Assim que chego no meu quarto a ficha cai. O que diabos Jace está fazendo na minha casa?

Não é possível que o mundo decida brincar comigo desse jeito. Mas tudo o que parece para mim é uma grande piada cósmica. A única pessoa que eu tenho problema com na escola... Tá bom, uma das únicas... mas pelo Anjo. 

E o fato da única razão plausível ser que o loiro se tornou amigo de Jonathan... é simplesmente tão absurdo. Eu me esforcei ao máximo para abaixar a cabeça e me desculpar para nunca mais ter que lidar com qualquer coisa relacionada à pessoa sentada no meu sofá nesse momento, mas seria pedir demais pelo jeito.

Respiro fundo - não porque realmente ajuda, mas porque é a única coisa que consigo pensar em fazer - e me deito na cama olhando para o teto. 

Olho para as estrelas de plástico - que brilham no escuro - coladas nele. Essa é talvez, a minha parte favorita do meu quarto. 

Eu as colei quando tinha 11 anos e morria de medo de ser deixada no escuro. Eu tinha medo que de algum modo, se eu ficasse muito quieta ou se nada acontecesse, eu fosse sugada para aquele vazio. Então minha mãe me levou para a IKEA e me disse para escolher alguma luzinha ou uma luminária. Mas eu me encantei pelas estrelas. 

Quando chegamos em casa, ela me ajudou a colar elas no teto do jeito que eu queria, e então sempre foi como se eu tivesse meu próprio céu para olhar todo dia antes de dormir, como se eu tivesse minhas próprias constelações e meu próprio mundo. Foi como criar algo do nada. E eu amo esse sentimento. 

E então meu celular começa a tocar, Killer Queen explodindo o silêncio no qual me encontrava. 

É o Simon. 

“Oi” atendo.

“Por favor fique calma” ele diz.

“Simon... você sequer tem noção do quanto essa frase causa o efeito contrário nas pessoas?!” Já começo a me preocupar.

“Tá, faz sentido... mas é só que você esqueceu seu... livro... na escola”

Ah Meu Anjo. Meu coração cai no chão, eu consigo ouvir o barulho estranho dele se estatelando e rolando pelo quarto, meus olhos se dirigindo para o criado mudo ao lado da minha cama, onde meu livro deveria estar. Eu estava lendo As Crônicas Lunares e agora a Cinder se foi. Ela se foi porque eu abandonei ela, sozinha... e o que eu vou fazer agora? Tudo em que consigo pensar é que eu não posso ler e ter certeza que a Cress não morre no próximo capítulo, ou que a Cinder vai conseguir cumprir seu papel e a Meu Raziel como eu posso não estar lendo?! 

“Clary... pare de surtar”

“Eu não estou surtando” minha respiração não está normal, daqui a pouco meu pulmão vai cair no chão junto com o coração e aí só vai sobrar meu cérebro para me lembrar que eu esqueci meu livro e a culpa é minha. 

“Simon o que eu faço? A escola já deve ter fechado a sala e você sabe que nunca deixam a gente entrar lá no horário das crianças e...”

“Clary, como você acha que eu sei que você esqueceu seu livro?”

Eu sei que de algum modo essa é uma pergunta válida mas não estou conseguindo processar o que está acontecendo mais.

“Como?”

“Eu vi na sala, e peguei para você”

“Graças ao Anjo” eu suspiro tão alto que tenho certeza que gritei e a vizinhança toda escutou. 

“Obrigada, obrigada, obrigada Simon!”

Ele ri um pouco pelo telefone. 

“Achei que você ia infartar”

“Eu também achei... e outra coisa” minha voz fica um pouco irritada “por que diabos você não começou falando que estava com meu livro? Muito legal de sua parte, quase ficou sem melhor amiga” 

“Bom... você nunca esquece seu livro e eu obviamente queria te dar um sustinho” bufo “Ei, eu peguei para você não peguei?”

“Pegou...” sorrio “Você é a minha pessoa favorita agora”

“É realmente bom que eu seja... estou quase chegando na sua casa, e aí você vai poder relaxar” 

“Muito obrigada” 

“Não tem de quê Baixinha”

Ele desliga antes que eu possa protestar.

Respiro fundo e relaxo, está tudo bem, meu livro está a salvo.

Quando ouço a campainha desço as escadas correndo, mal toco o chão até abrir a porta e pular nos braços de Simon.

“Obrigada, obrigada, obrigada, obrigada...eu não sei o que eu faria sem você, pelo Anjo Simon, você salvou a minha vida”

“Eu...Clary você vai me estrangular” Simon me entrega o livro e eu dou pulinhos com ele nos meus braços.

Vejo meu melhor amigo rir e sei que é da minha postura um tanto infantil mas não ligo. Só dou um tapinha amigável no braço dele e o idiota finge que doeu. 

“O que é que deu em você?” Jonathan se materializa atrás de mim e eu levo um susto tão grande que eu arfo. 

Me viro lentamente e noto que a gangue toda do meu irmão se reuniu no corredor para me assistir gritando e pulando. 

Fico vermelha. E esse é o negócio de ser ruiva, não é só o meu rosto que fica vermelho, mas T O D O o meu corpo. 

“É... Hummmm...” tento responder mas meu olhar crava em Jace e noto que ele está observando o Simon. Seus olhos são frios e um tanto angustiados, não sei quanto tempo encaro mas desvio o olhar quando ele olha para mim. Volto a me concentrar em Jonathan.

“E aí Simon?” Meu irmão comprimenta meu melhor amigo “Ainda bem que voltou de viagem, não sei mais o que eu faria para aguentar a Clary sem o gêmeo siamês dela”

Simon ri e diz “É... fazia um bom tempo desde que ficamos tanto tempo sem nos ver, fiquei com medo dela entrar em alguma espécie de transe sem interação humana” 

“Nem me diga” Jon balança a cabeça como se as preocupações idiotas deles fossem completamente compreensíveis. 

Estou quase dando um tapa nos dois, mas o loiro novamente me chama a atenção, o que diabos tem nesse garoto que captura meu olhar toda vez que ele entra no meu campo de vista? E por que ele parece tão intrigado com as bobeiras que Simon e Jonathan estão dizendo? E então eu escuto:

”Lembra aquela vez em que você quebrou o braço e a Clary quis se jogar de uma árvore porque não queria que você sofresse sozinho?” Jonathan não consegue calar a boca.

”Ei!” Eu piso no pé dele com força e Jonathan exclama um palavrão “Eu tinha oito anos e ainda acho que aquilo tudo foi muito legal da minha parte” 

“Foi bem idiota” Simon responde e olho feio para ele. 

A sala começa a entrar em um silêncio desconfortável enquanto fico vermelha e troco o peso dos meus pés. E então o santo do Jordan vem lá me salvar e mudar de assunto. 

“Clary, você quase me causou um infarto correndo pela escada daquele jeito” 

Caio na risada porque não sei mais o que fazer e rir sempre ajuda.

“É, o Simon veio me entregar uma coisa”.

“Ah, entendi, aposto que é um livro” Jordan fala e eu me surpreendo com o quanto ele me conhece, fico vermelha de novo. Ele presta atenção em mim! Fico fascinada observando o sorriso do meu amigo tatuado. 

E então Jace pigarreia e olho para ele esperando alguma coisa, mas nada. Mais silêncio desconfortável. 

“Érrr... então... Si” me viro para Simon “Quer sair para tomar um sorvete?” 

“Claro” Simon segura a porta para eu sair enquanto dou tchau para o grupo na minha casa. Dou um beijo na bochecha de Jonathan porque eu sei que ele realmente ficou preocupado com meus gritos e ele me fala que tenho que parar de ser escandalosa enquanto o mando ir cuidar da própria vida. 

Assim que chegamos no carro eu dou um suspiro de alívio e me viro para a entrada de casa procurando olhos dourados que sei que não vou encontrar lá, mas que não posso deixar de tentar.