Pra onde quer que eu vá... escrita por Amanda Vieira


Capítulo 3
Heitor




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 Alguns estudiosos elegem Heitor como verdadeiro grande herói da guerra de Troia, mas a grande maioria prefere conceder este título á Aquiles, talvez por ele ter tido a brilhante ideia que resultou no Cavalo de Troia, mundialmente conhecido. As pessoas ignoram o fato de que foi Heitor quem liderou e garantiu a durabilidade de Troia durante a guerra.

 Heitor assumiu a responsabilidade de comandar as tropas quando viu seu pai debilitado. Heitor, mesmo sabendo que Paris tinha errado e era o causador de toda desgraça, continuou ao lado do irmão. Heitor, o mais velho e mais sábio dos irmãos. Heitor que morreu por Troia, após ter erroneamente matado Pátroclo que vestia a armadura de Aquiles e desafiado a enfrentar um duelo com o herói grego, evitando que sua cidade sofre-se por seus pecados.

 Eu não sou Heitor de Troia, mas me orgulho de ter herdado seu nome. Minha mãe o escolheu, pois queria que eu viesse a me tornar um grande homem, independente das circunstancias. Talvez o nome tenha influenciado algo em mim. Talvez eu apenas queira estar a altura de carrega-lo.

 Encaro a mesa a minha frente. Estou no escritório que já foi do meu pai, tentando me adequar. Eu não era um homem de negócios até ele descobrir uma doença terminal. Na verdade, eu não era nada dele, antes do diagnóstico.

 Sempre fomos eu e minha mãe. Ela é uma mulher brilhante, que eu admiro e tenho orgulho. Estou aqui graças á ela, que tanto insistiu para que eu luta-se por meus direitos. Minha mãe se envolveu com meu pai brevemente e seu caso resultou no meu nascimento. Porém, meu pai estava de casamento marcado com outra mulher e não quis deixa-la. Eu herdei seu sobrenome, apesar de não usa-lo. Ele sempre nos ofereceu tudo o que seu dinheiro era capaz de proporcionar, exceto sua presença, isso sua mulher nunca iria permitir. Conforme eu ia crescendo, abdiquei de quaisquer contatos com meu pai, minha mãe era tudo o que me bastava e ela sempre foi autossuficiente, tanto que todo o dinheiro mandado por meu pai era depositado numa conta bancária em meu nome, ao qual não dei importância e ela nunca mexeu, pois não precisávamos.

 Aguardo inquieto a chegada de Flora, a viúva do meu pai. O enterro foi há dois dias e eu já sou presidente interino da M. Díaz International Company, dono de 65% das ações. O advogado irá ler o testamento e já estou me preparando psicologicamente para os chiliques de Flora, que sempre menosprezou minha existência e nutre um ódio genuíno pela minha mãe. Desde o dia em que meu pai apareceu em nossa casa, após o diagnóstico e resolveu me inserir como herdeiro da empresa, tenho tido mais contato com Flora, o que não a agradou nem um pouco.

 A porta se abre bruscamente, e o diabo em pessoa entra, trajando um vestido preto e salto alto. Logo atrás está Marcela, sua filha do primeiro casamento. E correndo atrás delas está Cibele, minha secretária, ela me olha assustada e antes que diga algo eu tomo a frente.

 -Tudo bem, Cibele, pode ir. -digo e ela se acalma. Flora nunca me respeitou e nem aos procedimentos da empresa, não achei que fosse começar agora.

 -O senhor deseja alguma coisa? -pergunta prestativa.

 -Apenas avise ao Aroldo que já estamos prontos. -peço e ela se vai.

 Flora está me olhando visivelmente irritada, enquanto Marcela não sabe como agir. Respiro fundo antes de me dirigir a elas.

 -Sentem-se. -digo, calmamente. Marcela opta pelo sofá, enquanto Flora caminha em minha direção, batendo os saltos no piso de mármore.

 -Quem você pensa que é? -grita, com as mãos espalmadas sobre a mesa, onde ainda estão os itens pessoais do meu falecido pai. Há um porta retrato dourado com uma foto de Flora e Marcela, mas há uma foto minha criança 4x4 enganchada. Flora a olha e então a pega e arranca minha foto. -Isso não vai ficar assim! Miguel só podia estar louco quando lhe deixou seu império.

 Nesse momento a porta se abre e Cibele entra, acompanhada do advogado da empresa.

 -O senhor Reyes. -anuncia e Aroldo vem nos cumprimentar. Enquanto isso Cibele nos serve um cafezinho que ela descobriu, eu adoro.

 -Marcela, linda como sempre. -comenta, beijando a mão branca e delicada de Marcela. Logo em seguida caminha até Flora. -Senhora Díaz, meus pêsames. -diz e Flora se recompões, fazendo drama. Aroldo me estende a mão por cima da mesa. -Senhor Díaz, meus pêsames e se me permite, parabéns pelo cargo.

 -Isso é completamente absurdo! -reclama Flora, mas a ignoro.

 -Aroldo, obrigado. Queira sentar-se, por favor. -respondo e ele ocupa uma das cadeiras a minha frente, pega sua pasta de couro e retira alguns papeis.

 -Podemos começar?-pergunta. Flora faz menção de contrariar, mas a corto com um gesto e assinto pra Aroldo. -Pois bem. Estamos aqui para que o testamento do senhor Miguel Perez Díaz seja lido e cumprido, conforme seus desejos. Primeiramente, o sr Miguel gostaria de assegurar que sua mulher Flora Martins Torres Díaz e sua enteada Marcela Martins Torres recebam uma mesada previamente já estipulada com o banco até que estas venham a contrair o matrimonio. A faculdade de Marcela e quaisquer cursos acadêmicos que está venha a fazer deveram continuar sendo bancados pela empresa, caso o pai ou mãe da mesma não interfiram.

 A essa altura Flora já está sentada ao lado de Aroldo, sorrindo vitoriosa.

 -E a casa?-interrompe.

 -É o próximo assunto. -responde Aroldo e volta a ler. -"A casa é vinculada a empresa e meus bens pessoais", claramente especificado no acordo pré-nupcial firmado entre o sr Miguel e a sra Flora. "Legalmente a residencia principal e minhas demais propriedades iram pertencer ao meu único e legitimo filho, Heitor Augusto Arantes Díaz. Entretanto, é de minha vontade que ele e Flora entrem em comum acordo, ou seja, Flora deve permanecer na casa principal, se assim Heitor concordar ou este deverá ceder outra propriedade que seja de seu agrado e de Flora, para que ela e Marcela possam residir."

 -Eu não acredito que Miguel deixou que eu passa-se por esta humilhação! -choraminga Flora.

 -Precisamos decidir isto agora?-pergunto a Aroldo.

 -Não recomendo. Você pode analisar todas as propriedades herdadas antes de decidir. No entanto, enquanto isto não for resolvido, Flora e Marcela deveram permanecer em sua atual residencia. -responde. Assinto.

 -Continue então. -peço. Então Flora se levanta transtornada.

 -Eu não vou sair da minha casa! -grita, a encaro.

 -Legalmente a casa não é sua, você assinou um contrato em que isso estava explicito concordando que fosse assim, não venha chorar agora. Miguel ainda esta sendo bonzinho em te deixar um teto. -retruco, ríspido. -Agora sente-se e vamos terminar logo com isso.

 -Eu não vou me sentar! -continua Flora. -Você é um bastardo e não vai tirar tudo de mim, eu vou te processar por se aproveitar do estado debilitado de Miguel!

 A encaro sério, ficando levemente irritado.

 -Você vai sentar agora e calar essa boca até Aroldo dizer que você precise responder alguma coisa, caso contrario, eu faço você ser enxotada daquela maldita casa hoje mesmo! -ameaço. Ela não se move. -Não teste a minha paciência Flora. Aroldo, pode continuar.

 Flora se senta e Aroldo pigarreia antes de continuar.

 -Quanto a mesada recebida por Lara Elizabeth Arantes, mãe de Heitor Augusto Arantes Díaz, deverá continuar sendo bancada pela empresa, sem reduções, até que esta venha a falecer.

 -O que?-exclama Flora. A olho ameaçadoramente, já sem paciência.

 -Aroldo, é possível suspender este termo?-pergunto, ele me encara. Suspiro. -Minha mãe nunca aceitou nada do Miguel, ela se sentiria ultrajada se isso continua-se, principalmente agora que eu sou o dono de tudo. Ela nunca precisou e não é agora que vai precisar.

 -Até parece. -debocha Flora, decido ignora-la.

 -Se ela manifestar seu desejo de renunciar a quaisquer bens deixados pelo sr Díaz perante o juíz, isso pode sim, ser revogado, mas é algo sem volta. -explica.

 -Obrigada, vou falar com ela. -agradeço, aliviado.

 -Entrem em contato comigo, que resolvo tudo. -oferece, assinto.

 Duas horas se passaram, até que enfim, Aroldo termina de ler o testamento. E já sei que vou para os Campos Elísios pelo simples fato de não ter matado Flora no dia de hoje. Aroldo se levanta pra ir embora e eu espero que ela faça o mesmo.

 -Quando tomar um decisão sobre a propriedade lembre-se de avisar Flora. Qualquer coisa estou a sua disposição. -fala Aroldo e estendo minha mão pra nos despedirmos.

 -Eu vou contratar um advogado e processar vocês dois, me aguardem! -exclama Flora, então se dirige até a porta, respiro aliviado.

 -Heitor, posso falar com você um momento?-pede Marcela, que esteve calada desde que chegou. A olho surpresa e Flora parece ultrajada.

 -Vamos embora, Marcela, agora! -impõe.

 -Pode ir, mãe, eu te encontro depois. -responde Marcela. Antes que Flora diga algo, intervenho.

 -Claro, podemos tomar um café. -convido, ela sorri. Flora nos olha enojada, então vai embora.

 Resolvo dar meu dia por encerrado. Amanhã me intero sobre tudo isso. Pego meu paletó do cabide, minha pasta e confiro rapidamente se há mais alguma coisa que preciso levar. Meus olhos recaem sobre o porta retrato dourado com a foto de Flora e Marcela, pego e entrego a Marcela. Ela o olha e sorri, guardando na bolsa.

 -Vamos. -chamo.

 Saímos da empresa e caminhamos até um café próximo. Me acomodo numa mesa perto da parede e Marcela me acompanha. Um garçom aparece e fazemos nossos pedidos, logo ele retorna com duas xícaras e um pedaço de bolo de chocolate para Marcela. Tomo um gole do meu café esperando que ela diga o que quer.

 Marcela é dois anos mais velha que eu e aposto que se parece com o pai, herdando apenas os cabelos da mãe. É uma mulher de vinte e sete anos belíssima. Esta se formando em medicina, pelo que soube, quer ser neurocirurgiã. Nós nunca tivemos contato por causa de sua mãe, que nunca me suportou. Nas raras vezes que estive na casa de Miguel, Flora mantinha Marcela longe de mim, chegando ao ponto de manda-la para a casa do pai, enquanto eu estivesse lá.

 -Meus pêsames. -solta de repente. A encaro.

 -Você sabe que ele não significava nada para mim. -retruco, ela me olha e me sinto culpado, ela não tem culpa de nada, assim como eu. -Desculpe.

 -Eu quem devo pedir desculpas, minha mãe não é fácil, sinto muito por tudo o que ela te causou e ainda causa. -diz, bufo.

 -Você não tem culpa dos erros dela. -digo e decido mudar de assunto. -Como está seu pai?-pergunto, mesmo não sabendo absolutamente nada dele.

 -Está bem, acho que minha mãe não vai dar chiliques quando ele vir me buscar agora. -responde. Pela minha expressão de confusão ela me conta algo que eu nunca imaginaria. -Ela não gostava que ele aparece-se para me buscar, achava que Miguel não iria gostar de seu ex-marido estar em sua casa, mesmo que fosse apenas por minha causa. Mas seu pai nunca se importou, ele era um bom homem, me tratava como se eu fosse sua sobrinha.

 -E o seu pai?-questiono, levemente curioso.

 -Ele brigava com minha mãe e ameaçava me tirar dela, já que ele não podia me ver quando quisesse ia me levar pra morar com ele, pois ele poderia me dar atenção, enquanto ela poderia se ocupar sendo a esposa de Miguel. Palavras dele, não minhas. -ela ri e acabo sorrindo também. -Eu sei que a culpa de você não conviver com seu pai é da minha mãe. Mas saiba que ele sempre acompanhou você de longe, Heitor, ele tinha muito orgulho de você e da sua mãe, mesmo que não dissesse.

 -A culpa é toda dele, Marcela. Quando o homem quer, mulher nenhuma fica no caminho. Ela é sua mãe, entendo, mas eu era filho! A culpa dele é incalculável, nada justifica. -respondo.

 -Você tem razão. -concorda. -Mas ele te amava, Heitor e sempre se culpou por não estar presente na sua vida. Ele achou que quando você cresce-se iria procura-lo, mas quando você se afastou, foi um golpe muito duro pro Miguel. Não que não fosse merecido, mas ele sofreu, de verdade. Acho que ele sempre quis que você herdasse a empresa e aproveitou a doença pra poder conviver um pouco com você nos últimos momentos.

 -Olha, Marcela, nós podemos mudar de assunto?-peço cansado. Ela concorda. -O que você queria falar comigo? Aposto que não era sobre os sentimentos enrustidos de Miguel.

 Ela da um sorriso amarelo e bebe um gole de seu cappuccino.

 -Eu sei que minha mãe não merece nada de você e que isso tudo é pedir de mais...

 -Você quer que eu a deixe ficar com a propriedade principal. -concluo. Marcela arregala os olhos.

 -Não Heitor, não é isso. Não exatamente. -diz apressada. Então respira fundo e me encara, com seus olhos cor de mel. -Eu queria que você permiti-se que ela fica-se com a propriedade do litoral. Eu sei que é a que ela mais adora, além da principal.

 -E por que isso?-pergunto, curioso. Ela dá de ombros.

 -Acho que faria bem á ela. É uma das casas que ela mais gosta, então não seria tão difícil convence-la. -responde.

 -E quanto a você?-questiono por causa da faculdade, ela sorri.

 -Vou ficar com meu pai. -responde prontamente.

 -Se você está tão certa disso, vou conversar com Aroldo e ver o que precisamos fazer. Sinceramente, não iria expulsa-las. -confesso, ela me encara surpresa.

 -Mas aquela casa é sua, por direito!

 Agora sou eu quem dou de ombros.

 -Nunca fui bem vindo nela, Marcela.

 -Mesmo assim, deveria ficar com ela. -insiste.

 -Vou pensar nisso. Ainda tenho que conversar com a minha mãe. -falo.

 -E sobre a minha faculdade, meu pai vai cuidar disso. -fala.

 -Não é preciso, não me importo realmente que a empresa continue pagando pelos seus estudos. -falo sincero.

 -Meu pai nunca gostou disso, pra começo de conversa. Agora que o Miguel não está mais aqui, meu pai vai fazer tudo o que sempre quis e minha mãe não permitiu. Sinceramente, acho que minha mãe queria que Miguel se torna-se meu pai, mas meu pai nunca aceitaria isso, ele só não entrou na justiça por minha causa, porque me afetaria. Agora que ele tem a chance de me bancar, não vai desperdiçar. -explica.

 -Tudo bem. Pede pra ele entrar em contato comigo, falarei com Aroldo pra ele agilizar os processos. -concordo, ela sorri.

 Conversar com Marcela se mostrou muito mais agradável do que eu poderia imaginar. Apesar do meu cansaço e minha vontade de ir pra casa, não me importei de ficar com ela no café até ela precisar ir embora por causa da faculdade. Então vou pra casa, descansar e conversar com a minha mãe.

...

Os dias passam e ainda estou analisando tudo o que meu pai me deixou. Flora cumpriu sua palavra e contratou um advogado pra nos processar, mas ela está sem apoio nenhum. Já comuniquei que darei a propriedade litorânea à elas e Marcela aproveitou a deixa para avisar que irá morar com o pai, o que deixou Flora ainda mais maluca. Richard, o pai de Marcela veio falar comigo pessoalmente e gostei bastante dele. Aroldo já havia preparado a papelada sobre as despesas universitárias e foi tudo bem rápido. Richard ficou agradecido por eu estar sendo tão prestativo e atencioso com sua filha, apesar de nossas diferenças, que envolvem a mãe dela.

Minha mãe disse que não quer mais nada do meu pai e que eu não preciso me preocupar com ela, eu teria um futuro brilhante e era tudo o que ela queria.

Eu assumi a empresa, fiz uma reunião com todos os assessores para me apresentar e juntos traçarmos um planejamento para dali em diante. Tenho que admitir, Miguel fora um ótimo professor no pouco tempo que pode me ensinar. Aprendi a ser grato a ele, apesar de tudo, ele não foi o pai perfeito, mas se importava o mínimo comigo e minha mãe, mesmo após a morte. Logo me adequei a rotina de ser um grande empresário e passei a administrar tudo com maestria.

Flora ainda se recusava a deixar a propriedade principal, mas eu já estava impondo minha presença lá. Minha mãe não queria vir comigo, mas eu estava decidido a tornar a propriedade minha casa. Contratei uma arquiteta e decoradora pra tornar tudo a minha cara e Flora me processou por isso também, mas a ignorei, a casa é minha e eu faço o que quiser. Só não a expulsei em respeito à Marcela. Embora já esteja no limite com seus chiliques.

Falando em Marcela, estamos mais próximos do que nunca. Saímos mais algumas vezes pra tomar café e até outros tipos de refeições. Ela está muito feliz por se mudar pra casa do pai em breve (está apenas esperando Flora ir pra casa do litoral) e eles tem passado mais tempo juntos também. As vezes ela aparece de surpresa na empresa e ficamos conversando banalidades. Eu também aproveito quando ela está lá pra visitar a obra com a arquiteta, Marcela tem um bom gosto e sempre me ajuda nas decisões.

Nesse momento estou me arrumando pra ir jantar com ela. Enquanto não me mudo, continuo no apartamento da minha mãe, mas já estou encaixotado minhas coisas. Termino de me arrumar e vou pro estacionamento pegar o carro. Sigo direto pro restaurante que Marcela marcou e a encontro me esperando numa mesa, tomando uma taça de vinho. Ela nota minha presença e sorri, como sempre. Me aproximo e me sento na cadeira a sua frente.

—Começando sem mim, dona Marcela. -repreendo e ela revira os olhos.

—Você estava demorando de mais e aproveitei que o garçom tava me dando mole, pedi um vinho. -retruca.

—Que garçom é esse que estava te assediando? -pergunto, erguendo a sobrancelha ao que ela ri.

—Ele agora está com uma cara triste por ver que eu realmente tenho um acompanhante. -diz, divertida. Olho em volta e logo identifico um garçom nos olhando. Fico irritado por sua atitude desrespeitosa com Marcela, que está levando tudo na brincadeira. -Hora, Heitor, não vai me dizer que está com ciúmes. -debocha. A encaro sério e ela para de sorrir. -É sério isso? O que está acontecendo, você mesmo me disse ontem que somos bons amigos.

—Então você decidiu retribuir o assédio de um garçom? -Retruco, ela me olha chocada.

—Eu não retribui nada, Heitor. Aliás, ele apenas foi atencioso comigo e eu fui simpática. Mas saiba que assim como os homens, mulheres também gostam de ter seus egos enaltecidos. -diz, brava. Suspiro.

—Vamos jantar. -falo e ela concorda.

Chamo o garçom e ele sorri descaradamente pra Marcela. Fazemos nossos pedidos e tentamos manter uma conversa até que o garçom volte com nosso jantar. Comemos em silêncio. O garçom está claramente assediando Marcela e ela prefere fingir que não é nada de mais. Me canso dessa situação e me levanto no meio da sobremesa, não tenho mais apetite e nem vontade de continuar aqui. Marcela me olha confusa, enquanto saco minha carteira e deposito algumas notas de dinheiro sobre a mesa.

—Estou indo embora. -aviso. Espero que ela venha comigo, mas ela me olha irritada e volta a prestar atenção em sua sobremesa.

—Não sei o que está acontecendo com você, então me ligue quando parar de ser babaca. -diz sem me olhar. Solto uma risada seca e vou embora.

Chego em casa me sentindo frustrado. Eu sei que Marcela pode pedir um uber, mas eu prometi a Richard que a levaria pra casa. Sinto que agi como um idiota e decido ligar pra ela, se ela ainda estiver no restaurante vou busca-la.

Volto a ficar irritado quando a ligação cai na caixa postal pela terceira vez. Decido ligar pro restaurante e eles me informam que ela já havia ido embora. Espero algum tempo e ligo pra casa de Richard, uma empregada me atende.

—Oi, aqui é o Heitor, queria saber se a Marcela já chegou. -explico.

—Ela ainda não chegou, sr Heitor. -responde e conheço a ficar inquieto.

—Tudo bem. Se ela chegar, me ligue por favor. -peço antes de desligar.

Volto a ligar pro celular de Marcela, até que ela finalmente me atende irritada.

—Mas que porra você quer comigo, Heitor? -atende, me fazendo sorrir, apesar de bravo.

—Onde você tá, sua maluca? -pergunto e ela grita frustrada.

—Qual é o seu problema? Maluco é você Heitor, que implicou com o garçom e começou a agir que nem um idiota. -retruca.

—Onde você tá? -insisto. Ela ri, amarga.

—Não te interessa, você me deixou lá sozinha!

—Porra, Marcela, me diz logo onde você está!

Alguns minutos de silêncio e ela finalmente me diz que foi pra uma pracinha logo adiante do restaurante. Corro pro carro e vou atrás dela. A encontro tomando sorvete, sentada num banco de cimento, apoiada numa mesa também de cimento.

—Não acredito que você veio tomar sorvete, Marcela. -repreendo, ela me mostra o dedo do meio. Me acomodo atrás dela, que continua de costas pra mim.

—Você é um babaca, Heitor. Nem sei por que te disse onde estava. -fala irritada.

Ficamos em silêncio, enquanto Marcela termina seu picole. Do nada ela se vira pra mim e seus olhos encontram os meus.

—Por que fez aquilo? -pergunta chateada. Respiro fundo antes de responde-la.

—Não gostei do jeito que ele tratou você.

—Por que?

—Eu só não gostei, Marcela, me desculpe se te magoei!

—Por que você não gostou, Heitor? -Insiste. Bufo e passo uma mão nos meus cabelos.

—Que droga, Marcela, o que você quer que eu diga? -pergunto.

—Quero que diga a verdade, Heitor.

—Não tem verdade nenhuma pra dizer, eu já fui bem claro.

Ela se levanta decidida.

—Se você não disser eu vou embora. -ameaça. A olho chocado.

Fecho meus olhos e analiso a situação. Essa noite não foi nada do que imaginei, nenhuma das vezes que sai com Marcela foi assim. Estou surpreso com minha atitude e com o rumo que as coisas tomaram. Me levanto e abro os olhos, encontrado um par de íris cor de mel.

—Eu fiquei com ciúmes. -respondo.

—Por que?

—Puta merda, Marcela, isso é um questionário agora? -reclamo.

Ela tenta se afastar, mas a puxo de volta. Ela começa a se debater em meus braços, nos fazendo parecer loucos.

—Para com isso, Marcela, vão achar que estou machucando você.

—Me solta, Heitor! -grita irritada.

Ainda bem que está tudo deserto ou eu teria problemas. Aperto Marcela mais forte contra mim, então viro seu rosto e vejo lágrimas se formarem em seus olhos.

—Desculpa. -peço e ela me encara. -Eu não devia ter agido daquela maneira e principalmente, não devia ter te deixado sozinha. Me perdoe.

—Tudo bem. -sussurra.

Fico olhando seu rosto por um momento. Ela sem duvidas parece com o pai e graças aos deuses por isso, não aguentaria olhar pra Marcela se ela fosse mais parecida com a mãe. Ela também está me olhando e sorrio. Antes que eu perceba, nossos lábios estão colados. A beijo com certa intensidade e Marcela se agarra a mim. Ficamos assim até que o ar nos falta e nos afastamos relutantes.

—Droga, acho que me apaixonei pela filha da minha MÁdrasta. -brinco e Marcela me dá um tapa no braço.

—Você é ridículo, Heitor. -fala. Então sorri pra mim. -Apaixonado é?

Sorrio de volta.

—Talvez.

—Caralho, Heitor, você é muito babaca. -xinga Marcela. Volto a aperta-la em meus braços.

—Calma, irritadinha. Eu tô brincando.

—Espero que minha mãe mate você quando descobrir. -diz Marcela, irritada. Gargalho.

—Você é louca. -digo e antes que ela faça ou fale algo a beijo. -Minha louca.


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