadra, depois fazer algumas flexões e por último um esporte, provavelmente vôlei.

— Ei Charles. — Martha me chama e eu fico atento. — Você soube o que aconteceu com as irmãs Jensen?

— Não. O que aconteceu?

— As duas e os pais delas foram fazer uma viagem durante o Natal, estava nevando muito, veio um caminhão e bateu no carro. As duas ficaram bem, mas os pais delas morreram na hora com o impacto. — Explica Cesar.

— Nossa. — Fico chocado. — Elas estão morando com quem agora?

— Com a tia delas. — Cesar responde.

— A louca dos gatos?

— Ela mesma. — Martha retruca.

Como esperado, foi vôlei. Eu, Martha e Cesar sempre ficamos no mesmo time, somos um trio bem unido, tipo Harry, Rony e Hermione. Em que eu sou o Harry porque o Rony e a Hermione namoram, sofro demais.

Depois de algumas aulas, temos o intervalo e vamos para o refeitório. Nós três nos sentamos na nossa mesa de costume. Avisto o garoto novato que eu “conheci” no início do dia, ele está procurando um lugar para se sentar, mas não encontra nenhum, sinto vontade de chamá-lo, mas a vergonha fala mais alto então eu deixo quieto. Até que vejo Cesar se levantar e balançar o braço chamando alguém, o garoto, fico sem entender o que está acontecendo.

— Mark, esse aqui é o Charles e essa é a Martha. — Cesar nos apresenta ao garoto novo.

— Olá Charles e Martha, você não é o garoto de hoje mais cedo que me falou onde era a minha sala? — Ele pergunta a mim.

— Sim, era eu. — Falo sem fazer contato visual com ele. — Como vocês dois se conhecem? — Pergunto para Cesar.

— Ele é o filho da namorada do meu tio.

— Por que não nos falou dele antes? — Martha questiona.

— Eu esqueci hehe. — Cesar responde e dá uma risadinha.

Nós quatro começamos a conversar, agora não éramos mais um trio, seríamos um quarteto, o quarteto fantástico, em que eu seria ou o tocha humana ou o coisa, muito provavelmente eu seria o coisa. Depois de mais aulas, vou embora da escola e chego em casa, sei que James vai estar lá, então me preparo para entrar e ir direto para o meu quarto. Passo pela porta bem rápido, porém a minha mãe é muito mais rápida do que eu.

— Aonde você pensa que vai mocinho? — Ela me segura pelo ombro e me questiona.

— Para o meu quarto? — Falo em dúvida.

— Nananinanão, você vai ao cinema comigo e com o seu irmão. A gente vai assistir Vidro, a continuação daquele filme que a gente gostou muito do cara que tem várias personalidades. Vai trocar de roupa e vamos logo.

Eu me arrumo bem rápido e logo vamos ao cinema. O filme foi incrível e eu gostei bastante, saímos do cinema e voltamos à casa, no caminho falamos sobre o filme e sobre outras coisas. Quando a gente passa por uma casa e tem três viaturas da polícia e um pessoal na calçada.

— Charles, aqui não é a casa daquela mulher que tem um monte de gatos?

— Sim, ela é a tia de duas amigas minhas que são irmãs. Natal passado elas sofreram um acidente e os pais delas morreram, as duas estavam morando com a tia. — Respondo olhando pela janela procurando entender o que aconteceu.

— O que será que aconteceu com elas? — Meu irmão pergunta do banco de trás, ninguém responde.

No dia seguinte, na escola, todo mundo já sabia do ocorrido. Houve boatos de que a tia das meninas maltratava elas e que o filho da mulher assediava ambas. Naquela noite, os quatro foram achados mortos pela casa, os vizinhos ouviram gritos e tiros e chamaram a polícia. Ainda não se sabe nada sobre quem possa ter feito aquilo, mas muitos estão comparando com um filme de terror de anos atrás, muito estranho e misterioso.