Carinhosa escrita por Mims


Capítulo 1
Único




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''Nessa noite passada eu sonhei

Com você e adorei

Carinhosa.''

—Carinhosa, Otto

 

A mente de Hermione sempre fora voraz. “Rápida e astuta” de acordo com Rony Weasley. Já Mcgonagall proferiu ‘’Brilhante, sem dúvidas’’.  Desde pequena, a garota costumava ir ao lago perto de sua casa apenas para ler um ou dois livros e contemplar o silêncio que a rodeava com uma constância escrupulosa. Talvez fosse devido a momentos como esse que ela insistisse em se manter exatamente como era. Genial.  Já é de conhecimento universal que Granger nunca tivera problemas em organizar, assimilar e decorar as mais diversas coisas, ainda mais nesse último. Ela definitivamente tinha uma mente bem estruturada.

No entanto, apesar de voraz, rápida, genial, astuta e bem estruturada, havia uma coisa que dava início ao caos dentro daquela cabeça imersa em cachos castanhos. Essa coisa, para Hermione, possuía nome, sobrenome e um par de olhos azuis hipnotizantes.

Pansy Parkinson, de alguma forma, conseguia provocar os sentimentos mais absurdos no turbilhão que havia se tornado a sabe-tudo. Quando a via transcendente pelos corredores da imensa Hogwarts, algo em seu peito palpitava e, mesmo encarando com uma estranheza fingida o olhar superior dela, sabia no fundo de sua alma que havia algo a mais em sua pose de arrogância do que a morena deixava transparecer.

Descobrira isso em uma quinta feira ao vê-la chorar baixinho no banheiro feminino.

Desde então, já caíra na rotina as duas se encontrarem na Sala Precisa, em um cenário reconfortante que misturava pilhas e mais pilhas de livros à espécie estranha e tricolor de flor que a Hermione nunca havia sequer ouvido falar, mas que era intimamente ligada à vida daquela que ansiava por ver assim que o dia de encontro se aproximava. Elas tinham um pacto meio silencioso de sempre abdicarem de suas tardes de domingo para se juntarem naquele mesmo lugar.

Havia alguma coisa na garota de cabelos curtos que fazia a grifana voltar repetidas vezes, mesmo contra sua própria vontade em algumas ocasiões. Ela só não fazia ideia do que era. Mesmo assim, não hesitava em caminhar apressada pelos corredores do castelo um pouco depois do entardecer, sabendo que se depararia com o mesmo oceano na íris da garota de verde.

“Você demorou.” Pansy falou num tom irreconhecível. Se fosse outra ocasião, Hermione até poderia chutar que aquilo era insegurança, mas parecia incomum demais para ser verdade.

“Perdi a hora lendo.” Suspirou colocando os livros que trazia em um canto qualquer da sala.  “Desculpa.”

“Tá tudo bem.” O jeito como ela mexeu nos cabelos evidenciou que não estava. “Senti sua falta.”

Pansy deu alguns passos à frente, se aproximando cada vez mais de Hermione até envolvê-la em um abraço desajeitado. Granger adorava o jeito como a garota vinha até si, quase que implorando por algum tipo de contato, adorava sentir as madeixas negras em contato com sua pele e adorava ainda mais a fragrância adocicada que as acompanhavam.

O abraço logo teve um fim e Parkinson voltou a dar alguns passos para trás, apenas pra encarar os olhos castanhos que amava tanto, mesmo negando para qualquer um que perguntasse. E, assim, ainda sem total consciência do que estava fazendo, beijou os lábios de quem já fora sua pior inimiga.

Sempre que se beijavam, a mente de Hermione entrava em colapso ininterruptamente e uma sensação nunca sentida antes lhe atingia o estômago sem nenhum tipo de pudor. Em seus momentos mais quietos, perguntava-se se poderia chamar aquilo de amor. Chegava à conclusão que quem sabe um dia, mas não naquele momento.

O jeito que Pansy segurava o rosto da morena e de como esta puxava a cintura da outra para perto representava algo, sem dúvidas. Sim, era inegável para ambas todo o desejo presente ali. No entanto, o contato chegou ao fim. Sempre quem cessava aquela proximidade era Granger, mas não daquela vez.

‘’O que será de nós?’’ Pansy perguntou, insegura, tomando coragem para enfrentar a tempestade que se formava diante de seus olhos.

‘’Pensei que não importasse, você mesma disse.’’ Hermione lembrou da discussão que tiveram na semana anterior.

‘’Pra mim importa. Agora importa.’’

Essas frases foram o bastante para que, mais uma vez, a mente de Hermione se desestruturasse por completo. Pansy se virou e Hermione encarou tanto suas costas quanto sua postura receosa. Sabia no que aquilo daria e odiava vê-la assim. Suspirou mais uma vez naquele dia e, quase num ato de paciência, sentou-se em um dos cantos da sala.

‘’Venha, deite aqui.’’ Usou seu tom de voz mais calmo e convidativo, o qual sabia que a sonserina iria ouvir.

Como um gato carente de atenção, Pansy veio quieta até onde Hermione estava e deitou-se em seu colo. A sabe-tudo, sentindo seu coração bater mais forte à presença de sua amada, logo começou a afagar os cabelos da garota.

‘’Tudo tá meio complicado.’’ Ela não esperava que Parkinson fosse a primeira a falar. ‘’Eu quero ficar com você, Granger, mas é tão difícil.’’

Hermione olhou com certa melancolia para a garota que gesticulava em seu colo, entretanto não ousava em tirar as mãos de suas mechas sedosas. Tentava pensar em algo que pudesse falar, mas todas as situações que envolvessem a sonserina deixavam-na sem reação.

‘’O Draco nunca entenderia, muito menos os outros sonserinos. E olhe que nem vou citar a reação de seus amigos e toda a ralé da Grifinória.’’ Arregalou os olhos após dizer a última parte e em seguida olhou para a companheira com um ar de quem pede perdão silenciosamente.

Hermione fechou os olhos por alguns segundos.

‘’Porque você não fala nada?’’ Parkinson perguntou impaciente.

‘’Estou pensando.’’ Direcionou seus pensamentos ao som da voz da garota, agora olhando diretamente em seus olhos, que encaravam outro canto do ambiente.

‘’Em quê?’’

‘’Em como é bom estar aqui, com você. E pra mim isso basta.’’ Voltou a falar e logo envolveu o rosto de Pansy em suas mãos, fazendo-a  levantar e olhar para si. ‘’Eu sei que não é fácil e acho que nós duas sabemos que nada vai melhorar, pelo menos não por enquanto. Então eu quero aproveitar cada momento que eu puder ao seu lado. O resto a gente resolve depois. Juntas.’’

O sorriso de Pansy Parkinson foi carinhoso. Hermione sempre gostou da incógnita que a outra representava em sua vida. Sempre teve muita certeza de tudo à sua volta e a presença instigante da sua então companheira fazia tudo parecer ter um pouco menos sentido, em um caos contraditório que ela gostava de sentir.

‘’Hermione?’’ A garota sussurrou, ainda mantendo o olhar firme.

‘’O que foi?’’

‘’Eu acho que te amo.’’

A sentença a surpreendeu com a mesma intensidade que qualquer notícia de escala mundial. Sem conseguir se conter, o rosto de Granger abriu-se em um sorriso entusiasta e, movida por impulsos, jogou-se em cima da garota à sua frente, decidida como nunca esteve.

Hermione apreciava aqueles momentos nos quais sentia os lábios de Pansy em contato com os seus, suas mãos percorrendo os cachos de seus cabelos com um toque singelo, calmo, diferente da pressa e urgência que costuma ter. O sorriso de ambas enlaçava aquele momento e concretizava o que elas pensavam em uma sintonia quase perfeita:

Não existe instante melhor que o agora.

Era inegável que a relação das duas não era algo concreto e estava longe de ser. Tinham brigas, desentendimentos, desavenças e mais uma série de coisas que Hermione não gostava sequer de lembrar, mas sempre acabava voltando todo domingo à Sala Precisa, encontrando Pansy com a mesma feição insegura, o mesmo olhar vacilante e o mesmo abraço de saudade.

‘’Achei que não voltaria.’’ A garota sussurrou prendendo-se nos braços de Hermione e logo começou a reconciliação.

Tudo bem, Hermione Granger sempre se definiu e foi definida por todos à sua volta como alguém calma, inteligente, sagaz e mais uma série de adjetivos que só lhe diziam vantagem. Não negava quando lhe atribuíam o título de brilhante, genial ou extraordinária, até porque uma parte mais egocêntrica de si concordava com tudo isso.

Pensava que possuía grande parte de sua vida planejada, que nada lhe sairia do controle e que sempre teria domínio total pelas situações que enfrentaria. Contudo isso fora antes de conhecer Pansy Parkinson e de voltar mais e mais vezes para a Sala Precisa, esperando ver a mesma alma que a completava.

No fundo, Hermione tinha a certeza que, caso se entregasse totalmente à garota, nunca conseguiria voltar a ser a mesma. E, mesmo completamente desestruturada e enfrentando continuamente a tempestade que havia nos olhos azuis de Pansy, estava começando a gostar da ideia.


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