A princesa proibida escrita por Helena Melbourne


Capítulo 22
O treinamento




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/767280/chapter/22

 

O exilado e a princesa andaram um pouco até chegarem a um ponto em que ouvirem o barulho de água caindo, as árvores se tornavam mais escassas e o terreno mais plano. Era uma linda visão, a água caía como um véu do alto das pedras, adornada pela vegetação e encontrava o rio de água transparente.

— Uau, como encontrou este lugar? -perguntou sem conter-se.

— A água do fosso deveria vir de algum ponto, então segui o curso do rio acima e achei essa cachoeira. É reservado e amplo, não poderíamos treinar no castelo, nem na floresta no meio de muitas árvores. – ele explicou aéreo. Seguiram para a margem do rio, onde o chão era formado por pequenas pedrinhas.

— Perfeito. – ela inspirou profundamente o ar fresco e limpo do local e voltou sua atenção ao seu guarda pessoal e agora instrutor. – Estou pronta, onde está minha espada? – perguntou empolgada, Kovu riu pelo nariz, mordendo o lábio inferior de uma forma divertida que, Kiara não pode negar, pareceu deixá-lo mais belo.

— Vossa Alteza já segurou uma espada antes? –  questionou, ela abriu a boca para responder, porém ele a interrompeu. – Não digo espadas decorativas ou de esporte usadas no castelo, mas as de luta.

— Não, mas não deve ser muito diferente. – argumentou inocentemente, ele retirou sua espada da bainha e a estendeu.

— Então, pegue-a. – pediu com doçura. Kiara segurou seu cabo e roçou levemente os dedos nos dele, provocando um formigamento engraçado na pele em contato. Quando o exilado percebeu que ela segurava firme, soltou sua mão e imediatamente a princesa caiu pelo peso da espada, derrubando-a junto. Kovu soltou uma risada gutural e Kiara o olhou com raiva.

— Oras, mas o senhor é mesmo vil.

— Não tome a mal, Alteza, apenas queria mostrar-lhe que não é tão simples assim lutar. Vossa Alteza é fraca, não tem músculos, não consegue ao menos segurar uma espada, como lutará, então? – ele a rondou, observando-a, Kiara quis encolher-se diante do olhar perscrutador do exilado, mas ao invés, empinou o nariz, sentindo seu orgulho ferido.

— Bom, o que faremos aqui se não vamos treinar? – indagou rude. – Por que trouxe a espada então? – remexeu-se inquieta sentindo ele aproximar-se demais.

— Vou matá-la, princesa. – ele sussurrou em seu ouvido com a voz arrastada, Kiara sentiu calafrios, não sabia se por suas palavras ou pela proximidade. – Nunca a encontrarão aqui. – ele riu novamente, afastando-se e ela soltou o ar que nem tinha percebido que prendera.

— Será que o senhor pode parar de ser insolente por um instante? – bufou.

— Quando vossa Alteza for párea para me desafiar, pararei.

— Eu serei, verás. Serei melhor. – ela fitou-o com desafio.

— Bom, para isso, precisa ganhar força. Estamos aqui hoje para que se exercite a fim de ganhar músculos e agilidade.

— Está certo, e que exercício farei? – perguntou vencida.

— Primeiro, vai correr daquela árvore à aquela pedra em forma de v. – ele apontou aos itens referidos.

— Quantas vezes?

— Até eu dizer que pare. – a princesa sentiu desconforto ao submeter-se às ordens de um exilado, mas se aquele fosse o preço para sua independência, ela o faria.

— Faz bem que eu esteja com calçados confortáveis. – ela murmurou.

— No entanto, este vestido que a senhorita usa não a permitirá movimentar-se com precisão. – ele apontou para o vestido vermelho de veludo com cauda, detalhes dourados no busto e mangas cumpridas. Ela riu em descrença.

— E o que o senhor sugere? Que eu me dispa dele? – perguntou sarcástica.

— Precisamente. – confirmou sério. Kiara abriu a boca e ficou vermelha, encabulada demais para balbuciar qualquer coisa. – Não a quero nua, princesa. Está com outras vestes por baixo, não? Apenas retire o vestido e amanhã traga vestimentas apropriadas, ou então podemos ir embora. – Sugeriu, não a deixando menos ofendida.

— O senhor é  muito... muito... Argh! – grunhiu batendo os braços.

— É vossa decisão. – deu de ombros entediado. Ela ficou alguns segundos refletindo, poderia ir embora, mas isso apenas adiaria o dia em que seguraria de fato a espada e ela não estaria nua, de qualquer modo.

— Está bem. – bufou e tentou alcançar os cordões nas costas para desatá-los. – Será que o senhor pode se virar, por obséquio? – Kovu ergueu as mãos rendido e ficou de costas. Passou-se algum tempo em que ela tentava afrouxar os laços feitos por Razel, mas estava difícil, rugiu de raiva.

 - Porventura queres ajuda? – questionou divertido.

— Não. -respondeu malcriada, porém passou-se mais um tempo e estava patética. – Sim... – deu-se derrotada. Kovu deu a volta e postou-se atrás dela, não sem antes lhe lançar um olhar vitorioso.

O exilado inalou o ar e pode sentir o cheiro doce que emanava do pescoço da princesa, sendo atraído pela curva daquele ponto sensível. A castanha experimentou a respiração quente dele em sua nuca, provocando pequenos arrepios na pele alva e a garota remexeu-se inquieta, o que não passou despercebido por Kovu.

Satisfeito, colocou as mãos nos cordões do vestido e os desfez, puxando o tecido de seu aperto, depois, desceu a manga das vestes quase como uma carícia. Kiara fechou os olhos aproveitando o deslizar das mãos firmes num toque mais intenso em contato com sua camisola fina, ela pode sentir o calor das mãos em sua pele.

Kiara sentiu-se tonta com aquela proximidade e toque, mas curiosamente não desconfortável. Um formigamento instaurou-se em seu corpo e ela suspirou, ansiando por mais contato das mãos do exilado. Foi então que percebeu que ele já não se encontrava atrás de si, abriu os olhos e deparou-se com esmeraldas curiosas fitando-a.

— Acredito que possa retirá-lo sozinha agora. – a princesa ruborizou de tal forma que o morango mais vermelho da região teria inveja de sua tonalidade.

— C-claro. – gaguejou. Se despiu do tecido pesado ficando apenas com a camisola branca, que apesar de mais fina não deixava nada transparecer, ainda assim, intimidou-se diante de seu olhar, havia algo ali que ela não conseguia definir.

— Muito bem, pode começar.

Kiara então passou a correr no espaço que Kovu demandou, no começo parecia muito simples, mas já na sexta vez que fez o percurso sentiu os pulmões arderem e parou.

— Perdoe-me, princesa, mas por acaso estou mal de minhas faculdades mentais e falei para que parasse sem ao menos perceber? – Kovu questionou ironicamente.

— Estou... cansada. – ela disse com dificuldade, apoiando-se nos joelhos.

— Claro que está, mantenha a respiração regular, inspire pelo nariz e solte pela boca. – ordenou. – Continue! – Kiara revirou os olhos e seguiu as instruções. Percebeu que ficava menos cansada daquela forma. – Pode descansar. – falou desleixado após mais um tempo de corrida da princesa, notando que ela realmente não conseguiria mais. – ela caiu de joelhos na margem do rio para refrescar-se, tentando manter o mínimo de dignidade.

— Você está se divertindo, não? – ela perguntou mais recuperada. Kovu notava que algumas vezes ela se dirigia a ele de uma forma muito pessoal, o que era considerado uma ofensa se não conhecesse a pessoa com intimidade. Ele não se deixava afetar, a irritando ainda mais, parecia que suas ofensas apenas alimentavam o ego do exilado.

— Não se eleve tanto, minha cara. Eu poderia estar fazendo coisas muito mais interessantes no momento.

— Como o quê? – desafiou.

— Como... – “reinar no meu lugar de direito”, pensou. – Ler um livro.

— Não tinha conhecimento de seu apreço pela leitura... – a informação realmente a pegou desprevenida. - Ou que sabia ler. – não era algo tão comum a alfabetização entre camponeses, ela imaginava que fosse o mesmo para exilados.

— Não me conheces, senhora. – ele disse sério. – E no exílio todos sabem ler. Após a derrota de... meu pai e a expulsão dos que o apoiaram alguns mestres do reino vieram conosco. Não sabia?

— Não, confesso que desconheço os detalhes desse passado, não é algo que meu pai goste de comentar. – se sentiu desconfortável por falar disso com ele.

— Bem, minha mãe como líder dos exilados fez questão de que todos tivessem acesso ao conhecimento. – a princesa ficou surpresa. - Os mestres trouxeram muitos livros para o exílio, mas confesso não se comparar com a biblioteca do castelo. – ele sorriu. Kiara ficou tomada de curiosidade, mas tinha receio de falar de um assunto tão delicado com ele.

— Por que tanta gente seguiu Scar? Ele era tão... – Kiara não queria ofendê-lo, no entanto, não conseguia ver como pessoas tão inteligentes apoiariam um homem ganancioso que só pensava em si.

— Mau? – ele completou e depois riu. – Princesa, o mundo não é dividido entre bem e mal. E para que um rei se mantenha no poder, não pode ser inteiramente “dócil”. – fez aspas e levantou-se da pedra em que estava assentado. – Já leste alguma obra do sir. Maquiavel?

— Não, por quê? – sentiu-se ingênua.

— Ele escreveu o livro “O príncipe”. – fez uma pausa e continuou. – “Tendo o príncipe necessidade de saber usar bem a natureza do animal, deve escolher a raposa e o leão, pois o leão não sabe se defender das armadilhas e a raposa não sabe se defender da força bruta dos lobos. Portanto é preciso ser raposa, para conhecer as armadilhas e leão, para aterrorizar os lobos.” – citou sem esforço, parecia ser uma frase que conhecia bem.

— Estás dizendo que a barbárie é justificável?

— Barbárie é uma violência sem propósito. Se um rei não mostra sua força, é fraco e qualquer um toma seu lugar, se não for benevolente, não há também propósito em mantê-lo.

— Meu pai não é um tirano, é sempre amável e o povo o respeita e admira, nunca houve uma levante.  – argumentou ofendida com a ideia que Kovu estava fazendo de seu pai. O exilado riu de lado lembrando-se da noite em que Simba resolveu “visita-lo”.

— Não digo que seja um tirano, apenas que suas atitudes não podem ser sempre agradáveis, da mesma forma que as de Scar não eram abomináveis a todo tempo.  – concluiu com um ar superior.

— Não vejo bondade num coração tão envenenado pelo poder a ponto de matar o próprio irmão. – falou indignada.

— Vosso pai matou o próprio tio. – ela iria cortá-lo. – E se não houvesse nada de bom em Scar como vossa avó pudera se apaixonar por ele? – Kovu questionou arqueando a sobrancelha direita.  A princesa abriu a boca em um perfeito “o”, parecendo escandalizada.

— Que bobagens o senhor diz? Isso nunca poderia acontecer.

— No entanto, aconteceu, princesa, quer vossa Alteza queira ou não. – ele sorriu satisfeito. – Pois bem, se não acreditas, pode perguntar por aí. – deu de ombros. – Agora vamos fazer um exercício diferente. – ele quebrou a tensão e demonstrou a nova série para a princesa, que manteve-se calada e mal humorada até retornarem ao castelo.

— Precisamos de um novo horário amanhã, se eu desaparecer todo dia no mesmo período, desconfiarão.

— Logo após o desjejum, então. – disse.

— Ótimo.  – falou simplesmente partindo para a ala da família real.

— Até mais ver, princesa. – despediu zombeteiro, não obtendo resposta.

Kiara subia as escadas apressadamente, não queria que a apanhassem naquele estado, mas ao cruzar o corredor norte deparou-se com Razel, que a olhara como se fosse uma pedinte.

— Senhorita... Alteza... O que fizeram a ti? – ela exclamou horrorizada. Kiara estava vermelha, suada e com as vestes sujas.

— Nada Razel, apenas caí. Prepare um banho para mim, sim? – pediu, dando por encerrado o assunto.

— Sim, Alteza.

Após banhar-se e colocar vestes limpas, Kiara seguiu para a biblioteca do castelo perto da sala de reuniões do rei. Enquanto procurava o tal livro murmurava para si, forçando uma voz mais grossa “Já leste alguma obra do Sir Maquiavel?” “Garoto petulante”. Até que achou o livro “O príncipe”, enfim.

— Vou mostrar a ele... – mas parou no meio de seu monólogo ao abrir o livro e encontrar uma espécie de livreto menor quase grudado nas páginas do maior. Parecia muito antigo, de fato, não era uma leitura popular nas terras do reino.

Com curiosidade, abriu o livreto menor deparando-se com uma caligrafia bem desenhada e de letras miúdas como se quisesse preencher as páginas com maior conteúdo possível. Esforçou as vistas e leu o nome na contracapa, “Sarabi Markova”.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A princesa proibida" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.