A luta a ser travada escrita por MT


Capítulo 12
Capitulo 12- Punhos Pesados


Notas iniciais do capítulo

Que Deus ou deus permita que continue a nadar, amém!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/779000/chapter/12

Meu punho enterrou-se na bochecha do campeão nacional e um grito excitado da plateia acompanhou cada gota de sangue que foi cuspida. Senti a carne comprimindo sob os dedos e então o choque ao tocar os dentes, o golpe havia entrado completamente. A cabeça dele girou para a esquerda com o impacto e carmim voou de entre seus lábios, mas Marcus Feliciano não caiu, sequer deu um passo cambaleante para firmar-se. Aquilo me fez hesitar, parar e observar, enquanto palmas e alguns gritos terminavam de esmaecer para voltar outra hora. Pude ver a íris selvagem encarando-me de soslaio, o suor percorrendo-lhe a pele de cor cobre e o pescoço grosso tensionando e fazendo veias saltarem. Um tremor percorreu minhas panturrilhas e senti meu corpo se inclinar levemente na direção contrária ao homem a frente.

Então minha costela explodiu em dor e um soco atingiu meu maxilar mandado-me cambaleando para trás com sangue na boca. Ergui a visão até o agressor, o homem negro, alto e com músculos definidos que travava a pouco um combate contra Marcus Feliciano. Com um relance para sua face, deixei minha mente processar que ele fora rápido o bastante para se aproveitar do momento que levei hesitando diante o campeão para atacar com aquela combinação, que imagino ter sido, de chute no corpo e direto na cabeça. Me mantive firme, de pé com os braços em guarda, mas agora parecia que haviam quatro ao invés de dois oponentes, o campeão teria conseguido mais do que causar uma pequena desorientação e uns hematomas. Marcus Feliciano teria ao menos rachado e deslocado algum osso com uma investida.

O momento se estatizou com todos parados a poucos passos um dos outros, pés firmes sobre a grama e roupas tremulando ao passar do vento. Aquele que acabara de me acertar tinha o campeão na sua distância, mas se fizesse um ataque eu poderia investir contra ele com um golpe tão certeiro quanto o que acabara de desferir. Feliciano não moveu nada exceto a cabeça. O silêncio na arquibancada começava a ser preenchido por murmúrios de conversas, pequenas, rápidas e impossíveis de serem discernidas pelos ouvidos no campo. Mas só podiam ter uma única essência.

´´O que está acontecendo ali?``

Antes que o tom aumentasse a explosão, o ruído de osso sendo quebrado, ecoou varrendo as palavras como uma monstruosa ventania. Vi o enorme corpo do oponente do campeão ser arrancado do chão e lançando a uma distância de quase um metro, por um único soco. Seu nariz afundado para dentro e ao redor dele surgiu um lago de sangue. Sob os holofotes o homem alto, esguio e de músculos definidos pairava inerte, com exceção de alguns pequenos espasmos que logo também findaram. Um frio sem ligação com o ar correu os dedos pela minha espinha. Marcus Feliciano avançou em minha direção com as ataduras de linho branco sobre os punhos manchadas de vermelho, a face com marcas rubras e íris trajando um aspecto animalesco

Ele desferiu um direto quase instantaneamente após ficar próximo o bastante para acertar. Girei escapando da ivenstida, mas fora um movimento atrapalhado e quase sem velocidade suficiente que fez a dor dos golpes na costela e no estômago morderem como mastins do inferno. Minhas pernas acabaram em paralelo com os pés apontando para o campeão. Tão perto dele que poderia ser considerado suicídio. 

Vi seu corpo iniciar sua correção de direção, os músculos tensionando, a perna que ficava para trás movendo-se, o punho direito surgindo no meu campo de visão. Ergui a mão com os dedos cerrados formando um ângulo de noventa graus entre antebraço e braço pondo o quadril e o próprio membro para incrementar a força e velocidade do movimento. O upper chocou-se contra a guarda dura e firme de Feliciano que terminara de girar no momento exato em que eu lançava o ataque. Senti o osso tremer abaixo da pele e a mão perder parte da sensibilidade. Mas isso foi tudo, os punhos do campeão caíram como chuva e de algum modo esquivei com cada golpe triscando violentamente a guarda. Recuei, o sangue correndo mais uma vez intensamente e recheado de adrenalina, o coração batendo tão ferozmente que parecia capaz de saltar para fora, a pele sendo lambida pelo vento e sua saliva, o suor, deslizando sobre ela. Estava assustado e excitado como costumava ficar nos primeiros sparrings.

Mas o campeão não me perseguiu. Seus olhos estavam fincados em mim, frios e curiosamente claros. Foi então que as marcas grandes e vermelhas em seus braços me chamaram a atenção. Eram hematomas que causavam leves depressões na pele, rubras marcas na musculatura dura e inexorável de Feliciano. A luta contra o outro cara havia sido mais danosa do que poderia ter imaginado, provavelmente também levara golpes no corpo que afetaram suas pernas. Correr não era algo que pudesse fazer bem o bastante para apostar seu fôlego nisso agora. Podia vencer, pensei e dei um passo, mas as costela e o estômago gemeram lembrando-me de seus próprios danos. Se eu podia, aquele cara iria.

A tensão era temperada pelo ruído animado da plateia, eles precentiam sangue e isso os excitava. E o meu corpo começava a sincronizar com esta euforia. Um leve balançar do peso da perna esquerda para direita, então movimentos do punho dianteiro de cima a baixo, olhos atentos a todo o corpo do oponente, observando até as gotas de suor. Eu sentia os anos voltando com toda sua carga de treinos, lutas e aprendizados. Feliciano tinha socos assustadores, mas eram apenas dois punhos contra as dezenas que enfrentei. Uma risada breve escapou dos meus lábios quando notei que havia encontrado o que procurara desde o dia no qual a luta contra o campeão nacional dos pesos super-leves fora marcada.

Eu estava finalmente calmo.

Avancei. Feliciano pôs-se também em rota de colisão. O ar era todo eletricidade e aclamações cheias de tesão e expectativa. Podia sentir o corpo irrompendo em energia, tornando-se o trovão que eletrocutava a atmosfera. Então um, dois, três jabs explodiram contra a guarda do campeão assim que adentrou na minha distância de fogo. Movi-me em arco e continuei, recuando quando ele se aproximava, mantendo-o no meu alcance e pondo a mim mesmo fora do dele. Pés e mãos dançando como uma chuva de raios sobre o estádio. Cada golpe ecoando num som abafado, no ruído da expansão supersônica do ar.

Mas um jab acertou o vento e Marcus Feliciano sumiu de vista. Por baixo um vulto disparou como uma bala, um par de punhos branco manchados por carmim em peculiar evidência. Meu peito foi atingido, meus pés arrancados do chão, sangue jorrou para fora da minha boca. O campeão estava ali com a expressão fria e quente de um tigre caçando. As cores fugiam e então a sensação áspera e fresca de grama após uma estrondosa queda.

Aquelas mãos, as mãos do campeão, eram realmente pesadas. Aquelas sem dúvidas eram mãos dignas de terem minha última luta. Que bom, sinto que posso descansar agora, sem arrependimentos dessa vez. E isso é uma merda.

As cores voltaram, a arquibancada, as pessoas, Marcus Feliciano. Era uma visão de baixo para cima com algumas pontas verdes se interpondo entre a cena e a íris. Minha face estava colada ao chão úmido e um líquido quente inundava-me a boca com seu sabor metálico. Havia ruído de palmas e gritos eufóricos, também do sujeito na cabine do narrador, mas o significado das palavras me escapavam. Fechei os olhos e cuspi mais sangue. O cansaço, a fraqueza, clamavam para que minha  consciência mergulhasse no torpor do sono. E não conseguia pensar em nada, tudo fugira a cabeça, pelo qual negar este pedido.

A poucos metros dali o som de armas sendo engatilhadas trouxe-me de volta os sentidos.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

So tiny!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A luta a ser travada" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.