Aurora Borealis escrita por Kyra_Spring


Capítulo 4
Capítulo 3: Melhores Inimigos




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-Meu nome? Meu nome é Dean Hook.

Assim que Bella ouviu aquele nome, sentiu seu estômago despencar, mas lutou com todas as forças para não se alterar. Se as previsões de Edward estivessem certas, ela pensou, ela ainda seria, aos olhos dele, uma inocente garota humana que não fazia idéia de quem - ou o que - o namorado fosse.

-Bem, então... te vejo na escola? - perguntou ela, para não deixar que o silêncio a incriminasse. Dean apenas sorriu e disse:

-Sim - ele a analisava de uma maneira desconfortável - Espero que nos demos bem.

Mas Bella não prestava mais atenção. Ela percebeu, apavorada, que a situação acabava de ficar ainda pior - Edward era muito pontual, e naquele momento entrava calmamente pela porta da frente do mercado. Ela prendeu a respiração, enquanto ele se aproximava.

-Olá, Bella - ele a abraçou cuidadosamente - Aqui estou, como prometido. Mas parece que você já terminou as suas compras, então não devo ser de muita utilidade.

-Quanta coincidência, Edward - a voz de Dean, apesar de se manter calma e gentil, agora tinha uma nota quase imperceptível de escárnio - Já faz muito tempo, não é?

-Olá, Dean - Bella observou os olhos de Edward, que se tornaram totalmente negros - Realmente, faz muito tempo.

-Vocês se conhecem? - perguntou ela, tentando soar o mais inocente possível. Por trás da máscara de cortesia deles, ela era capaz de sentir a tensão e a raiva entre os dois.

-Na verdade sim, Bella - Dean respondeu - Edward e eu somos velhos amigos, por assim dizer. Mas é muito interessante ver que você se ajeitou muito bem, Eddie.

-É, você tem razão - Edward não se alterou - Realmente, estou muito bem. A cidade nos recebeu bem, tenho uma namorada maravilhosa... - ele a encarou, com um olhar cheio de significado - Bem, e você, como está?

-Também estou me virando - respondeu o outro - Bem, se o belo casal me dá licença, preciso ir. E foi muito bom encontrá-lo aqui, Edward. Prometo que vamos manter contato.

-É com isso que estou contando - concordou o primeiro, com um estranho sorriso - Até mais, Dean.

Bella fez questão de pagar suas compras o mais rápido que pudesse. Edward não disse nada depois que Dean foi embora, mas permaneceu bem atrás dela, abraçando-a pela cintura. Apesar de a expressão facial dele permanecer calma e serena, os punhos estavam cerrados. Os dois saíram até o estacionamento, e ela fez menção de ir para a sua caminhonete, mas ele a segurou pelo pulso, dizendo:

-Vamos para o meu carro - a voz dele estava rouca, sussurrante - Precisamos conversar.

Ela obedeceu, e logo eles estavam na estrada, com ele pisando o mais fundo que podia. Ela o observava discretamente. Os músculos do rosto estavam endurecidos, os olhos estavam escuros e estreitos, e os ossos da mão esquerda pareciam querer arrebentar a pele, tamanha era a força com que ela estava fechada. A expressão facial era de puro ódio, e ele parecia usar todo o seu autocontrole para não arrebentar o volante.

Então, depois de rodarem por alguns minutos em altíssima velocidade, ele parou no acostamento da estrada. Abaixou a testa sobre o volante, a respiração curta e semelhante ao rosnado de um animal furioso. Até que, por fim, disse:

-Pelo amor de Deus, Bella - a voz dele permanecia um sussurro - Você se lembra daquela noite em Port Angeles, em que aqueles caras estavam atrás de você? Então - respirou fundo - Me ajude a me acalmar, como daquela vez, ou vou voltar até lá agora mesmo e arrancar fora os olhos daquele maldito! Diga qualquer coisa, qualquer bobagem... mas me distraia.

Edward percebeu o quanto suas palavras assustaram Bella. Não era para menos: ela nunca o viu tão furioso quanto daquela vez. Mas lutar contra toda aquela carga de raiva era um desafio e tanto. Enquanto estavam no mercado, ele lutou para levar adiante a farsa que Bella conseguira criar (talvez por acaso, talvez por pura genialidade, isso ele não sabia e nem procuraria saber), mas precisou recorrer até às últimas reservas de autocontrole. O instinto era mais forte. A provocação que ele e Simon fizeram no dia anterior ainda estava ardendo em sua mente como uma ferida inflamada.

-Minha mãe está me pedindo todos os dias para visitá-la - ela disse - Você sabe, acho que ela ainda vê como rejeição essa história de eu ter preferido ficar em Forks ao invés de ir para a Flórida. Acho que ela pensa que você me roubou dela, ou coisa assim.

-Sua mãe não parece fazer o tipo ciumento, Bella - disse ele, a cabeça ainda abaixada, os olhos ainda fechados, a voz baixa - Garanto que ela não se importa em dividir você comigo.

-Ah, você não a conhece - ela forçou uma risadinha - Na maior parte do tempo é adorável, mas ela sabe como tornar a vida de alguém um inferno, se quiser. Você precisava ver o que ela fazia com os ex-namorados que a magoavam... Ela é o tipo de mulher de quem jamais se deve ser inimigo...

-Parece que eu dei sorte de ver o lado adorável dela, então - a voz dele estava um pouco menos embargada - É o que Carlisle diz: as mulheres são cruéis, mas quem consegue viver longe delas?

Ela riu novamente. Edward levantou a cabeça: os olhos ainda estavam preocupantemente escuros, e a expressão facial continuava tensa e muito carregada. Bella estava com a cabeça cheia de perguntas, mas naquela hora elas não pareciam prudentes. Fez menção de tocá-lo, mas mudou de idéia no meio do caminho. Talvez, pensou, fosse melhor deixá-lo em silêncio.

-Sinto muito, Bella - disse ele, de repente, fazendo-a encará-lo, surpresa - Não queria que me visse desse jeito outra vez. Mas... droga, dessa vez eu fiquei muito perto de perder o controle! Ele sabia que você estaria lá - o olhar dele faiscava - E, mesmo se não soubesse, iria forçar um encontro "casual" em outro lugar.

Ela estremeceu. Isso parecia irritantemente óbvio. Lutando consigo mesma para não perguntar nada, manteve-se em silêncio. Mas não foi necessário perguntar nada. Ele mesmo já respondia:

-Dean está querendo briga - ele parecia que ia explodir a qualquer momento - Fui procurá-lo ontem à noite e...

-Você o quê? - ela o interrompeu, e ele estreitou novamente os olhos.

-Eu não fui procurá-lo no sentido literal da palavra. Não sou tão idiota assim - Edward explicou, irritado - Na verdade, tentei rastrear algum pensamento dele. Mas parece que ele e o irmãozinho Simon conseguiram me interceptar antes.

-Como? - ela piscou, confusa.

-Simon pode fazer isso. Bloquear poderes, desviar pensamentos, essas coisas. Sempre o achei meio estranho. O problema é que ele faz tudo o que Dean manda.

-Você falou com alguém da sua família?

-Só com Alice. E nem contei essa história para ela, ainda. Ele disse que não posso contar nem para a minha família e nem para você, e que vai marcar hora e lugar para nos encontrarmos.

-Sei que não é hora para perguntar isso, mas... você já tem algum plano?

-Na verdade, vou tentar ganhar tempo, por enquanto - deu um longo suspiro cansado, que deu lugar a um sorrisinho fraco - Aliás, nesse ponto eu devo agradecê-la, srta. Swan. Ele deve estar pensando que você não sabe de absolutamente nada a meu respeito, a essa hora. Parabéns, isso vai ser de grande utilidade.

Os olhos dele iam clareando aos poucos. Agora, estavam castanhos. E a expressão do rosto também ia se suavizando, dando lugar a uma preocupação profunda. Ela perguntou, com um leve tom divertido na voz:

-Você se lembra da noite em Port Angeles? - ele rosnou, contrariado, mas ela logo emendou - Você me levou para jantar, e ficou me ouvindo falar aquele monte de besteiras...

-Ah, sim... eu me lembro das suas teorias a meu respeito - ele também riu - E me lembro que você é terrivelmente teimosa para comer, curiosa demais e mais inconsequente do que o que seria saudável.

-Eu lembro que você deve ter provocado um ataque cardíaco em pelo menos duas garçonetes, naquele restaurante - a risada se tornou mais leve, mas logo parou, e o tom de voz se tornou diferente, meio saudoso, meio agradecido - Naquela noite, eu realmente te conheci.

-E mesmo assim continuou ao meu lado - ele continuava achando aquilo um absurdo, mas se perguntava o que teria acontecido se ela não estivesse lá, com ele, naquela hora - Ainda me pergunto o que exatamente foi aquela noite.

Os olhos dele já estavam bem claros, cor de âmbar. Ela se permitiu respirar aliviada. E, com um pouco de timidez, aproximou a sua mão do punho dele, ainda fechado, e o tocou. Ele não se mexeu, apenas fechou os olhos, perdido nos próprios pensamentos.

-O que seria de mim sem você, Isabella Swan? - disse ele, baixinho, esperando que ela não ouvisse. Olhou de relance para ela, e aparentemente ela não tinha ouvido. Depois, mais alto - Bem, é melhor irmos logo. Preciso encarar o pessoal lá de casa, e pensar em como discutir esse assunto com eles.

Ela concordou, e logo eles se dirigiam (numa velocidade até baixa para os padrões de Edward, acostumado a desafiar as leis da física no seu carro) para a casa dela, e a ajudou com as sacolas de compras. A despedida foi um momento tenso. Eles ficaram se encarando por algum tempo, sem dizer nada. Aliás, naqueles dias, o silêncio estava se tornando uma constante entre eles, mas não por falta do que dizer: por um lado, Edward queria desabafar e compartilhar com Bella tudo o que estava sentindo, mas sentia que não tinha o direito de perturbá-la ou assustá-la com os seus problemas. Por outro, Bella queria dizer que estava tudo bem, que iria dar tudo certo, mas nem mesmo ela acreditava nisso.

-Não sei se vou voltar hoje à noite - disse ele - Se eu realmente for seguir o conselho de Alice e comunicarmos à minha família, você estará presente. Tome cuidado, está bem? - ele tocou o rosto dela, passando os dedos pelas mechas. O perfume e o calor não mudaram, mas agora traziam consigo alguma coisa angustiante, que ele não sabia definir.

-Eu vou tomar - disse ela, tentando passar um pouco de confiança na voz trêmula - O mesmo para você, está bem?

Ele tocou os seus lábios gelados nos dela, e logo depois ele deu as costas em direção ao próprio carro, deixando-a lá, parada na varanda, observando... e pensando.

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-O que é que você tem na cabeça, hein?

-Eu não quero brigar, Alice.

-Devia ter voltado imediatamente e feito o que eu te disse!

-Você está transformando isso numa discussão.

-É claro que estou transformando isso numa discussão! Aliás, se eu tivesse feito isso desde o começo, provavelmente a essa hora todos já estariam de sobreaviso.

-E no que diabos isso iria adiantar? Além do mais, você não tem o direito de me culpar por nada. Não é possível que não haja nada entre as suas visões a esse respeito!

-O que custava você ter voltado à noite para falar conosco?

Mais tarde, Alice e Edward discutiam na sala da casa deles. Era uma discussão discreta: apesar do tom áspero e das expressões endurecidas, as vozes estavam baixas e controladas, e aquilo poderia muito bem se passar por uma conversa casual.

-Quando é que você vai entender que estamos juntos nisso, todos nós? - disse ela - E desde quando você se rende ao que um imbecil como o Hook diz?

-Passei a noite fora para pensar, está bem? - replicou ele - Aparentemente, ele está tentando manter isso apenas entre nós dois. Dean pode não valer absolutamente nada, mas também não é burro. Ele sabe o que iria acontecer se as famílias dele e minha se envolvessem.

-Não é o que está parecendo - ela insistiu - E é melhor levarmos em consideração esse talento do nosso amiguinho Simon.

-Não quero que isso se torne uma batalha, droga! - então, a voz dele subiu uma oitava - Quanto menos pessoas se envolverem, menos pessoas sairão machucadas!

-Para que você se machuque sozinho? Fora de cogitação! - uma sombra fugaz passou pelos olhos dela por um instante - Você não é indestrutível, e Dean sabe disso melhor do que ninguém.

-Eu me encontrei com ele, hoje - disse ele, de repente, fazendo-a arregalar os olhos - No mercado. Acho que ele esperava que Bella estivesse desacompanhada. Consegui manter o controle, mas duvido que conseguiria outra vez. E algo me diz que ele vai tentar se aproximar dela de novo.

-Ela já sabe sobre ele, não sabe? - perguntou ela, e ele respondeu com um aceno de cabeça - E como ela reagiu ao vê-lo?

-Bem, ela fingiu que não sabia de nada - foi a resposta dele - Não sei se ele acreditou, mas pelo menos irá servir para deixá-lo na dúvida, por enquanto. Mas não sei por quanto tempo posso fazer essa guerra fria durar.

-As aulas irão recomeçar na semana que vem - observou Alice - Há uma boa chance de eles começarem a frequentá-las também. Tanto Dean quanto Simon e Emma parecem jovens o bastante para ir ao colégio, e passariam mais despercebidos do que nós.

-Eu não suportaria ficar muito tempo numa sala fechada com ele - os olhos dele voltaram a escurecer, por uma fração de segundo - Isso seria um perigo para nós e para as pessoas de lá.

-Principalmente para as pessoas de lá - a outra enfatizou - Não temos como resolver isso sozinhos. E eu sei que, se tentarmos, coisas terríveis irão acontecer.

-Vai me contar o que viu ou não? - ele foi incisivo, mas ela se recusou - Isso não vai nos levar a lugar nenhum! Eu disse o que você queria, não disse?

-Como eu já disse antes, as minhas visões estão confusas demais, e tenho quase cem por cento de certeza que Simon está fazendo isso - rebateu ela - Por isso, nem vou levá-las a sério.

-Olha, essa não é a hora para discutirmos - disse Edward, por fim - É isso... vamos ter que convocar um conselho de família. Mas ainda não - ele fez questão de acrescentar rapidamente - Preciso, antes, avaliar a situação. Vamos esperar as aulas recomeçarem.

-Será que eu devo lembrá-lo que só nós dois vamos voltar esse ano? - ela acrescentou - E eu não sou o Emmett ou o Jasper, se você fizer alguma bobagem, com certeza não terei como impedir.

-É impressionante a fé que você coloca em mim - ele deu um sorriso sarcástico - Mas acho que tenho esse direito. Se eles realmente tiverem a petulância de aparecer no colégio, aí vou fazer o que você disser. Mas até lá, por favor, não diga nada.

-Tenho certeza que vou me arrepender por isso, mas... está bem - ela concordou, relutante - Mas é melhor que você não faça nenhuma bobagem.

-Pode ficar tranquila, eu não vou fazer nada - ele deu de ombros - Até porque, agora que eles sabem da Bella, não seria sobre mim que recairia uma represália.

Alice o analisou. Sim, isso esclarecia tudo. Ele queria manter Bella e a família protegidos. Mas era muito egoísmo dele pensar que não era exatamente nisso em que ela também estava pensando. De qualquer modo, ela o compreendia, e entendia porque Edward estava tentando adiar ao máximo o que seria uma briga inevitável. Ela tinha seus motivos para não revelar as visões que vinha tendo. Elas realmente eram confusas, quase incompreensíveis, mas havia coisas muito claras entre elas. E eram essas coisas que ela estava tentando desesperadamente evitar.

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O despertador naquela manhã soava estranhamente insuportável. Bella abriu os olhos e impediu a si mesma de arremessar contra a parede o rádio-relógio. Olhou pela janela, e viu que - "por que eu ainda torço pelo sol?" - chovia. Era o primeiro dia de aula do seu último ano.

Levantou-se e se arrumou com esmero, usando um suéter verde coberto por um casaco preto. O cabelo, por outro lado, estava particularmente desobediente, obrigando-a a prendê-lo numa trança firme. Sem fome, rumou direto para a porta da varanda, e de lá para a caminhonete. Estava frio, como no dia em que chegara a Forks, e nem parecia que o verão havia acabado de terminar.

Ainda se lembrava do trajeto, e logo parou a sua caminhonete em frente à série de prédios idênticos de tijolos vermelhos. O motor estava mais barulhento que o normal, coisa que ela só percebeu assim que o desligou. Hesitou ainda um pouco, antes de descer, procurando pelos vidros um Volvo prateado estacionado em algum lugar. Não o encontrou, mas viu um brilhante Chevrolet Camaro vermelho estacionado um pouco à frente, e que com certeza nunca tinha visto por ali. Abriu a porta e desceu devagar, desviando seu caminho um pouco para vê-lo.

-Exibidos... - ouviu uma voz familiar às suas costas - Eu venho pra escola naquela banheira e alguém me aparece com um Camaro! - ela se virou, e reconheceu Mike Newton, um rapaz louro de expressão amistosa e animada, sorrindo para ela.

-De quem será essa maravilha? - ela perguntou, mais para si mesma, ao ver a pintura lustrosa e vermelha - Garanto que esse polimento não vai sobreviver muito tempo por aqui, com essa chuva.

-Não diga isso, por favor, eu passei três horas e meia polindo! - outra voz, porém, a fez estremecer por dentro. Era ele, novamente. Dean Hook. E os olhos continuavam negros como piche - Olá, Bella!

-Vocês se conhecem? - os olhos de Mike se estreitaram um pouco. Será que ele ainda não havia superado totalmente aquilo?

-Nós nos conhecemos no mercado - ela esclareceu depressa, tentando manter a expressão facial inalterada - Dean, o seu carro é lindo! Não vejo um desses desde quando morava em Phoenix!

-Você entende de carros? - o sorriso dele era belíssimo, e naquele momento se abria plenamente.

-Não muito - respondeu ela, mantendo os olhos no Camaro para não encarar Dean e se trair - É que, quando eu estava em Phoenix, um dos ex-namorados da minha mãe tinha um desses.

-Não vai nos apresentar à sua nova amiga, Dean? - então, apareceu uma garota, ao lado dele. Ela era, também, inacreditavelmente bonita: os cabelos também negros, lisos e cortados na altura do queixo, emolduravam um rosto estreito, e ela tinha a elegância e beleza de uma modelo - menos do que Rosalie, apesar de tudo. Ao lado dela, estava um outro garoto, mais baixo, com cabelos castanho-escuros longos e presos num rabo-de-cavalo. Ele, ao contrário dos outros, tinha os olhos bem mais claros - meio castanhos, meio acinzentados. Um tom diferente do que ela esperava, com certeza.

-Bem, Bella, estes são Emma e Simon, meus irmãos - os dois fizeram um leve gesto de cabeça, cumprimentando-a - Simon, Emma, esta é Bella Swan, a garota de quem eu falei.

-Sinto muito por não poder ficar e conversar mais, mas preciso muito falar com o diretor a respeito dos horários deste ano - Bella sentiu que não conseguiria ficar impassível por muito mais tempo, então limitou-se a sorrir e a se despedir - Espero que nos encontremos outras vezes - "não mesmo!", pensou, enquanto dava as costas e saía.

Ela não olhou para trás um único instante, mas tentou não ir rápido demais. Mike, que já a conhecia há mais tempo, estranhou o seu comportamento, e assim que passaram em frente à diretoria, ele perguntou inocentemente:

-Você não ia falar com o diretor?

-O quê? - ela se virou, confusa, para só então se lembrar da mentira que inventara - Ah, droga, isso! Me espere na sala, eu preciso mesmo ir até lá. Obrigada por me lembrar.

Ela se virou lentamente, para se certificar de que Mike já havia sumido de vista, e então correu para o banheiro, trancando-se em um dos boxes. Estava quase hiperventilando: agora, com Dean na escola todos os dias, seria praticamente impossível manter o disfarce. E, o que era pior, o clima entre ele e Edward cedo ou tarde se tornaria insustentável. Ela já podia antever um desastre dentro dos prédios de tijolos vermelhos da Forks High School.

Alem disso, ainda pensou, os Hook não eram como os Cullen. Eles nunca hesitariam em usar um dos alunos como almoço. E a cidade era pequena, logo os desaparecimentos seriam notados. Além disso, não tinha como prever o que viria depois. Na verdade, não fazia idéia exatamente do que esperar deles, só sabia que sempre que estava com Dean, sentia-se ameaçada, e que esse sentimento se estendia aos irmãos dele. E seus olhos não a deixavam mentir: apesar dos rostos amistosos, os olhos estavam sempre negros, saturados de alguma coisa maligna, e isso era algo que eles não poderiam esconder.

"Não posso passar o dia todo escondida aqui", ela se decidiu, por fim, e com as pernas pesadas como se fossem feitas de chumbo, arrastou-se até a secretaria, onde pegou seus horários. A primeira aula era Inglês - ela agradeceu aos céus por não ter que se preocupar com uma aula maldita de trigonometria logo no começo do ano, ainda mais considerando as atuais circunstâncias.

Na carteira da frente, para seu supremo alívio, Edward guardava um lugar ao seu lado. Ela não quis procurar pela sala para ver se Dean ou algum dos outros estava lá, porque sentia que seu poder de interpretação já havia sido todo gasto naquele começo de aula.

-Não sabe o quanto estou feliz de te ver aqui - Bella sussurrou, assim que se sentou ao lado dele. Ele usava um casaco escuro sobre uma camisa vermelha, e quando ela se sentou, ele deu um beijo rápido na bochecha dela - Quase estraguei tudo!

-Acalme-se, por favor - disse ele, rapidamente, virando-se; os olhos dele estavam mais escuros que o habitual, e a expressão do rosto carregada e endurecida - Não se preocupe, você está agindo bem.

-Algum deles está aqui? - ela perguntou - Eu os encontrei na entrada, mas acho que agora não seria capaz de reconhecer nem o meu próprio rosto no espelho.

-Não, por sorte não - respondeu ele, a respiração alta e longa - Mas não vamos conseguir fugir em Trigonometria. Andei checando os horários, nossas aulas batem e não temos como mudá-las.

-Para você é fácil, é só não vir às aulas - replicou ela - Mas e quanto a mim? É sério, eu só o vi duas vezes e nas duas ele estava com aquele olhar assassino. A irmã dele também parece ser uma louca completa.

-Eu não vou simplesmente fugir da minha vida por causa dele - e então, ela se surpreendeu ao ver um sorriso atrevido brotar dos lábios de Edward - Se ele quer fazer esse joguinho, ótimo, esse é um jogo para dois. E pode ficar tranquila, eu serei um menino muito bem-comportado daqui para frente.

-Não é do seu comportamento que eu tenho medo - ela ainda insistiu - É do deles. Que garantias nós temos de que eles não vão matar ninguém daqui da escola? Ou da cidade?

-É melhor que eles nem pensem nisso - o punho dele se fechou com força, e a voz abaixou duas oitavas, tornando-se grave e ameaçadora.

Os dois ficaram em silêncio, tentando se concentrar na explicação do professor sobre os poemas de Byron, mas ambos com a mente em outro planeta. Edward tentou sondar a mente de Bella, mesmo sabendo que, como todas as outras vezes, não conseguiria captar absolutamente nada. Ela era diferente. Ela era intrigante. Ela era absurdamente apaixonante.

-Não gosto de Byron - ele disse, para quebrar o silêncio - Ele é exagerado demais para o meu gosto.

-Eu gosto - ela deu um sorrisinho - Pelo menos ele mostra que é sensível.

-Então para alguém mostrar que é sensível, essa pessoa precisa levar uma vida desregrada e autodestrutiva e morrer de tuberculose antes dos vinte e cinco anos? - ele abriu um sorriso de puro sarcasmo - Não, obrigado. Prefiro continuar sendo insensível.

Cedo demais, o período duplo de Inglês deu lugar a outro, de Trigonometria. Eles foram os primeiros a entrar, e pegaram logo as carteiras do fundo. Não demorou muito para que Dean e Emma entrassem e ocupassem duas carteiras da fileira da frente. Logo, ela percebeu que os dois eram diferentes dos Cullen até no comportamento: enquanto Edward e os irmãos preferiam se manter afastados dos demais, eles distribuíam cumprimentos e sorrisos para todos.

-Vai ser um dia muito longo... - resmungou Edward, quase sussurrando - Consegui fazer nossos horários baterem em todos os períodos para que você não me deixe sozinho com eles um minuto sequer. É seu dever impedir que eu faça uma bobagem, está bem?

-Positivo, capitão - disse ela, tentando um gracejo para descontraí-lo, o que não funcionou - É melhor que estejamos juntos, antes que eu diga alguma bobagem e estrague tudo.

-Você não vai - disse ele, simplesmente - Confio em você.

Edward passou os dois períodos esforçando-se para se comportar como a pessoa mais normal do mundo, explicando equações trigonométricas a Bella, e em nenhum momento dirigiu seus olhos para a direção onde os irmãos Hook estavam sentados. Em vez disso, espionava a mente daqueles que estavam sentados por perto, sem contudo se aproximar dos dois. E descobriu coisas interessantes.

Bella lhe dissera, uma vez, que ele deslumbrava as pessoas, o que era injusto, e só agora Edward teve a chance de ver esse fenômeno de fora. Dean e Emma, com seu comportamento amistoso, conseguiram conquistar a simpatia de toda a classe. E era inegável que ambos eram belos, e charmosos. Por um lado, isso era bom, porque desviava as atenções da escola sobre os Cullen, mas por outro tornava qualquer atitude mais difícil. Se a sala soubesse que ele e Dean se detestavam profundamente, assumiria o partido do novato, o que faria todas as atenções se recaírem sobre Edward. "Pilantra...", ele pensou, enquanto via a lista mental de elogios que as garotas da sala desfiavam a respeito dele. Isso, ele descobriu com uma certa surpresa, estava mexendo até com o seu amor-próprio, porque esses elogios eram destinados a ele mesmo, até bem pouco tempo atrás.

"Não seja estúpido, Edward", ele dizia para si mesmo, repetindo várias vezes essa mesma frase, como que para tentar se convencer. Assim foi até a hora do almoço, e durante o intervalo. Ele tentava aparentar o máximo de normalidade, mas no fundo sabia que aquilo era apenas uma fachada para algo mais grave do que podia imaginar.

A aula depois do almoço era História. Mas, assim que entrou, não reparou nos colegas ou na nova professora. A única coisa que percebeu foi um bilhete cuidadosamente dobrado sobre a sua mesa. Abriu-o lentamente. Havia apenas uma frase, escrita em letra de fôrma: "Me encontre agora, no km 128 da estrada. Venha sozinho, e nem pense em avisar alguém. Dean."

-Professora, pode me dar licença? - ele foi obrigado a também se aproveitar do seu poder de deslumbramento - Preciso resolver alguns assuntos de família.

-É claro, sr. Cullen - ela concordou com um sorriso gentil. Enquanto ele se levantava, Bella perguntou:

-O que houve? - ele não podia responder, porque se respondesse com certeza ela iria querer ir também. Então, limitou-se a dizer:

-Fique pronta às seis e meia. Eu vou te buscar, está bem? - e beijou rapidamente os lábios dela, para depois sair com passos apressados.

Ele entrou no carro e, assim que não havia ninguém vendo, acelerou o mais que podia, parando apenas no quilômetro indicado por uma placa velha e desbotada. Não havia ninguém lá, mas havia a entrada de uma trilha para a floresta. "Nada criativo como sempre, Hook", praguejou mentalmente, enquanto se colocava a correr pela trilha afora.

Parou em uma clareira de solo irregular e pedregoso. Dean estava sentado num grande tronco caído, com um sorriso estranho de zombaria e triunfo.

-Olá, Eddie - disse ele, com deboche na voz - Você é mesmo muito pontual. E essa cidade é um lugar bem pitoresco... realmente, é a sua cara.

-Por que não pára com as gracinhas e diz logo o que quer? - Edward fechou um punho - Se quer briga, ótimo, estamos sozinhos e ninguém vai nos incomodar.

-E que graça isso teria? - replicou o outro, com um tom despreocupado - Não, agora eu não quero brigar, apesar de que seria muito divertido acabar com você hoje mesmo.

-Você quer experimentar? - a voz do primeiro parecia mais o rosnado de uma fera, enquanto ele erguia o punho. Seu ódio aumentou ainda mais quando Dean começou a rir, dizendo:

-Não seja imbecil, você sabe muito bem que não me venceria nunca - a respiração de Edward era alta e cortada, à medida que sua raiva crescia, e seus olhos estavam negros como piche - Tenho apenas um recadinho da minha família para a sua: é melhor que não interfiram dessa vez, ou todos irão pagar, principalmente aquela sua namorada, a Isabella. Por sinal, como você conseguiu esconder dela por tanto tempo o monstro que é? Ou melhor, como conseguiu ficar por tanto tempo sem jantá-la? Devo admitir, ela tem um perfume interessante, exótico. Fico imaginando como seria o gosto...

-Fale dela mais uma vez desse jeito, e vai ficar sem a sua língua - Edward praticamente se agarrava às árvores para não saltar sobre o outro naquela mesma hora - Ela não tem nada a ver com essa história, então deixe-a fora disso!

-Não me interrompa - a voz do outro ficou seca, áspera - É isso. Se vocês são aberrações e gostam de fazer de conta que ainda são humanos, ótimo, mas nós vamos viver como devemos. E, independente do que o resto da sua família fizer, ainda temos contas a acertar com você e a sua irmãzinha Alice.

-Já que você gosta tanto de avisos, então leve um para a sua mamãezinha sádica e louca - Edward, então, deu um passo à frente, encarando Dean diretamente - Essas pessoas nos acolheram, e se ferirem qualquer um deles, qualquer um, - ele enfatizou a palavra - vocês todos vão ver quem realmente somos. E, se tocar na minha namorada, seu desgraçado, eu o faço em pedaços.

-Então você ficou corajoso de repente? - novamente, Dean riu debochado - Pode deixar, eu avisarei. Mas você sabe que não pode impedir, e sabe por que? Porque você é fraco e estúpido. E escreva as minhas palavras: eu vou acabar com você, e com tudo o que você tem - e, então, deu as costas para ir embora.

-NÃO SE ATREVA A ME DEIXAR AQUI FALANDO SOZINHO! - Edward berrou, e correu para bloquear a passagem dele - EU AINDA NÃO TERMINEI COM VOCÊ!

-Terminou sim, Cullen - Dean o empurrou, arremessando-o contra uma árvore no lado oposto da clareira - Mas eu acabei de começar com você - e, no instante seguinte, desapareceu por entre as árvores.

Por alguns segundos, Edward ficou sem reação. Mas, depois, ao tomar consciência do que havia acabado de acontecer, sentiu uma raiva incomensurável tomar conta de si. Ali, pelo menos, podia enlouquecer o quanto quisesse, sem ser incomodado. Começou a destruir cada árvore que via pela frente, até na clareira sobrarem apenas pedaços de galhos e troncos partidos. E não queria parar, porque em cada um deles via o rosto debochado de Dean, e esse sim ele desejava mais do que tudo estraçalhar. E fazia isso entre urros assustadores, como os de um animal acuado.

Mas então, de repente, parou, e percebeu o que estava fazendo. Era exatamente aquilo, ele estava agindo como um animal acuado. Ele não era um animal, era uma pessoa! Ainda havia humanidade nele, apesar de tudo. E era isso que o tornava diferente de Dean. Então, respirou fundo e, tirando os galhos presos às suas roupas, saiu pela trilha até a estrada.

Não havia mais o que fazer. O conselho da família Cullen seria convocado naquela noite.


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