Uma Seleção com Rosie Ambers escrita por ANA


Capítulo 60
Capítulo 56




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Entrei em um dos salões do palácio da Noruécia. Esse país era uma união da Noruega e Suécia, unificadas entre os séculos XIX e XX, separadas pouco depois, e novamente unidas no século atual com um casamento real e alguns acordos políticos.

Apesar de algumas controvérsias, aquilo era interpretado como normal pela maioria dos habitantes. A monarquia parlamentar foi mantida, assim como os idiomas norueguês e sueco. A família real da Noruécia morava em Oslo, antiga capital da Noruega.

Aquele palácio me lembrava um pouco o de Illea, mas certos cômodos tinham um estilo mais rústico.

Suki foi a primeira que vi. Ela estava sentada próxima à janela e olhava para a linha do horizonte de uma campina.

As outras também estavam ali. Cada uma no seu canto, naquele silêncio de sempre que havia entre nós. A cada dia que passava, naquela viagem, era mais evidente o quão competitivo o ambiente estava ficando. Era como voltar ao início da Seleção.

Eu sentia que deveria estar preparada. Ficaria noiva, o que repercutiria uma péssima relação com Suki, e então seria um grande desafio restaurar a amizade com ela. Eu tentaria, mas não iria insistir se Suki realmente não quisesse mais me ver.

Eu queria sentar ao lado da asiática e puxar assunto, mas não nos falávamos desde nossa conversa naquele lago em Madrid. Apenas consegui chegar a um metro dela, ainda sem coragem de dizer algo.

“Que bom que estão todas aqui.” Franzi a testa e me virei. Osten fechou a porta atrás de si. ”Tenho algo importante para dizer que não pode ser mais adiado. Não mais.”

Seu olhar caiu sobre mim, e diferente dos sorrisos divertidos que muitas vezes me lançava, ele estava determinado. 

Sua mão passou por dentro do seu terno, e desse saiu o que minha mente tinha suposto. Não sabia descrever o que estava sentindo, se como um arrepio, ou como se todo o sangue tivesse simplesmente parado de circular.

Eu deveria tê-lo avisado antes que as coisas estavam ruins com Suki… Pelo menos quando me perguntou o que estava errado depois do passeio de canoa eu deveria ter dado o braço a torcer e dito o que estava me incomodando. Ele jamais poderia adivinhar que o gelo que tinha se tornado a minha convivência com ela.

Agora, Osten andava em minha direção. Tentei-o avisar com um movimento mínimo da cabeça.

Não! Não é a hora! 

Osten travou a caminhada e o sorriso.

Por favor, me desculpe. Não é que eu não queira!

Era o que eu queria dizer. Ele pareceu decepcionado ao me entender. Olhou para baixo por um momento. E suspirou.

“Me desculpe por isso, Rosie.”

Não acreditei quando Osten simplesmente terminou seu trajeto e se ajoelhou. Minha atenção foi diretamente para Suki, ao meu lado. Ela me encarou com os olhos vazios, e os meus arderam, mas dizer que sentia muito àquele ponto já não faria nenhum sentido. 

“Quer se casar comigo?”

Respirei fundo, e me virei para Osten irritada, não necessariamente com ele, que ignorou os meus sinais, mas com a situação. Não era dessa forma que eu planejava aceitar o seu pedido. 

Osten não olhava para mim, e sim para o anel na caixa aberta. Ele elevou uma de suas mãos.

“Mas, eu?!”

“Eu me enganei.”Osten me olhou de relance.” Sempre dei a entender ser a Rosie, mas…”

As mãos deles estavam entrelaçadas e eu não conseguia entender o que estava acontecendo, até ouvir Suki dizer um “Sim, eu amo você!” e Osten corresponder a sua declaração. 

Dei um passo para trás, e ouvi uma risada de deboche. Jade estava recostada no canto, escondendo um sorriso com uma taça de vinho, porém sua risada voltou a sobressair. 

O restante da Elite estava petrificada, e a visão de Suki e Osten se beijando foi o estopim para que um soluço escapasse da minha boca.

“Sinto muito, tenho que te deixar ir.”

Osten sacudiu o braço para que eu o soltasse e se virou para o lado oposto, de olho em seus papeis.

“Não vai nem mesmo me explicar por quê, de repente, você e a Suki…?!”

Ele apenas apontou para a saída de seu escritório.

Andei de costas observando sua silhueta ficar cada vez mais longe, e quando dei por mim, já tinha passado pela porta. Ouvi várias vozes sobrepostas. Entendi de imediato: A mídia estava à minha procura no palácio. Passei pelos cômodos com pressa, e me assustei ao abrir a porta para um jardim. 

Não qualquer jardim.

Eu reconhecia aquela casinha de cachorro azul pintada com manchas vermelhas e laranjas e o pequeno pavão exótico que meu pai costumava criar. Mas aquilo fazia anos… Eu tinha tanto medo daquele animal, que ele acabou entregando-o para um amigo, e nunca mais trouxe nenhuma espécie encontrada em suas viagens para casa. 

Olhei para minhas mãos e pernas que eram menores que o normal. Por que sentia que era apenas uma garotinha? O tal pavão colocou a cabeça para fora da casinha, e eu voltei para dentro como um relâmpago.

Estava em casa. As cortinas estavam fechadas, mas a luz do sol passava pelo fino tecido e pelas laterais dando uma iluminação razoável. Achei o meu colar de pássaros em cima da mesa. Não sabia como ou por quê tinham devolvido. Minha mãe surgiu da porta da cozinha.

“Rosie.” ela se apressou em minha direção para me abraçar.“ A coordenadora ligou?” sorriu compreensiva.” Quer que eu te conte uma história bem maluca? Vamos sentar primeiro…” 

Ela me puxou para o sofá. Ela iria me explicar pela primeira vez o porquê de terem me zoado na escola com o fato de eu ser filha de uma ex selecionada. Eu havia negado veemente, o que só gerou mais risadas por parte de meus colegas. 

...

Uma borboleta passou voando pela mata preservada, e meu pai foi atrás provavelmente para vê-la pousar em alguma planta, numa posição perfeita para tirar uma foto e desenhá-la.

Ele sumiu e eu não conseguia encontrar o caminho de volta até o acampamento.

"Seus pais estão te esperando em frente a sua casa." disse um desconhecido.

"Que casa? Estamos a quilômetros de distância de Columbia."

"Não Kriss e Elliot. Seus pais verdadeiros."

A orquídea branca e violeta, na estufa do meu pai tinha acabado de murchar. De repente, me dei conta do porquê de estar ali. Foi o último local que estive, momentos antes da viagem para Angeles. 

Se eu tivesse desistido de ir naquele momento, se tivesse tido a coragem de negar perante o país a opção de participar daquela competição, não teria que conhecer Osten para vê-lo ir embora com Suki. Neguei com a cabeça e me agachei encostada à parede. Não havia mais nada a fazer, Osten tinha sido muito claro.

“Vai ficar chorando aí? Nós vamos pra praia agora!” Phoebe parou na minha frente.” Vai logo, já pedi pra sua mãe buscar seu biquíni.”

 “Phoebe, eu não quero sair. Não hoje…”

“E vai ficar curtindo o sofrimento enquanto aquele cafajeste aquelazinha estão felizes na lua de mel?!”

A menção ao cafajeste só piorou a minha situação. E aí começou uma bagunça. Tyler começou a me puxar sob seus os comandos, enquanto Amy, Lee, Audrey e Kerttu decidiam o biquíni com Hanna e Taylor. Emma tentava me defender para que eu ficasse um tempo sozinha, enquanto Mylene me olhava com um sorriso encorajador…

… 

“Rosie, bom dia.” Amy me cutucou.” Deixei você dormir até o último minuto possível, porque você parecia não dar ouvidos quando te chamamos há alguns minutos. Não acordou de madrugada para ler, né?”

“Não…” neguei com um riso fraco. Eu só tinha demorado um tempo para pegar no sono novamente depois dos dois pesadelos.  O mais incrível era ter pegado no sono de novo e continuar a sonhar quase que com o mesmos temas. ”Aliás, bom dia, obrigada pelo mimo.”

Ela piscou para mim, e apontou para a roupa do dia. 

“Cadê a Audrey?”

“Ah, ela…”

A loira abriu a porta no mesmo instante.

“Não foi fácil, tinha muita gente em cima, mas consegui uma das cópias enviadas por fax. Apenas a página da Rosie.”

“N-não espera!”

Franzi a testa com o alarde de Amy e a hesitação que Audrey expressou em seguida.

“O quê?”

“Desculpa dizer atropelado assim. É de Illea.”Amy começou”De uma revista de lá… Reportagens e fofocas sobre você e as outras garotas da Elite… Talvez seja melhor se você mesma ler…”

… 

O affair de Rosie Ambers

A selecionada, da província Columbia, participante da Elite, 

(...) Ninguém mais, ninguém menos do que seu melhor amigo, Tyler Reynolds.  (...)

'Eles passam muito tempo juntos na cozinha, com uma proximidade de se duvidar. Não é atoa que Tyler veio para Angeles. Ele poderia estar em qualquer lugar com a fama que tem. Ela manipulou o príncipe e pediu para que o melhor amigo viesse para o palácio. Abram os olhos.' diz uma fonte não identificada.

'Rosie se projetou no palácio por causa do sobrenome e da aparência de uma garota delicada e gentil. Mas sabemos, pelo menos, que de honesta ela não tem nada. A prova estava muito antes, com a falsidade que ela teve com Bridget.'  (...)

Haviam algumas fotos minhas e de Tyler nos abraçando, com ele beijando minha bochecha, com os braços ao redor do meu ombro enquanto cozinhava… 

Olhei para alguns comentários negativos sobre as outras integrantes da Elite.

(...)  'Jade é uma pessoa narcisista, uma alpinista social. Todos pensam nela como uma jovem doce, simpática, devota ao trabalho da moda e às novas responsabilidades como princesa. Mas ela sabe muito bem o que quer com o título real. Vai muito além do coração do príncipe Osten' (...)

(...)  'Eu tenho pena dessas pessoas que ainda se iludem quando alguém faz caridade. Como se isso medisse o valor de um ser humano. Se engana quem acha que a Katie não se aproveitou desse gesto. A família dela está ligada à política. Ela construiu a imagem junto com eles desde sempre. Acredito que virasse até uma candidata se não tivesse tido a sorte de ser selecionada.'  (...)

...

“Tyler? Você viu?” questionei assim que ouvi sua voz do outro lado da linha.

“Vi…”

“Eu sinto muito, mas vamos consertar isso, não se preocupe. Como estão as coisas aí?”

Passei o dia querendo falar com ele, mas esperei até o horário ideal para dizer isso, pois não podia atrapalhá-lo no serviço.

“O Carson foi o único aqui da cozinha que nunca se deu bem comigo. Todos tem quase certeza de que foi ele…"

"Hum... dá a entender que a fofoca começou dentro do palácio mesmo. Foi muito bem armado." Bufei.

"Como vocês receberam a notícia?”

“Foi um dia bem bagunçado. Cada uma das meninas da Elite foi criticada por algo… Katie de ser uma oportunista com caridades; Jade de ser preconceituosa e irônica com algumas piadas em sua coluna de moda; Paige de ser supostamente fria com um repórter…Eu sinceramente não estava esperando um ataque desses, mas acho que me acostumei. Boa parte de Illea já me odeia mesmo por causa de Bridget...”

“Eles não te odeiam. No máximo desconfiam, por ser muito mais interessante falar mal do que falar bem de uma pessoa. "

“Os seguidores devotos dela me odeiam sim."

“É isso que me irrita. Esse povo não tem nenhum compromisso com a verdade. Sinto muito por abandonar o barco, mas quero distância desse lugar."

“Você o quê?!” Arregalei os olhos ao entender a sentença.

“Não posso continuar aqui, não com esses boatos circulando sobre a gente.”

“Mas você não fez nada! Não fizemos absolutamente nada de errado! Se for embora, só vai estar dando o que eles querem: mais polêmica!”

“Sabe o que é trabalhar com olhares atravessados?”

“E acha que eu não estou recebendo também? E pra qualquer lugar que eu for daqui pra frente?”

Eu estava sendo observada quase a todos momentos pelos membros e amigos da família real da Noruécia, pelos funcionários locais, por algumas criadas e guardas, e acho que de todos Katie foi uma das que mais acreditou, porque me encarava sem discrição. Se Suki não acreditasse piamente em minha relação com o Lorenzo, acredito que estaria da mesma forma. 

"Seja lá como for, esse é o mundo que você escolheu. Não me inclua nisso. Estou sendo perseguido por esses malditos jornalistas toda vez que saio do serviço para o apartamento!”

“Me desculpa por isso…"

“Não é sua culpa, Ro. É só um desabafo, mas, por favor, entenda o meu lado. Só quero trabalhar em paz, é pedir muito?”

"Não. Eu sei que você tem razão, só... espere um tempo até eu pensar em algo pra que você não seja prejudicado..."olhei para a porta vendo que tinha companhia.

"Deixa que eu falo com ele."

Assenti passando o telefone.

"Oi, Tyler, aqui é o Osten. Sim...sim. Eu sei, mas vamos focar no que é mais importante no momento. Se você sair, isso só vai ser interpretado como uma confirmação. Se ficar, os rumores continuam, mas podem ser mais abafados. Sim... mas, sei... Aham... Sim. Minha sugestão é que fique em algum quarto no palácio, por esses tempos para evitar as abordagens todo dia até seu apartamento. Não precisa se sentir preso, nem nada.”

 A conversa deles durou mais um tempo. Tyler acabou sendo convencido pelo que captei, e o clima da conversa até se descontraiu quando o príncipe riu de algo que ele havia dito. Acabei ficando somente com a curiosidade.

"E você, como passou o dia?" Osten me encarou após desligar.

"...Bem, apesar de tudo. E você?"

"Bem." sorriu se aproximando "Eu já te disse que isso tudo é irrelevante, então relaxe."

Mais cedo ele havia me enviado um recado com o pedido de que eu não me estressar em lhe dar explicações, o que de fato eu faria. No entanto, era a primeira vez que eu o via após o pesadelo, e eu me sentia estranha com isso.

”Estou é grata por você não achar que eu e ele…”

“Confio em você” tocou meu queixo antes de deslizar os braços por minha cintura. Apenas mantive a cabeça encostada nele, tentando não me lembrar daquele sonho maluco. ”Quase não temos passado um tempo juntos desde que viajamos. Nossos horários simplesmente não batem. Mas vou mudar isso, garanto. Ainda quero te levar para um jantar ou algo assim.” ergueu meu rosto” Quer?”

“Não sei se você vai conseguir fazer uma mudança dessas sem chamar muita atenção, mas sim.”

“Deixa comigo.”

“Só não deixe ninguém ficarem sabendo, por favor. Isso pode…”

“Sim, se eu saísse com você, teria que sair com as outras.”

“Exatamente, não seria justo. Então se for para ser assim, melhor nem tentar.”

“Parece que alguém aqui não quer me dividir” me encarou com humor.

Não tive como não rolar os olhos com sua risada.

Ele se virou de lado para mexer em uma caneta deixada em cima da mesa. Estávamos no escritório de Olave, o rei da Noruécia.

“Osten…” 

“Hum?”

Recostei minha cabeça mais uma vez nele, criando coragem.

”Se algum dia você for me propor ou algo assim, por favor não faça na frente delas.”

"Como?!"Ele ameaçou rir novamente, mas não o fez. “Eu não pensei em fazer desse jeito, sinceramente, mas por quê o pedido? Você tem vergonha de…”

“Suki.”

Ele ergueu uma sobrancelha.

“Vergonha de Suki?”

“O motivo é ela.” Balancei a cabeça” Suki foi a primeira amiga que fiz no palácio, e ainda gosta muito de você. Acho que deveria ter contado para ela há mais tempo sobre nós, mas fui covarde, e agora estamos aqui. Eu realmente quero resolver as coisas, mas em particular.”

“Ah, sim, entendo. Bom, já era para eu ter dito isso..."

Franzi a testa com sua pausa e caminhada até a porta para se certificar se havia alguém por perto.

"O q..."

"Eu conversei com cada selecionada da Elite antes da viagem e disse que já tinha escolhido uma pessoa, mas que não eram elas. Não falei o seu nome antes que você surte!" Ergueu as mãos” Eu disse que não queria que o nome escapasse antes da hora, sob nenhum deslize, e elas entenderam. Mas o que importa é que cada uma aceitou ficar até o final da viagem por algum motivo. Algumas pela viagem, outras porque gostaram da ideia de diplomacia e queriam aproveitar a oportunidade… Suki me disse que gostou do trabalho.” Meneou a cabeça.” Me disse que entendia não ser escolhida.” Nos olhamos por um tempo."Sinto muito.”

“Não é sua culpa. Você deixou as coisas bem claras, fui eu que...”

“Vou conversar com ela. Prometo.” finalizou “Acho que já podemos ir. Você já está morta de sono, pelo que estou vendo.”

Tentei absorver o que ele tinha dito durante o retorno. Se todas foram informadas por Osten quanto a sua futura saída, teoricamente seria o momento de soltar fogos e dizer adeus ao sentimento de culpa. Mas a questão é que se Suki estava ali com esperanças, com certeza mais delas estavam.

“Lorenzo comentou comigo sobre vocês estarem cansadas das atividades de diplomacia e que eu poderia variar mais o cronograma" Prestei atenção em seu rosto." Acho que acabou por ser bem maçante... Me sinto mal por não perceber antes. Queria saber por você, se...”

“Osten, você sabe que eu amo admiro muito o seu trabalho, mas não passa pela minha cabeça fazer isso todos os dias.” Seu rosto pareceu murchar depois de uma pitada de surpresa.” Mas isso não me impede de te ajudar de vez em quando. Eu também acho importante aprender tudo o que estão passando.”

Ele sorriu compreensivo.

“Isso é um alívio.” segurou minha mão puxando-me de leve para um abraço final.

...

Fechei o colar. Eu tinha me habituado a evitar aquele tipo de peça nos últimos dias. Não só por me sentir mal pela confusão gerada com os presentes de Lorenzo e Osten, mas também por aquilo me lembrar o colar que o mordomo da família de Marie havia levado. 

A porta foi aberta no ímpeto, assustando a todas. 

"Preciso conversar a sós com você."

Ergui a sobrancelhas para Jade, que encarava Audrey e Amy para que saíssem. Essas começaram a acatar ao 'pedido'.

"Primeiro você invade meu quarto assim do nada, e agora expulsa quem quer?"

"Não é para tanto, Rosie."disse Amy" Estaremos esperando no quarto da Ophelia, aqui do lado, quando terminarem."

Respirei fundo assim que fiquei sozinha com Jade. Essa se sentou na cama e cruzou os braços inspecionando o ambiente.

"Pois então, estou curiosa sobre o que saiu nas notícias sobre você e Tyler. É realmente exagero tudo o que estão falando, ou o jogo que você tem feito é duplo?"

"Oi?!" Pisquei incrédula" Não acredito que veio até aqui só pra me perguntar isso."

"É duplo ou não?" Ela insistiu com mais arrogância.

"Nunca foi, nem nunca será." Encarei-a pelo reflexo do espelho" Eu já gostei do Tyler, no passado, mas nunca nos envolvemos. Ele se mudou para o palácio a trabalho. Mas parece que um funcionário que odiava ele vendeu aquelas fotos fora de contexto para a revista."

"Ah é?"

"É. E não entendo sua confusão, já que sabemos que a mídia sempre está louca por uma manchete, e eu não fui o único centro das atenções nesses dois dias."

Jade achou graça.

"Eles supõem que sou falsa. Você foi a única da Elite a ter uma acusação de verdade."

"O que você pretende com essa conversa? Sério." me virei."Nada do que eu te disser vai te convencer, então pra que perder tempo?"

Ela deu de ombros.

"Nada do que você fizer vai interferir nos meus objetivos de qualquer jeito. Mas das poucas vezes que conversei com Tyler, ficou muito claro pra mim que ele é uma boa pessoa. E eu acho que ele não merece levar um fora da namorada e logo depois ser iludido pela melhor amiga. Se você tem o mínimo de consideração..."

"Pra começar, pra iludir ele, Tyler precisaria estar gostando de mim."

"E não está?"

"Claro que não! Ele está na fossa por causa da Veronica!"

"Isso ele está mesmo..." zombou, mas logo retornou à seriedade" Se é o caso de você não estar se envolvendo com ele, pelo menos entenda que o cara sempre teve uma paixão e tanto por você."

"Jade."

Ela continuou como se não me ouvisse.

"Ele acabou ficando bêbado numa das pequenas comemorações que fizeram na cozinha para um funcionário e acabou me soltando mais detalhes do que deveria. Além de me falar a história toda com a Veronica, ele também me falou um tempão de você. Ele não teve só uma queda, mas um penhasco por você desde que vocês tinham uns 5 anos, se não me engano. Nunca falou pra não estragar a amizade."

Respirei fundo duas vezes. Nesse meio tempo Jade me observou com uma cara de quem sabia que tinha sido certeira com o comentário.

"Ok, não seria uma surpresa se ele me dissesse que já gostou de mim em algum momento, já que crescemos juntos. Mas você não conheceu a Veronica, nem a Holly. Eu assisti a esses dois relacionamentos dele. Posso garantir que se Tyler tivesse gostado de mim de verdade ele teria me dito sem rodeios há muito tempo."

"Isso te preocupa mais do que eu imaginei..." sorriu." Acho que não tenho muito como extrair a verdade de você. Mas uma hora alguém vai. Cuidado."

O ódio é que ela saiu sem me dar a chance de responder.

Precisei de um tempo para refletir. Embora Jade pudesse estar inventando tudo aquilo por provocação, não era a primeira vez que eu considerava a possibilidade de Tyler ter sentimentos por mim.

O fato dele ter atrapalhado alguns dos meus relacionamentos no passado, com a justificativa que não serviam para mim; A maneira como ele ficou incomodado quando lhe contei sobre a Seleção; O chaveiro em forma de coração que me deu no parque, enquanto comprou um de estrelas para Veronica; Até a dedicatória ‘Com amor, Tyler’, no livro que ele me deu de presente, em acréscimo a esses pequenos 'sinais' fazia minha cabeça rodar.

Mas eu precisava ser racional. Mesmo com algumas reservas quanto a vida pública que eu estava escolhendo, Tyler sempre se mostrou muito feliz com o meu envolvimento com o príncipe. E, de qualquer jeito, não adiantava nada me preocupar com isso no momento. 

Eu deveria esclarecer as coisas com ele ao voltar para Illea. Isso se houvesse necessidade.

...

Assim que entrei no saguão principal, reparei em Osten, seu antigo mentor Benjamin, o rei Olave, a rainha Ingrid, Marid -primeiro-ministro de Illea- e Andrew -Ministro das Relações Exteriores. Os dois últimos tinham chegado com seus assessores um dia após o nosso grupo. 

O planejamento deles era nos acompanhar nas visitas à Noruécia e à Nova Ásia. Isso claramente tinha o objetivo de afirmar a neutralidade de Illea frente ao atual desacordo entre esses dois países.

O príncipe Alison e a princesa Mikaela estavam sentados num dos sofás aguardando a conversa dos pais para sair, provavelmente. Dei um leve aceno quando passei, e eles corresponderam.

Alison me lembrava um pouco o Tyler pequeno: cabelos castanhos e olhos azuis. Tinha dez anos e era herdeiro como Kerttu. Minha impressão foi a de um menino educado e simpático, do estilo Klaus, mas poderiam ser apenas boas maneiras, pois segundo o que eu escutei foi ele mesmo um dos que mais fez bullying com Stefan.

Mikaela tinha um cabelo bem escuro, ondulado até o ombro e olhos da mesma cor que o irmão. Ela tinha seis anos de idade. Eu me lembrava dela perseguindo Kerttu e as meninas maiores pelo aniversário.

 Naquele dia, deveríamos ir para um Centro de Convenções, onde alguns políticos da região argumentariam em prol de causas sociais.

Um funcionário me avisou que eu era a única atrasada. Fui guiada até a garagem. Durante o trajeto de carro foi possível observar um pouco mais dos fiordes, que apareciam vez ou outra por detrás das ruas e casas. Eles eram muito conhecidos pelos programas turísticos realizados em barcos. Infelizmente não teríamos a chance de ir a nenhum deles.

Quase morri ao sair do carro e percorrer um trecho ao ar livre. Se o frio já estava de matar na Espanha, naquele país então...

O salão, porém, era climatizado. Ele tinha aproximadamente 200 cadeiras. Segundo a proposta de Marid, duas selecionadas por vez discursariam em ocasiões especiais. 

Sorri me lembrando da sorte de não ter que fazer isso naquele dia, haja vista que as duas com essa tarefa se voluntariaram. Jade era uma delas e foi até Osten e Marid para conversar, enquanto o resto de nós nos acomodamos na primeira fileira.

Acho que encarei Suki por tempo demais, pois me essa lançou um olhar frio ao qual eu ainda estava tentando me acostumar…

A primeira parte do evento foi composta por alguns políticos falavam norueguês, com um tradutor ao lado repetindo cada frase.

Quando dei por mim, Jade subia ao palco sob uma salva de palmas.

Ela tinha uma ótima oratória. Eu sabia que não era saudável o ato de se comparar, mas precisava admitir que estava a anos luz de falar em público como alguém como ela. Não poderia me livrar de algumas gaguejadas e dos momentos de pânico interno com o medo de errar ou perder a linha da fala.

A próxima a subir foi Suki. 

"Boa noite, senhoras e senhores." deu uma pequena risada quando seu microfone falhou. Eles logo corrigiram a falha. "Agradeço a oportunidade que me foi dada de falar sobre um tema tão importante e que ainda muito carece de intervenções..."

Eu não havia contado sobre a minha conversa com ela para Phoebe. E não faria isso tão cedo. Era capaz da bonita pegar um avião só para nos ajudar a reconciliar, e eu entendi que a minha insistência com Suki só tenderia a piorar as coisas.

Nem mesmo Amy e Audrey ficaram sabendo: No dia em que conversamos na canoa, eu preferi dar uma volta pelas redondezas do parque e fiz de tudo para não denunciar nossa discussão.

Pela maioria do tempo da Seleção, pode não ter sido um problema a minha proximidade com o Osten, já que eu apenas o via como um amigo. Mas assim que isso mudou, eu deveria ter esclarecido as coisas para Suki. 

Eu sempre vi o quão empenhada ela era para chamar atenção dele. Se dedicava mais que qualquer uma ali para ser uma boa escolha de esposa. Ela lutou por mais tempo que eu. Desde o primeiro dia, na verdade.

...

Era início de tarde quando nos levaram a uma ópera famosa de Oslo. O topo daquele prédio funcionava como um observatório da cidade e do fiorde Oslofjord, que no dia tinha uma cor entre azul e cinza claro. Existiam desde barcos pequenos a navios por perto, muitos atracando em pequenas ilhas com preservação.

Não pudemos ficar ali por muito tempo, visto que o espetáculo estava para começar. Haviam uns quatro andares com disposição circular, nos direcionaram para dentro até os lugares reservados no último andar. Alguns curiosos olhavam para cima e acenavam.

Reparei um pouco no vestuário das pessoas, um tanto formal e elegante demais. Me perguntei se era porque queriam caprichar para eventualmente aparecer em alguma filmagem, ou se era de costume mesmo irem assim para uma ópera.

Bufei internamente quando Amy e Audrey foram para um lugar específico para as criadas e funcionários do palácio da Noruécia- sob ordens de quem entendi ser da rainha- e que só sobrara um lugar especificamente ao lado de Suki, que conversava com a rainha Ingrid e algumas de suas parentes. 

Estava começando a me irritar o fato da asiática me ignorar de propósito, mas eu não podia fazer nada.

 Identifiquei uma mulher e um homem que saíram supervisionando os violinos, violas, violoncelos, trompetes, flautas, tubas e harpas, localizados um degrau abaixo, mas de frente para o palco. Um homem idoso de terno se sentou ao piano e assim que ele tocou os primeiros acordes a maioria das pessoas começou a parar de falar para ouvir.

As luzes foram apagadas uns cinco minutos depois. A orquestra tocou até os atores entrarem em cena.

Não consegui entender nenhum diálogo, obviamente, por ele ser em norueguês, mas isso não estragou o entretenimento. Tentava não rir dos personagens atrapalhados e gritos repentinos que eram dados. Pelo vestuário e cenário o enredo se passava na época da Idade Média. Não soube definir quem eram os protagonistas, se três homens trabalhadores de campo, ou o cavaleiro e uma camponesa com o romance proibido.

Lá para o meio da peça, a princesa Mikaela passou a ficar  inquieta, sendo repreendida quase toda hora uma tia ou prima mais velha, e o príncipe Alison simplesmente dormiu em todo tempo. Fiquei com pena, pois deu para ver que eles foram obrigados a estar ali.

O final da obra foi feliz para os três trabalhadores e trágico para o casal principal, o que emocionou a muitos. 

" Você parece ter gostado muito do espetáculo."

Olhei para Osten que também se aproximou do parapeito enquanto os demais presentes do nosso andar aguardavam o momento de sair. Suki já tinha se retirado junto com o grupo da rainha, na primeira leva.

"Quando eu era menor, me disseram que ópera é coisa para os mais velhos, como se fosse algo ultrapassado. Eu realmente gostei, principalmente do instrumental." apontei para os violinos, que continuavam a tocar baixo enquanto a multidão se retirava. "Muita gente pode não ligar, mas sem uma boa trilha sonora metade da emoção vai embora."

"Faz sentido. O mesmo vale para um filme ou um série. A escolha do repertório..."

Osten iria dizer mais algo, mas foi chamado por Jade e Ophelia. Não entendi se era um problema ou algo simples. Me sentei próxima a onde Amy e Audrey fofocavam com as criadas. Infelizmente o som dos instrumentos cessou totalmente, e os músicos passaram a guardar os instrumentos.

"Rosie Ambers." olhei para o lado vendo que eu acertara meu palpite. Marid, o primeiro-ministro, me encarava de braços cruzados.

"Sim?... Vossa Excelência." quase me esqueci do título, e senti que isso seria um erro, porque aquele homem passava uma impressão de quem amava uma homenagem.

"Quero que você e Katie façam o discurso no nosso próximo destino."

"Você quer dizer na..."

"Nova Ásia. É uma responsabilidade e tanto. Posso contar mesmo com você?"

"Ah, sim, claro. Pode." 

"Está resolvido então. Benjamin ficará a cargo, mais tarde, de te passar o tema da escrita."

Meneei a cabeça quando ele se foi. Se tinha uma maneira de acabar com o meu dia era com aquela tarefa.

Eu estava certa que a nossa próxima programação era ir a um evento de moda, conforme o pedido de Jade, mas encontrei Ophelia conversando animada com o príncipe na saída da ópera. Essa veio em minha direção com um sorriso de orelha a orelha para me dizer que tinha conseguido uma nova opção: como também já havia morado naquele país, pediu para passarmos o resto da tarde em uma biblioteca pública.

Paige também quis vir conosco. Suki, Jade, e Katie seguiram para o desfile, acompanhadas por Osten.

"Gostei daqui." Paige falou assim que entramos." Não sei se vou ficar mais interessada na vista ou nesse tanto de livros."

"Em ambos."Ophelia respondeu "Eu costumava vir quase todos os dias quando morei aqui. Muito bom para desestressar. Eu gostava de ler histórias para os meus irmãos ali naquela varandinha." apontou.

 A biblioteca era um prédio de dois andares, em uma área residencial perto de um porto. Tinha a extensão de quase um quarteirão e era decorada com sofás e poltronas para leitura.

De cara, me juntei a Amy e Audrey para achar a sessão com livros em inglês, apesar de Ophelia me chamar de minuto em minuto para me explicar e traduzir o enredo de alguns livros de autores locais. Paige foi outra que se aventurou em novos idiomas, pegando alguns livros em italiano.

 "Consegui achar o que estava procurando. Vem comigo." Ophelia me puxou para a área aberta. Sentei ao seu lado certa de que ela iria começar a metralhar informações sobre o livro, e em vez disso recebi um sorriso meio sem graça. "Desculpa me intrometer... estou curiosa."

"Hum?"

 "Você e Suki brigaram?"

"...Bom..."

"É que eu notei que você e ela não trocam quase nenhuma frase direito, nem quando estão do lado uma da outra."

"Ela decidiu se afastar, porque não consegue lidar comigo, estando nessa situação em que estamos..."

Um silêncio.

"Ah... é uma pena que ela leve as coisas dessa forma. Mas eu não posso julgar, se eu estivesse realmente lutando pelo Osten também não garanto que conseguiria manter esse nosso diálogo." deu de ombros e riu me olhando. "Você não está entendendo nada, né?" colocou a mão no meu ombro. "Vou facilitar: eu sei que você e ele já estão com planos de casamento. E ele pediu muita discrição, mas..."

"O motivo de você ainda estar aqui é causa das atividades de diplomacia?"

"Exatamente. "assentiu. "Isso vai entrar no meu currículo quando eu voltar para o curso de Relações Internacionais. Olha, eu vou ser honesta: Quando eu cheguei no palácio, achei que tinha encontrado minha alma gêmea, que daria super certo, porque Osten e eu temos muitos gostos em comum..." rolou os olhos e sorriu."Mas vi que não necessariamente. Eu percebi que ele gostava de você há um tempinho e fico feliz por vocês! Eu só pedi para ficar até o final por esse motivo: essa viagem tá sendo muito boa para mim, em questão de aprendizado."

 Basicamente, fiquei sem palavras por alguns instantes. Sorri fraco.

"Você não sabe o alívio que eu tô sentindo com isso."

"Menos uma pra querer roubar seu homem?" semicerrou os olhos.

"Menos uma pra querer a minha morte quando ele me pedir em casamento." Ela achou graça.

"Dê um tempo para Suki... ela vai entender na hora certa. Não acho, de verdade, que ela te odeie."

"Assim espero..." assenti. "Obrigada."

Ficamos ali até o anoitecer lendo e observando a iluminação da cidade.

 ... 

Olhei também pela janela do edifício, localizado no centro de Pequim, a capital da antiga China, na Nova Ásia, toquei seu ombro, despertando-o de seu estado catatônico. 

“Você está bem?”

“Sim, por quê?” 

Eu tinha fugido para a direção de Osten, que se dispersou do grupo que acompanhava a explicação de um senhor sobre o dia a dia de trabalho naquele Consulado.

“Dá para notar tanto assim que eu…”

“Você pode ser um ótimo ator, mas não consegue esconder as coisas perfeitamente não…”

Ele sorriu olhando para os lados.

”Não posso abrir muito o assunto com você aqui, mas… você sabe que onde estamos não é lá um local tão seguro.”

"Sim."

Haviam grupos que tentavam tomar o poder em meio à instabilidade política que cresceu durante a guerra e no pós guerra entre Nova Ásia e Illea. Mesmo que os ataques não ocorressem em Pequim, havia o risco. Era como lidar com os antigos rebeldes de Illea, e nós seremos reféns perfeitos.

“O governo asiático prometeu segurança se viéssemos, mostrando os itinerários e estrutura militar, e o primeiro-ministro e outros políticos de Illea insistiram…”

Osten me contou que, ao cair nessa conversa, acertou os detalhes para uma viagem com a Elite que formaria, tudo antes da Seleção começar.

“Sinto que não estamos completamente seguros..." continuou "A única coisa que consegui, de tanto reclamar, foi reduzir o tempo das saídas em lugares abertos.”

Além disso, as criadas estavam ficando sob a segurança que já existia na hospedagem e não nos acompanhariam aos locais, para que houvesse o menor número de pessoas possíveis para a segurança do palácio defender. Não era muito, mas já era alguma coisa.

"Eu... nem sei o que dizer para ajudar."

"Não tem o que fazer."deu de ombros" Já estamos aqui. A questão é torcer para nada acontecer. Não se afaste nem um segundo da guarda, ok?"

"Osten, você está com tempo?" Uma voz um tanto melodiosa- mas não de um ser adorável- chegou aos nossos ouvidos.

Katie andava em nossa direção e trazia papeis.

"Hã, sim? Ainda tenho uns minutos antes de ir para a reunião."

"Ótimo! Preciso te mostrar isso urgentemente. Desculpa, é sobre o discurso." disse olhando diretamente para mim.

 "Sem problemas. Eu vou dar uma revisada no meu mais tarde." pisquei para Osten me retirando.

...

 "Você nem é o pai e está assim?"

Osten parou de andar instantaneamente e olhou para Benjamin, reagindo com um abanar de cabeça e um sorriso fraco. 

Seu sobrinho estava para nascer. Ligaram dizendo que Josie entrara  em trabalho de parto há algumas horas. 

Desde então, passamos a tarde na expectativa. 

Nossa hospedagem era na embaixada da Nova Ásia, a residência do embaixador Gordon e de sua esposa Hilary. Nos reunimos na sala depois de uma nova ligação com o aviso de que o bebê poderia chegar a qualquer momento.

"Eadlyn me disse que Kaden está tão pálido quanto meu pai ficou no meu nascimento, e que estão de olho nele, caso desmaie."

"É realmente de família!" 

Benjamin soltou uma risada estridente, e ninguém foi forte para aguentar. 

" Recomendo que quem se casar com ele tenha os mesmos cuidados..."

"Nada disso. Só estou preocupado, não chegaria a esse ponto. Meu irmão é quem é muito emotivo."

O homem se recostou na cadeira nos olhando com ironia. Nunca tinha visto essa faceta dele. Sempre pareceu ser tão sério... Começou a contar sobre os nascimentos de seus três filhos, e o príncipe, sem dúvidas, não prestou atenção em uma palavra. Seu olhar não saia do telefone. 

"Precisamos sair, senão arriscamos de atrasar." Aquela voz imponente mudou o estado  entretido de Osten para focalizado numa fração de segundos. 

"Vamos indo, você tem razão."

"O tio Osten pode esperar mais um tempo e cumprir com seus deveres, não é mesmo?"

"É claro que sim, Sr." O príncipe assentiu ignorando a provocação de Marid. Eu sabia que ele odiava seu 'chefe' (e, pelo visto, era recíproco), mas tinha um grande senso de responsabilidade que se fazia mais importante do que qualquer aversão. 

"Estão realmente prontas?" Marid nos olhou com um ar de deboche" Não falta nada na maquiagem, no cabelo? Posso dar, no máximo, mais cinco minutos, afinal, hoje a imprensa vai chover sobre vocês. "

"Não há necessidade, Sua Excelência. Pelo menos, não por mim." A resposta foi de Suki. O resto concordou.

"Espero que se portem bem. Todo cuidado ao conversarem e exporem opiniões. Não querem envergonhar Illea, certo? "Seu olhar apático recaiu por um segundo no meu rosto, e eu encarei o piso me sentindo frustrada por parecer intimidada.

O telefone tocou e Osten o alcançou com urgência.

"Sim? ... Ok. Estamos saindo." ele desligou. "Os carros, eles chegaram."

"Eu e minha esposa vamos sair por último." O embaixador Gordon surgiu no cômodo.

"Isso. E nos encontramos no salão principal, como combinado." Marid disse tomando a dianteira. Osten nos abordou antes de segui-lo.

"Sobre hoje, apenas desviem do assunto se por acaso pressionarem vocês com perguntas sobre o conflito. É claro que aqueles que gostam de repercussão podem criar uma espécie de armadilha com a resposta que derem. Mas lembrem que o nosso objetivo aqui é fazer uma viagem amigável e garantir uma boa relação comercial." 

...

 Como Marid previu, a fachada do prédio do governo da Nova Ásia estava repleta de gente da imprensa.

Tentei não me atentar a isso, e sim a beleza do lugar. Canteiros com magnólias decoravam os dois lados da passarela. Não estavam tão floridas como o seu natural devido a época do ano, e aquilo me lembrou de quando Kerttu planejou plantá-las na estufa.

A princesa deveria estar completamente afobada com o nascimento do(a) primo(a). Queria estar em Illea para ver isso...

Reparei em Osten com uma expressão neutra, escondendo bem a ansiedade. Ele falou com alguns homens em mandarim ainda na entrada.

Um senhor de idade se aproximou. Eu tomei coragem cumprimentá-lo com uma das frases prontas que nos fizeram treinar, mas o homem começou a rir, e eu me perguntei se havia errado a pronúncia.

Osten segurou uma risada quando o olhei e falou em mandarim ele. Suki também disse algumas palavras.

“Você acabou dizendo bom dia, em vez de boa noite.” Sussurrou Ophelia antes de entrarmos no elevador. ”Mas não se preocupe, isso acontece.”

Fechei os olhos. Deveria ter esperado o restante das meninas falarem e simplesmente repetir a frase que dissessem, ou simplesmente me calar e sorrir.

 "Que lindo!" Exclamou Katie quando chegamos à sala de jantar.

Tratava-se de um encontro que reuniu integrantes do governo da Nova Ásia, além de representes de Illea e de outros países.

Haviam as cores vermelho, pérola e branco nas toalhas de mesa; Os lustres deveriam ter mais de cem anos, mas estavam muito bem conservados e uma música suave clássica tocava ao fundo. 

Confirmei com Ophelia e apenas utilizei o 'Ni Hao'(Olá). Essa  era a única frase que eu conseguia falar sem erros e que me livrava da preocupação de apenas sorrir para qualquer pessoa que olhasse diretamente para mim.

Após Osten se afastar conversando com o presidente e o primeiro-ministro locais, fomos direcionadas e divididas entre as várias mesas circulares. 

Ophelia e Katie em uma mesa. Paige e Jade em outra. Suki e eu na terceira. Li os demais nomes escritos nas placas assim que sentamos. Infelizmente eu já conhecia dois deles.

Sammy e Denis eram um casal de diplomatas alemães que conhecemos no aniversário de Kerttu. Tive vontade de sumir quando eles passaram pela porta, acompanhados de um outro casal de origem chinesa.

Suki se levantou instantaneamente para recebê-los e eu fiz o mesmo.

“Suki, minha flor, há quanto tempo!"

"Faz um bom tempo mesmo..."

“Estamos muito felizes em ver que continuam na competição.” Denis apertou a mão dela e a minha.”Esses são Hao-Yu e sua esposa Xīn Yí. Trabalhamos em conjunto há mais de dez anos.”

"Muito prazer" estendi a mão, cumprimentando-os. O casal parecia simpático. 

Senti que era observada de cima a baixo por Sammy. 

"Eu lembro de você." ela sorriu "Quem diria. E, Suki... Não é surpresa pra mim te ver chegar até aqui!"

Flagrei o olhar confuso que Hao-Yu e  Xīn Yí trocaram e me sentei bancando a distraída. Eu sabia que Sammy iria fazer diferença entre Suki e eu, já que quando nos conhecemos ela deixou muito claro seu apreço pela selecionada do grupo que falava o maior número de idiomas.

Não sei quem teve a ilustre ideia conversarem em mandarim: só então cai na real sobre o grande tédio que aquela noite seria.

Os garçons também não falavam a minha língua. Fiquei com medo de trazerem algum prato exótico- já tinham me traumatizado na infância com a informação de que era normal comerem baratas fritas na Ásia. Suspirei de alívio ao ver um salmão defumado.

Isso atraiu a atenção de Suki, mas ela logo desviou o olhar comentando algo com Sammy. 

Se ainda estivéssemos no início da nossa amizade, eu teria me aproximado dela para aprender um pouco do idioma. Quem sabe Suki não estivesse me ajudando a entrosar? Era duro pensar que dias como aqueles não voltariam.

“Acho melhor começarmos a conversar em inglês...” Denis sorriu em minha direção. ”Peço desculpas. Eu sei que Suki já falava mandarim por causa da família, mas a maioria de vocês não tem como nos acompanhar dessa maneira.”

“Tudo bem. Sem problemas.” Sorri.

"Já visitaram quantos lugares por aqui?" questionou.

Abri a boca para lhe responder, mas Suki foi mais rápida.

"Passamos pela antiga Muralha da China. A visita pegou um trecho da passagem e não havia mais ninguém além de nós e a segurança."

"Não é para menos.” disse Sammy” Os grupos que sobraram ainda fazem algumas revoltas."

“Por sorte, não em Pequim. É por isso que estamos aqui.” A fala de Denis gerou risadas na mesa.

Fiz o que pude para não fazer uma careta. 

"Também fomos à Cidade Proibida, ontem."Suki continuou.

O assunto passou dos pontos turísticos para os costumes da região. Ouvi mais ou menos a explicação de  Suki sobre uma tradição em que os noivos deveriam receber um lenço de presente dos convidados mais próximos em seu casamento.

"É claro que vou te dar um!" disse Sammy. "Caso você vença a Seleção." olhou para mim de soslaio.

 Eu estava o tempo todo tentando controlar o tédio com a situação.

Acabei notando um palco de madeira a uns metros de distância e infelizmente me recordei do que não queria. 

Marid nos avisou para ficar de sobreaviso. Eu já tinha revisado meu texto algumas milhões de vezes, e me perguntei se faria bem ler mais uma ou se isso só me faria ficar mais insegura. Só 'voltei ao ar' quando ouvi meu nome ser chamado.

"Oi, desculpe, sim?"

“Eu estava perguntando o que pretende fazer se você se tornar a próxima princesa de Illea?” A pergunta de Sammy, porém, me pegou desprevenida.

“Como… o que quer dizer? De serviço? O que pretendo fazer é apoiar o Osten em tudo, e …”

"Está preparada caso tenha que ficar mais de dez anos no exterior?"

"Hã?"

Percebi que minha confusão a divertiu de alguma forma.

"Afinal, quem se casar com ele vai ter que se acostumar com essa rotina. Às vezes são anos de missão diplomática no exterior. Já pensou sobre isso, certo?"

"...Ah, sim, claro! Não tinha entendido sua pergunta."

Senti meu rosto queimar de vergonha.

“Nem falei com vocês, perdão...” Olhei surpresa para o lado, onde Osten parou, na hora certa, me livrando da atenção da mesa. ”A noite está sendo agradável?”

“Sem dúvidas, Vossa Alteza!" Denis disse" A companhia dessas jovens é muito boa.”

“Ficamos muito felizes de reencontrá-las!" Sammy completou.”Já temos a nossa preferida entre as seis e acreditamos que ela seja essa a escolhida por Vossa Alteza, mas qual delas não iremos revelar. ” Ela deu uma olhada ‘discreta’ para a asiática que segurou o riso balançando a cabeça." Eu estava comentando com Rosie e Suki sobre o trabalho essencial que a futura esposa de um príncipe e diplomata deve cumprir."

"Ah, sim..." Osten assentiu com um sorriso. Seu olhar cruzou com o meu por um segundo.

"Honesta: foi um choque para mim ter que me mudar da Alemanha para Austrália, assim que me casei com Denis, "Sammy continuou" A sorte é que sempre formamos uma bela equipe, em todos esses países, por todos esses anos, não é, querido?"

"Com certeza."Denis sorriu e se virou para Osten." Desejamos muita felicidade para você e sua futura noiva."

"Mas, aliás, quando você vai anunciar? Já está na hora, não?" Sammy cruzou os braços.

"Ao final da viagem todos irão saber, fiquem tranquilos."

"Promessa é dívida, hein!" Denis disse fazendo os demais rirem. Osten se despediu em seguida.

Chegaram com sobremesas, o que desviou o assunto para isso e outras trivialidades. Não tive muito apetite para terminar a minha.

Talvez eu tenha entrado num estado de alerta. Passados alguns minutos, reparei em uma movimentação próxima ao palco. Estavam testando os microfones. Seria a hora? Osten, Ophelia, Marid e alguns políticos da Nova Ásia conversavam em pé próximos a nós, porém não o suficiente para que eu pudesse ouvir a conversa.

Katie passou diante deles para conversar com o rapaz que mexia no som.

"Com licença, que horas são?" Perguntei a Denis. 

"21:00, senhorita."

"Ok, obrigada."

"Está quase na hora do discurso." Suki me encarou.

"Sim..."

"Discurso? Que discurso? Não estou sabendo disso!"

Me levantei enquanto Suki respondia Sammy. Como eu desconfiava, o local onde várias pessoas entravam e saiam do salão se tratava da ala com sanitários.

O ministro das Relações Exteriores de Illea me abordou quando eu estava quase lá.

"Quer ser a primeira a falar?" ele perguntou.

"Eu... posso ser a segunda? Katie deve estar mais preparada para começar." Apontei para a mesma já posicionada.

"Ok, vou avisar Marid."

"Obrigada." Assenti.

Quando me cheguei ao banheiro, abri a bolsa de mão que tinham me dado e puxei os papeis. Por mais que eu pudesse ler na hora, o medo era de me perder no meio das linhas e não saber o que dizer.

"Oi, Rosie, me pediram para te cham... Você tá bem?" Ophelia me olhou com preocupação ao entrar." Você tá pálida, está tremendo?" segurou uma de minhas mãos.

"Relaxa..." Soltei uma lufada de ar, e respirei fundo fechando os olhos.

"Você quer que eu fale por você hoje? Posso ler o que escreveu, e depois te passo o que estou planejando pra você falar numa próxima."

"Não, não! Só tô um pouco nervosa" sorri" Mas vou sobreviver." 

Sentia o coração a mil, queimação por dentro e também enjoo, mas isso eram coisas que sempre sentia toda vez que falava em público. Pessoas como ela jamais entenderiam...

"Claro que vai!" ela me abraçou." É normal ter medo nessas horas. Tudo o que tem que fazer é alternar o olhar entre a folha e algum ponto. Pode ser a própria câmera. Isso evita que fique nervosa com a plateia."

"Ok, obrigada, vou tentar..."

Após alguns minutos, voltamos juntas para o local onde me esperavam. Katie já tinha iniciado seu discurso.

Não.

"Ophelia." 

Meu sussurro com certeza foi ouvido, mas ignorado.

Apesar de eu ter garantido que estava tudo bem, Ophelia se afastou de mim de repente e se direcionou a Osten. Esse, na mesma hora, deixou sua posição para vir falar comigo.

"Ophelia me disse que você..."

"Estou bem para falar, não se preocupe" o cortei.

Aproveitei que Katie já descia o palco para tomar o seu lugar. Era preferível fazer aquilo antes que eu perdesse a coragem.

O tremor nas mãos voltou de leve enquanto eu organizava os papeis. Meu olhar percorreu o salão lotado. Ignorei internamente o fato de que Sammy, Suki e outras muitas pessoas deveriam estar a espera de um deslize.  Assenti para o tradutor que me acompanharia frase a frase e iniciei.

...

Chegamos à embaixada perto das onze. As criadas ainda acordadas nos esperavam na sala de estar. 

“É uma menina! Eleanor, o nome dela, Vossa Alteza!" uma delas falou.

“Parabéns!” Suki abraçou Osten imediatamente. Um grande círculo se formou ao redor dele, o que impediu de me aproximar.

Amy e Audrey andaram em minha direção. Achei que me encheriam de perguntas sobre o discurso, e estava louca para contar, mas percebi que elas não estavam tão radiantes quanto o resto estava. 

"Chegou um novo comunicado..."disse Audrey" Está passando em vários jornais, mas a maioria por aqui estava mais interessada na notícia do bebê..."

Ela me entregou o papel.

(...) Segundo o que afirmam. Rosie Ambers deveria se chamar Lyssa Artois Beaufoy. Marie e Allan Beaufoy são um casal de naturalidade francês, residentes na Itália. Ambos realizaram buscas por 2 anos pela criança que nunca foi achada. Ontem a noite, sexta feira (17), o casal reuniu as últimas provas com o DNA de Rosie. O teste de maternidade e paternidade foi considerado positivo. Isso torna a selecionada a segunda herdeira de sua família, atrás de Oliver Artois Beaufoy, o ex noivo de Sua Alteza Real, princesa Delfina (...)


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Notas finais do capítulo

Próxima parada? Itália.

A referência horrenda a Divergente nesses sonhos kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
Me inspirei sem querer!
Alguém aí contou os medos da Rosie?!



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